quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

VÍRUS

VÍRUS

Introdução

Na antiguidade, o termo ‘vírus’ (do latim; significa veneno) foi utilizado como sinônimo de veneno e se referia a agentes de natureza desconhecida que provocavam diversas doenças.
A descoberta dos vírus deve-se a Dmitri Ivanowsky (em 1892), que, ao estudar a doença chamada ‘mosaico do tabaco’, detectou a possibilidade de transmissão da doença a partir de extratos de vegetais doentes para vegetais sadios, por meio de experimentos com filtros capazes de reter bactérias. Essa moléstia afeta as plantas do fumo, manchando as folhas com áreas necrosadas e levando-as à morte. Em 1935, cristais de vírus foram isolados e observados ao microscópio pela primeira vez. A sua composição parecia principalmente protéica, porém constatou-se mais tarde uma pequena quantidade de ácidos nucléicos. Nos sistemas tradicionais de classificação dos seres vivos, os vírus não são incluídos por não apresentarem características morfológicas celulares. Eles possuem estrutura molecular apenas visível ao microscópio eletrônico. Sua estrutura vem sendo cada vez mais esclarecida, à medida que a tecnologia em microscopia eletrônica evolui. Eles são tão pequenos que podem penetrar na célula das menores bactérias que se conhecem. Estruturas de vários vírus vistos com o microscópio eletrônico: as partículas esféricas são os vírus do mosaico amarelo do nabo; os cilindros longos são os vírus do mosaico do tabaco e no centro, temos, o bacteriófago T4.
Nos sistemas tradicionais de classificação dos seres vivos, os vírus não são incluídos por serem considerados partículas ou fragmentos que só adquirem manifestações vitais quando parasitam células vivas. Apesar de até hoje ainda persistir a discussão em torno do tema, a tendência é considerar os vírus como seres vivos. Os vírus são extremamente simples e diferem dos demais seres vivos pela inexistência de organização celular, por não possuírem metabolismo próprio, e por não serem capazes de se reproduzir sem estar dentro de uma célula hospedeira. São, portanto, parasitas intracelulares obrigatórios; são em conseqüência, responsáveis por várias doenças infecciosas. Geralmente inibem o funcionamento do material genético da célula infectada e passam a comandar a síntese de proteínas. Os vírus atacam desde bactérias, até plantas e animais. Muitos retrovírus (vírus de RNA) possuem genes denominados oncogenes, que induzem as células hospedeiras à divisão descontrolada, com a formação de tumores cancerosos.

1. Características

1.1. Filtrabilidade

Essa característica, que serviu de base para a descoberta do vírus, originou a denominação vulgar de "vírus filtrável", termo que teve de ser abandonado pelo fato de, posteriormente, se descobrir que existem bactérias filtráveis, como certos espiroquetas, e vírus não filtráveis, como o vírus do Mosaico Comum do feijoeiro e o do "Crinkle Mosaic" da batatinha. A filtrabilidade do vírus não é uma pura conseqüência de seu diminuto tamanho. Tipo de filtro, temperatura, ph, carga elétrica do vírus e do filtro, quantidade de pressão exercida sobre o filtro, natureza do fluído da suspensão e duração da filtração, são fatores que devem ser levados em consideração ao se determinar a filtrabilidade do vírus. Atualmente se dispõe de filtros de colódio, as Membranas de Gradocol, em que o tamanho dos poros é muito mais importante do que nos filtros bacteriológicos de porcelana.

1.2. Natureza Corpuscular

Desde 1898 se suspeita da natureza corpuscular do vírus, com a teoria do "contagium vivum fluidum", denominação que Beijerink emprestou de Fracastorius (1546) para caracterizar o filtrado infectivo do suco de fumo com mosaico. A guisa de esclarecimento, contagium era uma substância derivada do corpo do doente e que, passando de um indivíduo para outro, transmitia a doença e a teoria do contagium vivum foi criada por Fracastorius, quando postulou a idéia de que o contagium fosse devido a agentes vivos (seminaria). Entretanto, por muitos anos, essa característica foi um ponto altamente controvertido pois a ciência ainda não estava preparada para comprová-la. Apesar disso, mesmo antes da descoberta de microscópio eletrônico, em 1938, Wendell Stanley (1935) já mostrava evidências irrefutáveis sobre a natureza corpuscular do vírus ao cristalizar o vírus do Mosaico do Fumo. Hoje, acostumamos com representações esquemáticas e eletromicrográficos dos vírus, dificilmente imaginamos que essa característica tivesse sido um pomo de discórdia no passado.

1.3. Natureza Antigênica

Muito antes da descoberta dos vírus, já se sabia que doenças hoje conhecidas eram causadas por vírus, como por exemplo a varíola, conferiam resistência contra incidências subsequentes. A vacina contra a varíola se baseia, ainda hoje, na descobertas de Jenner (1798) de que o vírus do "cow-pox"(varíola bovina) imuniza contra o "small-pox"(varíola humana). Proteínas introduzidas no corpo animal, por via parenteral, sendo elas estranhas ao corpo do animal, induz a formação de substância que reagem especificamente com as proteínas injetadas. Estas proteínas estranhas constituem os antígenos e as substâncias induzidas, os anticorpos. Sendo os vírus de natureza nucleoproteica tem essa propriedade antigêno que serve de base para os métodos sorológicos usados em Virologia. Especula-se, atualmente, se as plantas possuem essa capacidade de formação de anticorpos, comprova somente em animais. Estirpes fracas do vírus da tristeza dos citros conferem resistência às estirpes mais severas do mesmo vírus. A natureza desse fenômeno, entretanto, não esta esclarecida.

1.4. Dimensões do vírus

As dimensões dos vírus, evidenciadas por estudos eletromicroscópicos, de ultrafiltração e ultracentrifugação, variam de 10 a 350 milimicra de diâmetro; o comprimento chega até 2.000 milimicra (vírus da Tristeza do Citrus). A guisa de comparação, os glóbulos vermelhos do sangue humano têm 7.500 milimicra de diâmetro e, dentro de uma célula bacteriana, podem caber mais de 1 milhão de partículas de vírus.

2. Evolução

Teriam os vírus evoluído de células vivas livres? Seriam eles produtos da evolução de alguma bactéria? Poderiam ser estes, componentes de células hospedeiras que se tornaram autônomos? Eles lembram genes que tenham adquirido a capacidade de existir independentemente da célula. Embora a virologia exista como ciência apenas há cerca de 100 anos, os vírus provavelmente têm estado presente nos organismos vivos desde a origem da vida. Se os vírus precederam ou surgiram somente após os organismos unicelulares, é uma questão controversa. Contudo, com base nas contínuas descobertas de vírus infectando diferentes espécies, pode-se concluir que, praticamente, todas as espécies deste planeta são infectadas por vírus. Os estudos tem sido limitados aos vírus isolados no presente ou de material de poucas décadas atrás. Infelizmente não existem fósseis dos vírus.

3. Estrutura

Os vírus são formados basicamente por um envoltório ou cápsula protéica, que abriga o material hereditário. Este pode ser tanto o ácido desoxirribonucléico (DNA) como o ácido ribonucléico (RNA). Esses dois ácidos nucléicos, no entanto, nunca ocorrem em um mesmo vírus.
Existem, assim, vírus de DNA e vírus de RNA. Em todos os outros seres vivos, o ácido desoxirribonucléico e o ácido ribonucléico ocorrem juntos dentro das células, sendo o DNA o "portador" das informações genéticas e o RNA o "tradutor" dessas informações.
Formados por uma cápsula (capsídio) protéica + ácido nucléico: DNA ou RNA. O capsídio, além de proteger o ácido nucléico viral, tem a capacidade de se combinar quimicamente com substâncias presentes na superfície das células, o que permite ao vírus reconhecer e atacar o tipo de célula adequado a hospedá-lo.
A partícula viral, quando fora da célula hospedeira, é genericamente denominada vírion. Cada tipo de vírus possui uma forma característica, mas todos eles são extremamente pequenos, geralmente muito menores do que as menores bactérias conhecidas, sendo visíveis somente ao microscópio eletrônico. Os vírus apresentam uma grande variedade de forma e de tamanho. O diâmetro dos principais vírus oscila de 15-300 nm. O vírus da varíola é o maior vírus humano que se conhece (300x250x100 nm), enquanto que o da poliomielite é o menor vírus humano (20 nm de diâmetro). O vírus da febre aftosa, responsável por uma doença em gado, possui 15 nm, sendo portanto, menor que o poliovírus. Num só grupo, as medidas citadas por diferentes autores, podem variar consideravelmente. Isto se deve em parte, a certas diferenças nas técnicas empregadas.Vírus de diferentes famílias apresentam diferentes morfologias que podem ser prontamente distinguidas pelo microscópio eletrônico. Esta relação é útil para o diagnóstico de doenças virais e, especialmente para reconhecer novos vírus responsáveis por infecções. Alguns vírus tem formas parecidas, daí ser importante o uso da imunomicroscopia eletrônica. Um vírion pode se apresentar sob vários formatos: esférico (influenzavírus),de ladrilho (poxvírus),de bastão (vírus do mosaico do tabaco) e de projétil (vírus da raiva).
Os vírus são extremamente simples e diferem dos seres vivos pela inexistência de organização celular, por não possuírem metabolismo próprio e por não serem capazes de se reproduzir, sendo replicados apenas no interior de uma célula hospedeira. São considerados parasitas intracelulares obrigatórios, e, em conseqüência disso, são responsáveis por várias doenças infecciosas. As diferentes proteínas virais interagem de modo específico com proteínas expostas nas membranas celulares, determinando, assim, as células que são susceptíveis a certos vírus. O vírus da poliomielite, por exemplo, é altamente específico, infectando apenas células nervosas, intestinais e da mucosa da garganta. Já o vírus da rubéola e o vírus da varíola conseguem infectar maior número de tecidos humanos. Existem vírus que infectam apenas bactérias, denominados bacteriófagos ou simplesmente fagos; os que infectam apenas fungos, denominados micófagos; os que infectam plantas, vírus de plantas e os que infectam animais denominados vírus de animais.

3.1. Vírus com DNA ou RNA

Quando o ácido nucléico é o DNA, ele é transcrito em várias moléculas de RNA ( pela bactéria ) que servirão de molde para a síntese de proteínas virais. É o caso do vírus da varíola, do herpes, do adenovírus (provoca infecções respiratórias), da hepatite B.
Quando o ácido nucléico é o RNA, dois processos podem ocorrer: O RNA viral é transcrito em várias moléculas de RNA mensageiro, que comandarão a síntese protéica. É o que ocorre com a maior parte dos vírus animais, como o vírus da raiva, da gripe; o vírus da poliomielite e de algumas encefalites têm o RNA que já funciona como RNA mensageiro. Nos vírus conhecidos como retrovírus, como é o caso do vírus da AIDS (HIV), o RNA é transcrito em DNA por uma enzima transcriptase reversa. A partir da ação dessa enzima, o RNA serve de molde a uma molécula de DNA, que penetra no núcleo da célula, e integra-se ao cromossomo do hospedeiro.
O DNA viral integrado ao cromossomo celular é chamado de provírus. Ele é reconhecido e transcrito pelas enzimas da célula hospedeira, de modo que logo começam a surgir moléculas de RNA com informações para síntese de transcriptase reversa e das proteínas do capsídeo. Algumas dessas moléculas de RNA são empacotadas juntamente com moléculas de transcriptase reversa, originando centenas de vírus completos (vírions). A infecção por retrovírus geralmente não leva à morte da célula hospedeira, e esta pode se dividir e transmitir o provírus integrado às células-filhas.

3.2. Retrovírus

Nem todo vírus de RNA é classificado como retrovírus, somente aqueles que usam o RNA como molde para síntese de DNA. Em 1980 foi isolado o primeiro retrovírus na espécie humana: o HTLV-1 - um retrovírus que infecta linfócitos T e causa um tipo de leucemia (câncer do sangue). Dois anos mais tarde, foi descoberto outro retrovírus, o HTLV-2, que causa outro tipo de leucemia. Em 1981 foi diagnosticado o primeiro caso de AIDS e somente em 1983 conseguiu-se provar que essa síndrome é causada por um novo tipo de retrovírus, que recebeu o nome de Vírus da Imunodeficiência Humana ou HIV .

3.3. Especificidade

Em geral, um tipo de vírus ataca um ou poucos tipos de célula. Isso porque um determinado tipo de vírus só consegue infectar uma célula que possua, na membrana, substâncias às quais ele possa se ligar. O vírus da Poliomielite, por exemplo, é altamente específico, infectando apenas células nervosas, intestinais e da mucosa da garganta. Já os vírus da Rubéola e da Varíola conseguem infectar maior número de tecidos humanos. Os vírus da Gripe são bastante versáteis e podem infectar diversos tipos de células humanas e também células de diferentes animais, como patos, cavalos e porcos. Em muitos casos, essa capacidade se deve ao fato de esses vírus conseguirem se ligar a substâncias presentes em células de diversos tipos de organismo.Os vírus, tanto de plantas como de animais, apresentam uma gama determinada de hospedeiros. Assim, o vírus da febre amarela urbana tem como hospedeiros somente o homem (transmissor: mosquito do gênero Aedes); o da febre amarela silvestre, o macaco e o homem (transmissor Haemogogus); o da Tristeza do Citrus, somente plantas cítricas; TWV pelo menos 74 espécies vegetais distribuídas em 14 famílias. Em vírus animais e especificidade vai até o nível histológico, servindo de base para classifica-los em vírus: vírus dermotrópicos (varíola, varicela, sarampo, rubéola, etc.), vírus pneumotrópicos (gripe, resfriado, etc.) vírus neurotrópicos (raiva, poliomielite, encefalites, etc.), vírus hepatotrópicos (febre-amarela, hepatite) e vírus linfo e glandulotrópicos (caxumba, linfogranuloma inguinal).

3.4. Propriedades

  1. Tamanho: os vírus são menores que outros organismos, embora eles variem consideravelmente em tamanho - de 10 nm a 300 nm. As bactérias possuem aproximadamente 1000 nm e as hemácias 7500 nm de diâmetro.
  2. Genoma: o genoma dos vírus pode ser formado de DNA ou RNA, nunca ambos (os vírus contém apenas um tipo de ácido nucléico).
  3. Metabolismo: os vírus não possuem atividade metabólica fora da célula hospedeira; eles não possuem atividade ribossomal ou aparato para síntese de proteínas.
Desta forma, os vírus só são replicados dentro de células vivas. O ácido nucléico viral contém informações necessárias para programar a célula hospedeira infectada, de forma que esta passa a sintetizar várias macromoléculas vírus-específicas necessárias a produção da progênie viral. Fora da célula susceptível, as partículas virais são metabolicamente inertes. Estes agentes podem infectar células animais e vegetais, assim como microrganismos. Muitas vezes não produzem prejuízos aos hospedeiros, embora demonstrem efeitos visíveis.
Se os vírus são organismos vivos ou não é uma questão filosófica, para a qual alguns virologistas poderão responder que não. Embora os vírus possuam as principais características de um organismo celular, eles não possuem a maquinaria necessária para executar aspectos básicos do metabolismo, tais como a síntese de proteínas. Eles não são capazes de replicar-se fora da célula hospedeira. Ao invés disto, os genes virais são capazes de controlar o metabolismo celular e redirecioná-lo para a produção de produtos vírus-específicos.Os vírus, por outro lado, diferem de outros agentes como: toxinas, outros parasitas intracelulares obrigatórios e plasmídeos. As toxinas não são capazes de se multiplicar. O ciclo de infecção viral inclui um "período de eclipse" durante o qual não se detecta a presença do vírus, o que não ocorre com os outros parasitas intracelulares. Os plasmídeos (que são moléculas de DNA capazes de se replicar em células independentemente do DNA celular) não apresentam as estruturas protetoras, que nos vírus impedem a degradação do ácido nucléico genômico.Uma grande contribuição para a virologia foi a descoberta de que os vírus podem ser cristalizados. Quando o químico-orgânico Wendell M. Stanley cristalizou o vírus do Mosaico do Tabaco (VMT) em 1935, forneceu um poderoso argumento para que se pudesse pensar nos vírus como estruturas químicas simples, consistindo somente de proteína e ácido nucléico. Desta forma, se pensarmos nos vírus fora das células, podemos considerá-los como estruturas moleculares excepcionalmente complexas. No interior das células, a informação levada pelo genoma viral, faz com que a célula infectada produza novos vírus, levando-nos a pensar nos vírus como organismos excepcionalmente simples.
Os vírus são constituídos de dois componentes essenciais: a parte central recebe o nome de cerne, onde se encontra o genoma, que pode ser DNA ou RNA, associado com uma capa protéica denominada capsídeo, formando ambos o nucleocapsídeo. O vírion constitui a última fase de desenvolvimento do vírus, ou seja, a partícula infectante madura. Em alguns grupos (poliovírus, adenovírus), os vírions consistem unicamente de nucleocapsídeo. Em outros grupos (mixovírus, herpesvírus, poxvírus), os virions são constituídos de nucleocapsídeo rodeado por uma ou mais membranas lipoprotéicas (o envelope). Muitos vírus adquirem seus envelopes por brotamento através de uma membrana celular apropriada (membrana plasmática em muitos casos, retículo endoplasmático, golgi ou membrana nuclear). O envelope é uma característica comum nos vírus de animais, porém incomum nos vírus de plantas.

4. Replicação

Existem basicamente dois tipos de ciclos replicativos: o ciclo lítico e o ciclo lisogênico. Para exemplificar, utilizaremos o ciclo replicativo dos bacteriófagos. Esses dois ciclos iniciam-se, por exemplo, com o fago T4 aderindo à superfície da célula bacteriana, utilizando as fibras protéicas da cauda. O DNA do vírus é, então, injetado para o interior da bactéria, ficando fora da célula a cápsula protéica vazia. A partir desse momento, começa a diferenciação entre o ciclo lítico e ciclo lisogênico.
A maior parte dos vírus, ao infectar uma célula animal, penetra com o capsídeo e o ácido nucléico, por um processo de viropexia. Se o vírus for envelopado, o envoltório pode incorporar-se à membrana plasmática da célula hospedeira e apenas o núcleo capsídeo penetra, ou mesmo, pode penetrar com todas as suas estruturas por viropexia. No interior dessa célula, o capsídeo rompe-se, liberando o ácido nucléico.

4.1. Ciclo Lítico

No ciclo lítico, o DNA viral, já no interior da bactéria, interrompe as funções normais da célula hospedeira e passa a comandar o seu metabolismo. Os genes do bacteriófago são transcritos em moléculas de RNA e traduzidos em proteínas virais. Isso ocorre porque as enzimas de transcrição e tradução da bactéria não distinguem os genes do invasor de seus próprios genes.
As primeiras proteínas virais que se formam são enzimas capazes de multiplicar o DNA viral ou inibir o funcionamento do cromossomo bacteriano. O passo seguinte é a produção das proteínas que constituirão as cabeças e caudas dos novos vírus, para depois se agregarem ao DNA, formando vírus completos. Cerca de 30 minutos após a entrada de um único fago invasor na célula bacteriana, cerca de 200 novos bacteriófagos são produzidos. Nesse momento inicia-se a lise, ou seja, a ruptura da célula bacteriana, e os novos bacteriófagos são libertados, podendo infectar outras bactérias e iniciar outro ciclo. Em vírus humanos e de animais, a produção maciça de vírus provoca um esgotamento da célula, favorecendo a lise celular. A célula produz grande quantidade de vírus e fica sem poder compor suas próprias estruturas. Os vírus que apresentam o ciclo lítico são chamados de virulentos ou vírus líticos.

4.2. Ciclo Lisogênico

No ciclo lisogênico, o DNA viral penetra na célula da bactéria e se incorpora ao DNA bacteriano, não interferindo no metabolismo da célula hospedeira. Essas bactérias são denominadas lisogênicas e esses vírus são denominados temperados ou não-virulentos. Nesses casos, a bactéria se reproduz normalmente e, a cada divisão da célula bacteriana, o DNA viral vai sendo transmitido às novas bactérias, sem se manifestar.
De acordo com determinadas condições, naturais ou artificias (como radiações ultravioleta, raios X ou certos agentes químicos), o DNA do fago separa-se do DNA bacteriano e inicia-se o ciclo lítico.
Esquema do ciclo lítico e do ciclo lisogênico de um vírus

4.3. A Liberação do vírus

A liberação do vírus pode ocorrer por esgotamento celular, havendo o rompimento da célula, como se a célula fosse desintegrando (é o caso da pólio ou dos bacteriófagos).
Ou pode ocorrer de forma lenta, em que o vírus leva uma porção da membrana da célula que irá constituir o envelope. Este é adquirido através de um processo conhecido como "brotamento" (uma forma de exocitose), nesta membrana o vírus agrega proteínas (espículas) por ele codificado, e que terá o papel de adsorver às células hospedeiras.

5. Viroses

O que diferencia os vírus de todos os outros seres vivos é que eles são acelulares, ou seja, não possuem estrutura celular. Assim, não têm a complexa maquinaria bioquímica necessária para fazer funcionar seu programa genético e precisam de células que os hospedem. Todos os vírus são parasitas intracelulares obrigatórios. Atuando como um "pirata" celular, um vírus invade uma célula e assume o comando, fazendo com que ela trabalhe quase que exclusivamente para produzir novos vírus. A infecção viral geralmente causa profundas alterações no metabolismo celular, podendo levar à morte das células infectadas. Vírus causam doenças em plantas e em animais, incluindo o homem. Fora da célula hospedeira, os vírus não manifestam nenhuma atividade vital: não crescem, não degradam nem fabricam substâncias e não reagem a estímulos. No entanto, se houver células hospedeiras compatíveis à sua disposição, um único vírus é capaz de originar em cerca de 20 minutos, centenas de novos vírus.

6. Bacteriófago

É um vírus muito estudado, pode ser vírus de DNA ou de RNA. São formados apenas pelo núcleo capsídeo, ou seja, não existem formas envelopadas. Os mais estudados são os que infectam a bactéria intestinal Escherichia coli, conhecidos como Bacteriófago ou fagos T2 e T4. Estes são constituídos por uma cápsula protéica bastante complexa, que apresenta uma região denominada cabeça, com formato poligonal, onde se aloja o ácido nucléico, e uma região denominada cauda, com formato cilíndrico, contendo, em sua extremidade livre, fibras protéicas. Quando o bacteriófagos entra em contato com a bactéria, adere à parede celular por meio de certas proteínas presentes nas fibras de sua cauda. Na cauda estão também presentes enzimas que, ativada após o reconhecimento molecular, são capazes de digerir e perfurar a parede da célula bacteriana.

7. Doenças causadas por vírus

7.1. Varíola

Transmissão: gotículas de saliva, contato direto, objetos contaminados (copos, garfos etc).
Modo de infecção: o vírus penetra pelas mucosas das vias respiratórias, dissemina-se pela corrente circulatória e instala-se na pele e mucosas, causando as ulcerações da doença.
Sintomas: As primeiras manifestações da varíola são febre, dor de cabeça, moleza, dores lombares, dor nas pernas e vômitos. Passada essa fase, começa a erupção cutânea, à primeira vista semelhante à da catapora. As erupções surgem na cabeça e vão descendo pelo resto do corpo; inicialmente, são manchas, em seguida transformam-se em vesículas de tamanho irregular e cheias de pus. Depois de secas, as vesículas ficam se cobertas por ima crosta que cai dentro de 10 dias, deixando cicatrizes profundas.
Controle (profilaxia): Aplicação de vacina antivariólica a partir dos 8 meses de idade. Apesar de ainda constar como compulsória, a vacinação antivariólica já não é realizada com regularidade, pois a doença é considerada erradicada. Na eventualidade de surgir algum caso ou suspeita de contágio, há tempo para se fazer a vacina protetora.

7.2. Febre Amarela

Transmissão: através da picada do mosquito Aedes aegypti, que se contamina ao picar um homem ou outro mamífero contaminado. A febre amarela é uma enfermidade infeciosa e epidêmica produzida por um vírus filtrável e transmitida ao homem pelo mosquito Aedes aegypti. Caracterizada por uma evolução em duas fases: - A primeira, congestiva e a Segunda, ictérica e hemorrágica, separadas por uma fase de remissão.
Conhece-se perfeitamente como se transmite essa enfermidade, desde as pesquisas da Comissão Norte-americana que atuou em Cuba, presidida por Walter Reed, as quais demonstram o seguinte:
  1. A fêmea do mosquito Aedes aegypti é a que transmite a febre amarela, se previamente houver sugado o sangue de um enfermo dessa febre durante os três primeiros dias da enfermidade.
  2. Depois de picar, necessita o mosquito de 12 dias até torna-se infetante. Fica depois infetante até morrer.
Modo de infecção: o vírus é introduzido juntamente com a saliva do mosquito; dissemina-se pelo corpo através do sangue e instala-se no fígado, baço, rins, medula óssea e gânglios linfáticos.
Controle (profilaxia): vacinação com linhagem de vírus atenuada (vírus vivos). Eliminação do mosquito Aedes, vetor da doença.

7.3. Sarampo

Transmissão: gotículas de saliva. Doença infecciosa própria da infância, causada por um vírus transmitido por contato com o doente ou por objetos contaminados. No Brasil, os surtos de sarampo ocorrem principalmente de agosto a novembro. Ataca principalmente as crianças entre 6 meses e 6 anos de idade, embora também possa ser contraída por adultos. A pessoa que já teve sarampo fica imunizada, e a imunidade é transmitida pela mãe ao bebê até os 4 ou 6 meses de idade, principalmente se ele receber leite materno. O período de contágio vai de 5 dias antes até 5 dias depois do aparecimento da erupção característica. O período de incubação é, em média, de 10 dias, podendo variar de 9 a 14 dias.
Modo de infecção: o vírus penetra pela mucosa das vias respiratórias, cai na corrente sangüínea e se dissemina por diversas partes do corpo.
Sintomas: Os primeiros sintomas do sarampo são semelhantes aos de uma gripe: durante 4 ou 5 dias, a criança tem febre alta, tosse, mal-estar e fica com os olhos vermelhos. O diagnóstico só é possível ao se encontrar na boca, na altura do segundo molar, uma série de manchinhas brancas (manchas de Koplik) e manchas vermelhas irregulares na abóboda palatina e na garganta (exantema).
Depois desses sintomas, as manchas vermelhas (exantemas) surgem atrás da orelha, espalhando-se em seguida pelo rosto, pescoço, tronco e membros. Com o aparecimento da erupção costumam se atenuar os sintomas anteriores, embora persistam a tose e a irritação dos olhos, que ficam muito sensível à luz. Durante toda a doença, há acentuada queda do apetite e mal-estar geral. As manchas começam a sumir 5 dias depois da primeira erupção, na ordem em que aparecem.
Controle (profilaxia): vacinação com vírus vivo de linhagem atenuada.

7.3. Poliomielite

Transmissão: "incerta ". Também conhecida como paralisia infantil, é uma doença infecciosa provocada por vírus. Ataca principalmente crianças entre 6 meses e 4 anos de idade. Trata-se de moléstia grave e altamente contagiosa. As epidemias costumam ocorrer no verão e no início do outono.
Sintomas: Os primeiros sinais da poliomielite são os comuns a todas as infecções: prostração, febre e dor de cabeça. podem aparecer também vômitos, prisão de ventre ou diarréia leve, dores nas pernas e vermelhidão na garganta. O sintoma característico da doença, contudo, é a dificuldade da criança de colocar a testa no joelho ou de dobrar a cabeça a ponto de colocar o queixo no peito.
Modo de infecção: acredita-se que o vírus penetre pela boca e se multiplique primeiro na garganta e nos intestinos. Daí dissemina-se pelo corpo, através do sangue. Se atingir células nervosas ele as destrói, o que causa paralisia e atrofia da musculatura esquelética, geralmente das pernas.
Controle (profilaxia): Existe um meio absolutamente seguro de livrar as crianças da poliomielite: a vacina Sabin, aplicada a partir dos 2 meses de idade. Em casos de epidemia, não há razão de preocupação se a criança já recebeu todas as doses da vacina ou se foi vacinada nos últimos 2 ou 3 meses. No entanto, se não recebeu todas as doses ou se recebeu a última dose há mais de 3 meses, deve receber logo uma dose de reforço. (vacina Salk = injeção) ou com vírus vivo atenuado (vacina Sabin = gotas).

7.4. Caxumba

Transmissão: gotículas de saliva, contato direto, objetos contaminados (copos, garfos etc).
Sintomas: O período de incubação habitual é de 17 a 21 dias, mais pode variar de 7 a 30 dias.
Antes aparecem os sintomas característicos da enfermidade pode, às vezes, notar-se ligeira febre, inapetência e abatimento.
O que permite diagnosticar a enfermidade, é a inchação e a dor que se produzem em uma e depois nas duas glândulas parótidas, situadas abaixo e também um pouco adiante e atrás das orelhas, o que da o aspecto característico. Ao examinar na face interna da bochecha o ponto em que desemboca o canal de Stenon, que é o que leva a saliva, da parótida à boca, observa-se que essa saliência é avermelhada. A quantidade de saliva , da parótida pode estar diminuída ou aumentada. Às vezes a inflamação pode atingir outras glândulas salivares tais como submaxilares e sublinguais.
Modo de infecção: o vírus ataca normalmente as glândulas salivares parótidas, podendo, entretanto, localizar-se nos testículos, ovários, pâncreas e cérebro.
Controle (profilaxia): vacinação.
É mito a idéia de que a caxumba é mais perigosa para os meninos do que para as meninas. Ela realmente pode “descer”, como se diz, porém a probabilidade é igual para os dois sexos. É raro acontecer, mas ela pode dar origem a uma inflamação do testículo (orquite) ou dos ovários (ooforite). “Quando isso ocorre, nos meninos, o testículo dói e pode aumentar de tamanho; as meninas sentem dor abdominal”, explica Ricardo Chaves. Essa inflamação, em raríssimas ocasiões e dependendo da intensidade, pode levar à esterilidade. “É muito incomum, mas quando isso acontece, só é descoberto quando a pessoa atinge a idade reprodutiva”, afirma o pediatra.

7.5. Raiva

Transmissão: pela mordedura de animal infectado, geralmente o cão ou morcego.
Modo de infecção: o vírus penetra pelo ferimento da mordedura juntamente com a saliva do cão. Atinge o sistema nervoso central, onde se multiplica, causando danos irreparáveis ao sistema nervoso.
Controle (profilaxia): Tão logo seja mordida ou lambida por um animal infectado, a criança deve ser vacinada ou receber soro anti-rábico. Ainda em casa, a mãe pode tentar matar o vírus, lavando o local da mordida com sabão e álcool - mas em seguida deve levar ao médico. Vacinação dos cães, eliminação dos cães de rua, vacinação de pessoas mordidas por cães desconhecidos ou com suspeita de portar a doença.

7.6. Encefalites Virais

Transmissão: picada de mosquitos e de carrapatos.
Modo de infecção: o vírus é introduzido na corrente sangüínea pela picada do artrópodo portador. Atinge as células do cérebro,onde se reproduz.
Controle (profilaxia): combate aos artrópodos vetores. Não existem vacinas.

7.7. Rubéola

Transmissão: O contágio é feito pela respiração do ar contaminado por vírus, e se dá de 7 dias antes a 5 dias depois do aparecimento de manchas vermelhas na pele. O período de incubação da doença é de 16 a 18 dias.
Modo de infecção: inicia-se com fracas dores de cabeça, febre baixa, aumento das glândulas do pescoço, ocorrendo, em seguida, o exantema com manchas vermelhas por todo o corpo. Em geral é doença benigna da infância. Pode ser muito grave em gestantes nos primeiros meses.
Sintomas: A forma mais leve de rubéola provoca erupções avermelhadas na pele, que desaparecem depois de 2 ou 3 dias, sem qualquer outro sintoma. Em outros casos, a erupção é mais intensa e precedida por febre, mal-estar, aumento dos gânglios localizados atrás das orelhas e na nuca e eventualmente tosse, sendo fácil confundir a doença com sarampo.
Controle (profilaxia): A vacina contra rubéola oferece bom grau de proteção. As meninas devem recebê-la obrigatoriamente antes da adolescência, para evitar riscos numa futura gravidez.

7.8. Gripe

Transmissão: Transmitida por contato direto através do aparelho respiratório e com período de incubação de 36 a 48 horas, a gripe (ou influenza) é causada por vírus de vários tipos. Muitas vezes confundido com resfriado (cujo vírus causador é diferente), ela é pouco freqüente em crianças menores de cinco anos. Os efeitos, diferentes e mais intensos do que os do resfriado, costumam se manifestar por períodos que duram de 4 a 10 dias.
Modo de infecção: o vírus ataca os tecidos das porções superiores do aparelho respiratório; raramente atinge os pulmões.
Controle (profilaxia): Não existe remédio eficaz para a doença, a não ser algumas medidas que evitam complicações maiores e aliviam alguns dos efeitos. Os antibióticos são inócuos, mas os antitérmicos podem baixar a febre e os xaropes facilitam a tosse. Convém manter a criança no leito a fim de que não manifestem conseqüências como otite, sinusite e pneumonia, entre outras.

7.9. Hepatite Infecciosa

Transmissão: contaminação de água e objetos por fezes de indivíduos contaminados. "Supõe-se" que moscas transportem o vírus de fezes contaminadas para alimentos, água e objetos.
Modo de infecção: o vírus se multiplica no fígado, causando destruição de células hepáticas.
Controle (profilaxia): medidas de saneamento; fiscalização dos manipuladores de alimentos. A injeção de gamaglobulina, extraída de soro sangüíneo humano, pode conferir proteção temporária.

7.10. Herpes

Transmissão: contato direto com herpéticos na fase de manifestação da doença.
Beijo - É uma forma de contágio fácil, mesmo que a pessoa não tenha nenhuma ferida aparente, pode ser portadora do vírus, o que é suficiente para infectar o outro, mas não significa que a doença irá se manifestar.
Copo - Beber água no mesmo copo de uma pessoa portadora do vírus também facilita o contágio. A pessoa também pode se contaminar apenas estando em um ambiente onde há alguém com o vírus.
Sol - A radiação dos raios ultra-violeta (UVA e UVB) agem bloqueando a ação das células de defesa do organismo e reduzindo a proteção imunológica. Estresse, fadiga, cigarro, bebida alcólica em excesso e menstruação também baixam a resistência imunológica
Modo de infecção: o tipo I, mais freqüente, desenvolve lesões na pele e na boca; o tipo II ou herpes genital é DST. Nos dois surgem pequenas bolhas, que se ulceram, havendo a seguir a cicatrização da pele, sem dar sinal da manifestação do vírus. Estes podem ficar latentes por muito tempo, até voltarem a se manifestar.
Controle (profilaxia): evitar contato direto com herpéticos em fase de manifestação da doença. Produtos capazes de abortar a manifestação herpética, quando ingeridos aos primeiros sinais de uma possível infecção.

7.11. Dengue

Transmissão: picada do Aedes aegypti, durante o dia.
Modo de infecção: forma benigna e forma hemorrágica, a qual pode levar à morte. Dores de cabeça e nas juntas, fraqueza, falta de apetite, febre e pele manchada. Nunca se deve tomar medicamentos que contenham ácido acetilsalicílico.
Controle (profilaxia) Não há, pois seria necessário evitar a picada dos mosquitos
Febre hemorrágica: Em função da inflamação dos vasos (por causa da instalação dos vírus no tecido que os envolve), há um consumo exagerado de plaquetas, pequenos soldados que trabalham contra as doenças. A falta de plaquetas interfere na homeostase do corpo - capacidade de controlar espontaneamente o fluxo de sangue. O organismo passa a apresentar uma forte tendência a ter hemorragias. Pode ocorrer:
1 - Se a pessoa tem dengue pela segunda vez (outro tipo de vírus), pode contrair a hemorrágica.
2 - Há quatro sorotipos diferentes de dengue. Um deles, o den2, é o mais intenso. Este tipo pode evoluir para a dengue hemorrágica.
3 - Combinação da seqüência de doença, da força do vírus e da suscetibilidade da pessoa. Se for alguém com Aids, por exemplo, a doença oferece mais riscos.

8. Vírus HIV

8.1. Introdução

A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) foi reconhecida em meados de 1981, nos EUA, a partir da identificação de um número elevado de pacientes adultos do sexo masculino, homossexuais e moradores de São Francisco ou Nova York, que apresentavam sarcoma de Kaposi, pneumonia por Pneumocystis carinii e comprometimento do sistema imune, o que levou à conclusão de que se tratava de uma nova doença, ainda não classificada, de etiologia provavelmente infecciosa e transmissível.

8.2. Vírus HIV - Vírus da Imunodeficiência Humana

Em 1983, o HIV-1 foi isolado de pacientes com AIDS pelos pesquisadores Luc Montaigner, na França, e Robert Gallo, nos EUA, recebendo os nomes de LAV (Lymphadenopathy Associated Virus ou Virus Associado à Linfadenopatia) e HTLV-III (Human T-Lymphotrophic Virus ou Vírus T-Linfotrópico Humano tipo lll) respectivamente nos dois países. Em 1986, foi identificado um segundo agente etiológico, também retrovírus, com características semelhantes ao HIV-1, denominado HIV-2. Nesse mesmo ano, um comitê internacional recomendou o termo HIV (Human Immunodeficiency Virus ou Vírus da Imunodeficiência Humana) para denominá-lo, reconhecendo-o como capaz de infectar seres humanos.
O HIV é um retrovírus com genoma RNA, da família Lentiviridae. Pertence ao grupo dos retrovírus citopáticos e não-oncogênicos que necessitam, para multiplicar-se, de uma enzima denominada transcriptase reversa, responsável pela transcrição do RNA viral para uma cópia DNA, que pode, então, integrar-se ao genoma do hospedeiro.
Embora não se saiba ao certo qual a origem do HIV-1 e 2 , sabe-se que uma grande família de retrovírus relacionados a eles está presente em primatas não-humanos, na África sub-Sahariana. Todos os membros desta família de retrovírus possuem estrutura genômica semelhante, apresentando homologia em torno de 50%. Além disso, todos têm a capacidade de infectar linfócitos através do receptor CD4. Aparentemente, o HIV-1 e o HIV-2 passaram a infectar o homem há poucas décadas; alguns trabalhos científicos recentes sugerem que isso tenha ocorrido entre os anos 40 e 50. Numerosos retrovírus de primatas não-humanos encontrados na África têm apresentado grande similaridade com o HIV-1 e com o HIV-2. O vírus da imunodeficiência símia (SIV), que infecta uma subespécie de chimpanzés africanos, é 98% similar ao HIV-1, sugerindo que ambos evoluíram de uma origem comum. Por esses fatos, supõe-se que o HIV tenha origem africana. Ademais, diversos estudos sorológicos realizados na África, utilizando amostras de soro armazenadas desde as décadas de 50 e 60, reforçam essa hipótese.
O HIV é bastante lábil no meio externo, sendo inativado por uma variedade de agentes físicos (calor) e químicos (hipoclorito de sódio, glutaraldeído). Em condições experimentais controladas, as partículas virais intracelulares parecem sobreviver no meio externo por até, no máximo, um dia, enquanto que partículas virais livres podem sobreviver por 15 dias, à temperatura ambiente, ou até 11 dias, a 37ºC.
Recentemente, têm sido descritas, ainda, variantes genômicas (subtipos), tanto de HIV-1 quanto de HIV-2, em pacientes infectados procedentes de diferentes regiões geográficas. Classificam-se, assim, os isolados de HIV-1 em dois grupos, M (major) e O (outlier), com variabilidade genética de até 30%. No grupo M, identificam-se nove subtipos (A, B, C, D, E, F, G, H e I), e no grupo O, apenas um. Em relação ao HIV-2 descrevem-se cinco subtipos: A, B, C, D, e E. Embora ainda não conhecida, especula-se a possibilidade de variantes virais possuírem diferentes índices de transmissibilidade e/ou patogenicidade.
Há dois tipos de HIV: HIV-1, que mostrou ser a causa principal da AIDS, e HIV-2, que também pode causar a doença.
O vírus HIV é um retrovírus envelopado, possui duas moléculas de RNA, que estão dispostas no interior do capsídeo. Esse conjunto é envolto por mais uma camada protéica, formando uma estrutura denominada core. Envolvendo o core, existe o envelope, composto por uma camada dupla de fosfolipídios, na qual estão imersas várias moléculas protéicas específicas desse vírus. Na face interna da camada de lipídios, prendem-se várias outras moléculas protéicas.
No interior do vírus, existem moléculas da enzima transcriptase reversa, que permitem ao vírus fazer uma molécula de DNA a partir da molécula de RNA viral (a transcriptase reversa ocorre não só no vírus da AIDS, mas em todos os demais membros da família Retroviridae).
Esquema do vírus HIV
Ciclo vital do HIV na célula humana.
ligação de glicoproteínas virais (gp120) ao receptor específico da superfície celular (principalmente linfócitos T-CD4); fusão do envelope do vírus com a membrana da célula hospedeira; liberação do "core" do vírus para o citoplasma da célula hospedeira; transcrição do RNA viral em DNA complementar, dependente da enzima transcriptase reversa; transporte do DNA complementar para o núcleo da célula, onde pode haver integração no genoma celular (provírus), dependente da enzima integrase, ou a permanência em forma circular, isoladamente; o provírus é reativado, e produz RNA mensageiro viral, indo para o citoplasma da célula; proteínas virais são produzidas e quebradas em subunidades, por intermédio da enzima protease; as proteínas virais produzidas regulam a síntese de novos genomas virais, e formam a estrutura externa de outros vírus que serão liberados pela célula hospedeira; e o vírion recém-formado é liberado para o meio circundante da célula hospedeira, podendo permanecer no fluído extracelular, ou infectar novas células.
A interferência em qualquer um destes passos do ciclo vital do vírus impediria a multiplicação e/ou a liberação de novos vírus. Atualmente estão disponíveis comercialmente drogas que interferem em duas fases deste ciclo: a fase 4 (inibidores da transcriptase reversa) e a fase 7 (inibidores da protease).

8.3. Células infectadas pelo o vírus HIV

O primeiro estágio de qualquer infecção viral é a adsorção do vírus a receptores da membrana plasmática da célula susceptível.
Sabe-se que a afinidade com as células hospedeiras depende das proteínas virais. Estas têm afinidade somente com determinadas proteínas presentes na membrana plasmática das células-alvo. No caso do vírus da AIDS, as moléculas protéicas de seu envelope têm grande afinidade com uma proteína denominada CD-4, presente na membrana plasmática de algumas células do corpo humano. Essas células são, principalmente, os linfócitos T e os macrófagos.
Um indivíduo com AIDS tem redução no número de linfócitos T, pois o HIV os destrói, causando uma queda bastante acentuada de sua imunidade, ficando o indivíduo suscetível a diversas infecções oportunistas. Já os macrófagos atuam como reservatórios desse vírus, disseminando este vírus pela corrente sangüínea para diferentes órgãos do corpo, como o cérebro e os pulmões.
Recentemente, verificou-se que não são apenas essas as células que contêm a proteína CD-4 na membrana plasmática, e, portanto, são passíveis de infecção pelo HIV. A proteína CD-4 ocorre também nos monócitos do sangue, nos linfócitos B, em alguns tipos celulares dos nódulos linfáticos, no timo, pele, encéfalo, medula óssea vermelha e intestinos. Os linfócitos presentes no sêmen e no fluido vaginal também podem ser infectados pelo HIV.
Esquema do vírus HIV atacando um linfócito T e, posteriormente, saindo do linfócito.

8.4. Formas de transmissão

As principais formas de transmissão do HIV são: sexual; sangüínea (em receptores de sangue ou hemoderivados e em usuários de drogas injetáveis, ou UDI); e vertical (da mãe para o filho, durante a gestação, parto ou por aleitamento). Além dessas formas, mais freqüentes, também pode ocorrer a transmissão ocupacional, ocasionada por acidente de trabalho, em profissionais da área da saúde que sofrem ferimentos com instrumentos pérfuro-cortantes contaminados com sangue de pacientes infectados pelo HIV.

8.4.1. Sexual

A principal forma de exposição em todo o mundo é a sexual, sendo que a transmissão heterossexual, nas relações sem o uso de preservativo é considerada pela OMS como a mais freqüente. Na África sub-Sahariana, é a principal forma de transmissão. Nos países desenvolvidos, a exposição ao HIV por relações homossexuais ainda é a responsável pelo maior número de casos, embora as relações heterossexuais estejam aumentando proporcionalmente como uma tendência na dinâmica da epidemia.
Os fatores que aumentam o risco de transmissão do HIV em uma relação heterossexual são: alta viremia, imunodeficiência avançada, relação anal receptiva, relação sexual durante a menstruação e presença de outra DST, principalmente as ulcerativas. Sabe-se hoje que as úlceras resultantes de infecções sexualmente transmissíveis como cancro mole, sífilis e herpes genital, aumentam muito o risco de transmissão do HIV.

8.4.2. Sangüínea

A transmissão sangüínea associada ao uso de drogas injetáveis é um meio muito eficaz de transmissão do HIV, devido ao uso compartilhado de seringas e agulhas. Essa via de transmissão adquire importância crescente em várias partes do mundo, como na Ásia, América Latina e no Caribe.
A transmissão mediante transfusão de sangue e derivados é cada vez menos relevante nos países industrializados e naqueles que adotaram medidas de controle da qualidade do sangue utilizado, como é o caso do Brasil.

8.4.3. Vertical

A transmissão vertical, decorrente da exposição da criança durante a gestação, parto ou aleitamento materno, vem aumentando devido à maior transmissão heterossexual. Na África, são encontradas as maiores taxas desta forma de infecção pelo HIV, da ordem de 30 a 40%; entretanto, em outras partes do mundo, como na América do Norte e Europa, situam-se em torno de 15 a 29%. Os principais motivos dessa diferença devem-se ao fato de que, na África, a transmissão heterossexual é mais intensa, e que neste continente, o aleitamento materno é muito mais freqüente do que nos países industrializados.
A transmissão intra-uterina é possível em qualquer fase da gravidez; porém é menos freqüente no primeiro trimestre. As infecções ocorridas nesse período não têm sido associadas a malformações fetais. O risco de transmissão do HIV da mãe para o filho pode ser reduzido em até 67% com o uso de AZT durante a gravidez e no momento do parto, associado à administração da mesma droga ao recém-nascido por seis semanas.
Um estudo realizado nos Estados Unidos (Aids Clinical Trial Group 076 ou ACTG-076) demonstrou redução na transmissão vertical de 25,6% para 8,3% com o uso de AZT durante a gravidez. A transmissão pelo leite materno é evitada com o uso de leite artificial ou de leite humano processado em bancos de leite, que fazem aconselhamento e triagem das doadoras.

8.4.4. Ocupacional

A transmissão ocupacional ocorre quando profissionais da área da saúde sofrem ferimentos com instrumentos pérfuro-cortantes contaminados com sangue de pacientes portadores do HIV. Estima-se que o risco médio de contrair o HIV após uma exposição percutânea a sangue contaminado seja de aproximadamente 0,3%. Nos caso de exposição de mucosas, esse risco é de aproximadamente 0,1%. Os fatores de risco já identificados como favorecedores deste tipo de contaminação são: a profundidade e extensão do ferimento a presença de sangue visível no instrumento que produziu o ferimento, o procedimento que resultou na exposição e que envolveu a colocação da agulha diretamente na veia ou artéria de paciente portador de HIV e, finalmente, o paciente fonte da infecção mostrar evidências de imunodeficiência avançada, ser terminal ou apresentar carga viral elevada.

8.4.5. Outras possíveis formas de transmissão

Embora o vírus tenha sido isolado de vários fluidos corporais, como saliva, urina, lágrimas, somente o contato com sangue, sêmen, secreções genitais e leite materno têm sido implicados como fontes de infecção.
O risco da transmissão do HIV por saliva foi avaliado em vários estudos laboratoriais e epidemiológicos. Esses estudos demonstraram que a concentração e a infectividade dos vírus da saliva de indivíduos portadores do HIV é extremamente baixa.
Até o momento, não foi possível evidenciar, com segurança, nenhum caso de infecção por HIV adquirido por qualquer das seguintes vias teóricas de transmissão: contato interpessoal não-sexual e não-percutâneo (contato casual), vetores artrópodes (picadas de insetos), fontes ambientais (aerossóis, por exemplo) e objetos inanimados (fômites), além de instalações sanitárias. Há raros relatos anedóticos de hipotética transmissão horizontal do HIV; porém, estes não resistem a uma análise mais cuidadosa, e as evidências são insuficientes para caracterizar formas não-tradicionais de transmissão.
Dados laboratoriais e epidemiológicos não provêm qualquer suporte à possibilidade teórica de transmissão por artrópodes atuando como vetores biológicos ou mecânicos. Não foi possível evidenciar qualquer multiplicação do HIV em artrópodes após inoculação intra-abdominal, intratorácica ou após repasto de sangue infectado. Outros estudos demonstraram ausência de replicação do HIV em linhagens celulares derivadas de artrópodes. Estudos epidemiológicos nos Estados Unidos, Haiti e África Central não demonstraram qualquer evidência de transmissão por vetores.
Conclui-se que formas alternativas de transmissão são altamente improváveis, e que a experiência cumulativa é suficientemente ampla para se assegurar enfaticamente que não há qualquer justificativa para restringir a participação de indivíduos infectados nos seus ambientes domésticos, escolares, sociais ou profissionais.

8.5. Prevenção e controle

As principais estratégias de prevenção empregadas pelos programas de controle envolvem: a promoção do uso de preservativos, a promoção do uso de agulhas e seringas esterilizadas ou descartáveis, o controle do sangue e derivados, a adoção de cuidados na exposição ocupacional a material biológico e o manejo adequado das outras DST.

8.5.1. Preservativos

Os preservativos masculinos e femininos são a única barreira comprovadamente efetiva contra o HIV, e o uso correto e consistente deste método pode reduzir substancialmente o risco de transmissão do HIV e das outras DST.
O uso regular de preservativos pode levar ao aperfeiçoamento na sua técnica de utilização, reduzindo a freqüência de ruptura e escape e, consequentemente, aumentando sua eficácia. Estudos recentes demonstraram que o uso correto e sistemático do preservativo masculino reduz o risco de aquisição do HIV e outras DST em até 95%.

8.5.2. Espermicidas

Os produtos espermicidas à base de nonoxinol-9 são capazes de inativar o HIV e agentes de outras DST "in vitro", e poderiam ter um papel importante na redução da transmissão sexual do HIV, se usados em associação com os preservativos. Estudos recentes sugerem que a concentração de nonoxinol-9, normalmente preconizada nos preservativos, seria insuficiente para inativar o HIV, sendo que o uso de concentrações mais elevadas poderiam apresentar toxicidade. Entretanto, a segurança e eficácia dos espermicidas atualmente disponíveis, nas condições de uso corrente, não estão bem estabelecidas, e mais estudos clínicos controlados são necessários para esta determinação.

8.5.3. Prevenção em usuários de drogas injetáveis (UDI)

Desde 1986, ficou claro que os UDI representavam um grupo focal particularmente importante, devido ao risco específico de ocorrência de epidemias de HIV nesta população, e ao potencial de representarem a interface através da qual a infecção por HIV se difundiria para a população heterossexual não usuária de drogas e consequentemente para as crianças.
A disseminação da infecção pelo HIV entre UDI em muitos países com características diferentes, levantou importantes questões sobre a natureza do comportamento dos dependentes, e da possibilidade de modificá-lo mediante intervenções preventivas, de modo a reduzir a transmissão do HIV.
Houve ceticismo inicial acerca da eficácia de ações educativas nessa população. O temor de que a estratégia de redução de danos, baseadas na facilitação do acesso a equipamento estéril de injeções pudesse levar ao aumento da população de usuários de drogas injetáveis, não se concretizou.
Há atualmente evidências suficientes para concluir que foi possível reduzir o nível epidêmico da transmissão do HIV em locais onde programas inovadores de saúde pública foram iniciados precocemente.
Os elementos desses programas de prevenção incluem orientação educativa, disponibilidade de testes sorológicos, facilitação de acesso aos serviços de tratamento da dependência de drogas, acesso a equipamento estéril de injeção, além de ações que se desenvolvem na comunidade de usuários de drogas a partir da intervenção de profissionais de saúde e/ou agente comunitários, recrutados na própria comunidade.
Em relação às mudanças comportamentais, demonstrou-se que os UDI podem ser sensíveis às ações preventivas e capazes de reduzir a freqüência das situações de risco. Porém, se todos os estudos demonstram redução de risco, evidenciam, infelizmente, a persistência de níveis importantes do comportamento de risco, mesmo nas cidades onde se obteve razoável impacto com as ações preventivas.

8.5.4. Exposição ocupacional

Embora alguns tipos de exposição acidental, como o contato de sangue ou secreções com mucosas ou pele íntegra teoricamente possam ser responsáveis por infecção pelo HIV, os seus riscos são insignificantes quando comparados com a exposição percutânea, através de instrumentos pérfuro-cortantes. Fatores como prevalência da infecção pelo HIV na população de pacientes, grau de experiência dos profissionais de saúde no cuidado desse tipo de paciente, uso de precauções universais (luvas, óculos de proteção, máscaras, aventais, etc.), bem como a freqüência de utilização de procedimentos invasivos, podem também influir no risco de transmissão do HIV.
O meio mais eficiente para reduzir tanto a transmissão profissional-paciente quanto a paciente-profissional, baseia-se na utilização sistemática das normas de biossegurança, na determinação dos fatores de risco associados, e na sua eliminação, bem como na implantação de novas tecnologias da instrumentação usadas na rotina de procedimentos invasivos.

8.6. Testes diagnósticos

Os testes para detecção da infecção pelo HIV podem ser divididos basicamente em quatro grupos:
  1. detecção de anticorpos;
  2. detecção de antígenos;
  3. cultura viral;
  4. amplificação do genoma do vírus.
As técnicas rotineiramente utilizadas para o diagnóstico da infecção pelo HIV são baseadas na detecção de anticorpos contra o vírus. Estas técnicas apresentam excelentes resultados e são menos dispendiosas, sendo de escolha para toda e qualquer triagem inicial. Porém detectam a resposta do hospedeiro contra o vírus, e não o próprio vírus diretamente. As outras três técnicas detectam diretamente o vírus ou suas partículas. São menos utilizadas rotineiramente, sendo aplicadas em situações específicas, tais como: exames sorológicos indeterminados ou duvidosos, acompanhamento laboratorial de pacientes, mensuração da carga viral para controle de tratamento, etc. A seguir, cada técnica será explicada separadamente.

8.6.1. Testes de detecção de anticorpos

ELISA (teste imunoenzimático): este teste utiliza antígenos virais (proteínas) produzidos em cultura celular (testes de primeira geração) ou através de tecnologia molecular recombinante. Os antígenos virais são adsorvidos por cavidades existentes em placas de plástico e, a seguir, adiciona-se o soro do paciente. Se o soro possuir anticorpos específicos, estes serão fixados sobre os antígenos. Tal fenômeno pode ser verificado com a adição de uma antiimunoglobulina humana conjugada a uma enzima como, por exemplo, a peroxidase. Em caso positivo ocorre uma reação corada ao se adicionar o substrato específico da enzima. Esta técnica é amplamente utilizada como teste inicial para detecção de anticorpos contra o vírus, devido à sua facilidade de automação e custo relativamente baixo. Apresenta atualmente altas sensibilidade e especificidade.
Western-blot: este ensaio envolve inicialmente a separação das proteínas virais por eletroforese em gel de poliacrilamida, seguida da transferência eletroforética dos antígenos para uma membrana de nitrocelulose. Em um terceiro momento, a membrana é bloqueada com proteínas que são adsorvidas por sítios não ocupados pelos antígenos. Posteriormente a membrana é colocada em contato com o soro que se deseja pesquisar. As reações antígeno-anticorpo são detectadas por meio da reação com antiimunoglobulina humana, conjugada com um radioisótopo ou uma enzima. A revelação é feita por auto-radiografia ou por substrato cromogênico. Geralmente este teste é utilizado para confirmação do resultado reagente ao teste ELISA (ou seja, teste confirmatório da infecção), devido à sua alta complexidade e custo. Tem alta especificidade e sensibilidade.
Imunofluorescência indireta: fixadas em lâminas de microscópio, as células infectadas (portadoras de antígenos) são incubadas com o soro que se deseja testar. Depois, são tratadas com outro soro que contenha anticorpos específicos para imunoglobulina humana (anti-lg) conjugados a um fluorocromo. A presença dos anticorpos é revelada por meio de microscopia de fluorescência. Também é utilizada como teste confirmatório.
Radioimunoprecipitação: a detecção dos anticorpos decorre de reações com antígenos radioativos. Estes antígenos são obtidos de células infectadas, mantidas na presença de radioisótopos durante a síntese de proteínas virais. Precipitados formados da reação desses antígenos com anticorpos específicos são sedimentados, dissociados com detergente, e depois, analisados por eletroforese em gel de poliacrilamida. Segue-se a auto-radiografia. É uma técnica menos conhecida, mas que pode ser utilizada para confirmação de diagnóstico. Outros testes para detecção de anticorpos: um grande número de testes rápidos para estudos de campo, triagens de grandes populações e para decisões terapêuticas em situações de emergência vêm sendo desenvolvidos, geralmente baseados em técnicas de aglutinação em látex e hemaglutinação.

8.6.2. Testes de detecção de antígeno VIRAL

Pesquisa de Antígeno p24: este teste quantifica a concentração da proteína viral p24 presente no plasma ou no sobrenadante de cultura de tecido. Embora esta proteína esteja presente no plasma de pacientes em todos os estágios da infecção pelo HIV, sua maior prevalência ocorre antes da soroconversão e nas fases mais avançadas da doença; o teste é realizado mediante a utilização da técnica de ELISA (imunoenzimático).

8.6.3. Técnicas de cultura viral

Cultura de células mononucleares de sangue periférico para isolamento do HIV: esta técnica foi inicialmente utilizada para caracterizar o HIV como agente causador da aids. As culturas são observadas quanto à evidência de formação sincicial (células gigantes multinucleadas), presença de atividade da transcriptase reversa e produção de antígeno p24 em sobrenadantes. São consideradas positivas quando dois testes consecutivos detectam a presença dos achados acima descritos em valores superiores ao limite de corte (cut-off).
Cultura quantitativa de células: é uma técnica que mede a carga viral intracelular, mediante a diluição seriada decrescente de uma população de 106 células do paciente infectado. Considera-se como positiva a menor diluição capaz de isolar alguma célula infectada.
Cultura quantitativa de plasma: técnica semelhante à anterior, porém utilizando alíquotas decrescentes de plasma. Considera-se como positiva a menor diluição capaz de infectar células mononucleares.

8.6.4. Testes de amplificação do genoma do vírus

Análise quantitativa direta da carga viral através de técnicas baseadas na amplificação de ácidos nucleicos, tais como a reação de polimerase em cadeia (PCR) quantitativa, amplificação de DNA em cadeia ramificada (branched-chain DNA ou bDNA) e amplificação seqüencial de ácidos nucleicos (nucleic acid sequence-based amplification ou NASBA). Embora as técnicas sejam diferentes, o PCR quantitativo e o NASBA apresentam alta sensibilidade, permitindo o acompanhamento da resposta terapêutica antiretroviral. Além disso, valores elevados de partículas virais detectados ao PCR quantitativo ou NASBA parecem estar relacionados com um maior risco de progressão da doença, independente da contagem de células TCD4+. Sugere-se sua monitorização a cada 3-4 meses. Em caso de início ou mudança de terapia antiretroviral, alguns autores recomendam uma dosagem da carga viral com 1 a 2 meses de tratamento, para avaliação da resposta ao esquema. Os resultados devem ser interpretados da seguinte maneira:
Carga viral abaixo de 10.000 cópias de RNA por ml: baixo risco de progressão ou de piora da doença.
Carga viral entre 10.000 e 100.000 cópias de RNA por ml: risco moderado de progressão ou de piora da doença.Carga viral acima de 100.000 cópias de RNA por ml: alto risco de progressão ou de piora da doença.

8.6.5. Contagem de células CD4+ em sangue periférico

A contagem de células T CD4+ em sangue periférico tem implicações prognósticas na evolução da infecção pelo HIV pois é a medida de imunocompetência celular; é mais útil no acompanhamento de pacientes infectados pelo HIV. De maneira didática pode-se dividir a contagem de células T CD4+ em sangue periférico em quatro faixas:
  1. maior que 500 células/mm3: estágio da infecção pelo HIV com baixo risco de doença. Há boa resposta às imunizações de rotina e boa confiabilidade nos testes cutâneos de hipersensibilidade tardia, como o PPD. Casos de infecção aguda podem apresentar estes níveis de células T CD4+, embora, de modo geral, esses pacientes tenham níveis mais baixos.
  2. entre 200 e 500 células/mm3: estágio caracterizado por surgimento de sinais e sintomas menores ou alterações constitucionais. Risco moderado de desenvolvimento de doenças oportunistas. Nesta fase, podem aparecer candidíase oral, herpes simples recorrente, herpes zoster, tuberculose, leucoplasia pilosa, pneumonia bacteriana.
  3. entre 50 e 200 células/mm3: estágio com alta probabilidade de surgimento de doenças oportunistas como pneumocistose, toxoplasmose de SNC, neurocriptococose, histoplasmose, citomegalovirose localizada. Está associado à síndrome consumptiva, leucoencefalopatia multifocal progressiva, candidíase esofagiana, etc.
  4. menor que 50 células/mm3: estágio com grave comprometimento de resposta imunitária. Alto risco de surgimento de doenças oportunistas como citomegalovirose disseminada, sarcoma de Kaposi, linfoma não-Hodgkin e infecção por micobactérias atípicas. Alto risco de vida com baixa sobrevida. Observações Estes valores levam em conta apenas a avaliação quantitativa. Alterações qualitativas na função dos linfócitos podem permitir o surgimento de condições oportunistas em pacientes com níveis diferentes de células T CD4+. Em crianças, a contagem de células T CD4+ tem níveis diferentes de interpretação. Quando não há disponibilidade de quantificação da carga viral, pode-se basear na contagem de células T CD4+ para iniciar ou alterar terapêutica anti-retroviral.
Soroconversão: é a positivação da sorologia para o HIV. A soroconversão é acompanhada de uma queda expressiva na quantidade de vírus no plasma (carga viral), seguida pela recuperação parcial dos linfócitos T CD4+ no sangue periférico. Esta recuperação é devida tanto à resposta imune celular quanto à humoral. Nesta fase observa-se o seqüestro das partículas virais e das células infectadas (linfócitos T-CD4+) pelos órgãos linfóides responsáveis por nossa imunidade, particularmente os linfonodos.
Janela imunológica: é o tempo compreendido entre a aquisição da infecção e a soroconversão (também chamada de janela biológica). O tempo decorrido para a sorologia anti-HIV tornar-se positiva é de seis a 12 semanas após a aquisição do vírus, com o período médio de aproximadamente 2,1 meses. Os testes utilizados apresentam geralmente níveis de até 95% de soroconversão nos primeiros 5,8 meses após a transmissão.

8.7. Aspectos clínicos

A infecção pelo HIV pode ser dividida em quatro fases clínicas:
  1. infecção aguda;
  2. fase assintomática, também conhecida como latência clínica;
  3. fase sintomática inicial ou precoce;
  4. aids.

8.7.1. Infecção aguda

A infecção aguda, também chamada de síndrome da infecção retroviral aguda ou infecção primária, ocorre em cerca de 50% a 90% dos pacientes. Seu diagnóstico é pouco realizado devido ao baixo índice de suspeição, sendo, em sua maioria, retrospectivo. O tempo entre a exposição e os sintomas é de cinco a 30 dias. A história natural da infecção aguda caracteriza-se tanto por viremia elevada, como por resposta imune intensa. Durante o pico de viremia, ocorre diminuição rápida dos linfócitos T CD4+, que posteriormente aumentam, mas geralmente não retornam aos níveis prévios à infecção.
Observa-se, também, aumento do número absoluto de linfócitos T CD8+ circulantes, com a inversão da relação CD4+/CD8+, que se torna menor que um. Este aumento de células T CD8+, provavelmente, reflete uma resposta T citotóxica potente, que é detectada antes do aparecimento de anticorpos neutralizantes. Existem evidências de que a imunidade celular desempenha papel fundamental no controle da viremia na infecção primária.
Os sintomas aparecem durante o pico da viremia e da atividade imunológica. As manifestações clínicas podem variar, desde quadro gripal até uma síndrome mononucleose-like. Além de sintomas de infecção viral, como febre, adenopatia, faringite, mialgia, artralgia, rash cutâneo maculopapular eritematoso, ulcerações muco-cutâneas envolvendo mucosa oral, esôfago e genitália, hiporexia, adinamia, cefaléia, fotofobia, hepatoesplenomegalia, perda de peso, náuseas e vômitos; os pacientes podem apresentar candidíase oral, neuropatia periférica, meningoencefalite asséptica e síndrome de Guillain-Barré. Os achados laboratoriais inespecíficos são transitórios, e incluem: linfopenia seguida de linfocitose, presença de linfócitos atípicos, plaquetopenia e elevação sérica das enzimas hepáticas. Os sintomas duram, em média, 14 dias, sendo o quadro clínico autolimitado. A ocorrência da síndrome de infecção retroviral aguda clinicamente importante ou a persistência dos sintomas por mais de 14 dias parecem estar relacionadas com a evolução mais rápida para aids. O quadro abaixo mostra os sinais e sintomas freqüentemente associados à sindrome viral aguda causada pelo HIV.
Principais sinais e sintomas associados a infecção aguda pelo HIV
Sinais e Sintomas
Freqüência (%)
Febre
80-90
Fadiga
70-90
Exantema
40-80
Cefaléia
32-70
Linfadenopatia
40-70
Faringite
50-70
Mialgia e/ou Artalgia
50-70
Nausea, Vômito e/ou Diarréia
30-60
Suores Noturnos
50
Meningite Asséptica
24
Úlceras Orais
10-20
Úlceras Genitais
5-15
Trombocitopenia
45
Linfopenia
40
Elevação dos níveis séricos de enzimas hepáticas
21

Adaptado de Kahn et al, 1998
Após a resolução da fase aguda, ocorre a estabilização da viremia em níveis variáveis (set points), definidos pela velocidade da replicação e clareamento viral. O set point é fator prognóstico de evolução da doença. A queda da contagem de linfócitos T CD4+, de 30 a 90 células por ano, está diretamente relacionada à velocidade da replicação viral e progressão para a aids.

8.7.2. Fase assintomática

Na infecção precoce pelo HIV, também conhecida como fase assintomática, o estado clínico básico é mínimo ou inexistente. Alguns pacientes podem apresentar uma linfoadenopatia generalizada persistente, "flutuante" e indolor. Portanto, a abordagem clínica nestes indivíduos no início de seu seguimento prende-se a uma história clínica prévia, investigando condições de base como hipertensão arterial sistêmica, diabetes, DPOC, doenças hepáticas, renais, pulmonares, intestinais, doenças sexualmente transmissíveis, tuberculose e outras doenças endêmicas, doenças psiquiátricas, uso prévio ou atual de medicamentos, enfim, situações que podem complicar ou serem agravantes em alguma fase de desenvolvimento da doença pelo HIV. A história familiar, hábitos de vida, como também uma avaliação do perfil emocional e psicossocial do paciente, seu nível de entendimento e orientação sobre a doença são extremamente importantes. No que diz respeito à avaliação laboratorial nesta fase, uma ampla variedade de alterações podem estar presentes. Os exames laboratoriais de rotina recomendados são:
  • Hemograma completo: para avaliação de anemia, leucopenia, linfopenia e plaquetopenia.Níveis bioquímicos: para uma visão das condições clínicas gerais, em particular para conhecimento dos níveis bioquímicos iniciais dos pacientes, principalmente funções hepática e renal, desidrogenase lática, amilase.
  • Sorologia para sífilis: em função do aumento da incidência de co-infecção, visto que a infecção pelo HIV pode acelerar a história natural da sífilis. Recomenda-se o VDRL e se positivo o exame confirmatório FTA-ABS. Pacientes HIV+ com evidências sorológicas de sífilis não tratada devem ser submetidos a punção lombar e avaliação para neurolues.
  • Sorologia para os vírus da hepatite: devido a alta incidência de co-infecção com hepatites B e C nos grupos de homossexuais, bissexuais, heterossexuais com múltiplos parceiros e usuários de drogas injetáveis. O screening recomendado para hepatite B é antígeno de superfície (HBS Ag) e o anticorpo anticore do vírus B (anti-HBc); para a hepatite C: anticorpo contra o vírus da hepatite C (Anti-HCV).
  • Sorologia para toxoplasmose (lgG): em decorrência da maioria dos pacientes apresentar exposição prévia ao Toxoplasma gondii, sendo indicada a profilaxia em momento oportuno, conforme faixa de células T CD4+ do paciente. Os métodos preferenciais são: hemoaglutinação, imunofluorescência ou ELISA.
  • Sorologia para citomegalovírus (CMV) e herpes: embora questionada, indica-se para detecção de infecção latente. Pacientes com sorologia negativa para citomegalovírus devem evitar exposição a hemoderivados de doadores com sorologia positiva, em caso de necessidade de transfusões sangüíneas.
  • Radiografia de tórax: recomenda-se na avaliação inicial como parâmetro basal para possíveis alterações evolutivas no futuro ou em pacientes com história de doença pulmonar freqüente. PPD (derivado protéico purificado): teste recomendado de rotina anual para avaliação da necessidade de quimioprofilaxia para tuberculose. Em paciente com infecção pelo HIV, considera-se uma enduração > 5mm como uma reação forte e indicativa da necessidade de quimioprofilaxia.
  • Papanicolaou: recomendado na avaliação ginecológica inicial, seis meses após e, se resultados normais, uma vez a cada ano. Sua indicação é de fundamental importância, devido a alta incidência de displasia cervical e rápida progressão para o câncer cervical em jovens HIV positivas.
  • Perfil imunológico e carga viral: é, sem dúvida, um dos procedimentos mais importantes na avaliação do paciente com infecção precoce pelo HIV, pois é a partir dela, através da interpretação dos vários testes atualmente disponíveis, que se pode ter parâmetros do real estadiamento da infecção, prognóstico, decisão quanto ao início da terapia anti-retroviral e avaliação da resposta ao tratamento, bem como o uso de profilaxia para as infecções oportunistas mais comuns na ocasião propícia. Recomenda-se a realização periódica de sub-tipagem de células T CD4+ e avaliação quantitativa da carga viral para HIV a cada 3-4 meses.

8.7.3. Fase sintomática inicial

  • Sudorese noturna: é queixa bastante comum e tipicamente inespecífica entre os pacientes com infecção sintomática inicial pelo HIV. Pode ser recorrente e pode ou não vir acompanhada de febre. Nessa situação deve ser considerada a possibilidade de infecção oportunista, particularmente tuberculoses, lançando-se mão de investigação clínica e laboratorial específicas.
  • Fadiga: também é freqüente manifestação da infecção sintomática inicial pelo HIV e pode ser referida como mais intensa no final de tarde e após atividade física excessiva. Fadiga progressiva e debilitante deve alertar para a presença de infecção oportunista, devendo ser sempre pesquisada.
  • Emagrecimento: é um dos mais comuns entre os sintomas gerais associados com infecção pelo HIV, sendo referido em 95-100% dos pacientes com doença em progressão. Geralmente encontra-se associado a outras condições como anorexia. A associação com diarréia aquosa o faz mais intenso.
  • Diarréia: consiste em manifestação freqüente da infecção pelo HIV desde sua fase inicial. Determinar a causa da diarréia pode ser difícil e o exame das fezes para agentes específicos se faz necessário.
  • Na infecção precoce pelo HIV, patógenos entéricos mais comuns devem ser suspeitados: Salmonella sp, Shigella sp, Campylobacter sp, Giardia lamblia, Entamoeba histolytica, adenovírus, rotavírus. Agentes como Cryptosporidium parvum e Isospora belli, geralmente reconhecidos em fase mais avançada da doença causada pelo HIV, podem apresentar-se como expressão clínica autolimitada, principalmente com a elevação da contagem de células T CD4+ obtida com o iníco do tratamento anti-retroviral. Quando a identificação torna-se difícil ou falha, provas terapêuticas empíricas podem ser lançadas, baseando-se nas características epidemiológicas e clínicas do quadro.
  • Sinusopatias: sinusites e outras sinusopatias ocorrem com relativa freqüência entre os pacientes com infecção pelo HIV. A forma aguda é mais comum no estágio inicial da doença pelo HIV, incluindo os mesmos agentes considerados em pacientes imunocompetentes: Streptococus pneumoniae, Moraxella catarrhalis e H. influenzae. Outros agentes como S. aureus e P. aeruginosa e fungos têm sido achados em sinusite aguda, porém seu comprometimento em sinusites crônicas é maior. Febre, cefaléia, sintomas locais, drenagem mucopurulenta nasal fazem parte do quadro.
  • Candidíase Oral e Vaginal (inclusive a recorrente): a candidíase oral é a mais comum infecção fúngica em pacientes portadores do HIV e apresenta-se com sintomas e aparência macroscópica característicos. A forma pseudomembranosa consiste em placas esbranquiçadas removíveis em língua e mucosas que podem ser pequenas ou amplas e disseminadas. Já a forma eritematosa é vista como placas avermelhadas em mucosa, palato mole e duro ou superfície dorsal da língua. A queilite angular, também freqüente, produz eritema e fissuras nos ângulos da boca. Mulheres HIV+ podem apresentar formas extensas ou recorrentes de candidíase vulvo-vaginal, com ou sem acometimento oral, como manifestação precoce de imunodeficiência pelo HIV, bem como nas fases mais avançadas da doença. As espécies patogênicas incluem Candida albicans, C. tropicalis, C. parapsilosis e outras menos comumente isoladas.
  • Leucoplasia Pilosa Oral: é um espessamento epitelial benigno causado provavelmente pelo vírus Epstein-Barr, que clinicamente apresenta-se como lesões brancas que variam em tamanho e aparência, podendo ser planas ou em forma de pregas, vilosidades ou projeções. Ocorre mais freqüentemente em margens laterais da língua, mas podem ocupar localizações da mucosa oral: mucosa bucal, palato mole e duro.
  • Gengivite: a gengivite e outras doenças periodontais pode manifestar-se de forma leve ou agressiva em pacientes com infecção pelo HIV, sendo a evolução rapidamente progressiva, observada em estágios mais avançados da doença, levando a um processo necrotizante acompanhado de dor, perda de tecidos moles periodontais, exposição e seqüestro ósseo.
  • Úlceras Aftosas: em indivíduos infectados pelo HIV é comum a presença de úlceras consideravelmente extensas, resultantes da coalescência de pequenas úlceras em cavidade oral e faringe, de caráter recorrente e etiologia não definida. Resultam em grande incômodo produzindo odinofagia, anorexia e debilitação do estado geral com sintomas constitucionais acompanhando o quadro.
  • Herpes Simples Recorrente: a maioria dos indivíduos infectados pelo HIV é co-infectada com um ou ambos os tipos de vírus herpes simples (1 e 2), sendo mais comum a evidência de recorrência do que infecção primária. Embora o HSV-1 seja responsável por lesões orolabiais e o HSV-2 por lesões genitais, os dois tipos podem causar infecção em qualquer sítio. Geralmente a apresentação clínica dos quadros de recorrência é atípica ao comparar-se aos quadros em indivíduos imunocompetentes, no entanto, a sintomatologia clássica pode manifestar-se independente do estágio da doença pelo HIV.
  • Herpes Zoster: de modo similar ao que ocorre com o HSV em pacientes com doença pelo HIV, a maioria dos adultos foi previamente infectada pelo vírus varicela zoster, desenvolvendo episódios de herpes zoster freqüentes. O quadro inicia com dor radicular, rash localizado ou segmentar comprometendo um a três dermátomos, seguindo o surgimento de maculopapulas dolorosas que evoluem para vesículas com conteúdo infectante. Pode também apresentar-se com disseminação cutânea extensa.
  • Trombocitopenia: na maioria das vezes é uma anormalidade hematológica isolada com um número normal ou aumentado de megacariócitos na medula óssea e níveis elevados de imunoglobulinas associadas a plaquetas, síndrome clínica chamada púrpura trombocitopênica imune. Clinicamente, os pacientes podem apresentar somente sangramentos mínimos como petéquias, equimoses e ocasionalmente epistaxes. Laboratorialmente considera-se o número de plaquetas menor que 100.000 células/mm3.

8.8. Doenças oportunistas

São doenças que se desenvolvem em decorrência de uma alteração imunitária do hospedeiro. Estas são geralmente de origem infecciosa, porém várias neoplasias também podem ser consideradas oportunistas.
As infecções oportunistas (IO) podem ser causadas por microrganismos não considerados usualmente patogênicos, ou seja, não capazes de desencadear doença em pessoas com sistema imune normal. Entretanto, microrganismos normalmente patogênicos também podem, eventualmente, ser causadores de IO. Porém, nesta situação, as infecções necessariamente assumem um caráter de maior gravidade ou agressividade para serem consideradas oportunistas.
As doenças oportunistas associadas à aids são várias, podendo ser causadas por vírus, bactérias, protozoários, fungos e certas neoplasias:
  1. Vírus: Citomegalovirose, Herpes simples, Leucoencafalopatia Multifocal Progressiva.
  2. Bactérias: Micobacterioses (tuberculose e complexo Mycobacterium avium-intracellulare), Pneumonias (S. pneumoniae), Salmonelose.
  3. Fungos: Pneumocistose, Candidíase, Criptococose, Histoplasmose.
  4. Protozoários: Toxoplasmose, Criptosporidiose, Isosporíase.
  5. Neoplasias: sarcoma de Kaposi, linfomas não-Hodgkin, neoplasias intra-epiteliais anal e cervical.

8.9. Tratamento

Existem, até o momento, duas classes de drogas liberadas para o tratamento anti-HIV:

8.9.1. Inibidores da transcriptase reversa

São drogas que inibem a replicação do HIV bloqueando a ação da enzima transcriptase reversa que age convertendo o RNA viral em DNA:
Nucleosídeos:
  • Zidovudina (AZT) cápsula 100 mg, dose:100mg 5x/dia ou 200mg 3x/dia ou 300mg 2x/dia;
  • Zidovudina (AZT) injetável, frasco-ampola de 200 mg;
  • Zidovudina (AZT) solução oral, frasco de 2.000 mg/200 ml;
  • Didanosina (ddI) comprimido 25 e 100mg, dose: 125 a 200mg 2x/dia;
  • Zalcitabina (ddC) comprimido 0,75mg, dose: 0,75mg 3x/dia;
  • Lamivudina (3TC) comprimido 150mg, dose: 150mg 2x/dia;
  • Estavudina (d4T) cápsula 30 e 40mg, dose: 30 ou 40mg 2x/dia;
  • Abacavir comprimidos 300 mg, dose: 300 mg 2x/dia.
Não-nucleosídeos:
  • Nevirapina comprimido 200 mg, dose: 200 mg 2x/dia;
  • Delavirdina comprimido 100 mg, dose: 400 mg 3x/dia;
  • Efavirenz comprimido 200 mg, dose: 600 mg 1x/dia.
Nucleotídeo: Adefovir dipivoxil: comprimido, 60 e 120 mg, dose: 60 ou 120 mg 1x/dia.

8.9.2. Inibidores da protease

Estas drogas agem no último estágio da formação do HIV, impedindo a ação da enzima protease que é fundamental para a clivagem das cadeias protéicas produzidas pela célula infectada em proteínas virais estruturais e enzimas que formarão cada partícula do HIV:
  • Indinavir cápsula 400 mg, dose: 800 mg 3x/dia;
  • Ritonavir cápsula 100mg, dose: 600mg 2x/dia;
  • Saquinavir cápsula 200mg, dose: 600mg 3x/dia;
  • Nelfinavir cápsula de 250 mg, dose 750 mg 3x/dia;
  • Amprenavir cápsula de 150 mg, dose 600 mg 2x/dia.
Terapia combinada: é o tratamento anti-retroviral com associação de duas ou mais drogas da mesma classe farmacológica (p ex. dois análogos nucleosídeos), ou de classes diferentes (p ex. dois análogos nucleosídeos e um inibidor de protease). Estudos multicêntricos demonstraram aumento na atividade anti-retroviral (elevação de linfócitos T-CD4+ e redução nos títulos plasmáticos de RNA-HIV) quando da associação de drogas, particularmente redução da replicação viral por potencializar efeito terapêutico ou por sinergismo de ação em sítios diferentes do ciclo de replicação viral. Outros estudos evidenciaram redução na emergência de cepas multirresistentes quando da utilização da terapêutica combinada.
Terapia anti-retroviral: é uma área complexa, sujeita a constantes mudanças. As recomendações deverão ser revistas periodicamente, com o objetivo de incorporar novos conhecimentos gerados pelos ensaios clínicos.

9. Hantavirus

As viroses emergentes preocupam as autoridades sanitárias de todo o mundo. Fruto de alterações no ecossistema e dos comportamentos econômicos, sociais e culturais do homem, estas viroses surgem como importante problema de saúde pública tanto nas zonas rurais como nas zonas urbanas. O exemplo mais clássico de uma virose emergente, já hoje consolidado na humanidade, é a infecção humana pelo vírus HIV(AIDS) que atualmente atinge praticamente todos os territórios. Entre as viroses emergentes as que guardam especial preocupação são aquelas associadas com as febres hemorrágicas dado o seu caráter comumente letal e a capacidade de disseminação.
A seguir são apresentadas duas viroses que causam febres hemorrágicas.

9.1. Hantaviroses

9.1.1. Aspectos Epidemiológicos

Hantaviroses são enfermidades agudas que podem se apresentar sobre as formas de Febre Hemorrágica com Síndrone Renal (HFRS) e Síndrone Pulmonar por Hantavírus (HPS), sendo a segunda a única forma encontrada nas Américas. A enfermidade não é específica de nenhum grupo étnico, se comporta de forma estacional coincidindo com a presença e o maior número de roedores portadores do vírus.
Agente Etiológio: São designados de hantavírus os agentes etiológicos do agravo que pentencem a família Buyanviridae (Quadro I).
Reservatórios: Os roedores, especialmente os silvestres, são os principais reservatórios dos Hantavírus e cada espécie parece ter tropismo por determinado tipo.
No roedor, a infecção pelo Hantavírus aparentemente não é letal e pode levá-lo ao estado de reservatório do vírus por toda a vida. Nesses animais, os Hantavírus são isolados principalmente nos pulmões e rins, apesar da presença de anticorpos séricos, sendo eliminados em grande quantidade na saliva, urina e fezes durante longo período, todavia, a duração e o período máximo de infectividade são desconhecidos.
Quadro 1 - Espécies de Hantavírus, enfermidades que causam, principais reservatórios e sua distribuição geográfica
ESPÉCIES
ENFERMIDADE
RESERVATÓRIO PRINCIPAL
DISTRIBUIÇÃO DO VÍRUS
DISTRIBUIÇÃO DO
RESERVATÓRIO
Hantaan (HTN) FHSR* Apodemus agrarius China, Russia, Coreia Europa Central, ao sul de Tracia, e as montanhas Tien Shan. Do rio Amur através da Coréia até a China.
Tailândia (China)
FHSR
Apodemus flavicollis Balcãs Inglaterra e Gales, desde a Espanha, França e sul da Escandinávia, através da Rússia Européia até os Urais. Desde Itália aos Balcãs, Síria, Líbano e Israel.
Seul (SEQ)
FHRS
Rattus norvegicus Mundial Ao redor do Mundo
Puumala (PUU)
FHSR
Clethrionomys glareolus Europa, Rússia, Escandinávia Desde a França a Escandinávia até o Lago Baikal. Sul da Espanha, Itália, Balcãs, Turquia, até o Saara. Grã- Bretanha, Irlanda.
Sin Nombre (SN)
SPH**
Peromyscus maniculatus EUA, Canadá, México Desde o Alaska ao Canadá, parede continental do EUA, excluindo o sudoeste e leste da baixa Califórnia, Oaxaca no México.
New York (NY)
SPH
Peromyscus
leucopus
EUA Parte central do EUA, Alberta, Ontario, Quebec, Nova Escócia, Canadá. Do Caribe até a Península de Yucatán no México.
Black Creek Canal (BCC)
SPH
Sigmodon hispidus EUA Nebraska, Virgínia, Península da Flórida, México, América Central (Panamá), Sul da América, (Norte da Colômbia e Venezuela).
Bayou (BAY)
SPH
Oligoryzomys
palustris
EUA Do Kansas ao Texas, New Jersey a Península da Flórida.
Andes (AND)
SPH
Oligoryzomys longicaudatus Calomys laucha Argentina Chile e Argentina até os 50o latitude sul.
Por Nombrarlo
SPH
Calomys laucha Paraguai Argentina, Uruguai, Paraguai, Brasil.
Rio Mamore (RIOM) Não reportado em humanos Oligoryzomys
Microtis
Bolívia Brasil, entre os rios Solimões e Amazonas, continuando nas terras baixas do Peru, Bolívia, Paraguai e Argentina.
Punchana (1) (2) Não reportado em humanos Oryzomys sp Perú Loretu, Perú
Caño Delgativo Não reportado em humanos Sigmodon alsoni Venezuela Venezuela

* FHSR: Febre hemorrágica com sindrome renal
* SPH: Sindrome pulmonar por hantavirus

9.1.2. Modos de Transmissão

A infecção humana ocorre mais freqüentemente pela inalação de aerossóis formados a partir de secreções e excreções dos reservatórios(roedores) de Hantavírus. Outras formas de transmissão para a espécie humana foram também descritas:
  • ingestão de alimentos e água contaminados;
  • percutânea, por meio de escoriações cutâneas e mordeduras de roedor;
  • contato do vírus com mucosa, por exemplo, a conjuntival;
  • acidentalmente, em trabalhadores e visitantes de biotérios e laboratórios.
Mais recentemente, há evidências da possibilidade de transmissão interhumana. Na Argentina, Cantoni e cols.(1997) verificaram durante um surto de hantavírus, na província de rio Negro, que os profissionais da área de saúde apresentaram risco maior do que o observado na população em geral. A hipótese de transmissão pessoa a pessoa em casos de síndrome pulmonar por Hantavírus descritos por Cantoni et cols(1997) direcionam a revisão das medidas de precaução e biossegurança no atendimento destes pacientes e manuseio de espécimes biológicas.
  1. Período de Incubação: O período de incubação da doença provocada por Hantavirus varia de 12 a 16 dias com uma variação de 05 a 42 dias.
  2. Período de Transmissibilidade: Até o momento é desconhecido.
  3. Susceptibilidade e Imunidade: Ao que parece, as pessoas sem dados sorológicos de infecção passada são uniformemente susceptíveis. Não existem relatos na literatura de reinfecção em humanos.
  4. Distribuição, Morbidade, Mortalidade e Letalidade: A Febre Hemorrágica com Síndrome Renal (HFRS) tem a distribuição na Europa e Ásia onde na China ocorrem de 40.000 a 100.000 casos por ano. Na Coréia do Sul tem ocorrido uma média de 1.000 casos por ano. Possui uma letalidade variável com média de 5% na Ásia e um pouco maior nas Ilhas Balcãs.
A forma respiratória da doença (HPS) com grande letalidade, identificada em junho de 1993 na região sudoeste dos Estados Unidos e, posteriormente, observada em outros 21 estados daquele país levou ao isolamento de outros Hantavírus como o Sin Nombre, Black Creek Canal, Bayou e New York. Desta forma, a Síndrome Pulmonar por Hantavírus passou a ser reconhecida em outros países e possibilitou o isolamento de novas espécies.
No Brasil os 3 primeiros casos clínicos de Síndrome Pulmonar por Hantavírus foram identificados no Estado de São Paulo, no Município de Juquitiba, em 1993. Outros sete casos foram registrados: um no Estado de Mato Grosso na cidade de Castelo dos Sonhos e outros seis no estado de São Paulo, nas cidades de Araraquara e Franca, ambos em 1996; um em Tupi Paulista e um em Nova Guataporanga, dois casos em Guariba, em 1998.
Tabela 1 - Casos de Síndrome Pulmonar por Hantavírus diagnosticados nas Américas até abril de 1998.
País
Casos
Argentina
150 casos
Brasil
10 casos
Chile
27 casos
Canadá (até julho de 1997)
13 casos
EUA (até julho de 1997)
162 casos
Uruguai
3 casos

A Letalidade na Argentina gira em torno de 30 % dos casos, enquanto no Brasil dos 10 casos que ocorreram no período, 9 foram a óbito.

9.1.3. Aspectos Clínicos

a) Síndrome Pulmonar por Hantavírus (HPS)
  • Descrição: febre, mialgias, dor abdominal, vômitos e cefaléia; seguidas de tosse produtiva, dispnéia, taquipnéia, taquicardia, hipertensão, hipoxemia arterial, acidose metabólica e edema pulmonar não cardiogênico. O paciente evolui para insuficiência respiratória aguda e choque circulatório.
  • Diagnóstico Diferencial: septicemias, leptospirose, viroses respiratórias, pneumonias atípicas (Legionella, Mycoplasma, Clamydia), histoplasmose pulmonar e pneumocitose.
  • Complicações: insuficiência respiratória aguda e choque circulatório.
  • Tratamento: desde o início do quadro respiratório, estão indicados medidas gerais de suporte clínico, inclusive com assistência em unidade de terapia intensiva nos casos mais graves.
b) Febre Hemorrágica com Síndrome Renal (HFRS)
  • Descrição: febre, cefaléia, mialgia, dor abdominal, náuseas, vômitos, rubor facial, petéquias e hemorragia conjuntival, seguida de hipotensão, taquicardía, oligúria e hemorragias severas, evoluindo para um quadro de poliúria que antecipa o início da recuperação, na maioria dos casos.
  • Diagnóstico diferencial: é importante, em nosso meio, lembrar de doenças que cursam com febre hemorrágica como malária grave, leptospirose, septicemia (Gram negativo), hepatite B, intoxicações exógenas, dengue hemorrágico e febre amarela.
  • Tratamento: na HFRS, as medidas de suporte e observação são fundamentais no tratamento dos paciente. Recomenda-se as seguintes medidas: isolamento dos pacientes com proteção de barreiras (avental, luvas e máscaras); evitar sobrecarga hídrica nos estágios iniciais, manter o aporte de fluidos adequado para repor perda na fase de poliúria, controle da hipotensão com expansores de volume e vasopressores nos casos graves, monitorização do estado hidroeletrolítico e ácido-básico e diálise peritoneal ou hemodiálise no tratamento da insuficiência renal.

9.1.4. Diagnóstico Laboratorial

Para os dois tipos de Hantaviroses, o diagnóstico faz-se através de Imunofluorescência, Elisa e Soroneutralização. A confirmação se dá através de PCR e Imunohistoquímica de órgãos positivos.

9.1.5. Medidas de Controle

As medidas de prevenção e controle devem ser baseadas em manejo ambiental, através principalmente de práticas de higiene e medidas corretivas no meio ambiente, saneamento, melhorias de condições de vida e moradia, tornando as habitações e os campos de trabalhos impróprios à instalação e proliferação de roedores (antirratização) associados a desratizações focais, quando necessários.

9.2. Controle de Roedores

Medidas básicas de controle de roedores poderão se obtidas no "Manual de controle de Roedores" do Ministério da Saúde, porém é essencial:
  • Eliminar todos os resíduos que possam servir para construção de tocas e ninhos;
  • Evitar entulhos e objetos inúteis no interior e ao redor do domicílio através de limpeza diária;
  • Armazenar insumos agrícolas e outros objetos em galpões distantes pelo menos 30 metros dos domicílios sobre estrados de 40 cm de altura;
  • Armazenar produtos agrícolas (grãos, hortigranjeiros e frutas) em silos ou tulhas situadas a uma distância mínima de 30 metros do domicílio, sobre estrados com 40 cm de altura do piso. O silo ou tuia deverá estar suspenso e a uma altura de 40 cm do solo com escada removível e ratoeiras dispostas em cada suporte;
  • Os produtos armazenados no interior dos domicílios devem ser conservados em recipientes fechados a 40 cm do solo;
  • Vedar fendas e outras aberturas superiores a 5 cm para evitar ingressos acidentais de roedores no interior dos domicílios;
  • Remover diariamente as sobras dos alimentos de animais domésticos;
  • Lixos orgânicos e inorgânicos, caso não exista coleta regular, devem ser enterrados separadamente, respeitando-se uma distância mínima de 30 metros do domicílio;
  • O plantio deve sempre obedecer uma distância mínima de 30 metros do domicílio;
  • O armazenamento em estabelecimentos comerciais deve seguir as mesmas orientações para o armazenamento em domicílio e em silos de maior porte;
  • Em locais onde haja coleta de lixo rotineira, os lixos orgânicos e inorgânicos devem ser acondicionados em latões com tampa ou em sacos plásticos sobre suporte de aproximadamente 1,5 metros de altura do solo.

10. Ebola

O Ebola é um vírus da família Flaviviridae, é um dos únicos vírus que têm a forma de uma linha (enrolada ou não) enquanto todos os outros vírus têm a forma irregular ou redondo. Por essa razão vários especialistas acreditam que que o Ebola deveria ser agrupado em um grupo próprio. O Ebola leva, mais ou menos, oito horas para se replicar. O vírus têm quatro espécies diferentes:
  1. Ebola Sudão
  2. Ebola Zaire (o mais letal deles)
  3. Ebola Reston
  4. Ebola Tai (Costa do Marfim)
Dentre as espécies citadas acima o Ebola Reston é o único transmitido pelo ar, mas não é mortal para o homem, é mortal apenas para macacos. O Ebola Zaire é o mais letal deles matando nove em cada dez pessoas infectadas e os cientistas ainda não sabem como a décima pessoa sobrevive.

10.1. Classificação

O Ebola é um vírus de nível 4 de patogenia (maior que a AIDS, que é apenas nível 2) O período de incubação do Ebola varia de 2 a 21 dias, dependendo da espécie. E a taxa de mortalidade do vírus é de 70 a 90 %, também dependendo da espécie.
Ao contrário do que se pensa, a maioria das espécies do Ebola, NÃO são transmitidas através do ar.
O Ebola pode ser transmitido pelo contato com sangue ou fluídos de pessoas previamente infectadas.
Pelo vírus ser transmitido por meio de secreções, o vírus pode se espalhar rapidamente na família e nos amigos, pois na alimentação, manuseio e quaisquer outros preparos e cuidados com a pessoa infectada, essas pessoas ficam em contato direto com as secreções.
Um dos principais meios de contaminação do Ebola é o compartilhamento de seringas já utilizadas.

10.2. Diagnóstico

O diagnóstico laboratorial oferece extremo risco para os técnicos envolvidos. O tratamento com soro hiperimune de animais tem efeito limitado e o paciente deve ser mantido sob constante suporte de líquidos devido à desidratação. Somente é possível bloquear o avanço da epidemia através de técnicas de isolamento denominadas "técnicas de barreira". Nelas, os pacientes são isolados e não podem receber visitas; os médicos e enfermeiras usam aventais, máscaras, luvas e óculos especiais; os materiais reutilizáveis devem ser esterilizados e o restante imediatamente incinerado. Os corpos das vítimas devem ser isolados para cremação ou sepultamento o mais rápido possível. Até hoje, apenas três epidemias de febre hemorrágica causadas pelo Ebola foram reconhecidas: a primeira em 1976, no Zaire, quando o vírus foi identificado; a segunda, em 1979, no Sudão, e a terceira novamente no Zaire, em 1995, na cidade de Kirkwit, a 200 km da capital, Kinshasa. Nelas, o índice de mortalidade revelou-se assustadoramente alto (80%), sendo levemente maior nos homens. Existem quatro subtipos conhecidos do vírus; um deles chama-se "Reston", pois foi isolado no subúrbio homônimo, que situa-se na periferia de Washington, D. C., de macacos importados das Filipinas.

10.3. Sintomas

Começa com uma dor de cabeça. Os olhos ficam vermelhos e rijos. Surge a febre. Perde-se a lucidez. Aparecem coceiras na pele, que amarelece e ganha feridas. Por baixo das chagas, a carne se rasga. O peito, os braços e o rosto cobrem-se de hematomas. O estômago regurgita vômito nego e sangue. Mais sangue brota por todos os poros e orifícios do corpo. Caem cabelos, pedaços da língua, da garganta e da traquéia. Os genitais apodrecem. Com as convulsões, sangue contaminado é jorrado por todos os lados. O cérebro se liquefaz. Vem a morte.

10.4. Origem

Não se sabe ao certo. Os virólogos acreditam que o vírus originou-se no interior da caverna Kitum, que fica nas encostas do monte Elgon, às margens do Lago Vitória, no Quênia, país da África Central. A primeira manifestação da doença foi em 1967.
Um espécie de "antepassado" do Ebola, o Marburgo, manifestou-se pela primeira vez na Alemanha, na cidade que lhe deu este nome. Quatro macacos vindos de Uganda levaram o vírus aos laboratórios da empresa Behring Works, que usava células de rins destes primatas para fazer vacina. O encarregado da limpeza e alimentação dos animais foi o primeiro a falecer, após 14 dias de contato. A seguir, 31 pessoas são infectadas e sete morrem. Depois disso, a cidade de Nzara, no Sudão teve centenas de mortos. Mas foi na zona de Bumba, às margens do rio Ebola, que a doença se manifestou com todo rigor, estendendo-se por 55 aldeias próximas e matando 90% das pessoas infectadas. O exército zairense isolou a área e a Organização Mundial de Saúde (OMS) teve de mandar especialistas para conter a epidemia. Posteriormente, outras manifestações da doença apareceram em várias cidades africanas. Não foi o vírus que atacou o homem, mas sim o inverso. O Ebola vive em meio às florestas inexploradas, africanas, parasitando animais, para os quais é inofensivo. Ao explorar as matas virgens, o homem destrói o ambiente natural do vírus, fazendo com que ele se depare com uma população atrasada em nível sanitário e médico. Daí o termo vírus emergente.

11. Prions

O neurologista norte-americano Stanley Prusiner, professor da Universidade da Califórnia, em São Francisco; descobriu uma proteína causadora da demência bovina e de outras doenças degenerativas do cérebro, ganhou o Prêmio Nobel de Medicina. O neurologista iniciou o trabalho em 1972, depois que um de seus pacientes morreu de demência resultante da doença de Creutzfeldt-Jakob. Dez anos depois, ele e sua equipe produziram um preparado derivado do cérebro de cobaias doentes que continha um só agente chamado prion.
Prusiner demonstrou grande humildade ao admitir que em 1980 a noção dos prions só poderia ser considerada como herética pelo mundo científico: naquela época, disse, era dogma que os agentes de doenças transmissíveis deveriam ser integrados de material genético, de DNA ou RNA, de modo a estabelecer uma infecção na célula anfitriã. Afinal, até mesmo os vírus, dentre os micróbios mais simples, dependem de tal material para a síntese direta de proteínas, necessárias para a sobrevivência e a reprodução. Não somente nesse aspecto a descoberta de Prusiner chocava-se com o conhecimento da época. Havia o fato também de que ele apontara as proteínas provocadoras da doença como geradas espontaneamente no organismo, mas também transmissíveis. Essa ação dupla era então desconhecida na ciência médica. E mais ainda, concluiu que os prions se multiplicavam em velocidade extraordinária, pelo simples contato da molécula contaminada com a sã (SEZAR, 1997).
Os prions, em última análise, são moléculas de proteínas normais (PrPc) produzidas nas células dos mamíferos, através de controle dos genes. Quando a molécula adquire uma configuração diferente (PrPSc), ela se torna patogênica. Essa configuração pode ocorrer devido à existência de um gene mutante no indivíduo, que eventualmente desenvolve a doença, neste caso hereditária. Extratos de cérebro de animais doentes, contendo PrPSc, injetados em animais sãos, causam a doença; acredita-se que os PrPSc induzem os prions normais a mudarem de configuração molecular, num efeito cascata, possibilitando o estabelecimento da doença (SEZAR, 1996).
A visualização por microscopia eletrônica do agente infeccioso do scrapie tem demonstrado a presença de bastonetes de 10-20mm de diâmetros e 100-200 mm de comprimento, estudos imunoeletromicroscopia, usando anticorpos anti-PrP, demonstram os bastonetes constituídos de PrP (TRABULSI, 1999).
No início, acreditava-se que as doenças fossem causadas por vírus de ação muito lenta. No entanto, a radiação ultravioleta, que destrói ácidos nucléicos, não inativava os extratos, que continuavam infecciosos. Isso sugeria uma coisa muito estranha: se o agente da infecção não continha ácido nucléico, não poderia ser um vírus. Prusiner e seus colaboradores descobriram que, ao contrário, as proteínas presentes no extrato eram responsáveis pela infecção; isso porque, ao usarem métodos de desnaturação, que modificam a conformação das proteínas, a capacidade infecciosa do extrato diminuía muito.
A proteína do "scrapie" foi chamada de PrP, que vem de "Prion Protein". Os prions são codificados por genes, os pesquisadores conseguiram descobrir, em células de mamíferos, o gene que codifica a PrP. Ficou assim estabelecido que este gene não é carregado pelo prion, mas reside nos cromossomos dos camundongos, das cobaias e dos seres humanos estudados. Em outras palavras, nossas células fabricam normalmente a proteína que chamamos de prion, sem que, no entanto, adoeçamos. Verificou-se, na realidade, que a proteína existe sob duas formas, uma patogênica e a outra não. À forma normal, não causadora de doença, chamou-se PrPc (PrP celular); a forma patogênica foi chamada de PrPSc (PrP Scrapie). Descobriu-se que, em algumas pessoas, o gene produtor de prions sofreu mutação; nessas pessoas, as encefalopatias espongiformes desenvolvem-se com maior facilidade. A doença, neste caso, comporta-se como hereditária, e não como uma infecção adquirida (SEZAR, 1996).
As duas proteínas se diferem somente em conformatação. PrPc é composto por 40% de alfa hélix enquanto a outra que é PrPsc é formada por 60% de uma base beta e 20% da estrutura alfa hélix. O mecanismo de infecção é iniciado por uma interação do PrPsc com a proteína Prion celular, causando uma conversão para a posterior conformatação. A partir daí a infecção se espalha porque as novas moléculas PrPsc são geradas exponencialmente de uma única molécula normal PrPc. O acumulo de PrPsc insolúvel é um dos fato que leva a morte neuronal. Existe uma discussão na literatura que a internação da PrPc é mediada por duas substâncias diferentes, entretanto os dois caminhos necessitam de uma terceira proteína, um receptor ou uma proteína ligada ao Prion para fazer a molécula ancorada no GPI ou converter o PrPc em PrPsc (AURIEMO,1996).
O fenômeno de conversão dos prions não é ainda bem claro, uma vez que viola a teoria biológica segundo a qual é necessário um ácido nucléico que funcione como modelo para a conversão. A "hipótese do dímero" considera que uma molécula inicial anormal (PrP-SC) se combina com uma molécula normal (PrP-C) para formar um heterodímero. Este é depois convertido num homodímero (PrP-SC/PrP-SC) que se pode dissociar e regenerar o "agente patogênico". Ocorre assim um crescimento exponencial do confôrmero anormal o PrP-SC (PRUSINER, 1996).
Crê-se que alguns indivíduos (humanos ou animais) herdam geneticamente proteínas com uma tendência aumentada para "espontaneamente" produzirem a pequena quantidade de proteínas de configuração anormal que inicie o processo de replicação. Noutros casos, indivíduos expostos a tais proteínas, por exemplo através da ingestão de alimentos, desenvolvem a doença bem como o potencial para uma posterior infecção. Não se sabe ao certo como o PrP "scrapie" danifica as células causando a doença. É muito possível que isso tenha a ver com os lisossomos celulares. Em culturas de neurônios, verificou-se que os PrPSc acumulam-se no interior dos lisossomos, não sendo hidrolisados normalmente pelas proteases. Possivelmente, quando nos tecidos do cérebro, os lisossomos acabam por arrebentar e matam as células; os prions liberados atacariam outras células vizinhas, repetindo-se assim o ciclo. Formariam-se "buracos" no cérebro, que ficaria com aspecto esponjoso, donde o termo encefalopatia espongiforme (SEZAR, 1996).
Doenças neurodegenerativas que afetam o homem e os animais tinham características similares ao "scrapie". O kuru, que atingia nativos de Papua-Nova Guiné, foi relatado em 1957. A estranha doença causava perda de coordenação motora seguida de demência e morte. Acredita-se que os nativos adquiriram a doença devido ao hábito de canibalismo, caracterizando uma doença infecciosa, sendo o agente etiológico provavelmente transferido do cérebro (órgão preferencialmente ingerido) de indivíduos doentes para indivíduos sadios. A doença foi exterminada pela interrupção da prática canibal. A doença de Creutzfeldt-Jackob (CJD), bastante rara (um afetado em um milhão de indivíduos), tem distribuição mundial, sendo também caracterizada por demência seguida de perda de coordenação motora. A doença de Gerstmann-Sträussler-Scheinker (GSS), que à semelhança da CJD leva ao aparecimento de alterações de coordenação motora e à Insônia Familiar Fatal (FFI), onde a demência é seguida de alterações no sono. O componente hereditário destas últimas é muito maior que o infeccioso, sendo responsável por mais de 90% do casos. Em 1986, a emersão de uma epidemia que acometeu o gado bovino da Grã-Bretanha foi relatada. Seu aparecimento foi associado ao uso de vísceras de ovelhas contaminadas com o "scrapie" no preparo da ração usada para alimentar estes animais. A doença, denominada encefalopatia espongiforme bovina (nome dado devido à grande quantidade de buracos presentes no cérebro destes animais) ou "doença da vaca louca", atingiu seu ápice em 1994 com 138.359 casos naquele país (MARTINS, 1999).

FONTE: http://www.acervosaber.com.br