Como um modo de ser, a personalidade define a maneira através da qual a pessoa incorpora suas experiências de vida, como constrói o seu mundo interno e sua consciência com seus significados e escalas de valores e como reage a tudo isso. A personalidade teria, assim, uma determinada forma (componente constitucional, biológico), sobre a qual a vida acrescenta continuadamente um conteúdo (componente vivencial, emocional).
É como se o conteúdo do indivíduo fosse uma sopa cujos ingredientes são fornecidos pelas vivências, conteúdo este colocado dentro de uma sopeira, cuja forma é definida pelos traços da personalidade. Apesar das várias formas de sopeiras, elas existem em número limitado (podemos classificar as personalidades de acordo com a predominância dos traços), as sopas, entretanto, terão infinitos sabores, dependendo dos temperos que a vida de cada pessoa possa oferecer. Assim, é importante distinguir claramente a forma da personalidade e o conteúdo da pessoa, a primeira de natureza constitucional e mais estável e, o segundo, de origem vivencial e características psicodinâmicas.
A personalidade do indivíduo deve ser definida – até por conceito – de tal modo que tenha a mesma forma desde muito precocemente até a sua morte ou então não seria um qualificativo daquela pessoa. O indivíduo faz-se representar por sua personalidade como uma maneira própria de apreender a realidade e construir seu conteúdo mental. Entre as variadas maneiras de classificarem-se as formas de personalidade, uma das mais simples e verdadeira é em relação ao temperamento introvertido e extrovertido. Há pessoas, extrovertidas, animadas, barulhentas e comunicativas, outras são retraídas, tímidas e muito preocupadas com a opinião dos demais. Essas diferenças fazem parte d os tipos psicológicos extrovertido e introvertido.
Como o nome diz, Introvertida é a pessoa que orienta seu foco de atuação predominantemente para dentro, para a introspecção, se mobiliza mais pelo subjetivo que pelo objetivo. A pessoa introvertida sempre elabora uma opinião subjetiva a partir da percepção do objeto (do mundo), de forma que este tenha algo a mais daquilo que é oferecido pelos órgãos dos sentidos, ou seja, um caráter subjetivo.
Enquanto a personalidade Extrovertida predominantemente se prende àquilo que recebe do mundo através dos órgãos dos sentidos, a pessoa introvertida se prende, sobretudo, à impressão subjetiva que o mundo é capaz de produzir nela. A pessoa introvertida, por exemplo, tem a sensibilidade necessária para compor uma música, enquanto a pessoa extrovertida tem mais facilidade para dançar essa música. A apreensão rítmica e coordenação motora são habilidades próprias do extrovertido.
Apesar da pessoa introvertida também observar as condições exteriores e objetivas (falamos “predominantemente” no parágrafo anterior), ela elege os fatores subjetivos como os elementos decisivos da existência e da realidade, portanto, apesar de ser uma pessoa que também se orienta pela percepção e pelo conhecimento como todas as outras, ela privilegia o componente subjetivo, aquele que ultrapassa a excitação fisiológica dos sentidos. Para o introvertido os sentimentos associados a um odor são muito mais importantes que o próprio cheiro, enquanto o extrovertido tem mais facilidade para descrever esse cheiro.
Quando duas pessoas se deparam com um mesmo objeto (evento, situação ou fato), nunca se poderá afirmar que elas o percebam da mesma maneira. Mesmo deixando de lado as diferenças neurosensoriais e fisiológicas que existem entre as pessoas (uns enxergam melhor, ouvem melhor, etc.), sempre existirão muitas e profundas diferenças no significado e na representação psíquica daquilo que é percebido, conseqüentemente, daquilo que é assimilado.
O mundo moderno, pleno que é de sons, imagens e toda sorte de estímulos sensoriais, valoriza significativamente o contacto objetivo e extrovertido com as coisas, com as formas, com as cores, com os preços, os tamanhos, etc. Por causa dessa supervalorização do conhecimento objetivo, os dotes sentimentais e afetivos das pessoas mais sensíveis e mais aptas a atribuir significados subjetivos às coisas, acabam sendo desvalorizados.
Um estilista de moda, por exemplo, tem probabilidade muito maior de ter um temperamento extrovertido, enquanto o estudioso de moda, da história da moda através dos tempos, das tendências estéticas e do conceito da forma, por exemplo, tende a ser introvertido.
A disposição subjetiva das pessoas introvertidas, em princípio, é um dote do temperamento recebido por herança e constitui uma característica definitiva da pessoa. Trata-se de uma sensibilidade psicológica inata, nasce com a pessoa. As considerações subjetivas das pessoas introvertidas são mais influentes que o objeto concreto e o valor psíquico dessas concepções subjetivas sobrepõem-se à impressão sensorial objetiva que se tem do próprio objeto.
Immanuel Kant tinha uma visão introvertida do mundo, refletindo e produzindo um material que influencia a filosofia até hoje. Kant nasceu em 1724 na Prússia, em Königsberg. Jamais saiu de sua cidade natal, levava uma vida monótona, pontual e só dedicada aos estudos. Para ele o “mundo lá fora”, notadamente o mundo material e objetivo, parecia não ter muito interesse.
Charles Darwin, por sua vez, avaliava a realidade extrovertidamente, descrevendo com minúcias o mundo objectual à sua volta. Britânico, nasceu em Shrewsbury em 1809, não parava em casa. A sua viagem de cinco anos a bordo do Beagle nas ilhas Gálapagos e escritos posteriores trouxeram-lhe reconhecimento como cientista e fama como escritor. Teve uma vida cheia de inconstâncias, vivendo entre Londres, Cambridge, na Escócia e outros lugares.
Por causa dessas discrepâncias no contacto com a realidade, e tipo de comportamento conseqüente, a pessoa extrovertida vê a introvertida como egoísta e vaidosa, enquanto esta vê aquela como efusiva e superficial. Parece que a pessoa introvertida age sob a influência de idéias, conceitos, valores éticos, culturais ou poéticos. Ela tem opiniões bem definidas sobre as coisas, muitas vezes despertando estranheza nas pessoas extrovertidas, as quais podem considerar a introversão como certa arrogância e egocentrismo.
A dificuldade em aceitar a realidade como ela é por procurar sempre uma realidade ideal, pode tornar a pessoa introvertida taciturna, não raras vezes implicante e de difícil acesso, ou o oposto, com notável indiferença, caso perceba que a realidade objetiva não está valendo a pena. As pessoas extrovertidas têm mais facilidade em adaptar-se à realidade como ela é, logo, mais dificilmente serão implicantes ou aborrecidas. As pessoas extrovertidas têm sucesso em dançar conforme a música, enquanto as introvertidas podem perder o passo por questionar se a música deveria ser esta mesmo.
Por causa dessas características o jovem introvertido terá dificuldades para a interação social, para fazer novas amizades, embora tenha grande habilidade em manter amizades que já fez. Há momentos onde, por menosprezo da objetividade necessária ao bom andamento da vida, a adaptação prática ao mundo e à vida fica seriamente prejudicada nas pessoas introvertidas.
Enquanto as pessoas extrovertidas se adaptam prontamente ao novo e às disposições diferentes das coisas, as introvertidas, por sua vez, sofrem para adaptar-se às novidades. Qualquer alteração no habitual tem nas introvertidas um efeito perturbador.
Por estas e outras razões, lidar com a vida prática é mais difícil para a pessoa introvertida. Geralmente ela se mostra mais insatisfeita com a realidade, parece viver sempre a procura de uma realidade ideal que não se encontra na realidade concreta.
Isso não quer dizer, de forma generalizada, que a pessoa introvertida tenha insucesso na lida cotidiana com as coisas, mas a maneira como lida com essas coisas é diferente da pessoa extrovertida. Uma pessoa introvertida pode ter sucesso no concerto doméstico ou nas atividades manuais, entretanto, poderá ser mais demorada em busca da perfeição, enquanto a pessoa extrovertida resolverá os problemas mais prontamente.
Os conceitos sobre melhor, certo e dever interferem mais na solução de problemas das pessoas introvertidas que das extrovertidas. As pessoas introvertidas costumam ter mais foco nos PORQUÊS, enquanto as extrovertidas no COMO. Ambos os temperamentos podem estar presentes em afinadores de piano, mas as pessoas extrovertidas são mais rápidas, embora a qualidade do trabalho possa ser mais refinada nas pessoas introvertidas.
Grande parte das pessoas introvertidas acumula também características de timidez, como dissemos. Para entender melhor, vejamos a introversão-extroversão como formas do temperamento e a timidez como conseqüência comportamental da introversão.
Na timidez a pessoa tem medo da opinião de outra pessoa a seu respeito e, por conta disso, acaba por evitar o contacto e a exposição aos demais. Geralmente a timidez faz as pessoas fugirem do inter-relacionamento social, elas evitam tanto a interação com outras pessoas que chegam a sentir grande ansiedade em lugares sociais.
Algumas pessoas introvertidas evitam, por exemplo, comemorar aniversário. Não pelo fato de se incomodarem em ficar mais velhas, mas por detestarem ser alvo de atenções, ficarem constrangidas por ver pessoas cantando em sua homenagem. Algumas fogem tanto das atenções a ponto de evitarem a qualquer preço a possibilidade de um casamento na igreja. Não conseguem imaginar-se sendo objeto exclusivo dos olhares de todos.
Normalmente o medo e a ansiedade das pessoas tímidas em lugares sociais dizem respeito à eventual possibilidade de outras pessoas tentarem interagir com elas. É assim que pessoas se escondem em banheiros durante intervalos de atividades sociais, profissionais ou escolares, por exemplo.
Sempre que alguém diz “é preciso tratar essa timidez”, a primeira coisa a ser questionada é se essa característica precisa ser tratada. Se for "tratável" significa que a timidez tem características de um transtorno emocional, uma doença ou uma condição mórbida. São necessários critérios para tirar a timidez de uma situação de característica daquela pessoa e colocá-la no lugar de um transtorno a ser tratado.
Um desses critérios usados para o diagnóstico médico é o estatístico. Dentro do Critério Estatístico devemos ter em mente o seguinte: nem sempre o habitual é normal ou ainda, nem sempre o excepcional é patológico. Portanto, as exceções à regra estatística devem ser valorizadas inicialmente como, simplesmente, Não-Normais, de forma a tornar este critério estatístico apenas relativamente válido. Os dentes cariados, por exemplo, embora muito freqüentes e habituais não são dentes normais, assim como a gravidez de gêmeos, apesar de não-normal, não chega a ser uma doença.
De um modo geral, o Critério Estatístico deve servir para destacar da população geral o não-habitual, o diferente ou o não-normal e, isoladamente, isso não é suficiente para autorizar declarar este incomum como doença. O próprio sistema cultural vigente se incumbe de argüir os comportamentos que excedem os limites da suposta faixa de normalidade e os pensamentos que escapam de uma pretendida faixa de coerência e realismo.
Desta forma, ou seja, estatisticamente, os comportamentos podem ser considerados bizarros, inadequados, esquisitos, aberrantes, etc. em comparação à expressiva maioria dos outros comportamentos. Da mesma forma os pensamentos podem ser incoerentes, sem nexo, irreais, também em comparação à maioria. As afirmações populares de que "... fulano não fala coisa-com-coisa..." ou que "... fulano se comporta de maneira estranha" são avaliações também motivadas pelo Critério Estatístico.
No extremo patológico desse tipo social de timidez está a chamada Fobia Social. De modo geral, quase todas as pessoas já experimentaram certa timidez em alguma fase ou momento da vida, entretanto, 45% delas continua a viver com algum grau de timidez e aproximadamente 4% merecem tratamento especializado.
As pessoas tímidas podem ser classificadas em três grupos que manifestam medo e ansiedade intensa diante da interação social; aquelas com medo de passar vergonha em público, com medo de falar algo errado e aquelas com medo da exposição e serem motivo de chacota.
Para as pessoas introvertidas algumas situações do convívio social são cruciais, como por exemplo, falar em público (73%), conversar com uma pessoa desejada (64%), conversar com pessoas com algum tipo de destaque ou autoridade (55%), diante da necessidade de se dirigirem aos outros, mesmo para um simples pedido de informação (50%), diante de situações novas (48%).
Um dos fatores de grande alívio para as tensões das pessoas tímidas e temerosas da opinião dos outros foi a internet. Alguns estudos mostram que as pessoas tímidas passam muito mais tempo nos sites de relacionamento (Facebook, MSN e outros) do que as pessoas não tímidas. A distância física entre as pessoas que se relacionam através da internet alivia a ansiedade das pessoas introvertidas em relação ao medo do outro.
Como foi dito, através do Critério Estatístico o introvertido será tido como diferente dos demais. Só por causa disso não pode ser considerado portador de algum transtorno, mas apenas diferente da maioria. Esse critério só tem valor considerando todas as variáveis, como por exemplo, as situacionais, sócio-culturais, temporais e existenciais. Há culturas onde a pessoa contida e reservada tem valor positivo, em outras se exige a expansividade e assim por diante. Por isso, não deve ser atribuído a este Critério Estatístico de diagnóstico um caráter decisivo, mas sim, subsidiário, com valor apenas se for considerado junto com outro critério; o Critério Valorativo.
No Critério Valorativo a quantidade dá lugar à qualidade. Trata-se de saber se aquilo que é incomum, aquele não-normal implica em prejuízo e morbidade, se é de fato patológico e causa sofrimento. Pelo Critério Valorativo podemos considerar que, em não havendo prejuízo ao indivíduo, aos outros e ao sistema sócio-cultural, toda pessoa que se destaca dos demais não pode ser considerada doente só por causa disso.
No critério valorativo interessa o VALOR que o sistema sócio-cultural atribui à maneira do indivíduo existir. E é por causa do valor cultural seriamente prejudicado que se atribui aos introvertidos e tímidos que essas pessoas se sentem diminuídas e ávidas por algum "tratamento" que as deixe iguais às outras, mais expansivas. Podemos comparar a necessidade de "tratamento" para a timidez à necessidade de "tratamento" para cabelos crespos das adolescentes, ou seja, muito mais uma exigência cultural que uma necessidade patológica.
Enquanto o Critério Estatístico utiliza termos como incomum, infreqüente, desproporcional, raro, fora do comum ou diferente, no critério valorativo os adjetivos serão outros. Esses termos dizem mais respeito à qualidade que à quantidade: mórbido, nocivo, indesejável, prejudicial, degenerado, deficiente, sofrível, cruel, irracional, desadaptado e assim por diante.
A Organização Mundial de Saúde diz que o completo estado de bem estar físico, mental e social define o que é saúde, portanto, tal conceito implica num critério valorativo, já que, tanto o bem-estar quanto o mal-estar, dizem respeito a valores.
A timidez, por exemplo, tendo em vista sua ocorrência universal (quase metade das pessoas), poderia ser considerada normal (de tão habitual), do ponto de vista estatístico. Porém, devido ao fato de tratar-se de uma atitude da personalidade que traz prejuízo social ou faz com que o introvertido se sinta inferior ou infeliz, acaba por receber da psiquiatria uma atenção de doença (embora seja sim uma característica e não uma doença).
Muito embora a introversão ou timidez seja um traço de personalidade, acaba proporcionando prejuízo à qualidade de vida por causa da valorização cultural que se atribui a ela, podendo levar a algum grau de sofrimento, logo, terá certa morbidade. É por causa do sofrimento, por exemplo, que a depressão deve ser tratada apesar de ser muito comum.
Se tomarmos a personalidade pelo conjunto dinâmico de traços, é bom destacar a idéia de que nenhum ser humano mostrará algum traço que já não exista em outros indivíduos. Portanto, a introversão ou timidez aparece em graus variáveis em todas as pessoas, sendo que os extrovertidos têm esse traço muito atenuado e os introvertidos o tem predominantemente. Pois bem. É exatamente a predominância de alguns traços e a atenuação de outros que acaba por constituir a personalidade de cada um do jeito que ela é.
O sistema sócio-cultural costuma elaborar uma relação muito extensa de adjetivos utilizados para a argüição dos indivíduos baseado na descrição de seus traços. Nesta visão o indivíduo pode ser classificado como sincero, honesto, compreensivo, inteligente, cálido, amigável, ambiciosos, pontual, tolerante, irritável, responsável, calmo, artístico, científico, ordeiro, religiosos, falador, excitado, moderado, calado, corajosos, cauteloso, impulsivo, oportunista, radical, pessimista, e por aí afora. Podemos ainda considerar a pessoa através de seu Traço Predominante, da característica que melhor a define, como se, entre tantos traços caracteristicamente humanos, este determinado traço específico predominasse sobre os demais. Assim é classificado o tímido ou introvertido.
Em termos de traços e características de personalidade, o estado que chamamos de não-normal deve, com freqüência, parecer como uma lente de aumento colocada sobre os traços normais. Nessa abordagem o aspecto que mais caracteriza s personalidade é o modo pelo qual a pessoa se relaciona com o mundo à sua volta, a maneira pela qual a pessoa interage com sua realidade, enfim, a maneira pela qual o sujeito se relaciona com o objeto. Isso definirá as pessoas ditas Introvertidas e as Extrovertidas.
A dificuldade com o novo na Personalidade Introvertida
A preponderância do fator subjetivo na consciência da pessoa introvertida resulta em subvalorização dos fatores objetivos e, desta forma, o objeto não tem para ele a mesma importância que deveria ter para os extrovertidos. Nos extrovertidos o objeto desempenha uma função muito importante.
Um fator de risco no relacionamento da pessoa introvertida com o mundo está no conflito desgastante entre a tendência de valorizar subjetivamente aos objetos, tendendo até a se divorciar destes e, por outro lado, a força das inegáveis, reais, concretas e avassaladoras impressões que causam os objetos que nos rodeiam. Geralmente há um momento onde da pessoa introvertida acaba se prejudicando por menosprezar o racionalismo necessário ao bom andamento da vida, necessário para a adaptação prática ao mundo e à vida.
Mesmo contra sua vontade, o aspecto concreto da vida prática finalmente acaba impressionando a pessoa introvertida uma hora ou outra, e provoca nele os efeitos mais incômodos e impertinentes. As necessidades do lado concreto cotidiano acabam por subtrair da pessoa introvertida sua tão desejada liberdade de espírito, impondo-lhe desagradável (e inevitável) dependência material e econômica.
Diante da angústia causada pela incapacidade de valorizar adequadamente o lado prático da vida a pessoa introvertida experimenta uma desagradável "covardia" ou dificuldade em impor sua própria personalidade, sua própria opinião. Por conseguinte, a adaptação da pessoa introvertida com a novidade do objeto causa desconfiança, medo e ansiedade.
Por causa dessas dificuldades a pessoa introvertida tem mais dificuldades para adaptar-se ao novo e, para ela, os objetos estarão sempre solidamente presos à alma, à tradição e constância, pois toda e qualquer alteração do habitual provoca efeito perturbador, quando não perigoso. Com isso, o pragmatismo da pessoa introvertida é muito mais difícil.
Particularidades das Funções Psicológicas
O Pensamento
O pensamento a pessoa introvertida se orienta, como dissemos, pelo elemento subjetivo. Este pensamento se encontra representado por um sentimento que, em última análise, determina seu juízo crítico. As coisas objetivas com que mantém contacto e as experiências concretas podem enriquecer seu conteúdo subjetivo, mas nem sempre favorecem sua prática concreta (pragmatismo). Na pessoa introvertida os eventos exteriores, ao contrário da pessoa extrovertida, não são a causa e o fim do pensamento, pois seu raciocínio começa e termina sempre no sujeito e não no objeto, na pessoa e não na coisa.
O conhecimento de novos fatos tem valor indireto para a pessoa introvertida, ou seja, a novidade pode favorecer novos pontos de vista, e estes sim, estes novos pontos de vista são mais importantes do que os fatos novos em si. A pessoa introvertida costuma equacionar problemas e teorias, costuma fornecer visões e sugestões, mas conserva sempre uma atitude prudente e reservada ante os fatos novos. Aceita-os como ilustração e exemplo, mas não lhes concede preponderância sobre aquilo que é subjetivamente conhecido e refletido.
Com esta maneira introvertida de pensar os fatos objetivos e concretos são de importância secundária para a pessoa introvertida. Nela sempre predomina o valor da idéia subjetiva, da imagem simbólica, das entrelinhas e da visão íntima das coisas. Esse tipo de pensamento é capaz de produzir idéias bastante abstratas e que nem sempre residem adequadamente à obviedade dos fatos, são idéias que expressam sua abstração íntima e desprendida do objeto. O mundo experimentado pela pessoa introvertida não é objetivo e concreto, como tende a ser nas pessoas extrovertidas, mas, sobretudo simbólico e subjetivo.
A diferença entre o pensamento introvertido e extrovertido seria o mesmo que existe entre o filósofo Kant e o biólogo Darwin, como dissemos antes. Um lidando com o subjetivo e outro investigando profundamente o objetivo. Como se vê, o mundo precisa dos dois tipos.
A despeito da plena capacidade de abstração da pessoa introvertida, muitas vezes seu pensamento pode revelar uma perigosa tendência para forçar os fatos a submeterem-se e se conformarem à sua idéia subjetivamente pré-formada, tendendo adequar o mundo às suas fantasias e devaneios.
A possibilidade de se distanciar da realidade dos fatos é uma ameaça na pessoa introvertida, contrariamente da pessoa extrovertida. Esta última é capaz de negar a essência dos fatos por insensibilidade ao além-objeto, pela dificuldade à abstração. Assim sendo, do mesmo modo que o pensamento extrovertido nem sempre consegue obter conceitos eficazes e reflexivos da vida, também o pensamento introvertido pode não conseguir aproximar-se da objetividade da realidade real. As convicções das pessoas introvertidas tendem a ser contundentes e criam teorias pela simples vontade e afinidade de criar teorias, podendo surgir aí uma acentuada tendência para saltar facilmente do real para o meramente imaginário.
O Sentimento
O sentimento da pessoa introvertida, como tudo nela, é determinado principalmente pelo fato subjetivo. Na questão do sentimento existe uma diferença tão essencial, em relação ao sentimento extrovertido, quanto a que existe entre a introversão e a extroversão do pensamento.
Como o sentimento introvertido está subordinado às condições subjetivas e se prende secundariamente ao objeto, é normal que ele se manifeste com menos facilidade e, quando se manifesta, costuma ser incompreendido pelas pessoas não introvertidas. As pessoas introvertidas normalmente são aquelas definidas como “fechadas”, que não expressam sentimentos.
O sentimento introvertido parece desvalorizar os objetos do mundo real, portanto, é mais provável que a pessoa introvertida manifeste sentimentos mais negativamente que de maneira positiva. Nessas pessoas o silêncio diante de alguma coisa que lhes fazem representa o mais expressivo elogio. O introvertido parece estar mais insatisfeito que satisfeito com a realidade, ele está sempre à procura de uma imagem ideal que não se encontra na realidade concreta.
Esse tipo de sentimento pode tornar a pessoa introvertida taciturna, de difícil acesso sentimental ou pseudo-portadora de notável indiferença. Pode ser tida como chata por nem sempre estar manifestando satisfação.
Se o pensamento subjetivo da pessoa introvertida é de difícil compreensão às pessoas extrovertidas, o mesmo se poderá dizer de seu sentimento. O sentimento introvertido tende sempre a libertar-se do objeto concreto e criar um vínculo subjetivo com objeto simbólico. Ela se relaciona mais dificilmente com o dinheiro do que com a riqueza.
A Percepção
Também a percepção, que em essência é algo fortemente atrelado ao objeto e à excitação dos sentidos, sofre uma transformação notável na pessoa introvertida. Na percepção da pessoa introvertida há um fator subjetivo, portanto, além do objeto, a ser percebido. Antes de perceber de cheiro como sendo de capim molhado, existirá sempre a presença contundente de um sujeito que percebe e que fornece seus atributos subjetivos para a excitação neurofisiológica do cheiro; se ele é bom, ruim, traz lembranças da infância, significa a dádiva da chuva e assim por diante. Na disposição introvertida, o ato perceptivo se baseia, sobretudo, na participação subjetiva da percepção.
Essas questões da percepção subjetiva podem ser explicadas, da maneira mais clara, pelas obras de arte que reproduzem subjetivamente os objetos exteriores. Se, por exemplo, vários pintores se esforçam em reproduzir a mesma paisagem, a sensibilidade pessoal fará com que os quadros sejam sempre diferentes entre si.
Essa diferença entre os quadros não é devida apenas pela capacidade artística maior ou menor de cada um, mas, principalmente, por causa das diferentes visões subjetivas do mesmo objeto. Inclusive alguns quadros denunciarão nítida diferença emocional, quer seja no estado de ânimo, na sensibilidade para o movimento, para a cor e formas, e assim por diante. Essas qualidades apontam uma intervenção mais ou menos intensa do fator subjetivo.
O fator subjetivo da percepção na pessoa introvertida vem a ser o mesmo que nas demais funções psíquicas. Trata-se de uma disposição de personalidade capaz de alterar a percepção sensorial do mundo e da realidade, remetendo a pessoa para além do caráter puramente objetivo. Neste caso, a percepção se refere, sobretudo, ao sujeito e não exclusivamente ao objeto. É assim que se torna realidade o ditado segundo o qual “a beleza está nos olhos de quem vê”.
Embora na pessoa introvertida exista, sem dúvida alguma, uma autêntica percepção sensorial, os objetos são vistos mais com olhar do sentimento do que com os olhos da visão. Na realidade, a pessoa introvertida percebe as coisas que todo mundo percebe, mas não se detém na pura influência do objeto, preferindo ater-se à percepção subjetiva suscitada pelo objeto.
Para o introvertido, o fator subjetivo de alguma coisa diz muito mais do que a simples percepção do objeto. A concepção subjetiva do introvertido apreende, pois, muito mais o fundo do que a superfície do mundo físico objectual. Ele não percebe a realidade do objeto como fator decisivo em seu destino, mas sim, a realidade do fator subjetivo das coisas. A percepção introvertida veria o nascer e morrer das coisas, sua origem e conseqüência, sua finalidade e destinação, muito mais que sua cor, sua forma, seu preço, seu valor prático.
É assim que a percepção introvertida capta uma imagem além da reprodução fotográfica do objeto, ela é vinculada à experiência, ao sentimento e à suposição da experiência futura, ao passo que a percepção extrovertida tende a apreender o aspecto momentâneo e claramente manifesto das coisas.
Conclusão
A extroversão e introversão são tipos de temperamento e dizem respeito à disposição da pessoa em relação ao mundo à sua volta, dizem respeito ao tipo de relacionamento do sujeito com o objeto.
Embora haja enorme diferença na representação, percepção e concepção do mundo entre as pessoas introvertidas e extrovertidas, não existe, automaticamente, conotação de valor (positivo ou negativo) em nenhuma dessas duas disposições da personalidade, pois a sociedade humana precisa dos dois tipos.
É comum entre as pessoas introvertidas existirem pessoas também tímidas. Geralmente essa timidez não preenche critérios de transtorno emocional suficientes para um “tratamento”, outras vezes esse traço implica em sofrimento ou prejuízo no desempenho pessoal que merece atenção especializada.
fonte: http://www.psiqweb.med.br - acesso em 16/02/2010