ENFERMAGEM, CIÊNCIAS E SAÚDE

Gerson de Souza Santos - Bacharel em Enfermagem, Especialista em Saúde da Família, Mestrado em Enfermagem, Doutorado em Ciências da Saúde - Universidade Federal de São Paulo. Atualmente professor do Curso de Medicina do Centro Universitário Ages - Irecê-Ba.

domingo, 15 de novembro de 2009

Distúrbios do Pâncreas



O pâncreas é uma glândula em forma de folha, com aproximadamente 12,5 centímetros de comprimento. Ele é circundado pela borda inferior do estômago e pela parede do duodeno (a primeira porção do intestino delgado que se conecta ao estômago). O pâncreas possui duas funções principais: a secreção de um líquido que contém enzimas digestivas para o interior do duodeno e a secreção dos hormônios insulina e glucagon, os quais são necessários para metabolizar o açúcar, para a corrente sangüínea.

Esse órgão também secreta grandes quantidades de bicarbonato de sódio para o duodeno, o qual neutraliza o ácido proveniente do estômago. Essa secreção de bicarbonato de sódio flui através de um ducto coletor que avança ao longo do centro do pâncreas (ducto pancreático). Em seguida, esse ducto unese ao ducto biliar comum (proveniente da vesícula biliar e do fígado) para formar a ampola de Vater, a qual desemboca no duodeno ao nível do esfíncter de Oddi.

Pancreatite Aguda

A pancreatite aguda é uma inflamação aguda do pâncreas que pode ser leve ou letal.

Normalmente, o pâncreas secreta suco pancreático através do ducto pancreático ao duodeno. Esse suco contém enzimas digestivas em uma forma inativa e um inibidor que inativa qualquer enzima que é ativada no seu percurso até o duodeno. A obstrução do ducto pancreático (p.ex., por um cálculo biliar alojado no esfíncter de Oddi) interrompe o fluxo do suco pancreático. Geralmente, a obstrução é temporária e causa um dano limitado, o qual é logo reparado. Entretanto, quando a obstrução persiste, ocorre um acúmulo de enzimas ativadas no pâncreas, as quais suplantam a capacidade do inibidor e começam a digerir as células do pâncreas, causando uma grave inflamação.

A lesão pancreática pode permitir que as enzimas extravasem e penetrem na corrente sangüínea ou na cavidade abdominal, onde elas causam irritação e inflamação do revestimento da cavidade abdominal (peritonite) ou de outros órgãos. A parte do pâncreas que produz hormônios, especialmente a insulina, tende a não ser lesada ou afetada.

Os cálculos biliares e o alcoolismo são responsáveis por aproximadamente 80% das internações hospitalares devido à pancreatite aguda. As mulheres apresentam pancreatite aguda causada por cálculos biliares cerca de 1,5 vezes mais freqüentemente que os homens, enquanto que os homens apresentam pancreatite alcoólica seis vezes mais que as mulheres.

Os cálculos biliares que causam a pancreatite aguda podem ficar retidos no esfíncter de Oddi durante algum tempo, bloqueando a abertura do ducto pancreático, mas a maioria dos cálculos biliares passa para o trato intestinal. O consumo diário de mais de 120 ml de álcool durante vários anos pode provocar a obstrução dos pequenos dúctulos pancreáticos que drenam para o ducto pancreático, desencadeando finalmente a pancreatite aguda. Uma crise de pancreatite pode ser desencadeada por um consumo excessivo de álcool ou por uma refeição copiosa. Existem muitos outros distúrbios que podem causar uma pancreatite aguda.

Sintomas

Quase todos os indivíduos com pancreatite aguda apresentam uma dor abdominal intensa, na zona superior do abdômen médio, abaixo do esterno. Freqüentemente, a dor irradia para as costas. Raramente, a dor é sentida primeiramente na região abdominal inferior. Normalmente, a dor tem um início súbito e atinge a intensidade máxima em minutos, é constante e intensa, é do tipo penetrante e dura vários dias. Comumente, mesmo doses elevadas de um narcótico injetável não provêem alívio completo.

A tosse, os movimentos vigorosos e a respiração profunda pioram a dor. A posição sentada ereta e a inclinação para frente podem prover algum alívio. A maioria dos indivíduos sente náusea e tem que vomitar, algumas vezes chegando a a presentar vômito seco, isto é, vômito sem eliminação de qualquer conteúdo.

Alguns indivíduos, sobretudo aqueles que apresentam pancreatite alcoólica aguda, podem jamais apresentar qualquer sintoma além de uma dor moderada. Outros sentemse muito mal. Eles apresentam um aspecto enfermo, apresentam uma sudorese excessiva, um aumento da freqüência de pulso (100 a 140 batimentos por minuto) e uma respiração superficial e rápida. A inflamação dos pulmões pode contribuir para a respiração rápida.

Inicialmente, a temperatura corpórea pode ser normal, mas ela aumenta em algumas horas para 37,7° a 38,3°C. A pressão arterial pode estar elevada ou baixa, mas ela tende a cair quando o indivíduo fica em pé, provocando desmaio. À medida que a doença evolui, os indivíduos tendem a perder contato com o meio ambiente. Alguns tornamse quase inconscientes. Ocasionalmente, a esclera (o branco dos olhos) adquire uma coloração amarelada.

Um em cada cinco indivíduos com pancreatite aguda apresenta aumento de volume na região abdominal superior. Esse aumento de volume pode ocorrer devido à interrupção do movimento do conteúdo gástrico e intestinal (uma condição denominada íleo paralítico) ou porque o pâncreas inflamado aumenta de volume e empurra o estômago para frente. Além disso, pode ocorrer acúmulo de líquido no interior da cavidade abdominal (uma condição denominada ascite).

Na pancreatite aguda grave (pancreatite necrotisante), a pressão arterial pode cair e pode levar ao choque. A pancreatite aguda grave é potencialmente letal.

Diagnóstico

A dor abdominal característica faz com que o médico suspeite de pancreatite aguda, principalmente em um indivíduo com uma colecistopatia (doença da vesícula biliar) ou que é alcoolista. Ao exame, o médico freqüentemente observa rigidez da musculatura abdominal. Durante a ausculta abdominal, realizada com o auxílio de um estetoscópio, ele pode observar uma redução dos ruídos intestinais.

Nenhum exame de sangue isoladamente estabelece o diagnóstico de pancreatite aguda, mas alguns exames o confirmam. Normalmente, os níveis séricos de duas enzimas produzidas pelo pâncreas (a amilase e a lipase) aumentam no primeiro dia da doença. No entanto, elas retornam ao normal após três a sete dias. Contudo, algumas vezes, os níveis dessas enzimas não aumentam em decorrência de uma destruição extensa do pâncreas ocorrida em episódios anteriores de pancreatite, restando poucas células para a liberação das enzimas. Os indivíduos com pancreatite aguda grave freqüentemente possuem menos eritrócitos (glóbulos vermelhos) do que o normal por causa de hemorrágias pancreáticas ou abdominais.

As radiografias abdominais padrões podem revelar uma dilatação de alças intestinais ou, raramente, um ou mais cálculos biliares. A ultrasonografia pode mostrar a presença de cálculos biliares na vesícula biliar e, às vezes, no ducto biliar comum. Além disso, ela pode detectar o aumento de volume do pâncreas.

A tomografia computadorizada (TC) é particularmente útil na detecção de alterações do tamanho do pâncreas e é utilizada em casos graves ou naqueles que apresentam complicações, como, por exemplo, uma pressão arterial extremamente baixa. Como as imagens são muito nítidas, a tomografia computadorizada ajuda o médico a estabelecer um diagnóstico preciso.

Na pancreatite aguda grave, a tomografia computadorizada ajuda a determinar o prognóstico. Quando a TC indica que o pâncreas está apenas discretamente aumentado de volume, o prognóstico é excelente. Por outro lado, se ela revelar grandes áreas de destruição no pâncreas, o prognóstico não é tão bom.

A colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (uma técnica radiográfica que revela a estrutura do ducto biliar comum e do ducto pancreático) normalmente é realizada somente quando a causa suspeita da pancreatite é um cálculo biliar alojado no ducto biliar comum. O médico passa um endoscópio através da boca do paciente até o intestino delgado, onde está localizado o esfíncter de Oddi. A seguir, ele injeta um contraste radiopaco (visível nas radiografias) nos ductos. Se as radiografias revelarem a persença de um cálculo biliar, o médico pode utilizar o endoscópio para removêlo.

Tratamento

A maioria dos indivíduos com pancreatite é hospitalizada. Um indivíduo com uma pancreatite aguda leve deve evitar a ingestão de alimentos e de água, pois isto estimula o pâncreas a produzir mais enzimas. Os líquidos e os nutrientes são administrados através da via intravenosa. Uma sonda é passada através do nariz até o estômago para remover o líquido e o ar, sobretudo quando a náusea e o vômito persistem.

Geralmente, o indivíduo com pancreatite aguda grave é internado em uma unidade de terapia intensiva, onde seus sinais vitais (pulso, pressão arterial e freqüência respiratória) são controlados. O débito urinário é mensurado freqüentemente. Além disso, são coletadas amostras de sangue para a mensuração de seus vários componentes (p.ex., hematócrito, glicemia, eletrólitos, contagem leucocitária e enzimas).

A alimentação do indivíduo é realizada através da via intravenosa e ele não recebe nada pela boca por pelo menos duas semanas, esta medida podendo ser prolongada por até seis semanas. Uma sonda é passada através da narina até o estômago com o objetivo de manter o estômago vazio e, freqüentemente, para administrar antiácidos, visando à prevenção da ocorrência de úlceras.

O volume sangüíneo é cuidadosamente mantido através da administração de líquidos intravenosos e a função cardíaca é rigorosamente controlada. O oxigênio é administrado através de uma máscara facial ou de cateteres nasais para aumentar a sua concentração na corrente sangüínea. Caso a oxigenioterapia for inadequada, o indivíduo pode necessitar de ventilação assistida com o auxílio de um respirador mecânico. A dor intensa normalmente é tratada com a meperidina.

Ocasionalmente, é necessária a realização de uma cirurgia nos primeiros dias de uma pancreatite aguda grave. Por exemplo, a cirurgia pode ser utilizada para aliviar a pancreatite decorrente de uma lesão ou para o esclarecimento de um um diagnóstico incerto. Algumas vezes, quando a condição do indivíduo deteriora após a primeira semana da doença, uma cirurgia é realizada para remover o tecido pancreático infectado e não funcionante.

A infecção de um pâncreas inflamado é um risco, sobretudo após a primeira semana da doença. Algumas vezes, o médico suspeita de uma infecção porque a condição do paciente piora e ele apresenta febre e um aumento da contagem leucocitária após os outros sintomas terem começado a desaparecer. O diagnóstico é confirmado através de hemoculturas e da realização de uma tomografia computadorizada (TC). O médico pode coletar uma amostra de material infectado do pâncreas inserindo uma agulha através da pele até o pâncreas. As infecções são tratadas com antibióticos e cirurgia.

Algumas vezes, ocorre a formação de um pseudocisto no pâncreas, cheio de enzimas pancreáticas, líquido e resíduos tissulares, o qual expande como um balão. Quando um pseudocisto aumenta de volume e causa dor ou outros sintomas, o médico deve realizar sua descompressão. A descompressão é particularmente urgente quando o pseudocisto aumenta de volume rapidamente, tornase infectado, sangra ou parece que está a ponto de romper. Dependendo de sua localização, a descompressão pode ser obtida através da passagem de um cateter através da pele e permitindo que o pseudocisto drene por várias semanas ou através da realização de um procedimento cirúrgico.

Quando a pancreatite aguda é devida a cálculos biliares, o tratamento depende de sua gravidade. Se a pancreatite for leve, a remoção da vesícula biliar normalmente pode ser postergada até o desaparecimento dos sintomas. A pancreatite grave devida a cálculos biliares é tratada endoscopicamente ou cirurgicamente. O procedimento cirúrgico consiste na remoção da vesícula biliar e na desobstrução dos ductos. Nos indivíduos idosos que apresentam outras doenças (p.ex., uma cardiopatia), o médico freqüentemente utiliza primeiramente a endos copia, mas, quando esse tratamento fracassa, a cirurgia deve ser realizada.

Causas de Pancreatite Aguda

  • Cálculos biliares
  • Alcoolismo
  • Drogas como a furosemida e a azatioprina
  • Parotidite (caxumba)
  • Níveis sangüíneos elevados de lipídeos, especialmente de triglicerídeos
  • Lesão pancreática causada por uma cirurgia ou uma endoscopia
  • Lesão pancreática causada por contusões ou feridas penetrantes
  • Câncer do pâncreas
  • Redução da irrigação sangüínea pancreática (p.ex., devido a uma pressão arterial extremamente baixa)
  • Pancreatite hereditária

Pancreatite Crônica

A pancreatite crônica é uma inflamação do pâncreas de longa duração.
Nos Estados Unidos e no Brasil, a causa mais comum da pancreatite crônica é o alcoolismo. Outras causas incluem uma predisposição hereditária e a obstrução do ducto pancreático resultante da estenose do ducto ou de um câncer pancreático. Raramente, um episódio de pancreatite aguda grave provoca uma estenose do ducto pancreático tão acentuada que acarreta a pancreatite crônica.

Em muitos casos, a causa da pancreatite é desconhecida.
Nos países tropicais (p.ex., Índia, Indonésia e Nigéria), a pancreatite crônica de causa desconhecida em crianças e adultos jovens pode dar origem ao diabetes e a depósitos de cálcio no pâncreas. Os sintomas iniciais comumente são decorrentes do diabetes.

Sintomas

Os sintomas da pancreatite crônica geralmente enquadramse em dois padrões. Em um deles, o indivíduo apresenta uma dor na região média do abdômen de intensidade variável. No outro, o indivíduo apresenta episódios intermitentes de pancreatite com sintomas semelhantes aos de uma pancreatite aguda leve a moderada. Algumas vezes, a dor é intensa e dura de muitas horas a vários dias. Em ambos os padrões, à medida que a pancreatite crônica evolui, as células que secretam enzimas digestivas são lentamente destruídas e, finalmente, a dor desaparece.

Como a quantidade de enzimas digestivas diminui, o alimento é absorvido inadequadamente e o indivíduo pode evacuar fezes volumosas e fétidas. As fezes apresentam uma coloração clara e um aspecto gorduroso, podendo inclusive conter gotículas de gordura. A má absorção também leva à perda de peso. Finalmente, as células secretoras de insulina do pâncreas podem ser destruídas, levando gradualmente ao diabetes.

Diagnóstico

O médico suspeita de pancreatite crônica baseandose nos sintomas do paciente ou nos antecedentes de episódios de pancreatite aguda. Os exames de sangue são menos úteis no diagnóstico da pancreatite crônica que no da pancreatite aguda, mas eles podem revelar níveis elevados de amilase e de lipase. Além disso, os exames de sangue podem ser utilizados para se verificar a concentração de glicose (um tipo de açúcar) no sangue, a qual pode estar elevada.

As radiografias abdominais e a ultrasonografia podem revelar a presença de cálculos no pâncreas. A pancreatografia retrógrada endoscópica (uma técnica radiográfica que mostra a estrutura do ducto pancreático) pode mostrar um ducto dilatado, uma estenose do ducto ou a presença de cálculos no mesmo. A tomografia computadorizada (TC) mostra essas anormalidades, assim como o tamanho, a forma e a textura do pâncreas. Ao contrário da pancreatografia retrógrada endoscópica, a tomografia computadorizada não exige o uso de um endoscópio.

Tratamento

Durante uma crise, a abstinência de álcool é essencial. O jejum alimentar e a administração de líquidos apenas pela via intravenosa podem prover um repouso ao pâncreas e ao intestino e pode aliviar a crise dolorosa. Freqüentemente, no entanto, é necessária a administração de analgésicos narcóticos para aliviar a dor.

Posteriormente, a ingestão de quatro ou cinco refeições por dia compostas por alimentos hipogordurosos e hipoprotéicos e ricos em carboidratos ajudará a reduzir a freqüência e a intensidade das recidivas. O paciente também deve continuar a abstinência alcoólica. Quando a dor persiste, o médico investiga a possibilidade de complicações (p.ex., uma massa inflamatória na cabeça do pâncreas ou um pseudocisto). Uma massa inflamatória pode exigir uma intervenção cirúrgica e um pseudocisto que produz dor à medida que cresce pode exigir uma descompressão.

Se o indivíduo apresentar uma dor contínua e não apresentar complicações, o médico normalmente realiza o bloqueio dos nervos que inervam o pâncreas para impedir que os estímulos dolorosos cheguem ao cérebro. Se esse procedimento não apresentar um bom resultado, a cirurgia é realizada. Por exemplo, quando o ducto pancreático encontrase dilatado, a criação de uma derivação (bypass) do pâncreas para o intestino delgado alivia a dor em cerca de 70% a 80% dos pacientes.

Quando o ducto não apresenta dilatação, pode ser necessária a remoção de uma porção do pâncreas. Se a doença afetar sobretudo a cauda do pâncreas (a parte mais distante do duodeno), esta será removida. Se a porção afetada for a cabeça do pâncreas, esta será removida juntamente com o duodeno. Essas cirurgias aliviam a dor em 60 a 80% dos casos. Entre os alcoolistas em recuperação, a remoção parcial do pâncreas somente é realizada naqueles que conseguem controlar o diabetes que ocorrerá em conseqüência da cirurgia.

O uso de comprimidos ou cápsulas de extratos de enzimas pancreáticas junto com as refeições pode tornar as fezes menos gordurosas e pode melhorar a absorção dos alimentos, mas esses problemas raramente são eliminados. Quando necessário, um antiácido líquido ou um pode ser utilizado juntamente bloqueador H2 com as enzimas pancreáticas. Com esse tratamento, o indivíduo normalmente ganha peso, apresenta um menor número de evacuações diárias, não apresenta mais gotículas de gordura nas fezes e geralmente sentese melhor. Se essas medidas forem ineficazes, o indivíduo pode tentar reduzir a ingestão de gordura. Além disso, a suplementação de vitaminas lipossolúveis (A, D e K) pode ser necessária.

Adenocarcinoma do Pâncreas

O adenocarcinoma do pâncreas é um tumor canceroso que se origina nas células que revestem o ducto pancreático. Aproximadamente 95% dos tumores cancerosos do pâncreas são adenocarcinomas. Esses tumores afetam os homens quase duas vezes mais do que as mulheres e são discretamente mais comuns entre os indivíduos da raça negra que entre os da raça branca. O adenocarcinoma do pâncreas é duas a três vezes mais comum em tabagistas inveterados. Os indivíduos com pancreatite crônica apresentam um maior risco de apresentálo.

Existe uma variabilidade mundial de incidência de câncer de pâncreas. Os dados indicam 9 em cada 100.000 indivíduos nos Estados Unidos, enquanto que, no Brasil, os dados publicados pelo Ministério da Saúde, em 1991, registraram índices de 7.3 homens e de 4.6 mulheres em 100.000 indivíduos, no estado de São Paulo. A doença vem se tornando mais comum nos Estados Unidos com o aumento da expectativa de vida. Raramente, o adenocarcinoma do pâncreas ocorre antes dos cinqüenta anos de idade. A média de idade no momento do diagnóstico é de 55 anos. Pouco se sabe sobre a sua causa.

Sintomas

O adenocarcinoma do pâncreas comumente é assintomático até o tumor tornarse volumoso. Por essa razão, no momento do diagnóstico e em 80% dos casos, o tumor já produziu metástases extrapancreáticas, afetando linfonodos próximos, o fígado ou os pulmões.
Os sintomas iniciais característicos são a dor e a perda de peso. No momento do diagnóstico, 90% dos pacientes apresentam dor abdominal, a qual é geralmente de média intensidade e localizada na região abdominal superior com irradiação para as costas, e uma perda de peso de pelo menos 10% de seu peso ideal.

Cerca de 80% desses cânceres ocorrem na cabeça do pâncreas (a parte mais próxima do duodeno e de ducto biliar comum). Conseqüentemente, a icterícia causada pela obstrução do ducto biliar comum é um sintoma inicial característico. Nos indivíduos com icterícia, a cor amarelo afeta não somente a pele, mas também a esclera dos olhos e outros tecidos. A icterícia é acompanhada por prurido generalizado.

Os tumores do corpo e da cauda do pâncreas (a parte média e a mais distante do duodeno) podem obstruir a veia que drena o baço, resultando em um aumento de volume deste órgão e varizes (veias varicosas dilatadas, tortuosas e edemaciadas) em torno do estômago e do esôfago. No caso de ruptura de veias varicosas, pode ocorrer um sangramento grave, sobretudo quando elas forem esofágicas.

Diagnóstico

O diagnóstico precoce é difícil. Na suspeita de adenocarcinoma do pâncreas, os procedimentos diagnósticos mais comumente utilizados são a tomografia computadorizada (TC) e pancreatografia retrógrada endoscópica (técnica radiográfica que revela a estrutura do ducto pancreático). Para confirmação do diagnóstico, o médico realiza uma biópsia do pâncreas, coletando uma amostra que é submetida ao exame microscópico.

A amostra de tecido é obtida com a inserção de uma agulha através da pele, a qual é guiada pela tomografia computadorizada ou pela ultrasonografia. Também deve ser realizada uma biópsia do fígado, para verificar se ocorreu disseminação do câncer. Quando o médico tem uma forte suspeita da existência do adenocarcinoma do pâncreas e os resultados dos exames são normais, ele deve realizar a exploração cirúrgica desse órgão.

Prognóstico e Tratamento

O prognóstico é muito ruim. Menos de 2% dos indivíduos com adenocarcinoma sobrevivem até cinco anos após o diagnóstico. A única esperança de cura é a cirurgia, a qual é realizada quando não existem metástases do câncer. O cirurgião pode realizar a remoção apenas do pâncreas ou deste órgão e do duodeno. Mesmo com a cirurgia, somente 10% dos indivíduos sobrevivem mais de cinco anos, independentemente do tratamento subseqüente.

A dor leve pode ser aliviada pela aspirina ou pelo acetaminofeno. A dor intensa na região abdominal superior pode ser aliviada com a flexão do tronco para frente, com abaixamento da cabeça e elevação dos joelhos ou através da administração de codeína oral ou de morfina. Para 70% a 80% dos pacientes com dor intensa, o bloqueio de nervos para eliminar a sensação da dor pode prover alívio. A falta de enzimas digestivas pancreáticas pode ser tratada com a administação de preparações orais de enzimas. Se o indivíduo apresentar diabetes, ele pode necessitar de tratamento com insulina.

Cistadenocarcinoma

Um tipo raro de câncer pancreático, o cistadenocarcinoma apresenta um prognóstico muito melhor que o adenocarcinoma. Apenas 20% desses cânceres apresentam metástases no momento da cirurgia. Se o câncer não tiver disseminado e for realizada a ressecção total do pâncreas, o indivíduo apresenta uma chance de 65% de sobreviver por pelo menos cinco anos.

Insulinoma

O insulinoma é um tipo raro de tumor pancreático que secreta insulina, um hormônio que reduz o nível de glicose no sangue.
Apenas 10% dos insulinomas são cancerosos.

Sintomas

Os sintomas de um insulinoma são decorrentes dos baixos níveis de glicose. Eles ocorrem quando o indivíduo não permanece muitas horas sem alimentarse, mais freqüentemente pela manhã, após um período de jejum noturno. Os sintomas, os quais podem simular vários distúrbios psiquiátricos e neurológicos, incluem a cefaléia, a confusão mental, alterações da visão, fraqueza muscular, instabilidade e alterações significativas de personalidade. A baixa concentração sérica de glicose pode inclusive acarretar perda da consciência, convulsões e coma. Sintomas que são semelhantes aos da ansiedade ou do pânico incluem o desmaio, a fraqueza, os tremores, a percepção dos batimentos cardíacos (palpitações), a sudorese, a fome e o nervosismo.

Diagnóstico e Tratamento

O diagnóstico do insulinoma pode ser difícil. O indivíduo permanece em jejum por no mínimo 24 horas (algumas vezes até 72 horas) e é rigorosamente monitorizado, freqüentemente em ambiente hospitalar. Após esse período, ele normalmente começa a apresentar sintomas e são realizados exames de sangue para mensurar a concentração de glicose e de insulina. As concentrações muito baixas de glicose e elevadas de insulina indicam a presença de um insulinoma. A seguir, o médico deve definir a localização do tumor com precisão. Exames de diagnóstico por imagem (p.ex., TC e ultrasonografia) podem ser utilizados para localizar o tumor. No entanto, em alguns casos, é necessária a realização de uma cirurgia exploradora. O tratamento para o insulinoma é a remoção cirúrgica.

Gastrinoma

O gastrinoma é um tumor pancreático que produz níveis excessivos de gastrina, um hormônio que estimula o estômago a secretar ácido e enzimas, acarretando úlceras pépticas.
A maioria dos indivíduos com essa doença apresenta vários tumores agrupados no pâncreas ou próximos a ele. Aproximadamente 50% desses tumores são cancerosos.
Algumas vezes, o gastrinoma faz parte de um distúrbio hereditário, a neoplasia endócrina múltipla , na qual tumores originamse de células de várias glândulas endócrinas (p.ex., células pancreáticas produtoras de insulina).

Sintomas e Diagnóstico

A quantidade excessiva de gastrina secretada pelo gastrinoma produz um conjunto de sintomas denominado síndrome de ZollingerEllison. Esta síndrome inclui a dor abdominal leve a intensa causada pelas úlceras pépticas gástricas, duodenais e localizadas em outras regiões do intestino. A perfuração, o sangramento e a obstrução intestinal podem ocorrer e são potencialmente letais. Entretanto, para mais de 5% dos indivíduos com um gastrinoma, os sintomas não são piores do que aqueles apresentados por indivíduos com úlceras pépticas de origem diferente. Em 35 a 40% dos pacientes, a diarréia é o primeiro sintoma.

O médico suspeita de um gastrinoma quando o paciente apresenta úlceras pépticas freqüentes ou numerosas que não respondem aos tratamentos antiulcerosos habituais. Os exames de sangue são utilizados para se detectar uma concentração de gastrina anormalmente elevada. Além disso, as amostras de suco gástrico (coletadas através de uma sonda nasogástrica) revelam uma acidez muito elevada. A localização dos tumores pode ser difícil porque quase sempre eles são pequenos e numerosos. Os médicos utilizam diversos exames diagnósticos por imagem como, por exemplo, a tomografia computadorizada (TC), a ultrasonografia e a arteriografia.

Tratamento

Aproximadamente 20% dos indivíduos com gastrinoma e que não apresentam neoplasia endócrina múltipla podem ser curados através da cirurgia. Para esses pacientes (no préoperatório) e para os demais pacientes, os medicamentos antiulcerosos usuais (p.ex., cimetidina, ranitidina e famotidina) aliviam os sintomas. No caso deles serem ineficazes, o omeprazol (que reduz a secreção ácida através de um outro mecanismo de ação) pode ser eficaz.

Quando esses tratamentos não forem bem sucedidos, pode ser necessária a realização de uma cirurgia de remoção do estômago (gastrectomia total). Essa cirurgia não remove o tumor, mas a gastrina não consegue mais afetar o estômago e, conseqüentemente, os sintomas desaparecem. Quando o estômago é removido, é necessária a realização de suplementação diá ria de vitamina B12 e de cálcio.

Quando os tumores malignos produzem metástases para outras regiões do corpo, as drogas antineoplásicas (quimioterapia) podem auxiliar na redução do número de células tumorais e da concentração sangüínea de gastrina. Contudo, a quimioterapia não cura o câncer, o qual, em última instância, é fatal.

Glucagonoma

O glucagonoma é um tumor que produz o hormônio glucagon, o qual eleva o nível de glicose no sangue e produz uma erupção cutânea característica.
Cerca de 80% desses tumores são cancerosos. Contudo, os tumores crescem lentamente e muitos indivíduos sobrevivem quinze anos ou mais após o diagnóstico. A média de idade de início os sintomas é de cinqüenta anos. Aproximadamente 80% das pessoas com glucagonoma são do sexo feminino.

Sintomas e Diagnóstico

A concentrão elevada de glucagon produz sintomas do diabetes melitus. Freqüentemente, o indivíduo apresenta perda de peso. Os exames de sangue podem revelar anemia e níveis baixos dos lipídeos no sangue. No entanto, em 90% dos indivíduos, os aspectos mais característicos são uma erupção cutânea descamativa, de cor castanho-avermelhado (eritema necrolítico migratório) que inicia na região inguinal (virilha) e dissemina para as nádegas, antebraços e pernas e a língua lisa, brilhante e de cor vermelho-alaranjado. Também podem ocorrer fissuras nos cantos da boca. O diagnóstico é estabelecido através da identificação da concentração elevada de glucagon no sangue e, em seguida, através da localização do tumor com o auxílio da angiografia ou de uma cirurgia abdominal exploradora.

Tratamento

No melhor dos casos, o tumor é removido cirurgicamente e todos os sintomas desaparecem. Entretanto, quando isto não é possível ou quando o tumor já produziu metástases, a administração de drogas antineoplásicas podem reduzir a concentração de glucagon e os sintomas. A octreotida também reduz a concentração de glucagon, pode eliminar a erupção cutânea e restaurar o apetite, facilitando o ganho de peso. Entretanto, a octreotida tende a elevar ainda a glicemia. Uma pomada de zinco pode ser utilizada para tratar a erupção cutânea. Algumas vezes, esta é tratada com a administração intravenosa de aminoácidos ou de ácidos graxos.
Fonte: Manual Merck