ENFERMAGEM, CIÊNCIAS E SAÚDE

Gerson de Souza Santos - Bacharel em Enfermagem, Especialista em Saúde da Família, Mestrado em Enfermagem, Doutorado em Ciências da Saúde - Universidade Federal de São Paulo. Atualmente professor do Curso de Medicina do Centro Universitário Ages - Irecê-Ba.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Distúrbios Alimentares



Os distúrbios alimentares graves são agrupados em três categorias: a recusa em manter um peso corpóreo mínimo normal (anorexia nervosa), a ingestão excessiva de alimentos seguida pela purgação (bulimia nervosa) e a ingestão excessiva de alimentos sem purgação (comer compulsivo ou binge-eating). O comer compulsivo (bingeeating) é o consumo rápido de grandes quantidades de alimento em um período curto de tempo, acompanhado por um sentimento de descontrole. A purgação é o vômito auto-induzido ou o uso inadequado de laxantes, diuréticos ou enemas para eliminar os alimentos do organismo.

Anorexia Nervosa

A anorexia nervosa é um distúrbio caracterizado por uma distorção da imagem corpórea, um medo extremo da obesidade, a recusa em manter um peso corpóreo mínimo normal e que, nas mulheres, produz a ausência de períodos menstruais. Cerca de 95% dos indivíduos que sofrem de anorexia nervosa são do sexo feminino. Ela geralmente inicia na adolescência, às vezes antes e menos freqüentemente na idade adulta. A anorexia nervosa afeta sobretudo indivíduos das classes sócio-econômicas média e alta. Na sociedade ocidental, o número de indivíduos com esse distúrbio parece estar aumentando. A anorexia nervosa pode ser leve e temporária ou grave e prolongada. Foram relatadas taxas de mortalidade de até 10 a 20%. No entanto, como existe a possibilidade de casos leves não terem sido diagnosticados, não se conhece exatamente quantos indivíduos sofrem de anorexia nervosa ou qual a porcentagem de indivíduos morrem em decorrência da mesma. A sua causa é desconhecida, mas os fatores sociais parecem ser importantes. O desejo de ser magro é algo muito freqüente na sociedade ocidental e a obesidade é considerada pouco atrativa, não saudável e indesejável. Mesmo antes da adolescência, as crianças estão ao par dessas atitudes e dois terços das adolescentes fazem dieta ou adotam outras medidas para controlar o peso. No entanto, somente uma pequena porcentagem delas desenvolve anorexia nervosa.

Sintomas

Muitas mulheres que mais tarde apresentam anorexia nervosa são meticulosas e compulsivas, com metas muito elevadas de realização e êxito. Os primeiros indicadores da iminência do distúrbio são o aumento da preocupação em relação à dieta e ao peso corpóreo, inclusive entre aquelas que já são magras, como é a maioria dos indivíduos com anorexia nervosa. A preocupação e a ansiedade em relação ao peso aumentam à medida que eles se tornam cada vez mais magros. Mesmo quando chega à emaciação, o indivíduo declara que se sente obeso, nega estar apresentando algum problema, não se queixa de falta de apetite ou de perda de peso e, geralmente, resiste ao tratamento. O indivíduo geralmente não procura um médico até serem levados por membros da família que se mostram preocupados. Anorexia significa “falta de apetite”, mas, na verdade, os indivíduos com anorexia nervosa têm apetite e preocupam-se com a alimentação.

Eles estudam regimes e calorias; acumulam, escondem e desperdiçam deliberadamente os alimentos; colecionam receitas e preparam refeições elaboradas para os outros. Metade dos que sofrem de anorexia nervosa come compulsivamente e em seguida realiza a purgação através do vômito ou do uso de laxantes e diuréticos. A outra metade simplesmente restringe a quantidade de alimentos ingeridos. A maioria também exercita-se excessivamente para controlar o peso. As mulheres param de menstruar, algumas vezes antes de perder muito peso. Tanto as mulheres quanto os homens podem perder o interesse sexual. Tipicamente, eles apresentam uma baixa freqüência cardíaca, hipotensão arterial, baixa temperatura corpórea, edema tissular causada pelo acúmulo de líquido e pêlos finos e macios ou excesso de pilificação corpórea ou facial.

Os anoréxicos que emagrecem muito tendem a manter uma grande atividade,incluindo a prática de programas de exercícios intensos. Eles não apresentam sintomas de deficiências nutricionais e, surpreendentemente, estão livres de infecções. A depressão é comum e os indivíduos com esse distúrbio freqüentemente mentem sobre a quantidade de alimento consumido e ocultam o vômito e os hábitos alimentares peculiares. As alterações hormonais resultantes da anorexia nervosa incluem níveis acentuadamente reduzidos de estrogênio e do hormônio tireoidiano e níveis aumentados de cortisol. Se o indivíduo tornar-se gravemente desnutrido, todos os principais sistemas orgânicos podem ser afetados. Os mais perigosos são os problemas cardíacos e os relacionados a líquidos e eletrólitos (sódio, potássio, cloreto). O coração torna-se mais fraco e bombeia menos sangue para o organismo. O indivíduo pode apresentar desidratação e propensa ao desmaio. O sangue pode tornar-se ácido (acidose metabólica) e a concentração de potássio no sangue pode diminuir. O vômito e o uso de laxantes e diuréticos podem piorar o quadro. Pode ocorrer a morte súbita, provavelmente em decorrência de arritmias cardíacas.

Diagnóstico e Tratamento

Normalmente, a anorexia nervosa é diagnosticada baseando-se na perda de peso acentuadae nos sintomas psicológicos característicos. O anoréxico típico é uma adolescente que perdeu pelo menos 15% de seu peso corpóreo, teme a obesidade, parou de menstruar, nega estar doente e parece saudável. Em geral, o tratamento consiste em duas etapas: a primeira é a restauração do peso corpóreo normal; a segunda, a psicoterapia, freqüentemente complementada com um tratamento medicamentoso. Quando a perda de peso ocorre de forma rápida ou grave – por exemplo, mais de 25% abaixo do peso corpóreo ideal –, a recuperação do peso é crucial. Essa perda de peso pode colocar em risco a vida do indivíduo. Comumente, o tratamento inicial é realizado em ambiente hospitalar, onde membros experientes da equipe médica incentivam – de modo firme, porém delicado – o indivíduo a alimentar-se. Raramente, o paciente é alimentado através da via intravenosa ou através de uma sonda gástrica que é inserida pelo nariz. Quando o estado nutricional do indivíduo é considerado aceitável, é instituído um tratamento de longo prazo, o qual é melhor realizado por especialistas em distúrbios alimentares. Este tratamento pode incluir a psicoterapia individual, em grupo, ou familiar, além de medicamentos. Quando a depressão é diagnosticada, são prescritos medicamentos antidepressivos. O tratamento visa estabelecer um ambiente tranqüilo, estável e interessado no indivíduo, estimulando-o a consumir uma quantidade adequada de alimento.

Bulimia Nervosa

A bulimia nervosa é um distúrbio caracterizado por episódios repetidos de comer compulsivo seguido pela purgação (vômito auto-induzido ou ingestão de laxantes e/ou diuréticos), dieta rigorosa ou prática excessiva de exercícios para contrabalançar os efeitos do comer compulsivo. Como ocorre na anorexia nervosa, a maioria dos indivíduos que sofrem de bulimia nervosa são do sexo feminino, apresentam uma grande preocupação em relação à forma e ao peso corpóreo e pertencem às classes sócio-econômicas média e alta. Embora a bulimia nervosa tenha sido retratada como uma epidemia, somente cerca de 2% das estudantes universitárias, como a população de maior risco, são bulímicas verdadeiras.

Sintomas

O comer compulsivo (consumo rápido e impulsivo de grandes quantidades de alimento acompanhado por uma sensação de perda de controle) é acompanhado por uma angústia intensa e também por purgação, dieta rigorosa e prática excessiva de exercícios. A quantidade de alimento consumido em uma vez pode ser bastante grande ou pode não ser maior que a de uma refeição normal. O estresse emocional muitas vezes desencadeia a ingestão excessiva, a qual geralmente é realizada em segredo. Um indivíduo deve apresentar esse comportamento pelo menos duas vezes por semana para que a bulimia nervosa seja diagnosticada, mas pode ocorrer com maior freqüência. Apesar dos bulímicos preocuparem-se com a obesidade e alguns são obesos, o seu peso corpóreo tende a oscilar em torno do normal.

O vômito auto-induzido pode provocar erosão do esmalte dos dentes, aumento das glândulas salivares das bochechas (glândulas parótidas) e inflamação do esôfago. O vômito e purgação podem reduzir a concentração de potássio no sangue, produzindo arritmias cardíacas. Foram descritos casos de morte súbita após a ingestão repetida de grandes quantidades de ipeca para a indução do vômito. Raramente, os indivíduos que apresentam esse distúrbio comem tanto durante um episódio de comer compulsivo que leva à ruptura do estômago. Em comparação com os indivíduos que apresentam anorexia nervosa, aqueles com bulimia nervosa tendem a ser mais conscientes de seu comportamento e sentem remorso ou culpa. Eles apresentam maior tendência a admitir suas preocupações ao médico ou a um outro confidente. Geralmente, os bulímicos são mais extrovertidos e mais propensos a um comportamento impulsivo (p.ex., abuso de drogas ou álcool e depressão manifesta).

Diagnóstico e Tratamento

O médico suspeita da bulimia nervosa quando um indivíduo demonstra uma preocupação evidente sobre o ganho de peso e apresenta oscilações importantes do peso corpóreo, especialmente quando existem evidências do uso excessivo de laxantes. Outros indícios incluem o aumento das glândulas salivares das bochechas, cicatrizes nos nós dos dedos pelo uso dos dedos para a indução do vômito, erosão do esmalte dos dentes causada pelo ácido gástrico e uma concentração baixa de potássio no sangue. O diagnóstico somente é confirmado quando o indivíduo descreve o comportamento de comer compulsivo e purgação. As duas modalidades de tratamento são a psicoterapia e o tratamento medicamentoso. A psicoterapia, a qual geralmente é melhor realizada por um terapeuta com experiência em distúrbios alimentares, pode ser muito eficaz. Um medicamento antidepressivo freqüentemene pode ser útil no controle da bulimia nervosa, mesmo quando o indivíduo não apresenta uma depressão evidente. No entanto, o distúrbio pode retornar após a interrupção da droga.

Comer Compulsivo ( Binge Eating)

O comer compulsivo (binge eating) é um distúrbio caracterizado pelo consumo exagerado de alimentos que não é acompanhado por uma purgação. Neste distúrbio, o consumo exagerado de alimentos contribui para uma ingestão excessiva de calorias. Ao contrário da bulimia nervosa, o comer compulsivo é mais comum em indivíduos obesos e torna-se mais prevalente com o aumento do peso corpóreo. Os indivíduos que apresentam comer compulsivo tendem a ser mais velhos do que aqueles com anorexia nervosa ou bulimia nervosa e a proporção de homens é maior (quase 50%).

Sintomas

Os indivíduos que apresentam esse distúrbio sofrem por causa dele. Aproximadamente 50% dos comedores compulsivos obesos apresentam depressão, enquanto que apenas 5% dos obesos sem esse distúrbio são deprimidos. Embora esse distúrbio não acarrete os problemas físicos que podem ocorrer na bulimia nervosa, ele é um problema para aquele que está tentando perder peso.

Tratamento

Como o comer compulsivo foi identificado apenas recentemente, não foram desenvolvidos programas terapêuticos padrões para o mesmo. A maioria dos indivíduos com esse distúrbio são tratados com programas convencionais de perda de peso utilizados no tratamento da obesidade, os quais dão pouca atenção ao comer compulsivo, embora 10% a 20% dos participantes desses programas apresentem esse problema. A maioria dos indivíduos aceita essa situação porque estão mais preocupados com a obesidade do que com o comer compulsivo. Os tratamentos específicos para o comer compulsivo encontram-se em fase de desenvolvimento e baseiam-se no tratamento da bulimia nervosa. Eles incluem a psicoterapia e o tratamento medicamentoso (antidepressivos e inibidores do apetite). Embora ambos os tratamentos sejam razoavelmente eficazes no controle do comer compulsivo, a psicoterapia parece ter efeitos mais duradouros.