Usando fibras plásticas e células humanas, médicos construíram e
implantaram uma traqueia em uma menina de dois anos e meio --a mais
jovem até hoje a receber um órgão desenvolvido por bioengenharia.
Jim Carlson/Associated Press |
Hannah Warren, 2, com seu pai, Darryl, após cirurgia no Children's Hospital de Illinois, nos EUA, onde ela recebeu uma traqueia feita por cientistas |
A cirurgia, que aconteceu no dia 9 de abril no Children's Hospital de
Illinois, nos EUA, e foi anunciada oficialmente nesta terça (30), é a
sexta do tipo no mundo e a primeira a ser feita nos Estados Unidos Paolo Macchiarini, especialista em medicina regenerativa que desenvolveu
a traqueia usada na operação de nove horas, afirmou que o tratamento da
menina coreano-canadense Hannah Warren o fez perceber que sua abordagem
para construir órgãos pode funcionar melhor em crianças do que em
adultos, aproveitando sua habilidade natural de regeneração. "O transplante de Hannah mudou minha forma de pensar a medicina
regenerativa", disse Macchiarini, cirurgião do Instituto Karolinska, em
Estocolmo (Suécia). A menina nasceu sem a traqueia --uma condição rara e fatal em 99% dos
casos-- e vivia desde o nascimento em uma UTI de um hospital na Coreia
do Sul, respirando por um tubo inserido na boca. Por outros problemas de
desenvolvimento, ela não come nem fala normalmente.
Órgão foi construído com fibras plásticas e células da paciente |
Três semanas após a cirurgia, a menina está serelepe com médicos e enfermeiros, sorrindo e acenando. Mark Holterman, cirurgião pediátrico do hospital, afirmou que Hannah
está respirando sozinha, apesar de ainda por uma abertura no pescoço e
não pela boca. "Ela teve complicações da cirurgia, mas a traqueia está
ótima."
OUTROS CASOS
Até agora, a medicina regenerativa só conseguiu criar poucos órgãos
simples, e coisas como corações artificiais ainda estão distantes. Antes de Hannah, a pessoa mais jovem a ter um órgão de bioengenheria
tinha sido um menino de quatro anos com espinha bífida (condição na qual
o tubo neural do feto não se fecha totalmente), que ganhou uma bexiga. Macchiarini já fez outros cinco implantes de traqueia similares ao de
Hannah. Um paciente, um americano operado em Estocolmo, morreu. Um homem
da Eritreia é o que viveu por mais tempo até agora, sobrevivendo há
dois anos e meio desde a operação. Para fazer a traqueia de Hannah, a equipe de Macchiarini montou um tubo
de fibras de plástico, com menos de um centímetro, que foi banhado em
uma solução contendo células-tronco tiradas da medula óssea da criança. Os médicos não sabem ao certo o que acontece após a implantação, mas
acreditam que as células-tronco sinalizem ao corpo para enviar outras
células para a traqueia, dando origem ao tecido de dentro e fora do
tubo. Como a traqueia só tem células de Hannah, não há necessidade de remédios contra a rejeição. David Warburton, diretor do programa de medicina regenerativa no
Instituto de Pesquisa Saban, em Los Angeles, que não participou da
cirurgia, afirmou que é preciso ter "otimismo com uma grande pitada de
ceticismo" quanto a essas abordagens experimentais. Especialistas cobram testes clínicos que avaliem esse tipo de procedimento. A menina agora deve encarar um longo processo de reabilitação para aprender a respirar normalmente e depois a comer e a falar.
À medida que ela crescer, também vai precisar de uma traqueia maior.
Segundo Macchiarini, a troca deverá ser feita a cada quatro anos, mas a
equipe tentou adiar essa substituição pelo maior tempo possível fazendo
um implante um pouco maior do que o necessário e incluindo plástico
biodegradável, material com certa elasticidade. Os pais da menina, Darryl e Young-Mi Warren, contaram que, logo após
Hannah nascer, eles ouviram que a chance de ela sobreviver após os seis
anos de idade era baixa. "Não queríamos Hannah só por mais uns dois
anos. Queríamos pelo resto de nossas vidas", afirmou Darryl, que soube
do trabalho de Macchiarini pela internet. "É inacreditável estarem
fazendo isso agora, justo quando Hannah precisava."
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaud/2013/04/1271426-menina-de-dois-anos-recebe-traqueiartificial.shtml