ENFERMAGEM, CIÊNCIAS E SAÚDE

Gerson de Souza Santos - Bacharel em Enfermagem, Especialista em Saúde da Família, Mestrado em Enfermagem, Doutorado em Ciências da Saúde - Universidade Federal de São Paulo. Atualmente professor do Curso de Medicina do Centro Universitário Ages - Irecê-Ba.

sábado, 28 de novembro de 2009

Anemias


As anemias são condições nas quais o número de eritrócitos ou a quantidade de hemoglobina (a proteína que transporta o oxigênio) presente nessas células encontram-se abaixo do normal. Os eritrócitos (hemácias, glóbulos vermelhos) contêm hemoglobina, a qual permite que eles transportem oxigênio dos pulmões e o liberem a todas as partes do corpo. Como a anemia reduz o número de eritrócitos ou a quantidade de hemoglobina presente nessas células, o sangue não consegue transportar uma quantidade adequada de oxigênio. Os sintomas causados pelo aporte inadequado de oxigênio são variados.

Por exemplo, a anemia pode causar fadiga, fraqueza, incapacidade de praticar exercícios e tontura. Quando a anemia torna-se mais grave, ela pode inclusive acarretar um acidente vascular cerebral ou um infarto do miocárdio. Exames de sangue simples podem identificar uma anemia. O hematócrito (porcentagem de eritrócitos do volume total de sangue) e a quantidade de hemoglobina em uma amostra de sangue podem ser determinados. Esses exames fazem parte do hemograma completo. A anemia pode ser causada por um sangramento excessivo, pela diminuição da produção de eritrócitos ou pelo aumento de sua destruição (hemólise).

Sangramento Excessivo

O sangramento excessivo é a causa mais comum de anemia. Quando ocorre uma perda sangüínea, o organismo rapidamente absorve água dos tecidos para o interior da corrente sangüínea a fim de manter os vasos sangüíneos cheios. Como conseqüência, o sangue torna-se diluído e a porcentagem de eritrócitos diminui. Finalmente, o aumento da produção de eritrócitos corrige a anemia. No entanto, a anemia pode ser grave desde o início, sobretudo quando ela ocorre devido a uma perda súbita de sangue, como em um acidente, em uma cirurgia, em um parto ou em uma ruptura de um vaso sangüíneo. A perda súbita de grandes volumes de sangue pode ocasionar dois problemas: a queda da pressão arterial porque o volume de líquido remanescente nos vasos sangüíneos é insuficiente, e a redução do suprimento de oxigênio ao organismo porque o número de eritrócitos que transportam o oxigênio diminui. Ambos podem acarretar um infarto do miocárdio, um acidente vascular cerebral ou a morte.

O sangramento crônico (contínuo ou repetido) é muito mais comum que uma perda súbita de sangue e ele pode ocorrer em várias partes do corpo. O sangramento de epistaxes (sangramentos nasais) recorrentes e de hemorróidas é evidente. O sangramento crônico devido a outras causas comuns (p.ex., úlceras gástricas e do intestino delgado ou pólipos e cânceres do intestino grosso, especialmente o câncer de cólon) podem não ser evidentes porque a quantidade de sangue é pequena e não aparece como sangue vivo nas fezes. Esse tipo de perda sangüínea é denominada perda oculta. Outras causas de sangramento crônico são os tumores de rim ou de bexiga, os quais podem acarretar perda de sangue pela urina, e o sangramento menstrual intenso. A anemia causada por sangramento varia de leve a grave e os sintomas variam.

A anemia pode ser assintomática ou pode causar desmaio, tontura, sede, sudorese, um pulso fraco e rápido e uma respiração acelerada. É comum o indivíduo apresentar tontura ao sentar-se ou levantar-se (hipotensão ortostática). A anemia também pode causar uma fadiga intensa, falta de ar, dor no peito e, quando suficientemente grave, a morte. Um determinante importante da intensidade dos sintomas é a rapidez da perda do sangue. Quando ela é rápida (durante algumas horas ou menos), a perda de apenas um terço do volume sangüíneo do corpo pode ser fatal. Quando ela é mais lenta (durante vários dias, semanas ou mais tempo), a perda de até dois terços do volume sangüíneo pode causar somente fadiga e fraqueza ou pode não causar qualquer sintoma.

Tratamento

O tratamento depende da velocidade da perda sangüínea e de quão grave é a anemia. A transfusão de eritrócitos é o único tratamento confiável para a perda rápida de sangue ou para a anemia grave. Além disso, a causa do sangramento deve ser encontrada e ele deve ser interrompido. Quando a perda de sangue é mais lenta ou a anemia é menos grave, o organismo pode produzir eritrócitos suficientes para corrigir a anemia sem necessidade de transfusão. Como durante um sangramento ocorre a perda de ferro (necessário para a produção de eritrócitos), a maioria dos indivíduos com anemia necessitam de suplementos de ferro, geralmente sob a forma de comprimidos.

Diminuição da Produção de Eritrócitos

Muitos nutrientes são necessários para a produção de eritrócitos. Os mais fundamentais são o ferro, a vitamina B12 e o ácido fólico, mas o organismo também necessita de quantidades mínimas de vitamina C, de riboflavina e de cobre, assim como de um equilíbrio hormonal adequado, especialmente especialmente da eritropoietina (um hormônio que estimula a produção de eritrócitos). Sem esses nutrientes e hormônios, a produção de eritrócitos torna-se lenta e inadequada e as células podem tornar-se deformadas e incapazes de transportar o oxigênio de modo adequado. As doenças crônicas também podem acarretar uma diminuição da produção de eritrócitos

Anemia por Deficiência de Ferro

O organismo recicla o ferro. Quando eritrócitos morrem, o ferro contido neles é devolvido à medula óssea para ser reutilizado na formação de novos eritrócitos. O organismo somente perde grandes quantidades de ferro quando ocorre uma perda de eritrócitos em conseqüência de um sangramento, acarretando uma deficiência de ferro. A deficiência de ferro é uma das causas mais comuns de anemia e a perda de sangue é praticamente a única causa de deficiência de ferro em adultos. Uma dieta pobre em ferro pode causar deficiência em lactentes e crianças pequenas, as quais necessitam de mais ferro por estarem crescendo. Nos homens e nas mulheres na pós-menopausa, a deficiência de ferro geralmente indica um sangramento do trato gastrointestinal.

Causas Comuns de Anemia


Sangramento Excessivo
Diminuição da Produção de Eritrócitos
Aumento da Destruição dos Eritrócitos
Súbito:
•Acidentes
•Cirurgia
•Parto
•Ruptura de vasos sangüíneos

Crônico:

•Epistaxe (sangramento nasal)
•Hemorróidas
•Úlceras gástricas ou do intestino delgado
•Câncer ou pólipos no trato gastrointestinal
•Tumores de rim ou de bexiga
•Sangramento menstrual intenso
Deficiência de ferro Deficiência de vitamina B12 Deficiência de ácido fólico Deficiência de vitamina C Doença crônica Baço aumentado de volume Lesão mecânica dos eritrócitos Reações auto-imunes contra os eritrócitos Hemoglobinúria noturna paroxística Esferocitose hereditária Eliptocitose hereditária Deficiência de G6PD Doença das células falciformes Doença da hemoglobina C Doença da hemoglobina S-C Doença da hemoglobina E Talassemia

O sangramento menstrual mensal pode causar deficiência de ferro em mulheres na pré-menopausa. O consumo dietético normal de ferro geralmente não consegue compensar a perda de ferro devido a um sangramento crônico e o organismo possui uma reserva muito pequena do mesmo. Conseqüentemente, o ferro perdido deve ser reposto através de suplementos. Como o feto em desenvolvimento utiliza o ferro, as mulheres grávidas também fazem uso de suplementos de ferro. Nos Estados Unidos, a dieta média contém cerca de 6 miligramas de ferro por 1.000 calorias de alimento e, conseqüentemente, o indivíduo médio consome aproximadamente 10 a 12 miligramas de ferro por dia. A carne vermelha é a melhor fonte de ferro, apesar de algum ferro poder ser absorvido de outros alimentos. As fibras vegetais, os fosfatos, o farelo de cereais e os antiácidos diminuem a absorção de ferro devido ao fato deles ligarem-se a ele. A vitamina C (ácido ascórbico) é o único elemento dos alimentos que aumenta a absorção de ferro. O organismo absorve diariamente de 1 a 2 miligramas de ferro dos alimentos, o que é aproximadamente igual à quantidade que o organismo perde normalmente todos os dias.

Sintomas

Em última instância, a anemia acarreta fadiga, falta de ar, incapacidade de praticar exercícios e outros sintomas. A deficiência de ferro pode causar sintomas próprios como, por exemplo, a pica (desejo de consumir elementos não alimentares como o gelo, terra ou amido), a glossite (inflamação da língua) e a queilose (fissuras labiais) e fissuras nas unhas das mãos, as quais apresentam uma deformidade em colher (quiloníquia).

Diagnóstico

Exames de sangue são utilizados para o diagnóstico da anemia. Quando um indivíduo apresenta anemia, normalmente são realizados exames para se verificar a presença de deficiência de ferro. A concentração de ferro pode ser mensurada no sangue. As concentrações de ferro e de transferrina (a proteína que transporta o ferro quando ele não se encontra no interior dos eritrócitos) são determinadas e comparadas. Quando menos de 10% da transferrina encontrase saturada com ferro, a deficiência de ferro é provável. No entanto, o exame mais sensível para a deficiência de ferro é a dosagem da concentração sérica de ferritina (uma proteína que armazena armazena o ferro). Uma concentração baixa da mesma indica deficiência de ferro. Contudo, algumas vezes a concentração de ferritina encontra-se normal ou mesmo elevada apesar da deficiência de ferro, pois ela pode ser aumentada artificialmente por uma lesão hepática, uma inflamação, uma infecção ou um câncer. Ocasionalmente, são necessários exames mais sofisticados para se estabelecer o diagnóstico. O exame mais específico é um exame da medula óssea, no qual uma amostra de células é examinada ao microscópio para determinar o seu conteúdo de ferro.

Tratamento

Como o sangramento é a causa mais comum de deficiência de ferro, o primeiro passo consiste na localização de sua causa e na sua interrupção. O tratamento medicamentoso ou cirúrgico pode ser necessário para controlar um sangramento menstrual excessivo, para reparar uma úlcera hemorrágica, para remover um pólipo de cólon ou para tratar um sangramento renal. Geralmente, o tratamento também envolve a reposição do ferro perdido. A maioria dos comprimidos de ferro contém sulfato ferroso, gluconato férrico ou um polissacarídeo. Os comprimidos de ferro são absorvidos mais adequadamente quando ingeridos 30 minutos antes das refeições. Em geral, um comprimido de ferro por dia é suficiente, mas, ocasionalmente, podem ser necessários dois.

Como a capacidade de absorção de ferro pelo intestino é limitada, doses mais elevadas são desperdiçadas e podem causar indigestão e constipação. O ferro quase sempre torna as fezes escuras, um efeito colateral normal e inofensivo. A correção da anemia por deficiência de ferro com suplementos de ferro leva de 3 a 6 semanas, mesmo após a interrupção do sangramento. Uma vez corrigida a anemia, o indivíduo deve continuar a tomar suplementos de ferro por 6 meses para repor as reservas do corpo. Exames de sangue são realizados periodicamente, para se assegurar que o suprimento de ferro é suficiente e que o sangramento cessou. Raramente, o ferro deve ser administrado sob a forma injetável. As injeções de ferro devem ser reservadas para os indivíduos que não toleram os comprimidos ou que continuam a perder grandes quantidades de sangue devido a um sangramento contínuo. O tempo de recuperação é o mesmo, independentemente dele ser administrado sob a forma de comprimidos ou de injeções.

Deficiências Vitamínicas

Além do ferro, a medula óssea necessita tanto da vitamina B12 quanto do ácido fólico para a produção de eritrócitos. Na falta de alguma dessas vitaminas, pode ocorrer a anemia megaloblástica. Neste tipo de anemia, a medula óssea produz megaloblastos (eritrócitos grandes e anormais). Os leucócitos e as plaquetas normalmente também são anormais. Embora a anemia megaloblástica seja freqüentemente causada por deficiência de vitamina B12 ou de ácido fólico na dieta ou por uma incapacidade de absorção dessas vitaminas, ela é algumas vezes causada por drogas utilizadas no tratamento do câncer (p.ex., metotrexato, hidroxiuréia, fluorouracil e citarabina).

Anemia por deficiência de vitamina B12

A anemia por deficiência de vitamina B12 (anemia perniciosa) é uma anemia megaloblástica causada por uma falta de vitamina B12. A absorção inadequada de vitamina B12 (cobalamina) causa a anemia perniciosa. Esta vitamina, disponível na carne, normalmente é imediatamente absorvida no íleo (a parte final do intestino delgado que comunica-se com o intestino grosso). No entanto, para ser absorvida, ela deve ligar- se ao fator intrínseco, uma proteína produzida no estômago, que a transporta até o íleo através de sua parede, e para o interior da corrente sangüínea. Sem o fator intrínseco, a vitamina B12 permanece no intestino e é excretada nas fezes.

Na anemia perniciosa, o estômago não produz o fator intrínseco, a vitamina B12 não é absorvida e ocorre a anemia mesmo quando são ingeridas grandes quantidades da vitamina com os alimentos. No entanto, como o fígado armazena uma grande quantidade de vitamina B12, a anemia somente ocorre dentro de 2 a 4 anos após o organismo parar de absorvê-la. Apesar da falta de fator intrínseco ser a causa mais comum de deficiência de vitamina B12, outras possíveis causas incluem o crescimento bacteriano anormal no intestino delgado que impede a sua absorção, determinadas doenças (p.ex., doença de Crohn) e cirurgias que envolvem a remoção do estômago ou da porção do intestino delgado onde a vitamina B12 é absorvida.

Como Ocorre a Anemia por Deficiência de Ferro


Geralmente, a anemia por deficiência de ferro desenvolve-se de modo gradual, em estágios. Os sintomas surgem nos estágios mais avançados.

Estágio 1 A perda de ferro é superior à ingestão, causando depleção das reservas de ferro, sobretudo na medula óssea. A concentração sérica de ferritina (uma proteína que armazena o ferro) diminui progressivamente.

Estágio 2 Como as reservas de ferro exauridas não conseguem satisfazer as necessidades de produção de eritrócitos, uma menor quantidade dos mesmos é produzida.

Estágio 3 A anemia começa a desenvolver-se. No início deste estágio, os eritrócitos apresentam um aspecto normal, mas existe uma quantidade menor dos mesmos. A concentração de hemoglobina e o hematócrito encontram-se reduzidos.

Estágio 4 A medula óssea tenta compensar a falta de ferro acelerando a divisão celular e produzindo eritrócitos muito pequenos (microcíticos), os quais são típicos da anemia por deficiência de ferro.

Estágio 5 À medida que a deficiência de ferro e a anemia progridem, podem ocorrer sintomas da deficiência de ferro e os sintomas da anemia pioram.

Uma dieta vegetariana rigorosa também pode causar deficiência de vitamina B12. Além de diminuir a produção de eritrócitos, a deficiência de vitamina B12 afeta o sistema nervoso, acarretando formigamento nas mãos e nos pés, perda de sensibilidade nas pernas, pés e mãos e movimentos espásticos. Outros sintomas podem incluir um tipo peculiar de cegueira à cores relacionadas ao amarelo e ao azul, inflamação ou sensação de queimação na língua, perda de peso, escurecimento da pele, confusão mental, depressão e diminuição da função intelectual.

Diagnóstico

Geralmente, a deficiência de vitamina B12 é diagnosticada durante a realização de exames de sangue de rotina para a investigação da anemia. Ao exame microscópico de uma amostra de sangue, são observados megaloblastos (eritrócitos grandes). Alterações de leucócitos e de plaquetas também podem ser detectadas, especialmente quando o indivíduo apresenta anemia há muito tempo. Quando essa deficiência é suspeitada, a concentração de vitamina B12 é mensurada. Quando a deficiência é confirmada, podem ser realizados exames para determinar a sua causa. Geralmente, os exames são centrados no fator intrínseco. Primeiramente, é coletada uma amostra de sangue para verificar a presença de anticorpos contra o fator intrínseco, que são encontrados em aproximadamente 60 a 90% dos indivíduos com anemia perniciosa.

O segundo exame, mais específico, é a análise gástrica. Um tubo fino e flexível denominado sonda nasogástrica é inserido através do nariz, passado através da garganta e avançado até atingir o estômago. Em seguida, é realizada a injeção intravenosa de pentagastrina (um hormônio que estimula a secreção de fator intrínseco). A seguir, uma amostra do conteúdo gástrico é coletada e a presença do fator intrínseco é avaliada. Se ainda houver dúvidas sobre o mecanismo causador da deficiência de vitamina B12, o médico pode solicitar um teste de Schilling. Primeiramente, é administrada uma pequena quantidade de vitamina B12 radioativa pela via oral e a sua absorção é mensurada. Em seguida, é administrado o fator intrínseco concomitante com a vitamina B12 e a sua absorção é novamente mensurada. Se a vitamina B12 for absorvida com o fator intrínseco e não o for na sua ausência, o diagnóstico de anemia perniciosa é confirmado. Outros exames são raramente necessários.

Tratamento

O tratamento da deficiência de vitamina B12 ou da anemia perniciosa consiste na reposição de vitamina B12. Como a maioria dos indivíduos que apresentam essa deficiência não conseguem absorver a vitamina B12 administrada pela via oral, eles devem utilizá-la sob a forma injetável. No início, as injeções são aplicadas diariamente ou semanalmente, por várias semanas, até a concentração sérica de vitamina B12 retornar ao normal. Em seguida, as injeções são aplicadas mensalmente. Os indivíduos com esse tipo de deficiência devem utilizar suplementos de vitamina B12 durante toda a vida.

Anemia por deficiência de ácido fólico

A anemia por deficiência de ácido fólico (folato) é uma anemia megaloblástica causada pela falta de ácido fólico. O ácido fólico é uma vitamina encontrada em vegetais crus, frutas frescas e carne vermelha, mas a cocção geralmente a destrói. Como o organismo armazena apenas uma pequena quantidade no fígado, uma dieta com pouco ácido fólico acarreta uma deficiência em poucos meses. A deficiência de ácido fólico é mais comum no mundo ocidental do que a de vitamina B12 porque muitos indivíduos não consomem quantidades suficientes de vegetais folhosos crus. Os indivíduos com doenças do intestino delgado, especialmente a doença de Crohn e o espru, podem apresentar problemas de absorção do ácido fólico. Determinadas drogas anticonvulsivantes e contraceptivos orais também diminuem a absorção dessa vitamina.

Menos comumente, as mulheres grávidas, os lactentes e os indivíduos submetidos à diálise devido a nefropatias apresentam essa deficiência por apresentarem uma maior necessidade de ácido fólico. Como o álcool interfere na absorção e no metabolismo do ácido fólico, os indivíduos que ingerem grandes quantidades de álcool também apresentam essa deficiência. Os indivíduos que apresentam deficiência de ácido fólico desenvolvem anemia. Os lactentes, mas não os adultos, podem apresentar alterações neurológicas e, na mulher grávida, essa deficiência pode causar defeitos da medula espinhal ou outras malformações fetais. Quando os médicos encontram megaloblastos (eritrócitos grandes) em um indivíduo com anemia, eles mensuram a concentração de ácido fólico em uma amostra de sangue. Se a deficiência de ácido fólico for confirmada, o tratamento geralmente consiste na ingestão de um comprimido diário de ácido fólico. Os indivíduos com problema de absorção de ácido fólico devem manter a suplementação durante toda a vida.

Anemia por deficiência de vitamina C

A anemia por deficiência de vitamina C é um tipo raro de anemia causado por uma deficiência crônica grave de vitamina C. Neste tipo de anemia, a medula óssea produz eritrócitos pequenos. Essa deficiência é diagnosticada através da mensuração da concentração de vitamina C nos leucócitos. Um comprimido diário de vitamina C corrige a deficiência e cura a anemia.

Doença Crônica

Uma doença crônica freqüentemente acarreta anemia, especialmente nos idosos. Condições como infecções, processos inflamatórios e o câncer suprimem a produção de eritrócitos na medula óssea. Como o ferro armazenado na medula óssea não pode ser utilizado pelos eritrócitos em desenvolvimento, esse tipo de anemia é comumente denominada anemia de reutilização do ferro. Em todos os indivíduos, as infecções, mesmos as triviais, e os processos inflamatórios (p.ex., artrite e tendinite) inibem a produção de eritrócitos na medula óssea, resultando em uma menor quantidade dos mesmos na circulação. No entanto, essas condições não causam anemia, exceto quando graves ou de longa duração (crônicas). Quanto mais grave a doença, mais grave a anemia resultante. Contudo, a anemia causada por uma doença crônica raramente torna-se grave.

O hematócrito (porcentagem de eritrócitos no sangue) raramente cai abaixo de 25% (o normal sendo de 45 a 52% para os homens e de 37 a 48% para as mulheres) e a concentração de hemoglobina (quantidade desta proteína transportadora de oxigênio nos eritrócitos) raramente cai abaixo de 8 gramas por decilitro de sangue (o normal sendo de 13 a 18 gramas por decilitro). Como esse tipo de anemia evolui lentamente e geralmente é leve, ela comumente não produz sintomas. Quando estes ocorrem, eles comumente são decorrentes da doença causadora da anemia e não da anemia em si. Exames laboratoriais podem indicar que a doença crônica é a causa da anemia, mas eles não podem confirmar o diagnóstico. Por essa razão, os médicos tentam inicialmente excluir outras causas de anemia, como o sangramento excessivo ou a deficiência de ferro. Como não existe um tratamento específico para esse tipo de anemia, os médicos tratam das doenças que a causam. O uso de suplemento de ferro ou de vitaminas não é útil. Nas raras ocasiões em que a anemia torna-se grave, as transfusões de eritropoietina (um hormônio que estimula a medula óssea a produzir eritrócitos) podem ser úteis.

Aumento da Destruição de Eritrócitos

Normalmente, os eritrócitos apresentam um período de vida de aproximadamente 120 dias. Quando eles envelhecem, células removedoras da medula óssea, do baço e do fígado as detectam e as destroem. Se uma doença destrói os eritrócitos prematuramente (hemólise), a medula óssea tenta compensar através de uma produção mais rápida de novos eritrócitos - cerca de 10 vezes mais rápida do que a velocidade normal de produção. Quando a destruição de eritrócitos ultrapassa a sua produção, ocorre a anemia hemolítica. As anemias hemolíticas são relativamente incomuns em comparação com as anemias causadas por perdas sangüíneas e pela diminuição da produção de eritrócitos. Vários fatores podem aumentar a destruição dos eritrócitos. O baço pode aumentar de volume (esplenomegalia). Obstáculos na corrente sangüínea podem fragmentar as células.

Anticorpos podem ligar-se aos eritrócitos e fazer com que o sistema imune os destrua em uma reação auto-imune. Algumas vezes, os eritrócitos são destruídos por causa de anormalidades próprias das células - de sua forma ou de sua superfície, de sua função ou de seu conteúdo de hemoglobina. A destruição de eritrócitos pode ocorrer em patologias como o lúpus eritematoso sistêmico e determinados cânceres, especialmente os linfomas. Várias drogas (p.ex., metildopa, dapsona e sulfas) também podem destruir os eritrócitos. Os sintomas da anemia hemolítica são semelhantes aos de outras anemias. Algumas vezes, a hemólise é abrupta e grave, resultando em uma crise hemolítica que inclui calafrios, febre, dorsalgia e gastralgia, sensação de desmaio e uma queda importante da pressão arterial. Podem ocorrer icterícia e urina escura decorrentes da presença do conteúdo dos eritrócitos lesados na corrente sangüínea. O baço aumenta de volume à medida que ele filtra muitos dos eritrócitos lesados, algumas vezes causando dor abdominal. A hemólise contínua pode produzir cálculos biliares pigmentados, um raro tipo de cálculo biliar composto pelos elementos escuros dos eritrócitos.

Esplenomegalia

Muitos distúrbios podem causar esplenomegalia (aumento de volume do baço). Quando o baço aumenta de volume, ele tende a reter e a destruir eritrócitos, criando um círculo vicioso: quanto mais células ele retém, maior ele se torna e quanto maior ele se torna, mais células ele retém. A anemia causada por um baço aumentado de volume geralmente evolui lentamente e os sintomas tendem a ser leves. Freqüentemente, o baço aumentado de volume também reduz a quantidade de plaquetas e de leucócitos na corrente sangüínea. Geralmente, o tratamento é direcionado ao distúrbio causador da esplenomegalia. Raramente, a anemia torna-se suficientemente grave a ponto de justificar a remoção cirúrgica do baço (esplenectomia).

Lesão Mecânica dos Eritrócitos

Normalmente, os eritrócitos percorrem os vasos sangüíneos sem sofrer alterações. No entanto, eles podem ser lesados mecanicamente por anormalidades dos vasos sangüíneos, como um aneurisma (uma dilatação da parede enfraquecida do vaso sangüíneo), por uma prótese valvular cardíaca ou por uma pressão arterial extremamente elevada. Essas anormalidades podem fragmentar eritrócitos normais, fazendo com que o seu conteúdo extravase na corrente sangüínea. Os rins podem filtrar essas substâncias do sangue, mas eles também podem ser lesados pelas mesmas. Quando uma quantidade importante de eritrócitos é lesada, ocorre a anemia hemolítica microangiopática. Este distúrbio é diagnosticado quando são observados fragmentos de eritrócitos lesados em uma amostra de sangue examinada microscopicamente. A causa da lesão é então identificada e, se possível, corrigida.

Reações Auto-Imunes

Algumas vezes, o sistema imune do organismo apresenta uma disfunção e destrói as suas próprias células, as quais ele erroneamente identifica como substâncias estranhas (reação auto-imune). Quando uma reação auto-imune é direcionada contra os eritrócitos, o resultado é a anemia hemolítica auto-imune (anemia mediada imunologicamente). A anemia hemolítica auto-imune possui diferentes causas, mas, na maioria dos indivíduos, a sua causa é desconhecida (idiopática). A anemia hemolítica auto-imune é diagnosticada através de exames laboratoriais que identificam anticorpos (auto-anticorpos) no sangue que se ligam aos eritrócitos e reagem contra os mesmos. As anemias hemolíticas auto-imunes são classificadas em dois tipos principais: a anemia hemolítica de anticorpos reativos ao calor (o tipo mais comum) e a anemia hemolítica de anticorpos reativos ao frio.

Anemia Hemolítica por Anticorpos Reativos ao calor

A anemia hemolítica por anticorpos reativos ao calor (anemia hemolítica por anticorpos quentes) é uma condição na qual o corpo produz autoanticorpos que reagem contra eritrócitos à temperatura corpórea. Esses auto-anticorpos revestem os eritrócitos, que são então identificados como corpos estranhos e são destruídos pelas células removedoras do baço ou, algumas vezes, do fígado e da medula óssea. Essa condição é mais comum entre as mulheres do que entre os homens. Cerca de um terço dos indivíduos que apresentam esse tipo de anemia apresentam uma doença subjacente, como um linfoma, uma leucemia ou uma doença do colágeno (especialmente o lúpus eritematoso sistêmico), ou foram expostas à determinadas drogas, sobretudo a metildopa.

Os sintomas freqüentemente são piores do que seria de se esperar em razão da gravidade da anemia, provavelmente porque a sua evolução é muito rápida. Como normalmente ocorre um aumento do baço, o hipocôndrio esquerdo pode ser doloroso ou apresentar uma sensação de desconforto. O tratamento depende da identificação ou não de sua causa. Primeiramente, os médicos tentam tratar ou eliminar a causa. Se nenhuma causa for identificada, comumente é realizada a administração de altas doses de um corticosteróide (p.ex., prednisona), primeiramente pela via intravenosa e, em seguida, pela via oral. Cerca de um terço dos indivíduos responde bem a essa droga, a qual é então reduzida gradativamente e interrompida. Os outros dois terços podem necessitar de uma esplenectomia (remoção cirúrgica do baço) para interromper a destruição de eritrócitos revestidos por auto-anticorpos. A remoção do baço controla a anemia em aproximadamente 50% dos indivíduos. Quando esses tratamentos fracassam, são administradas as drogas imunossupressoras (p.ex., ciclosporina e ciclofosfamida). As transfusões sangüíneas podem causar problemas para os indivíduos que apresentam uma anemia hemolítica auto-imune. O banco de sangue pode ser incapaz de encontrar sangue que não reaja com os auto-anticorpos e as transfusões em si podem estimular a produção de mais auto-anticorpos.

Anemia Hemolítica por Anticorpos Reativos ao Frio

A anemia hemolítica de anticorpos reativos ao frio (anemia hemolítica por anticorpos frios) é uma condição na qual o corpo produz auto-anticorpos que reagem contra os eritrócitos na temperatura ambiente ou em temperaturas baixas. Este tipo de anemia pode ser agudo ou crônico. A forma aguda freqüentemente ocorre em indivíduos que apresentam infecções agudas, principalmente certos tipos de pneumonia ou a mononucleose infecciosa. A forma aguda geralmente não dura muito, é relativamente leve e desaparece sem tratamento. A forma crônica é mais comum entre as mulheres, particularmente naquelas com mais de 40 anos de idade e que apresentam reumatismo ou artrite. Embora a forma crônica geralmente persista por toda a vida, a anemia normalmente é leve e produz poucos ou nenhum sintoma. Contudo, a exposição ao frio aumenta a destruição de eritrócitos, pode piorar as dores articulares e pode produzir sintomas como a fadiga e a coloração azulada dos braços e das mãos. Como é de se esperar, os indivíduos que apresentam essa patologia e vivem em climas frios apresentam substancialmente mais sintomas do que aquelas que vivem em climas quentes. A anemia hemolítica por anticorpos reativos ao frio é diagnosticada através de exames que detectam a presença de anticorpos sobre a superfície dos eritrócitos, os quais são mais ativos em temperaturas inferiores à temperatura corpórea. Não existe um tratamento específico e, por essa razão, o tratamento é direcionado ao alívio dos sintomas. A forma aguda associada às infecções melhora por si e raramente produz sintomas graves. A forma crônica pode ser prevenida evitando- se a exposição ao frio.

Hemoglobinúria Paroxística Noturna

A hemoglobinúria paroxística noturna é uma anemia hemolítica rara que causa episódios abruptos e recorrentes de destruição de eritrócitos pelo sistema imune. A destruição abrupta (paroxística) de muitos eritrócitos – a qual pode ocorrer a qualquer momento, não apenas à noite (noturna) – faz com que a hemoglobina extravase para a corrente sangüínea. Os rins filtram a hemoglobina, a qual pode tornar a urina escura (hemoglobinúria). A anemia é mais comum entre homens jovens, mas pode manifestar-se em qualquer idade e em ambos os sexos. A sua causa é desconhecida. A hemoglobinúria paroxística noturna pode causar cólicas estomacais ou dor lombar intensas e produzir coágulos nas veias grandes do adômen e dos membros inferiores. O diagnóstico é realizado através de exames laboratoriais que podem detectar as características anormais dos eritrócitos desse distúrbio. Os corticosteróides (p.ex., prednisona) freqüentemente ajudam no alívio dos sintomas, mas não existe uma cura disponível. Os indivíduos que apresentam coágulos sangüíneos podem necessitar da utilização de um anticoagulante (uma droga que reduz a propensão do sangue a coagular), como o warfarin. O transplante de medula óssea pode ser considerado para os indivíduos que apresentam a forma mais grave dessa anemia.

Anormalidades dos Eritrócitos

A destruição de eritrócitos pode ocorrer pelo fato dos mesmos apresentarem deformidades, membranas fracas que se rompem facilmente ou deficiências de enzimas necessárias para o funcionamento adequado e para a manutenção da flexibilidade que permite que eles circulem através dos vasos sangüíneos estreitos. Essas anormalidades dos eritrócitos ocorrem em determinadas doenças congênitas. A esferocitose hereditária é uma doença congênita na qual os eritrócitos que normalmente apresentam uma forma discóide assumem uma forma esférica. Os eritrócitos de forma anormal e rígidos são retidos e destruídos no baço, o que acarreta uma anemia e um aumento de volume do baço. Geralmente, a anemia é leve, mas pode tornar-se mais grave caso ocorra uma infecção. Quando o distúrbio é grave, pode haver icterícia e anemia, o fígado pode aumentar de volume e pode ocorrer a formação de cálculos biliares. Nos adultos jovens, essa patologia pode ser confundida com a hepatite. Podem ocorrer anormalidades ósseas, como o crânio em torre e dedos extranumerários (mãos e pés).

Geralmente, o tratamento não é necessário, mas a anemia grave pode exigir a remoção do baço. Esse procedimento não corrige a forma dos eritrócitos, mas ele reduz a quantidade que é destruída e, conseqüentemente, corrige a anemia. A eliptocitose hereditária é uma doença rara na qual os eritrócitos apresentam uma forma oval ou elíptica ao invés de esferoidal. Algumas vezes, esse distúrbio acarreta uma anemia leve, mas não requer tratamento. A esplenectomia pode ser útil na anemia grave. A deficiência de G6PD é uma doença na qual a enzima G6PD (glicose-6-fosfato desidrogenase) está ausente da membrana eritrocitária. A enzima G6PD auxilia no metabolismo da glicose, um açúcar simples que é a principal fonte energética para os eritrócitos, e produz o glutation, o qual auxilia na prevenção da destruição celular. Essa doença congênita quase sempre afeta o sexo masculino. Ela ocorre em 10% da população masculina da raça negra e em uma porcentagem menor dos indivíduos da raça branca da área do Mediterrâneo. Alguns indivíduos que apresentam deficiência de G6PD jamais apresentam anemia. A febre, as infecções virais ou bacterianas, a crise diabética, determinadas substâncias (p.ex., aspirina e vitamina K) e o feijão fava podem desencadear a destruição de eritrócitos e acarretar a anemia. Esta pode ser prevenida evitando-se situações ou substâncias que a desencadeiam. No entanto, não existe um tratamento que cure a deficiência de G6PD.

Anormalidades da Hemoglobina

As anormalidades congênitas da hemoglobina podem causar anemia. Os eritrócitos que contêm hemoglobina anormal podem apresentar uma forma alterada ou podem ser incapazes de transportar ou de liberar um suprimento adequado de oxigênio.

Doenças da Célula Falciforme

A doença da célula falciforme é uma doença congênita caracterizada por eritrócitos em forma de foice e anemia hemolítica crônica. A doença da célula falciforme afeta quase que exclusivamente a raça negra. Cerca de 10% dos negros americanos apresentam um gene para a doença da célula falciforme (apresentam o traço falciforme); eles não desenvolvem a doença da célula falciforme. Aproximadamente 0,3% deles apresenta dois genes e desenvolve a doença. Na doença da célula falciforme, os eritrócitos contêm uma forma anormal de hemoglobina (a proteína que transporta o oxigênio) que reduz a quantidade de oxigênio nas células, fazendo com que elas assumam um formato de foice. As células falciformes bloqueiam e lesam os vasos sangüíneos menores do baço, dos rins, do cérebro, dos ossos e de outros órgãos, reduzindo seu suprimento de oxigênio. Como essas células deformadas são frágeis, elas rompem à medida em que circulam através dos vasos sangüíneos, produzindo anemia grave, bloqueio do fluxo sangüíneo, lesão visceral e, possivelmente, a morte.

Sintomas

Os indivíduos com essa doença sempre apresentam algum grau de anemia e icterícia leve, mas elas podem apresentar alguns outros sintomas. Entretanto, qualquer coisa que reduza a quantidade de oxigênio em seu sangue, como o exercício vigoroso, a escalada de montanhas, o vôo em altas altitudes sem oxigênio suficiente ou uma doença, pode desencadear uma crise falciforme com piora súbita da anemia, dor (freqüentemente abdominal ou nos ossos longos), febre e, algumas vezes, dificuldade respiratória. A dor abdominal pode ser intensa e podem ocorrer vômitos. Os sintomas podem ser semelhantes aos da apendicite ou de um cisto de ovário. Nas crianças, uma forma comum de crise falciforme é uma síndrome torácica, caracterizada por dor torácica e dificuldade respiratória. A causa exata da síndrome torácica é desconhecida, mas parece ser uma infecção ou a obstrução de um vaso sangüíneo resultante de um coágulo ou de um êmbolo (uma parte de um coágulo que se desprega e se aloja em um vaso sangüíneo).

A maioria dos indivíduos com doença da célula falciforme apresenta esplenomegalia durante a infância. Em torno dos 9 anos de idade, o baço encontra- se tão lesado que ele atrofia e pára de funcionar. Como o baço auxilia no combate de infecções, esses indivíduos apresentam uma maior propensão à pneumonia pneumocócica e a outras infecções. As infecções virais em especial podem diminuir a produção de células sangüíneas e, conseqüentemente, a anemia torna-se mais grave. O fígado aumenta progressivamente de volume durante a vida e é freqüente a formação de cálculos biliares constituídos pelo pigmento dos eritrócitos lesados. O coração normalmente aumenta de volume e os sopros cardíacos são comuns. As crianças com doença da célula falciforme freqüentemente apresentam um tronco relativamente curto e membros superiores, membros inferiores, quirodáctilos (dedos das mãos) e pododáctilos (dedos dos pés) longos.

Alterações ósseas e da medula óssea podem causar dor, especialmente nas mãos e nos pés. Podem ocorrer episódios de dor articular com febre e a articulação do quadril pode tornar-se tão lesada que pode ser necessária a sua substituição por uma prótese. A má circulação cutânea pode causar úlceras nos membros inferiores, especialmente nos tornozelos. A lesão do sistema nervoso pode causar acidentes vasculares cerebrais. Nos indivíduos idosos, as funções pulmonar e renal podem deteriorar. Os homens jovens podem apresentar priapismo (ereções persistentes), o qual é comumente doloroso. Raramente, um indivíduo com traço falciforme apresenta sangue na urina em decorrência de um sangramento renal. Se o médico souber que o sangramento está relacionado ao traço falciforme, uma cirurgia exploradora desnecessária pode ser evitada.

Diagnóstico

Os médicos consideram a anemia, a dor gástrica, a dor óssea e as náuseas em um indivíduo jovem da raça negra como sinais de uma crise falciforme. Em um exame microscópico de uma amostra de sangue, podem ser observadas células falciformes e fragmentos de eritrócitos destruídos. A eletroforese de hemoglobina (um exame de sangue) pode detectar hemoglobinas anormais e indicar se o indivíduo apresenta traço falciforme ou doença da célula falciforme. A descoberta do traço pode ser importante para o planejamento familiar, para determinar o risco de concepção de um filho com doença da célula falciforme.

Tratamento e Prevenção

No passado, os indivíduos com doença da célula falciforme raramente sobreviviam além dos 20 anos. Atualmente, no entanto, eles vivem bem além dos 50 anos. Raramente, um indivíduo com traço falciforme morre subitamente durante a prática de exercícios extenuantes que provocam desidratação (p.ex., treinamento militar ou esportivo). A doença da célula falciforme não tem cura e, por isso, o tratamento visa a prevenção de crises, o controle da anemia e o alívio dos sintomas. Os indivíduos que apresentam essa doença devem tentar evitar as atividades que reduzem a quantidade de oxigênio no sangue e, mesmo por doenças menores (p.ex., uma infecção viral), eles devem procurar atendimento médico imediatamente. Por apresentarem um maior risco de infecção, eles devem ser imunizados com vacinas contra pneumococos e o Hemophilus influenzae.

Formas dos Eritrócitos

Os eritrócitos normais são flexíveis e possuem uma forma esférica, são mais espessos nas bordas que no centro. Em vários distúrbios congênitos, os eritrócitos tornam-se esféricos (esferocitose hereditária), ovais (eliptocitose hereditária) ou assumem uma forma de foice (doença da célula falciforme)

A crise falciforme pode exigir internação. O paciente recebe grandes quantidades de líquidos pela via intravenosa e drogas para aliviar a dor. No caso do médico suspeitar que a anemia é suficientemente grave a ponto de poder causar um acidente vascular cerebral, um infarto do miocárdio ou uma lesão pulmonar, podem ser realizadas transfusões sangüíneas e a administração de oxigênio. Ao mesmo tempo, as condições que podem ter causado a crise (p.ex., uma infecção) devem ser tratadas. Estão sendo estudadas drogas para controlar a doença da célula falciforme (p.ex., hidroxiuréia).

A hidroxiuréia aumenta a produção de um tipo de hemoglobina encontrado predominantemente nos fetos, o qual diminui a quantidade de eritrócitos que possuem a forma de uma foice. Conseqüentemente, ele reduz a freqüência de crises falciformes. A medula óssea de um membro da família ou de um outro doador que não apresenta o gene da doença da célula falciforme pode ser transplantada em um indivíduo com a doença. Embora o transplante possa ser curativo, ele é arriscado e os receptores devem utilizar drogas que deprimem o sistema imune durante o resto da vida. A terapia genética, uma técnica na qual genes normais são implantados em células precursoras (células que produzem células sangüíneas), também encontra-se em estudo.

Doenças das Hemoglobinas C, S-C E E

A doença da hemoglobina C ocorre em 2 a 3% dos indivíduos americanos da raça negra. Somente aqueles que possuem dois genes para a doença desenvolvem anemia, a qual varia de intensidade. Os indivíduos que apresentam esta doença, particularmente as crianças, podem apresentar episódios de dor abdominal e articular, esplenomegalia e icterícia leve, mas eles não apresentam crises graves. Em geral, os sintomas são poucos. A doença da hemoglobina S-C ocorre em indivíduos que possuem um gene para a doença da célula falciforme e um gene para a doença da hemoglobina C. Ela é muito mais comum do que a doença de hemoglobina C e os seus sintomas são similares aos da doença da célula falciforme, embora sejam muito mais leves. A doença da hemoglobina E afeta sobretudo os indivíduos da raça negra e os habitantes do sudeste asiático; ela é rara entre os chineses. Esta doença produz anemia, mas nenhum dos outros sintomas que ocorrem na doença da célula falciforme e na doença da hemoglobina C.

Talassemias

As talassemias são um grupo de doenças congênitas resultantes de um desequilíbrio da produção de uma das quatro cadeias de aminoácidos que constituem a hemoglobina. As talassemias são classificadas de acordo com a cadeia de aminoácidos afetada. Os dois tipos principais são a alfa-talassemia (a cadeia alfa é afetada) e a beta-talassemia (a cadeia beta é afetada). As talassemias também são classificadas de acordo com a presença de um gene afetado (talassemia minor) ou de dois genes afetados (talassemia major). A alfa-talassemia é mais comuns em indivíduos da raça negra (25% deles apresentam pelo menos um gene) e a betatalassemia é mais comum em indivíduos da área do Mediterrâneo e do sudeste asiático. Um gene para a beta-talassemia produz uma anemia leve a moderada, assintomática; dois genes causam uma anemia grave acompanhada de sintomas.

Cerca de 10% dos indivíduos que possuem pelo menos um gene para a alfatalassemia também apresentam uma anemia leve. Todas as talassemias produzem sintomas semelhantes, mas com gravidade diferente. A maioria dos indivíduos apresenta uma anemia leve. Nas formas mais graves, como na beta-talassemia major, podem ocorrer icterícia, úlceras de pele, cálculos biliares e esplenomegalia (algumas vezes enorme). A medula óssea hiperativa pode produzir aumento e espessamento de alguns ossos, sobretudo os da cabeça e da face. Os ossos longos podem enfraquecer e fraturar facilmente. As crianças com talassemia podem apresentar um crescimento mais lento e atingir a puberdade mais tarde do que o normal.

Como a absorção de ferro pode estar aumentada e como transfusões sangüíneas (fornecendo mais ferro) são necessárias, o ferro em excesso pode acumular e depositar-se no miocárdio (músculo cardíaco), podendo acarretar insuficiência cardíaca. As talassemias são mais difíceis de serem diagnosticadas do que as outras alterações da hemoglobina. A eletroforese de hemoglobina de uma gota de sangue é útil mas pode ser inconclusiva, especialmente no caso da alfa-talassemia. Por essa razão, o diagnóstico normalmente é baseado nos padrões hereditários e em exames especiais da hemoglobina. A maioria dos indivíduos que apresenta uma talassemia não necessita de tratamento, mas aqueles com formas graves podem necessitar de um transplante de medula óssea. A terapia genética encontra-se em estudo.

fonte: Manual Merck