VÍRUS
Introdução
Na antiguidade, o termo ‘vírus’ (do latim; significa veneno) foi
utilizado como sinônimo de veneno e se referia a agentes de natureza
desconhecida que provocavam diversas doenças.
A descoberta dos vírus deve-se a Dmitri Ivanowsky (em 1892), que, ao
estudar a doença chamada ‘mosaico do tabaco’, detectou a possibilidade
de transmissão da doença a partir de extratos de vegetais doentes para
vegetais sadios, por meio de experimentos com filtros capazes de reter
bactérias. Essa moléstia afeta as plantas do fumo, manchando as folhas
com áreas necrosadas e levando-as à morte. Em 1935, cristais de vírus foram isolados e observados ao microscópio
pela primeira vez. A sua composição parecia principalmente protéica,
porém constatou-se mais tarde uma pequena quantidade de ácidos
nucléicos. Nos sistemas tradicionais de classificação dos seres vivos, os vírus
não são incluídos por não apresentarem características morfológicas
celulares. Eles possuem estrutura molecular apenas visível ao
microscópio eletrônico. Sua estrutura vem sendo cada vez mais
esclarecida, à medida que a tecnologia em microscopia eletrônica evolui.
Eles são tão pequenos que podem penetrar na célula das menores
bactérias que se conhecem. Estruturas de vários vírus vistos com o microscópio eletrônico: as
partículas esféricas são os vírus do mosaico amarelo do nabo; os
cilindros longos são os vírus do mosaico do tabaco e no centro, temos, o
bacteriófago T4.
Nos sistemas tradicionais de classificação dos seres vivos, os vírus
não são incluídos por serem considerados partículas ou fragmentos que só
adquirem manifestações vitais quando parasitam células vivas. Apesar de até hoje ainda persistir a discussão em torno do tema, a tendência é considerar os vírus como seres vivos. Os vírus são extremamente simples e diferem dos demais seres vivos
pela inexistência de organização celular, por não possuírem metabolismo
próprio, e por não serem capazes de se reproduzir sem estar dentro de
uma célula hospedeira. São, portanto, parasitas intracelulares
obrigatórios; são em conseqüência, responsáveis por várias doenças
infecciosas. Geralmente inibem o funcionamento do material genético da célula
infectada e passam a comandar a síntese de proteínas. Os vírus atacam
desde bactérias, até plantas e animais. Muitos retrovírus (vírus de RNA)
possuem genes denominados oncogenes, que induzem as células hospedeiras
à divisão descontrolada, com a formação de tumores cancerosos.
1. Características
1.1. Filtrabilidade
Essa característica, que serviu de base para a descoberta do vírus,
originou a denominação vulgar de "vírus filtrável", termo que teve de
ser abandonado pelo fato de, posteriormente, se descobrir que existem
bactérias filtráveis, como certos espiroquetas, e vírus não filtráveis,
como o vírus do Mosaico Comum do feijoeiro e o do "Crinkle Mosaic" da
batatinha. A filtrabilidade do vírus não é uma pura conseqüência de seu
diminuto tamanho. Tipo de filtro, temperatura, ph, carga elétrica do
vírus e do filtro, quantidade de pressão exercida sobre o filtro,
natureza do fluído da suspensão e duração da filtração, são fatores que
devem ser levados em consideração ao se determinar a filtrabilidade do
vírus. Atualmente se dispõe de filtros de colódio, as Membranas de
Gradocol, em que o tamanho dos poros é muito mais importante do que nos
filtros bacteriológicos de porcelana.
1.2. Natureza Corpuscular
Desde 1898 se suspeita da natureza corpuscular do vírus, com a teoria
do "contagium vivum fluidum", denominação que Beijerink emprestou de
Fracastorius (1546) para caracterizar o filtrado infectivo do suco de
fumo com mosaico. A guisa de esclarecimento, contagium era uma
substância derivada do corpo do doente e que, passando de um indivíduo
para outro, transmitia a doença e a teoria do contagium vivum foi criada
por Fracastorius, quando postulou a idéia de que o contagium fosse
devido a agentes vivos (seminaria). Entretanto, por muitos anos, essa
característica foi um ponto altamente controvertido pois a ciência ainda
não estava preparada para comprová-la. Apesar disso, mesmo antes da
descoberta de microscópio eletrônico, em 1938, Wendell Stanley (1935) já
mostrava evidências irrefutáveis sobre a natureza corpuscular do vírus
ao cristalizar o vírus do Mosaico do Fumo. Hoje, acostumamos com
representações esquemáticas e eletromicrográficos dos vírus,
dificilmente imaginamos que essa característica tivesse sido um pomo de
discórdia no passado.
1.3. Natureza Antigênica
Muito antes da descoberta dos vírus, já se sabia que doenças hoje
conhecidas eram causadas por vírus, como por exemplo a varíola,
conferiam resistência contra incidências subsequentes. A vacina contra a
varíola se baseia, ainda hoje, na descobertas de Jenner (1798) de que o
vírus do "cow-pox"(varíola bovina) imuniza contra o "small-pox"(varíola
humana). Proteínas introduzidas no corpo animal, por via parenteral,
sendo elas estranhas ao corpo do animal, induz a formação de substância
que reagem especificamente com as proteínas injetadas. Estas proteínas
estranhas constituem os antígenos e as substâncias induzidas, os
anticorpos. Sendo os vírus de natureza nucleoproteica tem essa
propriedade antigêno que serve de base para os métodos sorológicos
usados em Virologia. Especula-se, atualmente, se as plantas possuem essa
capacidade de formação de anticorpos, comprova somente em animais.
Estirpes fracas do vírus da tristeza dos citros conferem resistência às
estirpes mais severas do mesmo vírus. A natureza desse fenômeno,
entretanto, não esta esclarecida.
1.4. Dimensões do vírus
As dimensões dos vírus, evidenciadas por estudos eletromicroscópicos,
de ultrafiltração e ultracentrifugação, variam de 10 a 350 milimicra de
diâmetro; o comprimento chega até 2.000 milimicra (vírus da Tristeza do
Citrus). A guisa de comparação, os glóbulos vermelhos do sangue humano
têm 7.500 milimicra de diâmetro e, dentro de uma célula bacteriana,
podem caber mais de 1 milhão de partículas de vírus.
2. Evolução
Teriam os vírus evoluído de células vivas livres? Seriam eles
produtos da evolução de alguma bactéria? Poderiam ser estes, componentes
de células hospedeiras que se tornaram autônomos? Eles lembram genes
que tenham adquirido a capacidade de existir independentemente da
célula. Embora a virologia exista como ciência apenas há cerca de 100
anos, os vírus provavelmente têm estado presente nos organismos vivos
desde a origem da vida. Se os vírus precederam ou surgiram somente após
os organismos unicelulares, é uma questão controversa. Contudo, com base
nas contínuas descobertas de vírus infectando diferentes espécies,
pode-se concluir que, praticamente, todas as espécies deste planeta são
infectadas por vírus. Os estudos tem sido limitados aos vírus isolados
no presente ou de material de poucas décadas atrás. Infelizmente não
existem fósseis dos vírus.
3. Estrutura
Os vírus são formados basicamente por um envoltório ou cápsula
protéica, que abriga o material hereditário. Este pode ser tanto o ácido
desoxirribonucléico (DNA) como o ácido ribonucléico (RNA). Esses dois
ácidos nucléicos, no entanto, nunca ocorrem em um mesmo vírus.
Existem, assim, vírus de DNA e vírus de RNA. Em todos os outros seres
vivos, o ácido desoxirribonucléico e o ácido ribonucléico ocorrem
juntos dentro das células, sendo o DNA o "portador" das informações
genéticas e o RNA o "tradutor" dessas informações.
Formados por uma cápsula (capsídio) protéica + ácido nucléico: DNA ou
RNA. O capsídio, além de proteger o ácido nucléico viral, tem a
capacidade de se combinar quimicamente com substâncias presentes na
superfície das células, o que permite ao vírus reconhecer e atacar o
tipo de célula adequado a hospedá-lo.
A partícula viral, quando fora da célula hospedeira, é genericamente
denominada vírion. Cada tipo de vírus possui uma forma característica,
mas todos eles são extremamente pequenos, geralmente muito menores do
que as menores bactérias conhecidas, sendo visíveis somente ao
microscópio eletrônico. Os vírus apresentam uma grande variedade de
forma e de tamanho. O diâmetro dos principais vírus oscila de 15-300 nm.
O vírus da varíola é o maior vírus humano que se conhece (300x250x100
nm), enquanto que o da poliomielite é o menor vírus humano (20 nm de
diâmetro). O vírus da febre aftosa, responsável por uma doença em gado,
possui 15 nm, sendo portanto, menor que o poliovírus. Num só grupo, as
medidas citadas por diferentes autores, podem variar consideravelmente.
Isto se deve em parte, a certas diferenças nas técnicas empregadas.Vírus
de diferentes famílias apresentam diferentes morfologias que podem ser
prontamente distinguidas pelo microscópio eletrônico. Esta relação é
útil para o diagnóstico de doenças virais e, especialmente para
reconhecer novos vírus responsáveis por infecções. Alguns vírus tem
formas parecidas, daí ser importante o uso da imunomicroscopia
eletrônica. Um vírion pode se apresentar sob vários formatos: esférico
(influenzavírus),de ladrilho (poxvírus),de bastão (vírus do mosaico do
tabaco) e de projétil (vírus da raiva).
Os vírus são extremamente simples e diferem dos seres vivos pela
inexistência de organização celular, por não possuírem metabolismo
próprio e por não serem capazes de se reproduzir, sendo replicados
apenas no interior de uma célula hospedeira. São considerados parasitas
intracelulares obrigatórios, e, em conseqüência disso, são responsáveis
por várias doenças infecciosas. As diferentes proteínas virais interagem de modo específico com
proteínas expostas nas membranas celulares, determinando, assim, as
células que são susceptíveis a certos vírus. O vírus da poliomielite,
por exemplo, é altamente específico, infectando apenas células nervosas,
intestinais e da mucosa da garganta. Já o vírus da rubéola e o vírus da
varíola conseguem infectar maior número de tecidos humanos. Existem vírus que infectam apenas bactérias, denominados
bacteriófagos ou simplesmente fagos; os que infectam apenas fungos,
denominados micófagos; os que infectam plantas, vírus de plantas e os
que infectam animais denominados vírus de animais.
3.1. Vírus com DNA ou RNA
Quando o ácido nucléico é o DNA, ele é transcrito em várias moléculas
de RNA ( pela bactéria ) que servirão de molde para a síntese de
proteínas virais. É o caso do vírus da varíola, do herpes, do adenovírus
(provoca infecções respiratórias), da hepatite B.
Quando o ácido nucléico é o RNA, dois processos podem ocorrer: O RNA
viral é transcrito em várias moléculas de RNA mensageiro, que comandarão
a síntese protéica. É o que ocorre com a maior parte dos vírus animais,
como o vírus da raiva, da gripe; o vírus da poliomielite e de algumas
encefalites têm o RNA que já funciona como RNA mensageiro. Nos vírus
conhecidos como retrovírus, como é o caso do vírus da AIDS (HIV), o RNA é
transcrito em DNA por uma enzima transcriptase reversa. A partir da
ação dessa enzima, o RNA serve de molde a uma molécula de DNA, que
penetra no núcleo da célula, e integra-se ao cromossomo do hospedeiro.
O DNA viral integrado ao cromossomo celular é chamado de provírus.
Ele é reconhecido e transcrito pelas enzimas da célula hospedeira, de
modo que logo começam a surgir moléculas de RNA com informações para
síntese de transcriptase reversa e das proteínas do capsídeo. Algumas
dessas moléculas de RNA são empacotadas juntamente com moléculas de
transcriptase reversa, originando centenas de vírus completos (vírions).
A infecção por retrovírus geralmente não leva à morte da célula
hospedeira, e esta pode se dividir e transmitir o provírus integrado às
células-filhas.
3.2. Retrovírus
Nem todo vírus de RNA é classificado como retrovírus, somente aqueles
que usam o RNA como molde para síntese de DNA. Em 1980 foi isolado o
primeiro retrovírus na espécie humana: o HTLV-1 - um retrovírus que
infecta linfócitos T e causa um tipo de leucemia (câncer do sangue).
Dois anos mais tarde, foi descoberto outro retrovírus, o HTLV-2, que
causa outro tipo de leucemia. Em 1981 foi diagnosticado o primeiro caso
de AIDS e somente em 1983 conseguiu-se provar que essa síndrome é
causada por um novo tipo de retrovírus, que recebeu o nome de Vírus da
Imunodeficiência Humana ou HIV .
3.3. Especificidade
Em geral, um tipo de vírus ataca um ou poucos tipos de célula. Isso
porque um determinado tipo de vírus só consegue infectar uma célula que
possua, na membrana, substâncias às quais ele possa se ligar. O vírus da
Poliomielite, por exemplo, é altamente específico, infectando apenas
células nervosas, intestinais e da mucosa da garganta. Já os vírus da
Rubéola e da Varíola conseguem infectar maior número de tecidos humanos.
Os vírus da Gripe são bastante versáteis e podem infectar diversos
tipos de células humanas e também células de diferentes animais, como
patos, cavalos e porcos. Em muitos casos, essa capacidade se deve ao
fato de esses vírus conseguirem se ligar a substâncias presentes em
células de diversos tipos de organismo.Os vírus, tanto de plantas como
de animais, apresentam uma gama determinada de hospedeiros. Assim, o
vírus da febre amarela urbana tem como hospedeiros somente o homem
(transmissor: mosquito do gênero Aedes); o da febre amarela silvestre, o
macaco e o homem (transmissor Haemogogus); o da Tristeza do Citrus,
somente plantas cítricas; TWV pelo menos 74 espécies vegetais
distribuídas em 14 famílias. Em vírus animais e especificidade vai até o
nível histológico, servindo de base para classifica-los em vírus: vírus
dermotrópicos (varíola, varicela, sarampo, rubéola, etc.), vírus
pneumotrópicos (gripe, resfriado, etc.) vírus neurotrópicos (raiva,
poliomielite, encefalites, etc.), vírus hepatotrópicos (febre-amarela,
hepatite) e vírus linfo e glandulotrópicos (caxumba, linfogranuloma
inguinal).
3.4. Propriedades
- Tamanho: os vírus são menores que outros organismos, embora eles variem consideravelmente em tamanho - de 10 nm a 300 nm. As bactérias possuem aproximadamente 1000 nm e as hemácias 7500 nm de diâmetro.
- Genoma: o genoma dos vírus pode ser formado de DNA ou RNA, nunca ambos (os vírus contém apenas um tipo de ácido nucléico).
- Metabolismo: os vírus não possuem atividade metabólica fora da célula hospedeira; eles não possuem atividade ribossomal ou aparato para síntese de proteínas.
Desta forma, os vírus só são replicados dentro de células vivas. O
ácido nucléico viral contém informações necessárias para programar a
célula hospedeira infectada, de forma que esta passa a sintetizar várias
macromoléculas vírus-específicas necessárias a produção da progênie
viral. Fora da célula susceptível, as partículas virais são
metabolicamente inertes. Estes agentes podem infectar células animais e
vegetais, assim como microrganismos. Muitas vezes não produzem prejuízos
aos hospedeiros, embora demonstrem efeitos visíveis.
Se os vírus são organismos vivos ou não é uma questão filosófica,
para a qual alguns virologistas poderão responder que não. Embora os
vírus possuam as principais características de um organismo celular,
eles não possuem a maquinaria necessária para executar aspectos básicos
do metabolismo, tais como a síntese de proteínas. Eles não são capazes
de replicar-se fora da célula hospedeira. Ao invés disto, os genes
virais são capazes de controlar o metabolismo celular e redirecioná-lo
para a produção de produtos vírus-específicos.Os vírus, por outro lado,
diferem de outros agentes como: toxinas, outros parasitas intracelulares
obrigatórios e plasmídeos. As toxinas não são capazes de se
multiplicar. O ciclo de infecção viral inclui um "período de eclipse"
durante o qual não se detecta a presença do vírus, o que não ocorre com
os outros parasitas intracelulares. Os plasmídeos (que são moléculas de
DNA capazes de se replicar em células independentemente do DNA celular)
não apresentam as estruturas protetoras, que nos vírus impedem a
degradação do ácido nucléico genômico.Uma grande contribuição para a
virologia foi a descoberta de que os vírus podem ser cristalizados.
Quando o químico-orgânico Wendell M. Stanley cristalizou o vírus do
Mosaico do Tabaco (VMT) em 1935, forneceu um poderoso argumento para que
se pudesse pensar nos vírus como estruturas químicas simples,
consistindo somente de proteína e ácido nucléico. Desta forma, se
pensarmos nos vírus fora das células, podemos considerá-los como
estruturas moleculares excepcionalmente complexas. No interior das
células, a informação levada pelo genoma viral, faz com que a célula
infectada produza novos vírus, levando-nos a pensar nos vírus como
organismos excepcionalmente simples.
Os vírus são constituídos de dois componentes essenciais: a parte
central recebe o nome de cerne, onde se encontra o genoma, que pode ser
DNA ou RNA, associado com uma capa protéica denominada capsídeo,
formando ambos o nucleocapsídeo. O vírion constitui a última fase de
desenvolvimento do vírus, ou seja, a partícula infectante madura. Em
alguns grupos (poliovírus, adenovírus), os vírions consistem unicamente
de nucleocapsídeo. Em outros grupos (mixovírus, herpesvírus, poxvírus),
os virions são constituídos de nucleocapsídeo rodeado por uma ou mais
membranas lipoprotéicas (o envelope). Muitos vírus adquirem seus
envelopes por brotamento através de uma membrana celular apropriada
(membrana plasmática em muitos casos, retículo endoplasmático, golgi ou
membrana nuclear). O envelope é uma característica comum nos vírus de
animais, porém incomum nos vírus de plantas.
4. Replicação
Existem basicamente dois tipos de ciclos replicativos: o ciclo lítico
e o ciclo lisogênico. Para exemplificar, utilizaremos o ciclo
replicativo dos bacteriófagos. Esses dois ciclos iniciam-se, por
exemplo, com o fago T4 aderindo à superfície da célula bacteriana,
utilizando as fibras protéicas da cauda. O DNA do vírus é, então,
injetado para o interior da bactéria, ficando fora da célula a cápsula
protéica vazia. A partir desse momento, começa a diferenciação entre o
ciclo lítico e ciclo lisogênico.
A maior parte dos vírus, ao infectar uma célula animal, penetra com o
capsídeo e o ácido nucléico, por um processo de viropexia. Se o vírus
for envelopado, o envoltório pode incorporar-se à membrana plasmática da
célula hospedeira e apenas o núcleo capsídeo penetra, ou mesmo, pode
penetrar com todas as suas estruturas por viropexia. No interior dessa
célula, o capsídeo rompe-se, liberando o ácido nucléico.
4.1. Ciclo Lítico
No ciclo lítico, o DNA viral, já no interior da bactéria, interrompe
as funções normais da célula hospedeira e passa a comandar o seu
metabolismo. Os genes do bacteriófago são transcritos em moléculas de
RNA e traduzidos em proteínas virais. Isso ocorre porque as enzimas de
transcrição e tradução da bactéria não distinguem os genes do invasor de
seus próprios genes.
As primeiras proteínas virais que se formam são enzimas capazes de
multiplicar o DNA viral ou inibir o funcionamento do cromossomo
bacteriano. O passo seguinte é a produção das proteínas que constituirão
as cabeças e caudas dos novos vírus, para depois se agregarem ao DNA,
formando vírus completos. Cerca de 30 minutos após a entrada de um único
fago invasor na célula bacteriana, cerca de 200 novos bacteriófagos são
produzidos. Nesse momento inicia-se a lise, ou seja, a ruptura da
célula bacteriana, e os novos bacteriófagos são libertados, podendo
infectar outras bactérias e iniciar outro ciclo. Em vírus humanos e de
animais, a produção maciça de vírus provoca um esgotamento da célula,
favorecendo a lise celular. A célula produz grande quantidade de vírus e
fica sem poder compor suas próprias estruturas. Os vírus que apresentam
o ciclo lítico são chamados de virulentos ou vírus líticos.
4.2. Ciclo Lisogênico
No ciclo lisogênico, o DNA viral penetra na célula da bactéria e se
incorpora ao DNA bacteriano, não interferindo no metabolismo da célula
hospedeira. Essas bactérias são denominadas lisogênicas e esses vírus
são denominados temperados ou não-virulentos. Nesses casos, a bactéria
se reproduz normalmente e, a cada divisão da célula bacteriana, o DNA
viral vai sendo transmitido às novas bactérias, sem se manifestar.
De acordo com determinadas condições, naturais ou artificias (como
radiações ultravioleta, raios X ou certos agentes químicos), o DNA do
fago separa-se do DNA bacteriano e inicia-se o ciclo lítico.
Esquema do ciclo lítico e do ciclo lisogênico de um vírus
4.3. A Liberação do vírus
A liberação do vírus pode ocorrer por esgotamento celular, havendo o
rompimento da célula, como se a célula fosse desintegrando (é o caso da
pólio ou dos bacteriófagos).
Ou pode ocorrer de forma lenta, em que o vírus leva uma porção da
membrana da célula que irá constituir o envelope. Este é adquirido
através de um processo conhecido como "brotamento" (uma forma de
exocitose), nesta membrana o vírus agrega proteínas (espículas) por ele
codificado, e que terá o papel de adsorver às células hospedeiras.
5. Viroses
O que diferencia os vírus de todos os outros seres vivos é que eles
são acelulares, ou seja, não possuem estrutura celular. Assim, não têm a
complexa maquinaria bioquímica necessária para fazer funcionar seu
programa genético e precisam de células que os hospedem. Todos os vírus
são parasitas intracelulares obrigatórios. Atuando como um "pirata"
celular, um vírus invade uma célula e assume o comando, fazendo com que
ela trabalhe quase que exclusivamente para produzir novos vírus. A
infecção viral geralmente causa profundas alterações no metabolismo
celular, podendo levar à morte das células infectadas. Vírus causam
doenças em plantas e em animais, incluindo o homem. Fora da célula
hospedeira, os vírus não manifestam nenhuma atividade vital: não
crescem, não degradam nem fabricam substâncias e não reagem a estímulos.
No entanto, se houver células hospedeiras compatíveis à sua disposição,
um único vírus é capaz de originar em cerca de 20 minutos, centenas de
novos vírus.
6. Bacteriófago
É um vírus muito estudado, pode ser vírus de DNA ou de RNA. São
formados apenas pelo núcleo capsídeo, ou seja, não existem formas
envelopadas. Os mais estudados são os que infectam a bactéria intestinal
Escherichia coli, conhecidos como Bacteriófago ou fagos T2 e T4. Estes
são constituídos por uma cápsula protéica bastante complexa, que
apresenta uma região denominada cabeça, com formato poligonal, onde se
aloja o ácido nucléico, e uma região denominada cauda, com formato
cilíndrico, contendo, em sua extremidade livre, fibras protéicas. Quando
o bacteriófagos entra em contato com a bactéria, adere à parede celular
por meio de certas proteínas presentes nas fibras de sua cauda. Na
cauda estão também presentes enzimas que, ativada após o reconhecimento
molecular, são capazes de digerir e perfurar a parede da célula
bacteriana.
7. Doenças causadas por vírus
7.1. Varíola
Transmissão: gotículas de saliva, contato direto, objetos contaminados (copos, garfos etc).
Modo de infecção: o vírus penetra pelas mucosas das
vias respiratórias, dissemina-se pela corrente circulatória e instala-se
na pele e mucosas, causando as ulcerações da doença.
Sintomas: As primeiras manifestações da
varíola são febre, dor de cabeça, moleza, dores lombares, dor nas pernas
e vômitos. Passada essa fase, começa a erupção cutânea, à primeira
vista semelhante à da catapora. As erupções surgem na cabeça e vão
descendo pelo resto do corpo; inicialmente, são manchas, em seguida
transformam-se em vesículas de tamanho irregular e cheias de pus. Depois
de secas, as vesículas ficam se cobertas por ima crosta que cai dentro
de 10 dias, deixando cicatrizes profundas.
Controle (profilaxia): Aplicação de vacina
antivariólica a partir dos 8 meses de idade. Apesar de ainda constar
como compulsória, a vacinação antivariólica já não é realizada com
regularidade, pois a doença é considerada erradicada. Na eventualidade
de surgir algum caso ou suspeita de contágio, há tempo para se fazer a
vacina protetora.
7.2. Febre Amarela
Transmissão: através da picada do mosquito Aedes
aegypti, que se contamina ao picar um homem ou outro mamífero
contaminado. A febre amarela é uma enfermidade infeciosa e epidêmica
produzida por um vírus filtrável e transmitida ao homem pelo mosquito
Aedes aegypti. Caracterizada por uma evolução em duas fases: - A
primeira, congestiva e a Segunda, ictérica e hemorrágica, separadas por
uma fase de remissão.
Conhece-se perfeitamente como se transmite essa enfermidade, desde as
pesquisas da Comissão Norte-americana que atuou em Cuba, presidida por
Walter Reed, as quais demonstram o seguinte:
- A fêmea do mosquito Aedes aegypti é a que transmite a febre amarela, se previamente houver sugado o sangue de um enfermo dessa febre durante os três primeiros dias da enfermidade.
- Depois de picar, necessita o mosquito de 12 dias até torna-se infetante. Fica depois infetante até morrer.
Modo de infecção: o vírus é introduzido juntamente
com a saliva do mosquito; dissemina-se pelo corpo através do sangue e
instala-se no fígado, baço, rins, medula óssea e gânglios linfáticos.
Controle (profilaxia): vacinação com linhagem de vírus atenuada (vírus vivos). Eliminação do mosquito Aedes, vetor da doença.
7.3. Sarampo
Transmissão: gotículas de saliva. Doença infecciosa
própria da infância, causada por um vírus transmitido por contato com o
doente ou por objetos contaminados. No Brasil, os surtos de sarampo
ocorrem principalmente de agosto a novembro. Ataca principalmente as
crianças entre 6 meses e 6 anos de idade, embora também possa ser
contraída por adultos. A pessoa que já teve sarampo fica imunizada, e a
imunidade é transmitida pela mãe ao bebê até os 4 ou 6 meses de idade,
principalmente se ele receber leite materno. O período de contágio vai
de 5 dias antes até 5 dias depois do aparecimento da erupção
característica. O período de incubação é, em média, de 10 dias, podendo
variar de 9 a 14 dias.
Modo de infecção: o vírus penetra pela mucosa das vias respiratórias, cai na corrente sangüínea e se dissemina por diversas partes do corpo.
Sintomas: Os primeiros sintomas do sarampo
são semelhantes aos de uma gripe: durante 4 ou 5 dias, a criança tem
febre alta, tosse, mal-estar e fica com os olhos vermelhos. O
diagnóstico só é possível ao se encontrar na boca, na altura do segundo
molar, uma série de manchinhas brancas (manchas de Koplik) e manchas
vermelhas irregulares na abóboda palatina e na garganta (exantema).
Depois desses sintomas, as manchas vermelhas (exantemas) surgem atrás
da orelha, espalhando-se em seguida pelo rosto, pescoço, tronco e
membros. Com o aparecimento da erupção costumam se atenuar os sintomas
anteriores, embora persistam a tose e a irritação dos olhos, que ficam
muito sensível à luz. Durante toda a doença, há acentuada queda do
apetite e mal-estar geral. As manchas começam a sumir 5 dias depois da
primeira erupção, na ordem em que aparecem.
Controle (profilaxia): vacinação com vírus vivo de linhagem atenuada.
7.3. Poliomielite
Transmissão: "incerta ". Também conhecida como
paralisia infantil, é uma doença infecciosa provocada por vírus. Ataca
principalmente crianças entre 6 meses e 4 anos de idade. Trata-se de
moléstia grave e altamente contagiosa. As epidemias costumam ocorrer no
verão e no início do outono.
Sintomas: Os primeiros sinais da poliomielite
são os comuns a todas as infecções: prostração, febre e dor de cabeça.
podem aparecer também vômitos, prisão de ventre ou diarréia leve, dores
nas pernas e vermelhidão na garganta. O sintoma característico da
doença, contudo, é a dificuldade da criança de colocar a testa no joelho
ou de dobrar a cabeça a ponto de colocar o queixo no peito.
Modo de infecção: acredita-se que o vírus penetre
pela boca e se multiplique primeiro na garganta e nos intestinos. Daí
dissemina-se pelo corpo, através do sangue. Se atingir células nervosas
ele as destrói, o que causa paralisia e atrofia da musculatura
esquelética, geralmente das pernas.
Controle (profilaxia): Existe um meio absolutamente seguro de livrar as crianças da poliomielite: a vacina Sabin, aplicada
a partir dos 2 meses de idade. Em casos de epidemia, não há razão de
preocupação se a criança já recebeu todas as doses da vacina ou se foi
vacinada nos últimos 2 ou 3 meses. No entanto, se não recebeu todas as
doses ou se recebeu a última dose há mais de 3 meses, deve receber logo
uma dose de reforço. (vacina Salk = injeção) ou com vírus vivo atenuado
(vacina Sabin = gotas).
7.4. Caxumba
Transmissão: gotículas de saliva, contato direto, objetos contaminados (copos, garfos etc).
Sintomas: O período de incubação habitual é de 17 a 21 dias, mais pode variar de 7 a 30 dias.
Antes aparecem os sintomas característicos da enfermidade pode, às vezes, notar-se ligeira febre, inapetência e abatimento.
O que permite diagnosticar a enfermidade, é a inchação e a dor que se
produzem em uma e depois nas duas glândulas parótidas, situadas abaixo e
também um pouco adiante e atrás das orelhas, o que da o aspecto
característico. Ao examinar na face interna da bochecha o ponto em que
desemboca o canal de Stenon, que é o que leva a saliva, da parótida à
boca, observa-se que essa saliência é avermelhada. A quantidade de
saliva , da parótida pode estar diminuída ou aumentada. Às vezes a
inflamação pode atingir outras glândulas salivares tais como
submaxilares e sublinguais.
Modo de infecção: o vírus ataca normalmente as
glândulas salivares parótidas, podendo, entretanto, localizar-se nos
testículos, ovários, pâncreas e cérebro.
Controle (profilaxia): vacinação.
É mito a idéia de que a caxumba é mais perigosa para os meninos do
que para as meninas. Ela realmente pode “descer”, como se diz, porém a
probabilidade é igual para os dois sexos. É raro acontecer, mas ela pode
dar origem a uma inflamação do testículo (orquite) ou dos ovários
(ooforite). “Quando isso ocorre, nos meninos, o testículo dói e pode
aumentar de tamanho; as meninas sentem dor abdominal”, explica Ricardo
Chaves. Essa inflamação, em raríssimas ocasiões e dependendo da
intensidade, pode levar à esterilidade. “É muito incomum, mas quando
isso acontece, só é descoberto quando a pessoa atinge a idade
reprodutiva”, afirma o pediatra.
7.5. Raiva
Transmissão: pela mordedura de animal infectado, geralmente o cão ou morcego.
Modo de infecção: o vírus penetra pelo ferimento da
mordedura juntamente com a saliva do cão. Atinge o sistema nervoso
central, onde se multiplica, causando danos irreparáveis ao sistema
nervoso.
Controle (profilaxia): Tão logo seja mordida ou
lambida por um animal infectado, a criança deve ser vacinada ou receber
soro anti-rábico. Ainda em casa, a mãe pode tentar matar o vírus,
lavando o local da mordida com sabão e álcool - mas em seguida deve
levar ao médico. Vacinação dos cães, eliminação dos cães de rua,
vacinação de pessoas mordidas por cães desconhecidos ou com suspeita de
portar a doença.
7.6. Encefalites Virais
Transmissão: picada de mosquitos e de carrapatos.
Modo de infecção: o vírus é introduzido na corrente sangüínea pela picada do artrópodo portador. Atinge as células do cérebro,onde se reproduz.
Controle (profilaxia): combate aos artrópodos vetores. Não existem vacinas.
7.7. Rubéola
Transmissão: O contágio é feito pela respiração do
ar contaminado por vírus, e se dá de 7 dias antes a 5 dias depois do
aparecimento de manchas vermelhas na pele. O período de incubação da
doença é de 16 a 18 dias.
Modo de infecção: inicia-se com fracas dores de
cabeça, febre baixa, aumento das glândulas do pescoço, ocorrendo, em
seguida, o exantema com manchas vermelhas por todo o corpo. Em geral é
doença benigna da infância. Pode ser muito grave em gestantes nos
primeiros meses.
Sintomas: A forma mais leve de rubéola
provoca erupções avermelhadas na pele, que desaparecem depois de 2 ou 3
dias, sem qualquer outro sintoma. Em outros casos, a erupção é mais
intensa e precedida por febre, mal-estar, aumento dos gânglios
localizados atrás das orelhas e na nuca e eventualmente tosse, sendo
fácil confundir a doença com sarampo.
Controle (profilaxia): A vacina contra rubéola
oferece bom grau de proteção. As meninas devem recebê-la
obrigatoriamente antes da adolescência, para evitar riscos numa futura
gravidez.
7.8. Gripe
Transmissão: Transmitida por contato direto através
do aparelho respiratório e com período de incubação de 36 a 48 horas, a
gripe (ou influenza) é causada por vírus de vários tipos. Muitas vezes
confundido com resfriado (cujo vírus causador é diferente), ela é pouco
freqüente em crianças menores de cinco anos. Os efeitos, diferentes e
mais intensos do que os do resfriado, costumam se manifestar por
períodos que duram de 4 a 10 dias.
Modo de infecção: o vírus ataca os tecidos das porções superiores do aparelho respiratório; raramente atinge os pulmões.
Controle (profilaxia): Não existe remédio eficaz
para a doença, a não ser algumas medidas que evitam complicações maiores
e aliviam alguns dos efeitos. Os antibióticos são inócuos, mas os
antitérmicos podem baixar a febre e os xaropes facilitam a tosse. Convém
manter a criança no leito a fim de que não manifestem conseqüências
como otite, sinusite e pneumonia, entre outras.
7.9. Hepatite Infecciosa
Transmissão: contaminação de água e objetos por
fezes de indivíduos contaminados. "Supõe-se" que moscas transportem o
vírus de fezes contaminadas para alimentos, água e objetos.
Modo de infecção: o vírus se multiplica no fígado, causando destruição de células hepáticas.
Controle (profilaxia): medidas de saneamento;
fiscalização dos manipuladores de alimentos. A injeção de gamaglobulina,
extraída de soro sangüíneo humano, pode conferir proteção temporária.
7.10. Herpes
Transmissão: contato direto com herpéticos na fase de manifestação da doença.
Beijo - É uma forma de contágio fácil, mesmo que a pessoa
não tenha nenhuma ferida aparente, pode ser portadora do vírus, o que é
suficiente para infectar o outro, mas não significa que a doença irá se
manifestar.
Copo - Beber água no mesmo copo de uma pessoa portadora do
vírus também facilita o contágio. A pessoa também pode se contaminar
apenas estando em um ambiente onde há alguém com o vírus.
Sol - A radiação dos raios ultra-violeta (UVA e UVB) agem
bloqueando a ação das células de defesa do organismo e reduzindo a
proteção imunológica. Estresse, fadiga, cigarro, bebida alcólica em
excesso e menstruação também baixam a resistência imunológica
Modo de infecção: o tipo I, mais freqüente,
desenvolve lesões na pele e na boca; o tipo II ou herpes genital é DST.
Nos dois surgem pequenas bolhas, que se ulceram, havendo a seguir a
cicatrização da pele, sem dar sinal da manifestação do vírus. Estes
podem ficar latentes por muito tempo, até voltarem a se manifestar.
Controle (profilaxia): evitar contato direto com
herpéticos em fase de manifestação da doença. Produtos capazes de
abortar a manifestação herpética, quando ingeridos aos primeiros sinais
de uma possível infecção.
7.11. Dengue
Transmissão: picada do Aedes aegypti, durante o dia.
Modo de infecção: forma benigna e forma hemorrágica,
a qual pode levar à morte. Dores de cabeça e nas juntas, fraqueza,
falta de apetite, febre e pele manchada. Nunca se deve tomar
medicamentos que contenham ácido acetilsalicílico.
Controle (profilaxia) Não há, pois seria necessário evitar a picada dos mosquitos
Febre hemorrágica: Em função da inflamação dos vasos
(por causa da instalação dos vírus no tecido que os envolve), há um
consumo exagerado de plaquetas, pequenos soldados que trabalham contra
as doenças. A falta de plaquetas interfere na homeostase do corpo -
capacidade de controlar espontaneamente o fluxo de sangue. O organismo
passa a apresentar uma forte tendência a ter hemorragias. Pode ocorrer:
1 - Se a pessoa tem dengue pela segunda vez (outro tipo de vírus), pode contrair a hemorrágica.
2 - Há quatro sorotipos diferentes de dengue. Um deles, o den2, é o
mais intenso. Este tipo pode evoluir para a dengue hemorrágica.
3 - Combinação da seqüência de doença, da força do vírus e da
suscetibilidade da pessoa. Se for alguém com Aids, por exemplo, a doença
oferece mais riscos.
8. Vírus HIV
8.1. Introdução
A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) foi reconhecida em
meados de 1981, nos EUA, a partir da identificação de um número elevado
de pacientes adultos do sexo masculino, homossexuais e moradores de São
Francisco ou Nova York, que apresentavam sarcoma de Kaposi, pneumonia
por Pneumocystis carinii e comprometimento do sistema imune, o que levou
à conclusão de que se tratava de uma nova doença, ainda não
classificada, de etiologia provavelmente infecciosa e transmissível.
8.2. Vírus HIV - Vírus da Imunodeficiência Humana
Em 1983, o HIV-1 foi isolado de pacientes com AIDS pelos
pesquisadores Luc Montaigner, na França, e Robert Gallo, nos EUA,
recebendo os nomes de LAV (Lymphadenopathy Associated Virus ou Virus
Associado à Linfadenopatia) e HTLV-III (Human T-Lymphotrophic Virus ou
Vírus T-Linfotrópico Humano tipo lll) respectivamente nos dois países.
Em 1986, foi identificado um segundo agente etiológico, também
retrovírus, com características semelhantes ao HIV-1, denominado HIV-2.
Nesse mesmo ano, um comitê internacional recomendou o termo HIV (Human
Immunodeficiency Virus ou Vírus da Imunodeficiência Humana) para
denominá-lo, reconhecendo-o como capaz de infectar seres humanos.
O HIV é um retrovírus com genoma RNA, da família Lentiviridae.
Pertence ao grupo dos retrovírus citopáticos e não-oncogênicos que
necessitam, para multiplicar-se, de uma enzima denominada transcriptase
reversa, responsável pela transcrição do RNA viral para uma cópia DNA,
que pode, então, integrar-se ao genoma do hospedeiro.
Embora não se saiba ao certo qual a origem do HIV-1 e 2 , sabe-se que
uma grande família de retrovírus relacionados a eles está presente em
primatas não-humanos, na África sub-Sahariana. Todos os membros desta
família de retrovírus possuem estrutura genômica semelhante,
apresentando homologia em torno de 50%. Além disso, todos têm a
capacidade de infectar linfócitos através do receptor CD4.
Aparentemente, o HIV-1 e o HIV-2 passaram a infectar o homem há poucas
décadas; alguns trabalhos científicos recentes sugerem que isso tenha
ocorrido entre os anos 40 e 50. Numerosos retrovírus de primatas
não-humanos encontrados na África têm apresentado grande similaridade
com o HIV-1 e com o HIV-2. O vírus da imunodeficiência símia (SIV), que
infecta uma subespécie de chimpanzés africanos, é 98% similar ao HIV-1,
sugerindo que ambos evoluíram de uma origem comum. Por esses fatos,
supõe-se que o HIV tenha origem africana. Ademais, diversos estudos
sorológicos realizados na África, utilizando amostras de soro
armazenadas desde as décadas de 50 e 60, reforçam essa hipótese.
O HIV é bastante lábil no meio externo, sendo inativado por uma
variedade de agentes físicos (calor) e químicos (hipoclorito de sódio,
glutaraldeído). Em condições experimentais controladas, as partículas
virais intracelulares parecem sobreviver no meio externo por até, no
máximo, um dia, enquanto que partículas virais livres podem sobreviver
por 15 dias, à temperatura ambiente, ou até 11 dias, a 37ºC.
Recentemente, têm sido descritas, ainda, variantes genômicas
(subtipos), tanto de HIV-1 quanto de HIV-2, em pacientes infectados
procedentes de diferentes regiões geográficas. Classificam-se, assim, os
isolados de HIV-1 em dois grupos, M (major) e O (outlier), com
variabilidade genética de até 30%. No grupo M, identificam-se nove
subtipos (A, B, C, D, E, F, G, H e I), e no grupo O, apenas um. Em
relação ao HIV-2 descrevem-se cinco subtipos: A, B, C, D, e E. Embora
ainda não conhecida, especula-se a possibilidade de variantes virais
possuírem diferentes índices de transmissibilidade e/ou patogenicidade.
Há dois tipos de HIV: HIV-1, que mostrou ser a causa principal da AIDS, e HIV-2, que também pode causar a doença.
O vírus HIV é um retrovírus envelopado, possui duas moléculas de RNA,
que estão dispostas no interior do capsídeo. Esse conjunto é envolto
por mais uma camada protéica, formando uma estrutura denominada core.
Envolvendo o core, existe o envelope, composto por uma camada dupla de
fosfolipídios, na qual estão imersas várias moléculas protéicas
específicas desse vírus. Na face interna da camada de lipídios,
prendem-se várias outras moléculas protéicas.
No interior do vírus, existem moléculas da enzima transcriptase
reversa, que permitem ao vírus fazer uma molécula de DNA a partir da
molécula de RNA viral (a transcriptase reversa ocorre não só no vírus da
AIDS, mas em todos os demais membros da família Retroviridae).
Esquema do vírus HIV
Ciclo vital do HIV na célula humana.
ligação de glicoproteínas virais (gp120) ao receptor específico da
superfície celular (principalmente linfócitos T-CD4); fusão do envelope
do vírus com a membrana da célula hospedeira; liberação do "core" do
vírus para o citoplasma da célula hospedeira; transcrição do RNA viral
em DNA complementar, dependente da enzima transcriptase reversa;
transporte do DNA complementar para o núcleo da célula, onde pode haver
integração no genoma celular (provírus), dependente da enzima integrase,
ou a permanência em forma circular, isoladamente; o provírus é
reativado, e produz RNA mensageiro viral, indo para o citoplasma da
célula; proteínas virais são produzidas e quebradas em subunidades, por
intermédio da enzima protease; as proteínas virais produzidas regulam a
síntese de novos genomas virais, e formam a estrutura externa de outros
vírus que serão liberados pela célula hospedeira; e o vírion
recém-formado é liberado para o meio circundante da célula hospedeira,
podendo permanecer no fluído extracelular, ou infectar novas células.
A interferência em qualquer um destes passos do ciclo vital do vírus
impediria a multiplicação e/ou a liberação de novos vírus. Atualmente
estão disponíveis comercialmente drogas que interferem em duas fases
deste ciclo: a fase 4 (inibidores da transcriptase reversa) e a fase 7
(inibidores da protease).
8.3. Células infectadas pelo o vírus HIV
O primeiro estágio de qualquer infecção viral é a adsorção do vírus a receptores da membrana plasmática da célula susceptível.
Sabe-se que a afinidade com as células hospedeiras depende das
proteínas virais. Estas têm afinidade somente com determinadas proteínas
presentes na membrana plasmática das células-alvo. No caso do vírus da
AIDS, as moléculas protéicas de seu envelope têm grande afinidade com
uma proteína denominada CD-4, presente na membrana plasmática de algumas
células do corpo humano. Essas células são, principalmente, os
linfócitos T e os macrófagos.
Um indivíduo com AIDS tem redução no número de linfócitos T, pois o
HIV os destrói, causando uma queda bastante acentuada de sua imunidade,
ficando o indivíduo suscetível a diversas infecções oportunistas. Já os
macrófagos atuam como reservatórios desse vírus, disseminando este vírus
pela corrente sangüínea para diferentes órgãos do corpo, como o cérebro
e os pulmões.
Recentemente, verificou-se que não são apenas essas as células que
contêm a proteína CD-4 na membrana plasmática, e, portanto, são
passíveis de infecção pelo HIV. A proteína CD-4 ocorre também nos
monócitos do sangue, nos linfócitos B, em alguns tipos celulares dos
nódulos linfáticos, no timo, pele, encéfalo, medula óssea vermelha e
intestinos. Os linfócitos presentes no sêmen e no fluido vaginal também
podem ser infectados pelo HIV.
Esquema do vírus HIV atacando um linfócito T e, posteriormente, saindo do linfócito.
8.4. Formas de transmissão
As principais formas de transmissão do HIV são: sexual; sangüínea (em
receptores de sangue ou hemoderivados e em usuários de drogas
injetáveis, ou UDI); e vertical (da mãe para o filho, durante a
gestação, parto ou por aleitamento). Além dessas formas, mais
freqüentes, também pode ocorrer a transmissão ocupacional, ocasionada
por acidente de trabalho, em profissionais da área da saúde que sofrem
ferimentos com instrumentos pérfuro-cortantes contaminados com sangue de
pacientes infectados pelo HIV.
8.4.1. Sexual
A principal forma de exposição em todo o mundo é a sexual, sendo que a
transmissão heterossexual, nas relações sem o uso de preservativo é
considerada pela OMS como a mais freqüente. Na África sub-Sahariana, é a
principal forma de transmissão. Nos países desenvolvidos, a exposição
ao HIV por relações homossexuais ainda é a responsável pelo maior número
de casos, embora as relações heterossexuais estejam aumentando
proporcionalmente como uma tendência na dinâmica da epidemia.
Os fatores que aumentam o risco de transmissão do HIV em uma relação
heterossexual são: alta viremia, imunodeficiência avançada, relação anal
receptiva, relação sexual durante a menstruação e presença de outra
DST, principalmente as ulcerativas. Sabe-se hoje que as úlceras
resultantes de infecções sexualmente transmissíveis como cancro mole,
sífilis e herpes genital, aumentam muito o risco de transmissão do HIV.
8.4.2. Sangüínea
A transmissão sangüínea associada ao uso de drogas injetáveis é um
meio muito eficaz de transmissão do HIV, devido ao uso compartilhado de
seringas e agulhas. Essa via de transmissão adquire importância
crescente em várias partes do mundo, como na Ásia, América Latina e no
Caribe.
A transmissão mediante transfusão de sangue e derivados é cada vez
menos relevante nos países industrializados e naqueles que adotaram
medidas de controle da qualidade do sangue utilizado, como é o caso do
Brasil.
8.4.3. Vertical
A transmissão vertical, decorrente da exposição da criança durante a
gestação, parto ou aleitamento materno, vem aumentando devido à maior
transmissão heterossexual. Na África, são encontradas as maiores taxas
desta forma de infecção pelo HIV, da ordem de 30 a 40%; entretanto, em
outras partes do mundo, como na América do Norte e Europa, situam-se em
torno de 15 a 29%. Os principais motivos dessa diferença devem-se ao
fato de que, na África, a transmissão heterossexual é mais intensa, e
que neste continente, o aleitamento materno é muito mais freqüente do
que nos países industrializados.
A transmissão intra-uterina é possível em qualquer fase da gravidez;
porém é menos freqüente no primeiro trimestre. As infecções ocorridas
nesse período não têm sido associadas a malformações fetais. O risco de
transmissão do HIV da mãe para o filho pode ser reduzido em até 67% com o
uso de AZT durante a gravidez e no momento do parto, associado à
administração da mesma droga ao recém-nascido por seis semanas.
Um estudo realizado nos Estados Unidos (Aids Clinical Trial Group 076
ou ACTG-076) demonstrou redução na transmissão vertical de 25,6% para
8,3% com o uso de AZT durante a gravidez. A transmissão pelo leite
materno é evitada com o uso de leite artificial ou de leite humano
processado em bancos de leite, que fazem aconselhamento e triagem das
doadoras.
8.4.4. Ocupacional
A transmissão ocupacional ocorre quando profissionais da área da
saúde sofrem ferimentos com instrumentos pérfuro-cortantes contaminados
com sangue de pacientes portadores do HIV. Estima-se que o risco médio
de contrair o HIV após uma exposição percutânea a sangue contaminado
seja de aproximadamente 0,3%. Nos caso de exposição de mucosas, esse
risco é de aproximadamente 0,1%. Os fatores de risco já identificados
como favorecedores deste tipo de contaminação são: a profundidade e
extensão do ferimento a presença de sangue visível no instrumento que
produziu o ferimento, o procedimento que resultou na exposição e que
envolveu a colocação da agulha diretamente na veia ou artéria de
paciente portador de HIV e, finalmente, o paciente fonte da infecção
mostrar evidências de imunodeficiência avançada, ser terminal ou
apresentar carga viral elevada.
8.4.5. Outras possíveis formas de transmissão
Embora o vírus tenha sido isolado de vários fluidos corporais, como
saliva, urina, lágrimas, somente o contato com sangue, sêmen, secreções
genitais e leite materno têm sido implicados como fontes de infecção.
O risco da transmissão do HIV por saliva foi avaliado em vários
estudos laboratoriais e epidemiológicos. Esses estudos demonstraram que a
concentração e a infectividade dos vírus da saliva de indivíduos
portadores do HIV é extremamente baixa.
Até o momento, não foi possível evidenciar, com segurança, nenhum
caso de infecção por HIV adquirido por qualquer das seguintes vias
teóricas de transmissão: contato interpessoal não-sexual e
não-percutâneo (contato casual), vetores artrópodes (picadas de
insetos), fontes ambientais (aerossóis, por exemplo) e objetos
inanimados (fômites), além de instalações sanitárias. Há raros relatos
anedóticos de hipotética transmissão horizontal do HIV; porém, estes não
resistem a uma análise mais cuidadosa, e as evidências são
insuficientes para caracterizar formas não-tradicionais de transmissão.
Dados laboratoriais e epidemiológicos não provêm qualquer suporte à
possibilidade teórica de transmissão por artrópodes atuando como vetores
biológicos ou mecânicos. Não foi possível evidenciar qualquer
multiplicação do HIV em artrópodes após inoculação intra-abdominal,
intratorácica ou após repasto de sangue infectado. Outros estudos
demonstraram ausência de replicação do HIV em linhagens celulares
derivadas de artrópodes. Estudos epidemiológicos nos Estados Unidos,
Haiti e África Central não demonstraram qualquer evidência de
transmissão por vetores.
Conclui-se que formas alternativas de transmissão são altamente
improváveis, e que a experiência cumulativa é suficientemente ampla para
se assegurar enfaticamente que não há qualquer justificativa para
restringir a participação de indivíduos infectados nos seus ambientes
domésticos, escolares, sociais ou profissionais.
8.5. Prevenção e controle
As principais estratégias de prevenção empregadas pelos programas de
controle envolvem: a promoção do uso de preservativos, a promoção do uso
de agulhas e seringas esterilizadas ou descartáveis, o controle do
sangue e derivados, a adoção de cuidados na exposição ocupacional a
material biológico e o manejo adequado das outras DST.
8.5.1. Preservativos
Os preservativos masculinos e femininos são a única barreira
comprovadamente efetiva contra o HIV, e o uso correto e consistente
deste método pode reduzir substancialmente o risco de transmissão do HIV
e das outras DST.
O uso regular de preservativos pode levar ao aperfeiçoamento na sua
técnica de utilização, reduzindo a freqüência de ruptura e escape e,
consequentemente, aumentando sua eficácia. Estudos recentes demonstraram
que o uso correto e sistemático do preservativo masculino reduz o risco
de aquisição do HIV e outras DST em até 95%.
8.5.2. Espermicidas
Os produtos espermicidas à base de nonoxinol-9 são capazes de
inativar o HIV e agentes de outras DST "in vitro", e poderiam ter um
papel importante na redução da transmissão sexual do HIV, se usados em
associação com os preservativos. Estudos recentes sugerem que a
concentração de nonoxinol-9, normalmente preconizada nos preservativos,
seria insuficiente para inativar o HIV, sendo que o uso de concentrações
mais elevadas poderiam apresentar toxicidade. Entretanto, a segurança e
eficácia dos espermicidas atualmente disponíveis, nas condições de uso
corrente, não estão bem estabelecidas, e mais estudos clínicos
controlados são necessários para esta determinação.
8.5.3. Prevenção em usuários de drogas injetáveis (UDI)
Desde 1986, ficou claro que os UDI representavam um grupo focal
particularmente importante, devido ao risco específico de ocorrência de
epidemias de HIV nesta população, e ao potencial de representarem a
interface através da qual a infecção por HIV se difundiria para a
população heterossexual não usuária de drogas e consequentemente para as
crianças.
A disseminação da infecção pelo HIV entre UDI em muitos países com
características diferentes, levantou importantes questões sobre a
natureza do comportamento dos dependentes, e da possibilidade de
modificá-lo mediante intervenções preventivas, de modo a reduzir a
transmissão do HIV.
Houve ceticismo inicial acerca da eficácia de ações educativas nessa
população. O temor de que a estratégia de redução de danos, baseadas na
facilitação do acesso a equipamento estéril de injeções pudesse levar ao
aumento da população de usuários de drogas injetáveis, não se
concretizou.
Há atualmente evidências suficientes para concluir que foi possível
reduzir o nível epidêmico da transmissão do HIV em locais onde programas
inovadores de saúde pública foram iniciados precocemente.
Os elementos desses programas de prevenção incluem orientação
educativa, disponibilidade de testes sorológicos, facilitação de acesso
aos serviços de tratamento da dependência de drogas, acesso a
equipamento estéril de injeção, além de ações que se desenvolvem na
comunidade de usuários de drogas a partir da intervenção de
profissionais de saúde e/ou agente comunitários, recrutados na própria
comunidade.
Em relação às mudanças comportamentais, demonstrou-se que os UDI
podem ser sensíveis às ações preventivas e capazes de reduzir a
freqüência das situações de risco. Porém, se todos os estudos demonstram
redução de risco, evidenciam, infelizmente, a persistência de níveis
importantes do comportamento de risco, mesmo nas cidades onde se obteve
razoável impacto com as ações preventivas.
8.5.4. Exposição ocupacional
Embora alguns tipos de exposição acidental, como o contato de sangue
ou secreções com mucosas ou pele íntegra teoricamente possam ser
responsáveis por infecção pelo HIV, os seus riscos são insignificantes
quando comparados com a exposição percutânea, através de instrumentos
pérfuro-cortantes. Fatores como prevalência da infecção pelo HIV na
população de pacientes, grau de experiência dos profissionais de saúde
no cuidado desse tipo de paciente, uso de precauções universais (luvas,
óculos de proteção, máscaras, aventais, etc.), bem como a freqüência de
utilização de procedimentos invasivos, podem também influir no risco de
transmissão do HIV.
O meio mais eficiente para reduzir tanto a transmissão
profissional-paciente quanto a paciente-profissional, baseia-se na
utilização sistemática das normas de biossegurança, na determinação dos
fatores de risco associados, e na sua eliminação, bem como na
implantação de novas tecnologias da instrumentação usadas na rotina de
procedimentos invasivos.
8.6. Testes diagnósticos
Os testes para detecção da infecção pelo HIV podem ser divididos basicamente em quatro grupos:
- detecção de anticorpos;
- detecção de antígenos;
- cultura viral;
- amplificação do genoma do vírus.
As técnicas rotineiramente utilizadas para o diagnóstico da infecção
pelo HIV são baseadas na detecção de anticorpos contra o vírus. Estas
técnicas apresentam excelentes resultados e são menos dispendiosas,
sendo de escolha para toda e qualquer triagem inicial. Porém detectam a
resposta do hospedeiro contra o vírus, e não o próprio vírus
diretamente. As outras três técnicas detectam diretamente o vírus ou
suas partículas. São menos utilizadas rotineiramente, sendo aplicadas em
situações específicas, tais como: exames sorológicos indeterminados ou
duvidosos, acompanhamento laboratorial de pacientes, mensuração da carga
viral para controle de tratamento, etc. A seguir, cada técnica será
explicada separadamente.
8.6.1. Testes de detecção de anticorpos
ELISA (teste imunoenzimático): este teste utiliza
antígenos virais (proteínas) produzidos em cultura celular (testes de
primeira geração) ou através de tecnologia molecular recombinante. Os
antígenos virais são adsorvidos por cavidades existentes em placas de
plástico e, a seguir, adiciona-se o soro do paciente. Se o soro possuir
anticorpos específicos, estes serão fixados sobre os antígenos. Tal
fenômeno pode ser verificado com a adição de uma antiimunoglobulina
humana conjugada a uma enzima como, por exemplo, a peroxidase. Em caso
positivo ocorre uma reação corada ao se adicionar o substrato específico
da enzima. Esta técnica é amplamente utilizada como teste inicial para
detecção de anticorpos contra o vírus, devido à sua facilidade de
automação e custo relativamente baixo. Apresenta atualmente altas
sensibilidade e especificidade.
Western-blot: este ensaio envolve inicialmente a
separação das proteínas virais por eletroforese em gel de
poliacrilamida, seguida da transferência eletroforética dos antígenos
para uma membrana de nitrocelulose. Em um terceiro momento, a membrana é
bloqueada com proteínas que são adsorvidas por sítios não ocupados
pelos antígenos. Posteriormente a membrana é colocada em contato com o
soro que se deseja pesquisar. As reações antígeno-anticorpo são
detectadas por meio da reação com antiimunoglobulina humana, conjugada
com um radioisótopo ou uma enzima. A revelação é feita por
auto-radiografia ou por substrato cromogênico. Geralmente este teste é
utilizado para confirmação do resultado reagente ao teste ELISA (ou
seja, teste confirmatório da infecção), devido à sua alta complexidade e
custo. Tem alta especificidade e sensibilidade.
Imunofluorescência indireta: fixadas em lâminas de
microscópio, as células infectadas (portadoras de antígenos) são
incubadas com o soro que se deseja testar. Depois, são tratadas com
outro soro que contenha anticorpos específicos para imunoglobulina
humana (anti-lg) conjugados a um fluorocromo. A presença dos anticorpos é
revelada por meio de microscopia de fluorescência. Também é utilizada
como teste confirmatório.
Radioimunoprecipitação: a detecção dos anticorpos
decorre de reações com antígenos radioativos. Estes antígenos são
obtidos de células infectadas, mantidas na presença de radioisótopos
durante a síntese de proteínas virais. Precipitados formados da reação
desses antígenos com anticorpos específicos são sedimentados,
dissociados com detergente, e depois, analisados por eletroforese em gel
de poliacrilamida. Segue-se a auto-radiografia. É uma técnica menos
conhecida, mas que pode ser utilizada para confirmação de diagnóstico.
Outros testes para detecção de anticorpos: um grande número de testes
rápidos para estudos de campo, triagens de grandes populações e para
decisões terapêuticas em situações de emergência vêm sendo
desenvolvidos, geralmente baseados em técnicas de aglutinação em látex e
hemaglutinação.
8.6.2. Testes de detecção de antígeno VIRAL
Pesquisa de Antígeno p24: este teste quantifica a
concentração da proteína viral p24 presente no plasma ou no sobrenadante
de cultura de tecido. Embora esta proteína esteja presente no plasma de
pacientes em todos os estágios da infecção pelo HIV, sua maior
prevalência ocorre antes da soroconversão e nas fases mais avançadas da
doença; o teste é realizado mediante a utilização da técnica de ELISA
(imunoenzimático).
8.6.3. Técnicas de cultura viral
Cultura de células mononucleares de sangue periférico para isolamento do HIV:
esta técnica foi inicialmente utilizada para caracterizar o HIV como
agente causador da aids. As culturas são observadas quanto à evidência
de formação sincicial (células gigantes multinucleadas), presença de
atividade da transcriptase reversa e produção de antígeno p24 em
sobrenadantes. São consideradas positivas quando dois testes
consecutivos detectam a presença dos achados acima descritos em valores
superiores ao limite de corte (cut-off).
Cultura quantitativa de células: é uma técnica que
mede a carga viral intracelular, mediante a diluição seriada decrescente
de uma população de 106 células do paciente infectado. Considera-se
como positiva a menor diluição capaz de isolar alguma célula infectada.
Cultura quantitativa de plasma: técnica semelhante à
anterior, porém utilizando alíquotas decrescentes de plasma.
Considera-se como positiva a menor diluição capaz de infectar células
mononucleares.
8.6.4. Testes de amplificação do genoma do vírus
Análise quantitativa direta da carga viral através de técnicas
baseadas na amplificação de ácidos nucleicos, tais como a reação de
polimerase em cadeia (PCR) quantitativa, amplificação de DNA em cadeia
ramificada (branched-chain DNA ou bDNA) e amplificação seqüencial de
ácidos nucleicos (nucleic acid sequence-based amplification ou NASBA).
Embora as técnicas sejam diferentes, o PCR quantitativo e o NASBA
apresentam alta sensibilidade, permitindo o acompanhamento da resposta
terapêutica antiretroviral. Além disso, valores elevados de partículas
virais detectados ao PCR quantitativo ou NASBA parecem estar
relacionados com um maior risco de progressão da doença, independente da
contagem de células TCD4+. Sugere-se sua monitorização a cada 3-4
meses. Em caso de início ou mudança de terapia antiretroviral, alguns
autores recomendam uma dosagem da carga viral com 1 a 2 meses de
tratamento, para avaliação da resposta ao esquema. Os resultados devem
ser interpretados da seguinte maneira:
Carga viral abaixo de 10.000 cópias de RNA por ml: baixo risco de progressão ou de piora da doença.
Carga viral entre 10.000 e 100.000 cópias de RNA por ml: risco
moderado de progressão ou de piora da doença.Carga viral acima de
100.000 cópias de RNA por ml: alto risco de progressão ou de piora da
doença.
8.6.5. Contagem de células CD4+ em sangue periférico
A contagem de células T CD4+ em sangue periférico tem implicações
prognósticas na evolução da infecção pelo HIV pois é a medida de
imunocompetência celular; é mais útil no acompanhamento de pacientes
infectados pelo HIV. De maneira didática pode-se dividir a contagem de
células T CD4+ em sangue periférico em quatro faixas:
- maior que 500 células/mm3: estágio da infecção pelo HIV com baixo risco de doença. Há boa resposta às imunizações de rotina e boa confiabilidade nos testes cutâneos de hipersensibilidade tardia, como o PPD. Casos de infecção aguda podem apresentar estes níveis de células T CD4+, embora, de modo geral, esses pacientes tenham níveis mais baixos.
- entre 200 e 500 células/mm3: estágio caracterizado por surgimento de sinais e sintomas menores ou alterações constitucionais. Risco moderado de desenvolvimento de doenças oportunistas. Nesta fase, podem aparecer candidíase oral, herpes simples recorrente, herpes zoster, tuberculose, leucoplasia pilosa, pneumonia bacteriana.
- entre 50 e 200 células/mm3: estágio com alta probabilidade de surgimento de doenças oportunistas como pneumocistose, toxoplasmose de SNC, neurocriptococose, histoplasmose, citomegalovirose localizada. Está associado à síndrome consumptiva, leucoencefalopatia multifocal progressiva, candidíase esofagiana, etc.
- menor que 50 células/mm3: estágio com grave comprometimento de resposta imunitária. Alto risco de surgimento de doenças oportunistas como citomegalovirose disseminada, sarcoma de Kaposi, linfoma não-Hodgkin e infecção por micobactérias atípicas. Alto risco de vida com baixa sobrevida. Observações Estes valores levam em conta apenas a avaliação quantitativa. Alterações qualitativas na função dos linfócitos podem permitir o surgimento de condições oportunistas em pacientes com níveis diferentes de células T CD4+. Em crianças, a contagem de células T CD4+ tem níveis diferentes de interpretação. Quando não há disponibilidade de quantificação da carga viral, pode-se basear na contagem de células T CD4+ para iniciar ou alterar terapêutica anti-retroviral.
Soroconversão: é a positivação da sorologia para o
HIV. A soroconversão é acompanhada de uma queda expressiva na quantidade
de vírus no plasma (carga viral), seguida pela recuperação parcial dos
linfócitos T CD4+ no sangue periférico. Esta recuperação é devida tanto à
resposta imune celular quanto à humoral. Nesta fase observa-se o
seqüestro das partículas virais e das células infectadas (linfócitos
T-CD4+) pelos órgãos linfóides responsáveis por nossa imunidade,
particularmente os linfonodos.
Janela imunológica: é o tempo compreendido entre a
aquisição da infecção e a soroconversão (também chamada de janela
biológica). O tempo decorrido para a sorologia anti-HIV tornar-se
positiva é de seis a 12 semanas após a aquisição do vírus, com o período
médio de aproximadamente 2,1 meses. Os testes utilizados apresentam
geralmente níveis de até 95% de soroconversão nos primeiros 5,8 meses
após a transmissão.
8.7. Aspectos clínicos
A infecção pelo HIV pode ser dividida em quatro fases clínicas:
- infecção aguda;
- fase assintomática, também conhecida como latência clínica;
- fase sintomática inicial ou precoce;
- aids.
8.7.1. Infecção aguda
A infecção aguda, também chamada de síndrome da infecção retroviral
aguda ou infecção primária, ocorre em cerca de 50% a 90% dos pacientes.
Seu diagnóstico é pouco realizado devido ao baixo índice de suspeição,
sendo, em sua maioria, retrospectivo. O tempo entre a exposição e os
sintomas é de cinco a 30 dias. A história natural da infecção aguda
caracteriza-se tanto por viremia elevada, como por resposta imune
intensa. Durante o pico de viremia, ocorre diminuição rápida dos
linfócitos T CD4+, que posteriormente aumentam, mas geralmente não
retornam aos níveis prévios à infecção.
Observa-se, também, aumento do número absoluto de linfócitos T CD8+
circulantes, com a inversão da relação CD4+/CD8+, que se torna menor que
um. Este aumento de células T CD8+, provavelmente, reflete uma resposta
T citotóxica potente, que é detectada antes do aparecimento de
anticorpos neutralizantes. Existem evidências de que a imunidade celular
desempenha papel fundamental no controle da viremia na infecção
primária.
Os sintomas aparecem durante o pico da viremia e da atividade
imunológica. As manifestações clínicas podem variar, desde quadro gripal
até uma síndrome mononucleose-like. Além de sintomas de infecção viral,
como febre, adenopatia, faringite, mialgia, artralgia, rash cutâneo
maculopapular eritematoso, ulcerações muco-cutâneas envolvendo mucosa
oral, esôfago e genitália, hiporexia, adinamia, cefaléia, fotofobia,
hepatoesplenomegalia, perda de peso, náuseas e vômitos; os pacientes
podem apresentar candidíase oral, neuropatia periférica,
meningoencefalite asséptica e síndrome de Guillain-Barré. Os achados
laboratoriais inespecíficos são transitórios, e incluem: linfopenia
seguida de linfocitose, presença de linfócitos atípicos, plaquetopenia e
elevação sérica das enzimas hepáticas. Os sintomas duram, em média, 14
dias, sendo o quadro clínico autolimitado. A ocorrência da síndrome de
infecção retroviral aguda clinicamente importante ou a persistência dos
sintomas por mais de 14 dias parecem estar relacionadas com a evolução
mais rápida para aids. O quadro abaixo mostra os sinais e sintomas
freqüentemente associados à sindrome viral aguda causada pelo HIV.
Principais sinais e sintomas associados a infecção aguda pelo HIV
Sinais e Sintomas
|
Freqüência (%)
|
Febre |
80-90
|
Fadiga |
70-90
|
Exantema |
40-80
|
Cefaléia |
32-70
|
Linfadenopatia |
40-70
|
Faringite |
50-70
|
Mialgia e/ou Artalgia |
50-70
|
Nausea, Vômito e/ou Diarréia |
30-60
|
Suores Noturnos |
50
|
Meningite Asséptica |
24
|
Úlceras Orais |
10-20
|
Úlceras Genitais |
5-15
|
Trombocitopenia |
45
|
Linfopenia |
40
|
Elevação dos níveis séricos de enzimas hepáticas |
21
|
Adaptado de Kahn et al, 1998
Após a resolução da fase aguda, ocorre a estabilização da viremia em
níveis variáveis (set points), definidos pela velocidade da replicação e
clareamento viral. O set point é fator prognóstico de evolução da
doença. A queda da contagem de linfócitos T CD4+, de 30 a 90 células por
ano, está diretamente relacionada à velocidade da replicação viral e
progressão para a aids.
8.7.2. Fase assintomática
Na infecção precoce pelo HIV, também conhecida como fase
assintomática, o estado clínico básico é mínimo ou inexistente. Alguns
pacientes podem apresentar uma linfoadenopatia generalizada persistente,
"flutuante" e indolor. Portanto, a abordagem clínica nestes indivíduos
no início de seu seguimento prende-se a uma história clínica prévia,
investigando condições de base como hipertensão arterial sistêmica,
diabetes, DPOC, doenças hepáticas, renais, pulmonares, intestinais,
doenças sexualmente transmissíveis, tuberculose e outras doenças
endêmicas, doenças psiquiátricas, uso prévio ou atual de medicamentos,
enfim, situações que podem complicar ou serem agravantes em alguma fase
de desenvolvimento da doença pelo HIV. A história familiar, hábitos de
vida, como também uma avaliação do perfil emocional e psicossocial do
paciente, seu nível de entendimento e orientação sobre a doença são
extremamente importantes. No que diz respeito à avaliação laboratorial
nesta fase, uma ampla variedade de alterações podem estar presentes. Os
exames laboratoriais de rotina recomendados são:
- Hemograma completo: para avaliação de anemia, leucopenia, linfopenia e plaquetopenia.Níveis bioquímicos: para uma visão das condições clínicas gerais, em particular para conhecimento dos níveis bioquímicos iniciais dos pacientes, principalmente funções hepática e renal, desidrogenase lática, amilase.
- Sorologia para sífilis: em função do aumento da incidência de co-infecção, visto que a infecção pelo HIV pode acelerar a história natural da sífilis. Recomenda-se o VDRL e se positivo o exame confirmatório FTA-ABS. Pacientes HIV+ com evidências sorológicas de sífilis não tratada devem ser submetidos a punção lombar e avaliação para neurolues.
- Sorologia para os vírus da hepatite: devido a alta incidência de co-infecção com hepatites B e C nos grupos de homossexuais, bissexuais, heterossexuais com múltiplos parceiros e usuários de drogas injetáveis. O screening recomendado para hepatite B é antígeno de superfície (HBS Ag) e o anticorpo anticore do vírus B (anti-HBc); para a hepatite C: anticorpo contra o vírus da hepatite C (Anti-HCV).
- Sorologia para toxoplasmose (lgG): em decorrência da maioria dos pacientes apresentar exposição prévia ao Toxoplasma gondii, sendo indicada a profilaxia em momento oportuno, conforme faixa de células T CD4+ do paciente. Os métodos preferenciais são: hemoaglutinação, imunofluorescência ou ELISA.
- Sorologia para citomegalovírus (CMV) e herpes: embora questionada, indica-se para detecção de infecção latente. Pacientes com sorologia negativa para citomegalovírus devem evitar exposição a hemoderivados de doadores com sorologia positiva, em caso de necessidade de transfusões sangüíneas.
- Radiografia de tórax: recomenda-se na avaliação inicial como parâmetro basal para possíveis alterações evolutivas no futuro ou em pacientes com história de doença pulmonar freqüente. PPD (derivado protéico purificado): teste recomendado de rotina anual para avaliação da necessidade de quimioprofilaxia para tuberculose. Em paciente com infecção pelo HIV, considera-se uma enduração > 5mm como uma reação forte e indicativa da necessidade de quimioprofilaxia.
- Papanicolaou: recomendado na avaliação ginecológica inicial, seis meses após e, se resultados normais, uma vez a cada ano. Sua indicação é de fundamental importância, devido a alta incidência de displasia cervical e rápida progressão para o câncer cervical em jovens HIV positivas.
- Perfil imunológico e carga viral: é, sem dúvida, um dos procedimentos mais importantes na avaliação do paciente com infecção precoce pelo HIV, pois é a partir dela, através da interpretação dos vários testes atualmente disponíveis, que se pode ter parâmetros do real estadiamento da infecção, prognóstico, decisão quanto ao início da terapia anti-retroviral e avaliação da resposta ao tratamento, bem como o uso de profilaxia para as infecções oportunistas mais comuns na ocasião propícia. Recomenda-se a realização periódica de sub-tipagem de células T CD4+ e avaliação quantitativa da carga viral para HIV a cada 3-4 meses.
8.7.3. Fase sintomática inicial
- Sudorese noturna: é queixa bastante comum e tipicamente inespecífica entre os pacientes com infecção sintomática inicial pelo HIV. Pode ser recorrente e pode ou não vir acompanhada de febre. Nessa situação deve ser considerada a possibilidade de infecção oportunista, particularmente tuberculoses, lançando-se mão de investigação clínica e laboratorial específicas.
- Fadiga: também é freqüente manifestação da infecção sintomática inicial pelo HIV e pode ser referida como mais intensa no final de tarde e após atividade física excessiva. Fadiga progressiva e debilitante deve alertar para a presença de infecção oportunista, devendo ser sempre pesquisada.
- Emagrecimento: é um dos mais comuns entre os sintomas gerais associados com infecção pelo HIV, sendo referido em 95-100% dos pacientes com doença em progressão. Geralmente encontra-se associado a outras condições como anorexia. A associação com diarréia aquosa o faz mais intenso.
- Diarréia: consiste em manifestação freqüente da infecção pelo HIV desde sua fase inicial. Determinar a causa da diarréia pode ser difícil e o exame das fezes para agentes específicos se faz necessário.
- Na infecção precoce pelo HIV, patógenos entéricos mais comuns devem ser suspeitados: Salmonella sp, Shigella sp, Campylobacter sp, Giardia lamblia, Entamoeba histolytica, adenovírus, rotavírus. Agentes como Cryptosporidium parvum e Isospora belli, geralmente reconhecidos em fase mais avançada da doença causada pelo HIV, podem apresentar-se como expressão clínica autolimitada, principalmente com a elevação da contagem de células T CD4+ obtida com o iníco do tratamento anti-retroviral. Quando a identificação torna-se difícil ou falha, provas terapêuticas empíricas podem ser lançadas, baseando-se nas características epidemiológicas e clínicas do quadro.
- Sinusopatias: sinusites e outras sinusopatias ocorrem com relativa freqüência entre os pacientes com infecção pelo HIV. A forma aguda é mais comum no estágio inicial da doença pelo HIV, incluindo os mesmos agentes considerados em pacientes imunocompetentes: Streptococus pneumoniae, Moraxella catarrhalis e H. influenzae. Outros agentes como S. aureus e P. aeruginosa e fungos têm sido achados em sinusite aguda, porém seu comprometimento em sinusites crônicas é maior. Febre, cefaléia, sintomas locais, drenagem mucopurulenta nasal fazem parte do quadro.
- Candidíase Oral e Vaginal (inclusive a recorrente): a candidíase oral é a mais comum infecção fúngica em pacientes portadores do HIV e apresenta-se com sintomas e aparência macroscópica característicos. A forma pseudomembranosa consiste em placas esbranquiçadas removíveis em língua e mucosas que podem ser pequenas ou amplas e disseminadas. Já a forma eritematosa é vista como placas avermelhadas em mucosa, palato mole e duro ou superfície dorsal da língua. A queilite angular, também freqüente, produz eritema e fissuras nos ângulos da boca. Mulheres HIV+ podem apresentar formas extensas ou recorrentes de candidíase vulvo-vaginal, com ou sem acometimento oral, como manifestação precoce de imunodeficiência pelo HIV, bem como nas fases mais avançadas da doença. As espécies patogênicas incluem Candida albicans, C. tropicalis, C. parapsilosis e outras menos comumente isoladas.
- Leucoplasia Pilosa Oral: é um espessamento epitelial benigno causado provavelmente pelo vírus Epstein-Barr, que clinicamente apresenta-se como lesões brancas que variam em tamanho e aparência, podendo ser planas ou em forma de pregas, vilosidades ou projeções. Ocorre mais freqüentemente em margens laterais da língua, mas podem ocupar localizações da mucosa oral: mucosa bucal, palato mole e duro.
- Gengivite: a gengivite e outras doenças periodontais pode manifestar-se de forma leve ou agressiva em pacientes com infecção pelo HIV, sendo a evolução rapidamente progressiva, observada em estágios mais avançados da doença, levando a um processo necrotizante acompanhado de dor, perda de tecidos moles periodontais, exposição e seqüestro ósseo.
- Úlceras Aftosas: em indivíduos infectados pelo HIV é comum a presença de úlceras consideravelmente extensas, resultantes da coalescência de pequenas úlceras em cavidade oral e faringe, de caráter recorrente e etiologia não definida. Resultam em grande incômodo produzindo odinofagia, anorexia e debilitação do estado geral com sintomas constitucionais acompanhando o quadro.
- Herpes Simples Recorrente: a maioria dos indivíduos infectados pelo HIV é co-infectada com um ou ambos os tipos de vírus herpes simples (1 e 2), sendo mais comum a evidência de recorrência do que infecção primária. Embora o HSV-1 seja responsável por lesões orolabiais e o HSV-2 por lesões genitais, os dois tipos podem causar infecção em qualquer sítio. Geralmente a apresentação clínica dos quadros de recorrência é atípica ao comparar-se aos quadros em indivíduos imunocompetentes, no entanto, a sintomatologia clássica pode manifestar-se independente do estágio da doença pelo HIV.
- Herpes Zoster: de modo similar ao que ocorre com o HSV em pacientes com doença pelo HIV, a maioria dos adultos foi previamente infectada pelo vírus varicela zoster, desenvolvendo episódios de herpes zoster freqüentes. O quadro inicia com dor radicular, rash localizado ou segmentar comprometendo um a três dermátomos, seguindo o surgimento de maculopapulas dolorosas que evoluem para vesículas com conteúdo infectante. Pode também apresentar-se com disseminação cutânea extensa.
- Trombocitopenia: na maioria das vezes é uma anormalidade hematológica isolada com um número normal ou aumentado de megacariócitos na medula óssea e níveis elevados de imunoglobulinas associadas a plaquetas, síndrome clínica chamada púrpura trombocitopênica imune. Clinicamente, os pacientes podem apresentar somente sangramentos mínimos como petéquias, equimoses e ocasionalmente epistaxes. Laboratorialmente considera-se o número de plaquetas menor que 100.000 células/mm3.
8.8. Doenças oportunistas
São doenças que se desenvolvem em decorrência de uma alteração
imunitária do hospedeiro. Estas são geralmente de origem infecciosa,
porém várias neoplasias também podem ser consideradas oportunistas.
As infecções oportunistas (IO) podem ser causadas por microrganismos
não considerados usualmente patogênicos, ou seja, não capazes de
desencadear doença em pessoas com sistema imune normal. Entretanto,
microrganismos normalmente patogênicos também podem, eventualmente, ser
causadores de IO. Porém, nesta situação, as infecções necessariamente
assumem um caráter de maior gravidade ou agressividade para serem
consideradas oportunistas.
As doenças oportunistas associadas à aids são várias, podendo ser
causadas por vírus, bactérias, protozoários, fungos e certas neoplasias:
- Vírus: Citomegalovirose, Herpes simples, Leucoencafalopatia Multifocal Progressiva.
- Bactérias: Micobacterioses (tuberculose e complexo Mycobacterium avium-intracellulare), Pneumonias (S. pneumoniae), Salmonelose.
- Fungos: Pneumocistose, Candidíase, Criptococose, Histoplasmose.
- Protozoários: Toxoplasmose, Criptosporidiose, Isosporíase.
- Neoplasias: sarcoma de Kaposi, linfomas não-Hodgkin, neoplasias intra-epiteliais anal e cervical.
8.9. Tratamento
Existem, até o momento, duas classes de drogas liberadas para o tratamento anti-HIV:
8.9.1. Inibidores da transcriptase reversa
São drogas que inibem a replicação do HIV bloqueando a ação da enzima
transcriptase reversa que age convertendo o RNA viral em DNA:
Nucleosídeos:
- Zidovudina (AZT) cápsula 100 mg, dose:100mg 5x/dia ou 200mg 3x/dia ou 300mg 2x/dia;
- Zidovudina (AZT) injetável, frasco-ampola de 200 mg;
- Zidovudina (AZT) solução oral, frasco de 2.000 mg/200 ml;
- Didanosina (ddI) comprimido 25 e 100mg, dose: 125 a 200mg 2x/dia;
- Zalcitabina (ddC) comprimido 0,75mg, dose: 0,75mg 3x/dia;
- Lamivudina (3TC) comprimido 150mg, dose: 150mg 2x/dia;
- Estavudina (d4T) cápsula 30 e 40mg, dose: 30 ou 40mg 2x/dia;
- Abacavir comprimidos 300 mg, dose: 300 mg 2x/dia.
Não-nucleosídeos:
- Nevirapina comprimido 200 mg, dose: 200 mg 2x/dia;
- Delavirdina comprimido 100 mg, dose: 400 mg 3x/dia;
- Efavirenz comprimido 200 mg, dose: 600 mg 1x/dia.
Nucleotídeo: Adefovir dipivoxil: comprimido, 60 e 120 mg, dose: 60 ou 120 mg 1x/dia.
8.9.2. Inibidores da protease
Estas drogas agem no último estágio da formação do HIV, impedindo a
ação da enzima protease que é fundamental para a clivagem das cadeias
protéicas produzidas pela célula infectada em proteínas virais
estruturais e enzimas que formarão cada partícula do HIV:
- Indinavir cápsula 400 mg, dose: 800 mg 3x/dia;
- Ritonavir cápsula 100mg, dose: 600mg 2x/dia;
- Saquinavir cápsula 200mg, dose: 600mg 3x/dia;
- Nelfinavir cápsula de 250 mg, dose 750 mg 3x/dia;
- Amprenavir cápsula de 150 mg, dose 600 mg 2x/dia.
Terapia combinada: é o tratamento anti-retroviral
com associação de duas ou mais drogas da mesma classe farmacológica (p
ex. dois análogos nucleosídeos), ou de classes diferentes (p ex. dois
análogos nucleosídeos e um inibidor de protease). Estudos multicêntricos
demonstraram aumento na atividade anti-retroviral (elevação de
linfócitos T-CD4+ e redução nos títulos plasmáticos de RNA-HIV) quando
da associação de drogas, particularmente redução da replicação viral por
potencializar efeito terapêutico ou por sinergismo de ação em sítios
diferentes do ciclo de replicação viral. Outros estudos evidenciaram
redução na emergência de cepas multirresistentes quando da utilização da
terapêutica combinada.
Terapia anti-retroviral: é uma área complexa,
sujeita a constantes mudanças. As recomendações deverão ser revistas
periodicamente, com o objetivo de incorporar novos conhecimentos gerados
pelos ensaios clínicos.
9. Hantavirus
As viroses emergentes preocupam as autoridades sanitárias de todo o
mundo. Fruto de alterações no ecossistema e dos comportamentos
econômicos, sociais e culturais do homem, estas viroses surgem como
importante problema de saúde pública tanto nas zonas rurais como nas
zonas urbanas. O exemplo mais clássico de uma virose emergente, já hoje
consolidado na humanidade, é a infecção humana pelo vírus HIV(AIDS) que
atualmente atinge praticamente todos os territórios. Entre as viroses
emergentes as que guardam especial preocupação são aquelas associadas
com as febres hemorrágicas dado o seu caráter comumente letal e a
capacidade de disseminação.
A seguir são apresentadas duas viroses que causam febres hemorrágicas.
9.1. Hantaviroses
9.1.1. Aspectos Epidemiológicos
Hantaviroses são enfermidades agudas que podem se apresentar sobre as
formas de Febre Hemorrágica com Síndrone Renal (HFRS) e Síndrone
Pulmonar por Hantavírus (HPS), sendo a segunda a única forma encontrada
nas Américas. A enfermidade não é específica de nenhum grupo étnico, se
comporta de forma estacional coincidindo com a presença e o maior número
de roedores portadores do vírus.
Agente Etiológio: São designados de hantavírus os agentes etiológicos do agravo que pentencem a família Buyanviridae (Quadro I).
Reservatórios: Os roedores, especialmente os
silvestres, são os principais reservatórios dos Hantavírus e cada
espécie parece ter tropismo por determinado tipo.
No roedor, a infecção pelo Hantavírus aparentemente não é letal e
pode levá-lo ao estado de reservatório do vírus por toda a vida. Nesses
animais, os Hantavírus são isolados principalmente nos pulmões e rins,
apesar da presença de anticorpos séricos, sendo eliminados em grande
quantidade na saliva, urina e fezes durante longo período, todavia, a
duração e o período máximo de infectividade são desconhecidos.
Quadro 1 - Espécies de Hantavírus, enfermidades que causam, principais reservatórios e sua distribuição geográfica
ESPÉCIES
|
ENFERMIDADE
|
RESERVATÓRIO PRINCIPAL
|
DISTRIBUIÇÃO DO VÍRUS
|
DISTRIBUIÇÃO DO
RESERVATÓRIO |
Hantaan (HTN) | FHSR* | Apodemus agrarius | China, Russia, Coreia | Europa Central, ao sul de Tracia, e as montanhas Tien Shan. Do rio Amur através da Coréia até a China. |
Tailândia (China) |
FHSR
|
Apodemus flavicollis | Balcãs | Inglaterra e Gales, desde a Espanha, França e sul da Escandinávia, através da Rússia Européia até os Urais. Desde Itália aos Balcãs, Síria, Líbano e Israel. |
Seul (SEQ) |
FHRS
|
Rattus norvegicus | Mundial | Ao redor do Mundo |
Puumala (PUU) |
FHSR
|
Clethrionomys glareolus | Europa, Rússia, Escandinávia | Desde a França a Escandinávia até o Lago Baikal. Sul da Espanha, Itália, Balcãs, Turquia, até o Saara. Grã- Bretanha, Irlanda. |
Sin Nombre (SN) |
SPH**
|
Peromyscus maniculatus | EUA, Canadá, México | Desde o Alaska ao Canadá, parede continental do EUA, excluindo o sudoeste e leste da baixa Califórnia, Oaxaca no México. |
New York (NY) |
SPH
|
Peromyscus leucopus |
EUA | Parte central do EUA, Alberta, Ontario, Quebec, Nova Escócia, Canadá. Do Caribe até a Península de Yucatán no México. |
Black Creek Canal (BCC) |
SPH
|
Sigmodon hispidus | EUA | Nebraska, Virgínia, Península da Flórida, México, América Central (Panamá), Sul da América, (Norte da Colômbia e Venezuela). |
Bayou (BAY) |
SPH
|
Oligoryzomys palustris |
EUA | Do Kansas ao Texas, New Jersey a Península da Flórida. |
Andes (AND) |
SPH
|
Oligoryzomys longicaudatus Calomys laucha | Argentina | Chile e Argentina até os 50o latitude sul. |
Por Nombrarlo |
SPH
|
Calomys laucha | Paraguai | Argentina, Uruguai, Paraguai, Brasil. |
Rio Mamore (RIOM) | Não reportado em humanos | Oligoryzomys Microtis |
Bolívia | Brasil, entre os rios Solimões e Amazonas, continuando nas terras baixas do Peru, Bolívia, Paraguai e Argentina. |
Punchana (1) (2) | Não reportado em humanos | Oryzomys sp | Perú | Loretu, Perú |
Caño Delgativo | Não reportado em humanos | Sigmodon alsoni | Venezuela | Venezuela |
* FHSR: Febre hemorrágica com sindrome renal
* SPH: Sindrome pulmonar por hantavirus
9.1.2. Modos de Transmissão
A infecção humana ocorre mais freqüentemente pela inalação de
aerossóis formados a partir de secreções e excreções dos
reservatórios(roedores) de Hantavírus. Outras formas de transmissão para
a espécie humana foram também descritas:
- ingestão de alimentos e água contaminados;
- percutânea, por meio de escoriações cutâneas e mordeduras de roedor;
- contato do vírus com mucosa, por exemplo, a conjuntival;
- acidentalmente, em trabalhadores e visitantes de biotérios e laboratórios.
Mais recentemente, há evidências da possibilidade de transmissão
interhumana. Na Argentina, Cantoni e cols.(1997) verificaram durante um
surto de hantavírus, na província de rio Negro, que os profissionais da
área de saúde apresentaram risco maior do que o observado na população
em geral. A hipótese de transmissão pessoa a pessoa em casos de síndrome
pulmonar por Hantavírus descritos por Cantoni et cols(1997) direcionam a
revisão das medidas de precaução e biossegurança no atendimento destes
pacientes e manuseio de espécimes biológicas.
- Período de Incubação: O período de incubação da doença provocada por Hantavirus varia de 12 a 16 dias com uma variação de 05 a 42 dias.
- Período de Transmissibilidade: Até o momento é desconhecido.
- Susceptibilidade e Imunidade: Ao que parece, as pessoas sem dados sorológicos de infecção passada são uniformemente susceptíveis. Não existem relatos na literatura de reinfecção em humanos.
- Distribuição, Morbidade, Mortalidade e Letalidade: A Febre Hemorrágica com Síndrome Renal (HFRS) tem a distribuição na Europa e Ásia onde na China ocorrem de 40.000 a 100.000 casos por ano. Na Coréia do Sul tem ocorrido uma média de 1.000 casos por ano. Possui uma letalidade variável com média de 5% na Ásia e um pouco maior nas Ilhas Balcãs.
A forma respiratória da doença (HPS) com grande letalidade,
identificada em junho de 1993 na região sudoeste dos Estados Unidos e,
posteriormente, observada em outros 21 estados daquele país levou ao
isolamento de outros Hantavírus como o Sin Nombre, Black Creek Canal,
Bayou e New York. Desta forma, a Síndrome Pulmonar por Hantavírus passou
a ser reconhecida em outros países e possibilitou o isolamento de novas
espécies.
No Brasil os 3 primeiros casos clínicos de Síndrome Pulmonar por
Hantavírus foram identificados no Estado de São Paulo, no Município de
Juquitiba, em 1993. Outros sete casos foram registrados: um no Estado de
Mato Grosso na cidade de Castelo dos Sonhos e outros seis no estado de
São Paulo, nas cidades de Araraquara e Franca, ambos em 1996; um em Tupi
Paulista e um em Nova Guataporanga, dois casos em Guariba, em 1998.
Tabela 1 - Casos de Síndrome Pulmonar por Hantavírus diagnosticados nas Américas até abril de 1998.
País
|
Casos
|
Argentina |
150 casos
|
Brasil |
10 casos
|
Chile |
27 casos
|
Canadá (até julho de 1997) |
13 casos
|
EUA (até julho de 1997) |
162 casos
|
Uruguai |
3 casos
|
A Letalidade na Argentina gira em torno de 30 % dos casos, enquanto
no Brasil dos 10 casos que ocorreram no período, 9 foram a óbito.
9.1.3. Aspectos Clínicos
a) Síndrome Pulmonar por Hantavírus (HPS)
- Descrição: febre, mialgias, dor abdominal, vômitos e cefaléia; seguidas de tosse produtiva, dispnéia, taquipnéia, taquicardia, hipertensão, hipoxemia arterial, acidose metabólica e edema pulmonar não cardiogênico. O paciente evolui para insuficiência respiratória aguda e choque circulatório.
- Diagnóstico Diferencial: septicemias, leptospirose, viroses respiratórias, pneumonias atípicas (Legionella, Mycoplasma, Clamydia), histoplasmose pulmonar e pneumocitose.
- Complicações: insuficiência respiratória aguda e choque circulatório.
- Tratamento: desde o início do quadro respiratório, estão indicados medidas gerais de suporte clínico, inclusive com assistência em unidade de terapia intensiva nos casos mais graves.
b) Febre Hemorrágica com Síndrome Renal (HFRS)
- Descrição: febre, cefaléia, mialgia, dor abdominal, náuseas, vômitos, rubor facial, petéquias e hemorragia conjuntival, seguida de hipotensão, taquicardía, oligúria e hemorragias severas, evoluindo para um quadro de poliúria que antecipa o início da recuperação, na maioria dos casos.
- Diagnóstico diferencial: é importante, em nosso meio, lembrar de doenças que cursam com febre hemorrágica como malária grave, leptospirose, septicemia (Gram negativo), hepatite B, intoxicações exógenas, dengue hemorrágico e febre amarela.
- Tratamento: na HFRS, as medidas de suporte e observação são fundamentais no tratamento dos paciente. Recomenda-se as seguintes medidas: isolamento dos pacientes com proteção de barreiras (avental, luvas e máscaras); evitar sobrecarga hídrica nos estágios iniciais, manter o aporte de fluidos adequado para repor perda na fase de poliúria, controle da hipotensão com expansores de volume e vasopressores nos casos graves, monitorização do estado hidroeletrolítico e ácido-básico e diálise peritoneal ou hemodiálise no tratamento da insuficiência renal.
9.1.4. Diagnóstico Laboratorial
Para os dois tipos de Hantaviroses, o diagnóstico faz-se através de
Imunofluorescência, Elisa e Soroneutralização. A confirmação se dá
através de PCR e Imunohistoquímica de órgãos positivos.
9.1.5. Medidas de Controle
As medidas de prevenção e controle devem ser baseadas em manejo
ambiental, através principalmente de práticas de higiene e medidas
corretivas no meio ambiente, saneamento, melhorias de condições de vida e
moradia, tornando as habitações e os campos de trabalhos impróprios à
instalação e proliferação de roedores (antirratização) associados a
desratizações focais, quando necessários.
9.2. Controle de Roedores
Medidas básicas de controle de roedores poderão se obtidas no "Manual
de controle de Roedores" do Ministério da Saúde, porém é essencial:
- Eliminar todos os resíduos que possam servir para construção de tocas e ninhos;
- Evitar entulhos e objetos inúteis no interior e ao redor do domicílio através de limpeza diária;
- Armazenar insumos agrícolas e outros objetos em galpões distantes pelo menos 30 metros dos domicílios sobre estrados de 40 cm de altura;
- Armazenar produtos agrícolas (grãos, hortigranjeiros e frutas) em silos ou tulhas situadas a uma distância mínima de 30 metros do domicílio, sobre estrados com 40 cm de altura do piso. O silo ou tuia deverá estar suspenso e a uma altura de 40 cm do solo com escada removível e ratoeiras dispostas em cada suporte;
- Os produtos armazenados no interior dos domicílios devem ser conservados em recipientes fechados a 40 cm do solo;
- Vedar fendas e outras aberturas superiores a 5 cm para evitar ingressos acidentais de roedores no interior dos domicílios;
- Remover diariamente as sobras dos alimentos de animais domésticos;
- Lixos orgânicos e inorgânicos, caso não exista coleta regular, devem ser enterrados separadamente, respeitando-se uma distância mínima de 30 metros do domicílio;
- O plantio deve sempre obedecer uma distância mínima de 30 metros do domicílio;
- O armazenamento em estabelecimentos comerciais deve seguir as mesmas orientações para o armazenamento em domicílio e em silos de maior porte;
- Em locais onde haja coleta de lixo rotineira, os lixos orgânicos e inorgânicos devem ser acondicionados em latões com tampa ou em sacos plásticos sobre suporte de aproximadamente 1,5 metros de altura do solo.
10. Ebola
O Ebola é um vírus da família Flaviviridae, é um dos únicos vírus que
têm a forma de uma linha (enrolada ou não) enquanto todos os outros
vírus têm a forma irregular ou redondo. Por essa razão vários
especialistas acreditam que que o Ebola deveria ser agrupado em um grupo
próprio. O Ebola leva, mais ou menos, oito horas para se replicar. O
vírus têm quatro espécies diferentes:
- Ebola Sudão
- Ebola Zaire (o mais letal deles)
- Ebola Reston
- Ebola Tai (Costa do Marfim)
Dentre as espécies citadas acima o Ebola Reston é o único transmitido
pelo ar, mas não é mortal para o homem, é mortal apenas para macacos. O
Ebola Zaire é o mais letal deles matando nove em cada dez pessoas
infectadas e os cientistas ainda não sabem como a décima pessoa
sobrevive.
10.1. Classificação
O Ebola é um vírus de nível 4 de patogenia (maior que a AIDS, que é
apenas nível 2) O período de incubação do Ebola varia de 2 a 21 dias,
dependendo da espécie. E a taxa de mortalidade do vírus é de 70 a 90 %,
também dependendo da espécie.
Ao contrário do que se pensa, a maioria das espécies do Ebola, NÃO são transmitidas através do ar.
O Ebola pode ser transmitido pelo contato com sangue ou fluídos de pessoas previamente infectadas.
Pelo vírus ser transmitido por meio de secreções, o vírus pode se
espalhar rapidamente na família e nos amigos, pois na alimentação,
manuseio e quaisquer outros preparos e cuidados com a pessoa infectada,
essas pessoas ficam em contato direto com as secreções.
Um dos principais meios de contaminação do Ebola é o compartilhamento de seringas já utilizadas.
10.2. Diagnóstico
O diagnóstico laboratorial oferece extremo risco para os técnicos
envolvidos. O tratamento com soro hiperimune de animais tem efeito
limitado e o paciente deve ser mantido sob constante suporte de líquidos
devido à desidratação. Somente é possível bloquear o avanço da epidemia
através de técnicas de isolamento denominadas "técnicas de barreira".
Nelas, os pacientes são isolados e não podem receber visitas; os médicos
e enfermeiras usam aventais, máscaras, luvas e óculos especiais; os
materiais reutilizáveis devem ser esterilizados e o restante
imediatamente incinerado. Os corpos das vítimas devem ser isolados para
cremação ou sepultamento o mais rápido possível. Até hoje, apenas três
epidemias de febre hemorrágica causadas pelo Ebola foram reconhecidas: a
primeira em 1976, no Zaire, quando o vírus foi identificado; a segunda,
em 1979, no Sudão, e a terceira novamente no Zaire, em 1995, na cidade
de Kirkwit, a 200 km da capital, Kinshasa. Nelas, o índice de
mortalidade revelou-se assustadoramente alto (80%), sendo levemente
maior nos homens. Existem quatro subtipos conhecidos do vírus; um deles
chama-se "Reston", pois foi isolado no subúrbio homônimo, que situa-se
na periferia de Washington, D. C., de macacos importados das Filipinas.
10.3. Sintomas
Começa com uma dor de cabeça. Os olhos ficam vermelhos e rijos. Surge
a febre. Perde-se a lucidez. Aparecem coceiras na pele, que amarelece e
ganha feridas. Por baixo das chagas, a carne se rasga. O peito, os
braços e o rosto cobrem-se de hematomas. O estômago regurgita vômito
nego e sangue. Mais sangue brota por todos os poros e orifícios do
corpo. Caem cabelos, pedaços da língua, da garganta e da traquéia. Os
genitais apodrecem. Com as convulsões, sangue contaminado é jorrado por
todos os lados. O cérebro se liquefaz. Vem a morte.
10.4. Origem
Não se sabe ao certo. Os virólogos acreditam que o vírus originou-se
no interior da caverna Kitum, que fica nas encostas do monte Elgon, às
margens do Lago Vitória, no Quênia, país da África Central. A primeira
manifestação da doença foi em 1967.
Um espécie de "antepassado" do Ebola, o Marburgo, manifestou-se pela
primeira vez na Alemanha, na cidade que lhe deu este nome. Quatro
macacos vindos de Uganda levaram o vírus aos laboratórios da empresa
Behring Works, que usava células de rins destes primatas para fazer
vacina. O encarregado da limpeza e alimentação dos animais foi o
primeiro a falecer, após 14 dias de contato. A seguir, 31 pessoas são
infectadas e sete morrem. Depois disso, a cidade de Nzara, no Sudão teve
centenas de mortos. Mas foi na zona de Bumba, às margens do rio Ebola,
que a doença se manifestou com todo rigor, estendendo-se por 55 aldeias
próximas e matando 90% das pessoas infectadas. O exército zairense
isolou a área e a Organização Mundial de Saúde (OMS) teve de mandar
especialistas para conter a epidemia. Posteriormente, outras
manifestações da doença apareceram em várias cidades africanas. Não foi o
vírus que atacou o homem, mas sim o inverso. O Ebola vive em meio às
florestas inexploradas, africanas, parasitando animais, para os quais é
inofensivo. Ao explorar as matas virgens, o homem destrói o ambiente
natural do vírus, fazendo com que ele se depare com uma população
atrasada em nível sanitário e médico. Daí o termo vírus emergente.
11. Prions
O neurologista norte-americano Stanley Prusiner, professor da
Universidade da Califórnia, em São Francisco; descobriu uma proteína
causadora da demência bovina e de outras doenças degenerativas do
cérebro, ganhou o Prêmio Nobel de Medicina. O neurologista iniciou o
trabalho em 1972, depois que um de seus pacientes morreu de demência
resultante da doença de Creutzfeldt-Jakob. Dez anos depois, ele e sua
equipe produziram um preparado derivado do cérebro de cobaias doentes
que continha um só agente chamado prion.
Prusiner demonstrou grande humildade ao admitir que em 1980 a noção
dos prions só poderia ser considerada como herética pelo mundo
científico: naquela época, disse, era dogma que os agentes de doenças
transmissíveis deveriam ser integrados de material genético, de DNA ou
RNA, de modo a estabelecer uma infecção na célula anfitriã. Afinal, até
mesmo os vírus, dentre os micróbios mais simples, dependem de tal
material para a síntese direta de proteínas, necessárias para a
sobrevivência e a reprodução. Não somente nesse aspecto a descoberta de
Prusiner chocava-se com o conhecimento da época. Havia o fato também de
que ele apontara as proteínas provocadoras da doença como geradas
espontaneamente no organismo, mas também transmissíveis. Essa ação dupla
era então desconhecida na ciência médica. E mais ainda, concluiu que os
prions se multiplicavam em velocidade extraordinária, pelo simples
contato da molécula contaminada com a sã (SEZAR, 1997).
Os prions, em última análise, são moléculas de proteínas normais
(PrPc) produzidas nas células dos mamíferos, através de controle dos
genes. Quando a molécula adquire uma configuração diferente (PrPSc), ela
se torna patogênica. Essa configuração pode ocorrer devido à existência
de um gene mutante no indivíduo, que eventualmente desenvolve a doença,
neste caso hereditária. Extratos de cérebro de animais doentes,
contendo PrPSc, injetados em animais sãos, causam a doença; acredita-se
que os PrPSc induzem os prions normais a mudarem de configuração
molecular, num efeito cascata, possibilitando o estabelecimento da
doença (SEZAR, 1996).
A visualização por microscopia eletrônica do agente infeccioso do
scrapie tem demonstrado a presença de bastonetes de 10-20mm de diâmetros
e 100-200 mm de comprimento, estudos imunoeletromicroscopia, usando
anticorpos anti-PrP, demonstram os bastonetes constituídos de PrP
(TRABULSI, 1999).
No início, acreditava-se que as doenças fossem causadas por vírus de
ação muito lenta. No entanto, a radiação ultravioleta, que destrói
ácidos nucléicos, não inativava os extratos, que continuavam
infecciosos. Isso sugeria uma coisa muito estranha: se o agente da
infecção não continha ácido nucléico, não poderia ser um vírus. Prusiner
e seus colaboradores descobriram que, ao contrário, as proteínas
presentes no extrato eram responsáveis pela infecção; isso porque, ao
usarem métodos de desnaturação, que modificam a conformação das
proteínas, a capacidade infecciosa do extrato diminuía muito.
A proteína do "scrapie" foi chamada de PrP, que vem de "Prion
Protein". Os prions são codificados por genes, os pesquisadores
conseguiram descobrir, em células de mamíferos, o gene que codifica a
PrP. Ficou assim estabelecido que este gene não é carregado pelo prion,
mas reside nos cromossomos dos camundongos, das cobaias e dos seres
humanos estudados. Em outras palavras, nossas células fabricam
normalmente a proteína que chamamos de prion, sem que, no entanto,
adoeçamos. Verificou-se, na realidade, que a proteína existe sob duas
formas, uma patogênica e a outra não. À forma normal, não causadora de
doença, chamou-se PrPc (PrP celular); a forma patogênica foi chamada de
PrPSc (PrP Scrapie). Descobriu-se que, em algumas pessoas, o gene
produtor de prions sofreu mutação; nessas pessoas, as encefalopatias
espongiformes desenvolvem-se com maior facilidade. A doença, neste caso,
comporta-se como hereditária, e não como uma infecção adquirida (SEZAR,
1996).
As duas proteínas se diferem somente em conformatação. PrPc é
composto por 40% de alfa hélix enquanto a outra que é PrPsc é formada
por 60% de uma base beta e 20% da estrutura alfa hélix. O mecanismo de
infecção é iniciado por uma interação do PrPsc com a proteína Prion
celular, causando uma conversão para a posterior conformatação. A partir
daí a infecção se espalha porque as novas moléculas PrPsc são geradas
exponencialmente de uma única molécula normal PrPc. O acumulo de PrPsc
insolúvel é um dos fato que leva a morte neuronal. Existe uma discussão
na literatura que a internação da PrPc é mediada por duas substâncias
diferentes, entretanto os dois caminhos necessitam de uma terceira
proteína, um receptor ou uma proteína ligada ao Prion para fazer a
molécula ancorada no GPI ou converter o PrPc em PrPsc (AURIEMO,1996).
O fenômeno de conversão dos prions não é ainda bem claro, uma vez que
viola a teoria biológica segundo a qual é necessário um ácido nucléico
que funcione como modelo para a conversão. A "hipótese do dímero"
considera que uma molécula inicial anormal (PrP-SC) se combina com uma
molécula normal (PrP-C) para formar um heterodímero. Este é depois
convertido num homodímero (PrP-SC/PrP-SC) que se pode dissociar e
regenerar o "agente patogênico". Ocorre assim um crescimento exponencial
do confôrmero anormal o PrP-SC (PRUSINER, 1996).
Crê-se que alguns indivíduos (humanos ou animais) herdam
geneticamente proteínas com uma tendência aumentada para
"espontaneamente" produzirem a pequena quantidade de proteínas de
configuração anormal que inicie o processo de replicação. Noutros casos,
indivíduos expostos a tais proteínas, por exemplo através da ingestão
de alimentos, desenvolvem a doença bem como o potencial para uma
posterior infecção. Não se sabe ao certo como o PrP "scrapie" danifica
as células causando a doença. É muito possível que isso tenha a ver com
os lisossomos celulares. Em culturas de neurônios, verificou-se que os
PrPSc acumulam-se no interior dos lisossomos, não sendo hidrolisados
normalmente pelas proteases. Possivelmente, quando nos tecidos do
cérebro, os lisossomos acabam por arrebentar e matam as células; os
prions liberados atacariam outras células vizinhas, repetindo-se assim o
ciclo. Formariam-se "buracos" no cérebro, que ficaria com aspecto
esponjoso, donde o termo encefalopatia espongiforme (SEZAR, 1996).
Doenças neurodegenerativas que afetam o homem e os animais tinham
características similares ao "scrapie". O kuru, que atingia nativos de
Papua-Nova Guiné, foi relatado em 1957. A estranha doença causava perda
de coordenação motora seguida de demência e morte. Acredita-se que os
nativos adquiriram a doença devido ao hábito de canibalismo,
caracterizando uma doença infecciosa, sendo o agente etiológico
provavelmente transferido do cérebro (órgão preferencialmente ingerido)
de indivíduos doentes para indivíduos sadios. A doença foi exterminada
pela interrupção da prática canibal. A doença de Creutzfeldt-Jackob
(CJD), bastante rara (um afetado em um milhão de indivíduos), tem
distribuição mundial, sendo também caracterizada por demência seguida de
perda de coordenação motora. A doença de Gerstmann-Sträussler-Scheinker
(GSS), que à semelhança da CJD leva ao aparecimento de alterações de
coordenação motora e à Insônia Familiar Fatal (FFI), onde a demência é
seguida de alterações no sono. O componente hereditário destas últimas é
muito maior que o infeccioso, sendo responsável por mais de 90% do
casos. Em 1986, a emersão de uma epidemia que acometeu o gado bovino da
Grã-Bretanha foi relatada. Seu aparecimento foi associado ao uso de
vísceras de ovelhas contaminadas com o "scrapie" no preparo da ração
usada para alimentar estes animais. A doença, denominada encefalopatia
espongiforme bovina (nome dado devido à grande quantidade de buracos
presentes no cérebro destes animais) ou "doença da vaca louca", atingiu
seu ápice em 1994 com 138.359 casos naquele país (MARTINS, 1999).
FONTE: http://www.acervosaber.com.br