ENFERMAGEM, CIÊNCIAS E SAÚDE

Gerson de Souza Santos - Bacharel em Enfermagem, Especialista em Saúde da Família, Mestrado em Enfermagem, Doutorado em Ciências da Saúde - Universidade Federal de São Paulo. Atualmente professor do Curso de Medicina do Centro Universitário Ages - Irecê-Ba.

domingo, 15 de novembro de 2009

Indigestão


Indigestão é um termo impreciso que as pessoas utilizam para referir se a sintomas diferentes. Neste capítulo, o termo é empregado para indicar uma ampla gama de distúrbios do trato digestivo, incluindo a dispepsia, a náusea e o vômito, a regurgitação, a sensação de bolo na garganta e a halitose (mal hálito).

Dispepsia

A dispepsia é a dor ou o desconforto localizado na região abdominal superior ou no tórax e que, freqüentemente, é descrita como a sensação de acúmulo de gases, de plenitude ou como uma dor tipo queimação. A dispepsia possui muitas causas. Algumas são distúrbios graves como, por exemplo, úlceras gástricas, úlceras duodenais, gastrite (inflamação do estômago) e câncer gástrico.

A ansiedade também causa dispepsia, possivelmente pelo fato de o indivíduo ansioso tender a suspirar ou a inspirar deglutindo ar, o que pode acarretar distensão gástrica ou intestinal e também eructação (arrotos) e flatulência. Além disso, a ansiedade pode aumentar a sensibilidade do indivíduo a sensações desagradáveis, de modo que pequenos desconfortos tornamse muito estressantes. A bactéria Helicobacter pylori pode causar inflamação e úlceras gástricas ou duodenais, mas não está claro se ela pode causar dispepsia leve nos indivíduos que não apresentam úlcera.

Sintomas e Diagnóstico

A dor ou o desconforto na região abdominal superior ou no tórax pode ser acompanhada por eructação e borborigmos (ruídos intestinais audíveis). Para alguns indivíduos, a ingestão de alimentos piora a dor, enquanto que, para outros, a alimentação a alivia. Outros sintomas incluem a falta de apetite, a náusea, a constipação, a diarréia e a flatulência. Freqüentemente, um indivíduo com dispepsia é tratado sem que sejam realizados exames laboratoriais. Quando estes são realizados, eles não conseguem identificar qualquer anormalidade em cerca de 50% dos casos.

Mesmo quando anormalidades são detectadas, elas freqüentemente não são responsáveis por todos os sintomas. No entanto, como a dispepsia pode ser um sinal de alerta precoce de uma doença grave, exames são solicitados em determinados casos. Quando a dispepsia persiste por mais do que algumas poucas semanas, quando ela não é responsiva ao tratamento ou quando ela é acompanhada por perda de peso ou por outros sintomas inusuais, o indivíduo é submetido a exames. Normalmente, os exames laboratoriais incluem o hemograma completo e a pesquisa de sangue oculto nas fezes.

Estudos radiográficos contrastados (com bário) do esôfago, do estômago ou do intestino delgado podem ser realizados quando o indivíduo apresenta dificuldade de deglutição, vômitos, perda de peso ou uma dor que melhora ou piora com a ingestão de alimentos. Um endoscópio (tubo de visualização de fibra óptica) é utilizado para examinar o interior do esôfago, do estômago ou da porção inicial do intestino e para a realização de uma biópsia da mucosa gástrica. A amostra de tecido coletada é examinada ao microscópio para se detectar a presença do Helicobacter pylori. Algumas vezes, outros exames podem ser úteis como, por exemplo, aqueles que mensuram as contrações esofágicas ou a resposta do esôfago ao ácido.

Causas Comuns de Dispepsia

  • Deglutição de ar (aerofagia)
  • Regurgitação (refluxo) de ácido do estômago
  • Irritação gástrica (gastrite)
  • Úlcera gástrica ou duodenal
  • Câncer do estômago
  • Inflamação da vesícula biliar (colecistite)
  • Intolerância à lactose (incapacidade de digerir leite e produtos laticínios)
  • Distúrbio da motilidade intestinal (p.ex., síndrome do cólon irritável)
  • Ansiedade ou depressão

Tratamento

Se a causa da dispepsia não for identificada, o médico tratará os sintomas. Pode ser tentado um tratamento de curto prazo com um antiácido ou um bloqueador H2 (p.ex., cimetidina, ranitidinaou famotidina). Quando o indivíduo apresenta uma infecção do revestimento gástrico causada pelo Helicobacter pylori, o médico pode prescrever o subsalicilato de bismuto e um antibiótico (p.ex., amoxicilina ou metronidazol).

Náusea e Vômito

A náusea é uma sensação desagradável no abdômen que, freqüentemente, termina em vômito. O vômito é a eliminação forçada do conteúdo gástrico através da boca. A náusea e o vômito são causados pela ativação do centro do vômito localizado no cérebro. O vômito é uma das formas mais dramáticas de eliminação de substâncias nocivas pelo organismo. Ele pode ser causado pela ingestão ou deglutição de uma substância irritante ou tóxica ou de alimento estragado. Algumas pessoas apresentam náusea e podem vomitar devido aos movimentos de um barco, um carro ou um avião.

O vômito pode ocorrer durante a gravidez, particularmente nas primeiras semanas, sobretudo pela manhã, e pode ser intenso. Muitos medicamentos, como as drogas antineoplásicas (quimioterapia) e os analgésicos opiáceos (p.ex., morfina) podem causar náusea e vômito. A obstrução mecânica do intestino acaba causando vômito quando os alimentos e líquidos refluem a partir do bloqueio. Além disso, a irritação ou a inflamação do estômago, do intestino ou da vesícula biliar pode causar vômito. Os problemas psicológicos também podem causar náusea e vômito (vômito psicogênico).

Esse vômito pode ser intencional (p.ex., um indivíduo com bulimia vomita para perder peso). Ele pode ser nãointencional, sendo uma resposta condicionada para a obtenção de algum benefício (p.ex., evitar a ida à escola). O vômito psicogênico também pode ser resultante de uma situação ameaçadora ou desagradável que produz ansiedade. Algumas vezes, os fatores psicológicos que causam vômito dependem da base cultural do indivíduo.

Por exemplo, para a maioria dos americanos, comer formigas cobertas com chocolate é repulsivo, enquanto que em outras partes do mundo elas são consideradas uma iguaria. O vômito pode ser uma expressão de hostilidade (p.ex., uma criança que vomita durante uma crise de raiva) ou pode ser causado por um conflito psicológico grave. Por exemplo, uma mulher que deseja ter filhos pode vomitar na data ou próximo da data em que ela foi submetida à histerectomia (remoção cirúrgica do útero).

Sintomas, Diagnóstico e Tratamento

Logo antes do vômito, o indivíduo freqüentemente apresenta náusea, vômito seco e salivação excessiva. Embora o indivíduo geralmente sinta malestar durante o episódio de vômito, após vomitar ele sente uma sensação de alívio.Para identificar a causa, o médico primeiramente questiona o paciente sobre outros sintomas. A seguir, ele pode solicitar exames laboratoriais simples (p.ex., hemograma completo e urinálise) e exames de sangue mais sofisticados e estudos radiográficos e ultrasonográficos da vesícula biliar, do pâncreas, do estômago e do intestino.

Quando é detectada uma causa orgânica do vômito, esta deve ser tratada. Quando a sua causa é psicológica, o tratamento pode consistir na tranqüilização do paciente ou da prescrição de uma medicação. Para a resolução de problemas complexos, o indivíduo pode necessitar de consultas regulares. Para suprimir a náusea, o médico pode prescrever medicamentos antieméticos.

Regurgitação

A regurgitação é a expulsão de alimentos a partir do esôfago ou do estômago sem náusea ou contrações vigorosas da musculatura abdominal.Freqüentemente, a regurgitação é causada pelo refluxo gastroesofágico (passagem do suco gástrico para o esôfago). Ela também pode ser causada por uma estenose ou por uma obstrução do esôfago. A obstrução pode ser decorrente de várias causas, incluindo o câncer de esôfago.

Além disso, ela pode ser causada por uma incoordenação do controle nervoso do esôfago e de seu esfíncter na entrada do estômago (esfíncter esofágico inferior). A regurgitação sem causa orgânica é denominada ruminação. Ela é comum em lactentes, mas não o é em adultos. A ruminação em adultos ocorre sobretudo naqueles que apresentam distúrbios emocionais, especialmente durante períodos de estresse.

Sintomas, Diagnóstico e Tratamento

O ácido proveniente do estômago causa a regurgitação de um material com sabor acre ou amargo. Um esôfago estenosado ou obstruído causa a regurgitação de um líquido sem gosto que contém muco ou alimento não digerido. Na ruminação, os indivíduos regurgitam pequenas quantidades de alimento do estômago, geralmente 15 a 30 minutos após a alimentação Normalmente, eles mastigam o material novamente e tornam a deglutilo. Esse distúrbio não é acompanhado por náusea, dor ou dificuldade de deglutição. O médico procura uma causa orgânica que justifique a regurgitação.

O refluxo gastroesofágico é diagnosticado por estudos radiográficos, de mensurações da pressão e da acidez do esôfago e de outros testes. O diagnóstico de estenose ou de obstrução esofágica requer a realização de radiografias ou de uma endoscopia. O tratamento de uma estenose ou de uma obstrução esofágica depende de sua causa. Se não foi detectada qualquer causa orgânica, drogas que estimulam a contração normal (p.ex., metoclopramida ou cisaprida) podem ser úteis. Alternativamente, a terapia de relaxamento ou o biofeedback podem aliviar o quadro.

Sensação de Bolo na Garganta

A sensação de bolo na garganta (antigamente denominada globo histérico) é a sensação de apresentar um bolo na garganta, quando ele na realidade não existe.Essa sensação pode ser decorrente de uma atividade muscular ou de sensibilidade anormal do esôfago. Ela também pode ser conseqüencia da deglutição freqüente e do ressecamento da garganta devidos à ansiedade, de uma outra emoção forte ou de respiração acelerada. A sensação de bolo na garganta pode fazer com que o indivíduo apresente relutância para alimentarse. Entretanto, o quadro (que é semelhante à reação normal de sufocação que ocasionalmente é desencadeada por sofrimento, ansiedade,raiva, orgulho ou alegria) é aliviado com aingestão de alimento ou bebida ou pelo choro.

Diagnóstico e Tratamento

Para identificar a causa da sensação de bolo,o médico interroga o indivíduo e realiza umexame físico. Ele pode solicitar um hemogramacompleto, uma radiografia torácica, um estudocontrastado do esôfago e a mensuração daspressões no esôfago. Quando os sintomas forem típicos, não for observada qualquer alteração orgânica e se tensões sociais ou psicológicas forem evidentes, o diagnóstico é estabelecido.Tranqüilizar o indivíduo, assegurandolhe quenão se trata de um distúrbio grave, pode proporcionar alívio. Não existe uma droga específica que alivie a sensação de bolo na garganta,mas os medicamentos ansiolíticos ou antidepressivos podem ser úteis. Quando o problema for a ansiedade, a depressão ou um outroproblema psicossocial, ele deve ser tratado deforma específica, possivelmente com o auxíliode um psiquiatra ou psicólogo.

Halitose

A halitose (mau hálito) é um odor desagradável da respiração. Normalmente, a halitose é causada por determinados alimentos ou substâncias que foram deglutidos ou inalados, por alguma doença dentária ou gengival, ou pela fermentação de partículas alimentares na boca. A halitose pode ser um sintoma de determinadas doenças que afetam outros orgãos (p.ex., diabetes não controlado ou doenças hepáticas, pulmonares ou bucais). A halitose normalmente não é causada por distúrbios intestinais.

Como o esfíncter esofágico inferior permanece fechado (exceto durante a deglutição), os odores gástricos ou de regiões inferiores do trato digestivo não conseguem subir. Entretanto, um tumor esofágico ou gástrico pode provocar a regurgitação até a boca de líquido ou de gás com odor fétido. A halitose psicogênica é a crença de possuir mau hálito sem que isto seja verdade. Esse problema pode ocorrer em indivíduos que tendem a exagerar as sensações normais do corpo.

Algumas vezes, a halitose psicogênica é causada por um distúrbio mental grave (p.ex., esquizofrenia). Um indivíduo com pensamentos obsessivos pode apresentar uma sensação exagerada de estar sujo. Um indivíduo paranóico pode apresentar o delírio de que seus órgãos estão apodrecendo.

Tratamento

As causas orgânicas podem ser corrigidas ou removidas. Por exemplo, as pessoas podem parar de consumir alho ou podem melhorar a higiene dentária. Existem muitos sprays ou colutórios desodorizantes e um dos melhores ingredientes ativos é a clorofila. A ingestão de carvão ativado, que absorve odores, é uma outra medicação. A asseguração por parte do médico da não existência de halitose pode auxiliar alguns indivíduos com halitose psicogênica. No caso de persistência do problema, a psicoterapia pode ser benéfica.