ENFERMAGEM, CIÊNCIAS E SAÚDE

Gerson de Souza Santos - Bacharel em Enfermagem, Especialista em Saúde da Família, Mestrado em Enfermagem, Doutorado em Ciências da Saúde - Universidade Federal de São Paulo. Atualmente professor do Curso de Medicina do Centro Universitário Ages - Irecê-Ba.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Bronquiectasia e Atelectasia


Tanto a bronquiectasia como a atelectasia são resultantes de uma lesão parcial do trato respiratório. Na bronquiectasia, são os brônquios (as vias aéreas que se ramificam a partir da traquéia) que se encontram lesados. Na atelectasia, parte do pulmão contrai devido à uma perda de ar.

Bronquiectasia

A bronquiectasia é uma dilatação irreversível de porções dos brônquios devida à lesão da parede brônquica. A bronquiectasia não é em si uma doença isolada, mas é produzida de diversas maneiras e é conseqüência de diferentes processos que lesam a parede brônquica, interferindo direta ou indiretamente em suas defesas. A condição pode ser difusa ou pode afetar somente uma ou duas áreas. Tipicamente, a bronquiectasia causa dilatação dos brônquios de calibre médio, mas, freqüentemente, os brônquios menores localizados abaixo apresentam cicatrização e obstrução.

Ocasionalmente, nos casos de aspergilose broncopulmonar alérgica, ocorre uma forma de bronquiectasia que afeta os brônquios de grosso calibre, um distúrbio provocado por uma resposta imune ao fungo Aspergillus. Em geral, a parede brônquica é formada por várias camadas, que variam de espessura e de composição nas diferentes partes das vias aéreas. O revestimento interno (mucosa) e a região imediatamente inferior (submucosa) contêm células que ajudam a proteger as vias aéreas e os pulmões contra substâncias potencialmente nocivas. Essas células incluem as células secretoras de muco, as células ciliadas, que possuem estruturas semelhantes a pêlos que auxiliam na eliminação de partículas e de muco do inteior das vias aéreas, e muitas outras células que estão relacionadas à imunidade e à defesa do organismo contra organismos invasores e substâncias nocivas. Fibras musculares e elásticas e uma camada cartilaginosa constituem a estrutura das vias aéreas, permitindo a variação de seu diâmetro de acordo com a necessidade.

Os vasos sangüíneos e o tecido linfóide auxiliam na nutrição e na defesa da parede brônquica. Na bronquiectasia, ocorre destruição e inflamação crônica em áreas das paredes brônquicas. As células ciliadas são lesadas ou destruídas e a produção de muco aumenta. Além disso, a parede perde seu tônus normal. A área afetada torna- se mais dilatada, flácida e pode produzir protuberâncias ou bolsas semelhantes a pequenos balões. O aumento de muco possibilita o crescimento bacteriano, produz freqüentemente obstrução brônquica e acarreta o acúmulo de secreções e um maior dano à parede brônquica. A inflamação pode estender-se até os pequenos sacos aéreos dos pulmões (alvéolos), causando broncopneumonia, formação de cicatrizes e uma perda de tecido pulmonar funcional.

Nos casos graves, a formação de tecido cicatricial e a perda de vasos sangüíneos na parede dos brônquios podem sobrecarregar o coração. Além disso, a inflamação e o aumento de vasos sangüíneos na parede brônquica pode provocar o surgimento de uma expectoração sanguinolenta. A obstrução das vias aéreas lesadas pode acarretar níveis anormalmente baixos de oxigênio no sangue. Muitas condições podem causar a bronquiectasia. A causa mais comum é a infecção, seja ela crônica ou recorrente. As respostas imunes anormais, os problemas congênitos que afetam a estrutura das vias aéreas ou a capacidade dos cílios de eliminar muco e fatores mecânicos, como a obstrução brônquica, podem predispor um indivíduo a infecções que levam à bronquiectasia. É provável que um pequeno número de casos seja decorrente da inalação de substâncias tóxicas que lesam os brônquios.

Compreendendo a Bronquiectasia

Na bronquiectasia, algumas áreas da parede brônquica são destruídas e apresentam inflamação crônica, os cílios são destruídos ou lesados e a produção de muco aumenta.

Sintomas e Diagnóstico

Apesar de a bronquiectasia ocorrer em qualquer idade, o quadro aparece com maior freqüência na primeira infância. No entanto, em alguns casos, os sintomas surgem muito mais tarde ou podem jamais se manifestar. Os sintomas começam de maneira gradual, comumente após uma infecção do trato respiratório, e tendem a piorar no decorrer dos anos. A maioria dos indivídos apresenta uma tosse de longa duração e produtiva. A quantidade e o tipo do escarro dependem da extensão da doença e da presença de uma complicação por uma infecção sobreposta. Normalmente, as crises de tosse ocorrem no início da manhã e no final do dia. A tosse com sangue é comum e pode ser o primeiro e o único sintoma.

Os episódios freqüentes de pneumonia podem também indicar a existência de bronquiectasia. Os indivíduos com bronquiectasia generalizada apresentam sibilos ou dificuldade respiratória. Além disso, eles podem apresentar bronquite crônica, enfisema ou asma. A doença é muito grave, e ocorre mais comumente nos países menos desenvolvidos, podendo sobrecarregar o coração e acarretar insuficiência cardíaca – uma condição que pode produzir edema (inchaço) nos pés ou nas pernas, acúmulo de líquido no abdômen e dificuldade respiratória, sobretudo na posição deitada. Pode-se suspeitar a existência de bronquiectasia através dos sintomas ou pela presença de outro distúrbio associado. No entanto, é necessária a realização de estudos radiográficos para a confirmação do diagnóstico e para a avaliação da extensão e da localização da doença. As radiografias torácicas padrões podem ser normais, mas, algumas vezes, elas detectam as alterações pulmonares causadas pela bronquiectasia.

A tomografia computadorizada (TC) de alta resolução geralmente confirma o diagnóstico e é especialmente útil na determinação da extensão da doença quando é aventada a possibilidade de um tratamento cirúrgico. Freqüentemente, após o diagnóstico da bronquiectasia, são realizados exames que verificam a presença de doenças que podem ser reponsáveis pelo quadro. Esses exames incluem a determinação dos níveis de imunoglobulina no sangue, a dosagem da concentração de sal no suor (anormais em casos de fibrose cística) e o exame de amostras nasais, brônquicas ou do sêmen para se determinar se as células ciliadas apresentam defeitos estruturais ou funcionais. Quando a bronquiectasia é limitada a uma área (p.ex., um lobo ou segmento pulmonar), pode ser realizada uma broncoscopia de fibra óptica (exame que utiliza um tubo de visualização que é introduzido nos brônquios), para se determinar se a causa é um corpo estranho aspirado ou um tumor pulmonar. Outros exames podem ser realizados para a identificação de doenças subjacentes, como a aspergilose broncopulmonar alérgica.


Principais Causas de Bronquiectasia

Infecções respiratórias
Sarampo Coqueluche Infecção por adenovírus Infecção bacteriana (por exemplo, por Klebsiella, Staphylococcus ou Pseudomonas) Gripe Tuberculose Infecção por fungo Infecção por Mycoplasma

Obstrução brônquica
Aspiração de corpo estranho Aumento de tamanho de gânglios linfáticos Tumor pulmonar Tampão de muco

Lesões por inalação
Lesão causada por vapores, gases ou partículas nocivas Aspiração de ácido gástrico e partículas de alimento

Distúrbios genéticos
Fibrose cística Discinesia ciliar, inclusive síndrome de Kartagener Deficiência de alfa1-antitripsina

Anormalidades imunológicas
Síndromes de deficiência imunoglobulínica Disfunções dos leucócitos Deficiências do complemento Certos distúrbios auto-imunes ou hiperimunes, como a artrite reumatóide e a colite ulcerativa

Outros distúrbios

Abuso de drogas como, por exemplo, a heroína Infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) Síndrome de Young (azoospermia obstrutiva) Síndrome de Marfan

Prevenção

As vacinações infantis contra o sarampo e a coqueluche têm ajudado a reduzir o número de indivíduos que desenvolvem bronquiectasia. As vacinações anuais contra a gripe também ajudam a impedir a ação destrutiva dos agentes virais causadores da doença. A vacina pneumocócica pode ajudar a evitar determinados tipos de pneumonia pneumocócica e suas graves complicações. O uso de antibióticos na fase inicial de infecções, como a pneumonia e a tuberculose, também pode evitar a bronquiectasia ou reduzir sua gravidade.

A administração de imunoglobulinas em uma síndrome de deficiência imunoglobulínica pode evitar a ocorrência de infecções recorrentes e complicações derivadas das mesmas. O uso adequado de medicamentos antiinflamatórios, como os corticosteróides, pode evitar as lesões brônquicas que produzem as bronquiectasias, principalmente nos indivíduos com aspergilose broncopulmonar alérgica. Evitar a inalação de vapores perniciosos, gases, fumaça (inclusive a fumaça de tabaco) e poeiras nocivas (como a de sílica ou o talco) também ajuda a evitar a bronquiectasia ou a reduzir sua gravidade.

A aspiração de corpos estranhos até as vias aéreas pode ser prevenida pelo controle rigoroso do que as crianças colocam na boca, evitando-se a excessiva sedação por drogas ou álcool e pela busca de auxílio médico no caso do paciente apresentar sintomas neurológicos, como o comprometimento do nível de consciência, ou sintomas gastrointestinais, como a dificuldade de deglutição, a regurgitação ou a tosse após a alimentação. Além disso, deve ser evitada a instilação de gotas oleosas ou de óleo mineral na boca ou no nariz na hora de dormir, pois essas substâncias podem ser aspiradas até os pulmões. A broncoscopia pode ser utilizada para detectar e tratar uma obstrução brônquica antes que ocorram lesões graves.

Tratamento

Não são recomendados os medicamentos que suprimem a tosse porque eles podem agravar o problema. Para os indivíduos que eliminam secreção em grande quantidade, a drenagem postural e a tapotagem (percussão torácica) várias vezes ao dia, ajudam a drenar o muco e são essenciais no tratamento da bronquiectasia. As infecções são tratadas com antibióticos. Em alguns casos, os antibióticos são prescritos durante um longo período para evitar as recidivas freqüentes.

Os medicamentos antiinflamatórios, como os corticosteróides e os mucolíticos (substâncias que diminuem a viscosidade do pus e do muco) também podem ser administrados. Se a concentração de oxigênio no sangue estiver baixa, a administração de oxigênio ajuda a prevenir complicações como o cor pulmonale (doença cardíaca relacionada a uma doença pulmonar). Se o paciente apresentar insuficiência cardíaca, os diuréticos podem reduzir o edema. Caso o paciente apresente sibilos ou dificuldade respiratória, as drogas broncodilatadoras freqüentemente são úteis.

Raramente, é realizada a remoção cirúrgica de uma parte de um pulmão. Esse tipo de procedimento é uma opção somente quando a doença está limitada a um pulmão ou, de preferência, a um lobo ou segmento pulmonar. A cirurgia também pode ser aventada para os indivíduos que apresentam infecções repetidas apesar do tratamento ou para aqueles que expectoram grandes quantidades de sangue. Como alternativa, o médico pode obstruir deliberadamente o vaso sangrante.

Atelectasia

A atelectasia é uma condição na qual parte do pulmão torna-se desprovida de ar e entra em colapso. A principal causa da atelectasia é a obstrução de um brônquio principal, uma das duas ramificações da traquéia que se dirigem diretamente aos pulmões. As vias aéreas pequenas também podem ser obstruídas. A obstrução pode ser causada por um tampão de muco, um tumor ou um corpo estranho aspirado para o interior do brônquio. O brônquio também pode ser obstruído por causa de uma pressão externa provocada por um tumor ou o aumento de tamanho de linfonodos (gânglios linfáticos). Quando uma via aérea é obstruída, o ar contido nos alvéolos é absorvido pela corrente sangüínea, o que acarreta sua diminuição de volume e sua retração.

O tecido pulmonar colapsado comumente enche-se de células sangüíneas, soro e muco, o que propicia o desenvolvimento de infecções. Após uma cirurgia – sobretudo quando torácica ou abdominal –, a respiração comumente é superficial e as partes inferiores dos pulmões não se expandem adequadamente. Tanto a cirurgia como outras causas de respiração superficial podem causar a atelectasia. Na síndrome do lobo médio, um tipo de atelectasia de longa duração, o lobo médio do pulmão direito contrai, geralmente em decorrência da pressão sobre o brônquio exercida por um tumor ou por linfonodos, mas, algumas vezes, sem que haja compressão do brônquio.

O pulmão obstruído e contraído pode desenvolver uma pneumonia que não chega a curar completamente e que produz inflamação crônica, cicatrização e bronquiectasia. Na atelectasia por aceleração, a qual ocorre em pilotos de aviões a jato, as grandes forças geradas pela alta velocidade do vôo fecham as vias aéreas pequenas e produzem um colapso dos alvéolos. Na microatelectasia irregular ou difusa, o sistema tensoativo do pulmão é comprometido. O surfactante é uma substância tensoativa que recobre o revestimento dos alvéolos e reduz a tensão superficial alveolar, impedindo o seu colapso.

Os recém-nascidos prematuros que apresentam uma deficiência de surfactante desenvolvem a síndrome da angústia respiratória neonatal. Os adultos também podem apresentar microatelectasias devido à administração excessiva de oxigênio, a uma infecção generalizada grave (sépsis) ou a muitos outros fatores que lesam o revestimento dos alvéolos.

Sintomas e Diagnóstico

A atelectasia pode ocorrer lentamente e causar apenas uma discreta dificuldade respiratória. Algumas vezes, os indivíduos com a síndrome do lobo médio não apresentam sintoma, embora muitos apresentem uma tosse seca. Quando a atelectasia atinge uma grande área pulmonar de forma rápida, o indivíduo pode apresentar uma coloração azulada ou acinzentada, uma dor intensa no lado afetado e uma dificuldade respiratória extrema. Se houver uma infecção concomitante, o paciente apresenta febre e a freqüência cardíaca acelerada. Ocasionalmente, o indivíduo pode apresentar uma hipotensão arterial grave (choque).

O médico suspeita de atelectasia baseando-se nos sintomas do paciente e nos resultados do exame físico. O diagnóstico é confirmado por uma radiografia que mostra a zona desprovida de ar. Uma tomografia computadorizada (TC) ou uma broncoscopia de fibra óptica pode ser realizada para se detectar a causa da obstrução.

Prevenção e Tratamento

O paciente deve adotar medidas para evitar a atelectasia após uma cirurgia. Embora apresentem um maior risco de atelectasia, os tabagistas podem diminuir a probabilidade de sua ocorrência se deixarem de fumar de seis a oito semanas antes da cirurgia. No período pós-operatório, os pacientes devem ser estimulados a respirar profundamente, a tossir com regularidade e a movimentar- se assim que possível. Os dispositivos e os exercícios respiratórios também são úteis.

Os indivíduos com deformidades torácicas ou distúrbios neurológicos que produzem uma respiração superficial durante longos períodos podem ser beneficiados com a utilização de aparelhos mecânicos que auxiliam na respiração. Os aparelhos aplicam uma pressão contínua aos pulmões, de modo que, mesmo no final de uma respiração, as vias aéreas colapsem. O principal tratamento para a atelectasia repentina e de grande escala é a eliminação da causa subjacente. Quando uma obstrução não pode ser eliminada pela tosse ou pela aspiração das vias aéreas, ela geralmente pode ser removida pela broncoscopia. Para qualquer infecção, são administrados antibióticos. Freqüentemente, a atelectasia de longa duração é tratada com antibióticos pelo fato de a infecção ser praticamente inevitável.

Em certos casos, a parte afetada do pulmão pode ser removida quando uma infecção recorrente ou persistente torna-se incapacitante ou quando a perda sangüínea é grave. No caso de uma obstrução de vias aéreas por um tumor, o alívio da obstrução através da cirurgia ou de outros meios pode evitar que a atelectasia progrida e que ocorra o desenvolvimento de uma pneumonia obstrutiva recorrente.