ENFERMAGEM, CIÊNCIAS E SAÚDE

Gerson de Souza Santos - Bacharel em Enfermagem, Especialista em Saúde da Família, Mestrado em Enfermagem, Doutorado em Ciências da Saúde - Universidade Federal de São Paulo. Atualmente professor do Curso de Medicina do Centro Universitário Ages - Irecê-Ba.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

DIGESTÃO E ABSORÇÃO

          

          O sistema gastrintestinal transporta principalmente nutrientes, eletrólitos e água para dentro do corpo. Nos organismos unicelulares, as necessidades metabólicas podem ser supridas por difusão ou transporte de substâncias do ambiente através da membrana celular. Entretanto, a escala extremamente aumentada dos organismos pluricelulares, com o fato de que esses organismos são, em sua maior parte, terrestres e, portanto, normalmente não nadam em uma sopa de nutrientes, exigiu o desenvolvimento de sistemas especializados para transportar nutrientes para dentro do corpo. Assim, o sistema gastrintestinal e o fígado atuam em conjunto com o sistema circulatório para assegurar o suprimento das necessidades nutricionais das células distantes da superfície externa do corpo.
          A maioria dos nutrientes em uma dieta humana habitual consiste em macromoléculas que são incapazes de atravessar prontamente as membranas celulares. De forma semelhante, os nutrientes em geral não são ingeridos predominantemente na forma de soluções, mas como alimento sólido. Por conseguinte, além do processo físico de captação do alimento, o intestino serve para reduzir fisicamente a refeição a uma suspensão de pequenas partículas misturadas com nutrientes em solução. Em seguida, essas partículas são quimicamente alteradas, resultando em moléculas capazes de atravessar o revestimento intestinal. Esses processos são designados como digestão e envolvem a motilidade gastrintestinal, bem como as influências de alterações do pH, detergentes biológicos e enzimas. 
          A fase final no processo de assimilação de uma refeição envolve o movimento dos nutrientes digeridos para fora do conteúdo intestinal, através do revestimento intestinal, e para dentro da circulação sanguínea ou do sistema linfático, para então serem transferidos a locais mais distantes do corpo. Em seu conjunto, esse movimento direcionado dos nutrientes é denominado absorção. A eficiência da absorção pode variar amplamente para as diferentes moléculas da dieta, bem como para aquelas administradas por via oral com intenção terapêutica, como os fármacos. As barreiras contra a absorção, encontradas por determinado nutriente, dependem, em grande parte, de suas características físicoquímicas e, em particular, de sua natureza hidrofílica (como os produtos da digestão de proteínas e de carboidratos) ou hidrofóbica (como os lipídeos da dieta). Para as principais substâncias de importância vital para o organismo, o trato gastrintestinal não depende exclusivamente do processo de difusão através do revestimento para efetuar sua captação, tendo desenvolvido mecanismos de transporte ativo que captam solutos específicos com alta eficiência.
          Existe uma capacidade excessiva para a digestão e a absorção de uma refeição, incluindo excesso de enzimas e outros produtos secretados, bem como um excesso de área de superfície disponível para a absorção nos indivíduos saudáveis. Por conseguinte, a assimilação dos nutrientes é altamente eficiente, contanto que sejam apresentadas quantidades adequadas ao lúmen. Em épocas primitivas, isso sem dúvida alguma ajudou nossos ancestrais a sobreviver em circunstâncias nas quais o alimento nem sempre era encontrado em quantidades abundantes. Por outro lado, nos tempos modernos e nos países desenvolvidos, essa capacidade excessiva de captação de nutrientes pode contribuir para as elevadas taxas de obesidade.
Excreção
          O sistema gastrintestinal também atua como importante órgão para a excreção de substâncias do corpo. Essa função excretora estende-se não apenas aos resíduos não absorvíveis óbvios da refeição, mas também a classes específicas de substâncias que não podem sair do corpo por outras vias. Por conseguinte, de modo diferente da função excretora do sistema renal, que processa produtos predominantemente hidrossolúveis de degradação metabólica, o intestino trabalha com o sistema biliar para excretar moléculas hidrofóbicas, como o colesterol, os esteroides e os metabólitos dos fármacos. Como veremos adiante, o intestino também abriga um complexo ecossistema de bactérias simbióticas, conhecidas como comensais, mesmo em condições de saúde, e muitos membros dessa comunidade morrem diariamente ou são eliminados pelas fezes. Por fim, as células do próprio revestimento intestinal sofrem rápida renovação, e as fezes também contêm resíduos dessas células mortas
que se desprendem do revestimento após o desempenho de suas funções.
Defesa do hospedeiro
          O intestino é um longo tubo, que se estende da boca até o ânus, cuja superfície interna existe em continuidade com o exterior corporal. Naturalmente, isso é essencial para sua função de transportar nutrientes do ambiente para dentro do corpo; todavia, isso também implica que o intestino, à semelhança da pele, representa uma porta potencial de entrada de substâncias menos desejáveis no corpo. Com efeito, essa propriedade é explorada na administração de fármacos por via oral. Além disso, o intestino é potencialmente vulnerável aos microrganismos infecciosos que podem entrar no sistema com a ingestão de alimentos e de água. Para proteger a si mesmo e ao corpo, o intestino desenvolveu um sistema sofisticado de defesas imunológicas. De fato, o trato gastrintestinal representa o maior órgão linfoide do corpo, com um número significativamente maior de linfócitos do que aquele encontrado no sistema imune circulante. O sistema imune gastrintestinal também é caracterizado por capacidades funcionais específicas, mais notavelmente sua capacidade de distinguir entre “amigo” e “inimigo”, desenvolvendo defesas imunológicas contra patógenos, ao mesmo tempo em que se mostra tolerante aos antígenos da dieta e às bactérias comensais benéficas.
Desenvolvimento de órgãos ocos
O próprio trato gastrintestinal é um longo tubo muscular que se estende da boca até o ânus. Dentro do revestimento desse tubo, estruturas glandulares em fundo cego invaginam-se na parede do intestino e esvaziam suas secreções no lúmen intestinal, definido como a cavidade dentro do intestino. Em vários pontos ao longo do trato gastrintestinal, órgãos glandulares mais elaborados também estão ligados ao intestino e conectados com o lúmen por ductos, possibilitando também a drenagem das secreções para dentro do intestino, onde podem ser misturadas com o conteúdo intestinal. Exemplos desses órgãos incluem o pâncreas e as glândulas salivares. As glândulas, de modo geral, podem ser consideradas como estruturas que convertem materiais brutos da corrente sanguínea em secreções fisiologicamente úteis, como soluções ácidas e enzimáticas. A função desses órgãos ocos está estreitamente coordenada com a do próprio intestino para proporcionar um processamento ótimo da refeição após sua ingestão. Em geral, os órgãos ocos que drenam secreções dentro do intestino apresentam uma estrutura comum. As células secretoras especializadas formam estruturas conhecidas como ácinos, onde ocorre a produção de uma secreção primária no fundo cego da glândula. Grupos desses ácinos, que se assemelham a cachos de uvas, deságuam, em seguida, em estruturas na forma de dúctulos semelhantes a tubos; ductos maiores coletam as secreções de um grupo de ductos menores até que um ducto coletor principal seja alcançado, conectado diretamente com o lúmen intestinal. A morfogênese de ramificação que resulta nessas estruturas durante o desenvolvimento amplifica a área de superfície funcional da glândula e sua capacidade de secreção. O fígado, que é considerado neste livro como um participante de importância crítica da função gastrintestinal geral, possui uma estrutura altamente especializada, que será discutida em detalhe em um capítulo posterior. Por enquanto, é suficiente dizer que o fígado é projetado não apenas para secretar substâncias no lúmen gastrintestinal por meio do sistema biliar, mas também para receber substâncias absorvidas do intestino, que são inicialmente transportadas para o fígado pela circulação porta, antes de seu processamento e distribuição para o corpo.
Divisão do intestino em segmentos funcionais
O movimento dos constituintes de uma refeição ao longo da extensão do intestino é um processo regulado, que envolve a retenção seletiva em locais específicos, para promover uma digestão e uma absorção ótimas. Esse processo é realizado por estruturas musculares lisas especializadas, conhecidas como esfincteres, cuja função também é coordenada com a do sistema como um todo. Por exemplo, o piloro, que controla o efluxo do estômago, retém a refeição no lúmen gástrico e a libera lentamente para segmentos mais distais para adequar a disponibilidade dos nutrientes com a capacidade das enzimas necessárias para a digestão e com a área de superfície absortiva. De modo semelhante, a papila ileal retém a maior parte da microbiota gastrintestinal dentro do lúmen do colo, abrindo-se apenas de modo intermitente para possibilitar a entrada dos resíduos da refeição digerida, com água e restos celulares, no intestino grosso. Por fim, o esfincter de Oddi relaxa durante uma refeição para possibilitar o efluxo das secreções
biliares e pancreáticas no lúmen. Os esfincteres gastrintestinais estão, em sua maioria, sob controle involuntário e realizam seus ciclos normais de relaxamento e contração sem ação consciente, em resposta a sinais liberados durante o progresso da ingestão e digestão de uma refeição. Muitos deles também podem funcionar em grande parte independente do sistema nervoso central, sendo controlados pelo sistema nervoso entérico. Por outro lado, o músculo esfincter externo do ânus pode ser controlado voluntariamente, uma habilidade aprendida durante o treinamento na infância e algumas vezes usada para efeito cômico de expulsão seletiva de flatos. Os esfincteres esofágicos são regulados pelo sistema nervoso central.

Fonte: Fisiologia Gastrintestinal. Kim E. Barrett. 2º Edição. 2015.

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