ENFERMAGEM, CIÊNCIAS E SAÚDE

Gerson de Souza Santos - Bacharel em Enfermagem, Especialista em Saúde da Família, Mestrado em Enfermagem, Doutorado em Ciências da Saúde - Universidade Federal de São Paulo. Atualmente professor do Curso de Medicina do Centro Universitário Ages - Irecê-Ba.

sábado, 21 de novembro de 2009

Insuficiência Renal


A insuficiência renal é a alteração da função dos rins na qual esses órgãos são incapazes de excretar as substâncias tóxicas do organismo de forma adequada. As causas da insuficiência renal são muitas, algumas das quais acarretam uma diminuição rápida da função renal (insuficiência renal aguda), enquanto outras acarretam uma diminuição gradual da função renal (insuficiência renal crônica).

Insuficiência Renal Aguda

A insuficiência renal aguda é a diminuição rá-pida da capacidade dos rins de eliminar as subs-tâncias tóxicas presentes no sangue, acarretando um acúmulo de produtos da degradação metabó-lica (p.ex., uréia) no sangue.

A insuficiência renal aguda pode ocorrer em de-corrência de qualquer condição que diminua o suprimento sangüíneo aos rins, que obstrua o flu-xo de urina após ela haver deixados os rins ou que lesa os rins. As substâncias tóxicas podem lesar os rins. Essas substâncias tóxicas podem ser medicamentos/drogas, venenos, cristais precipitados na urina e anticorpos que reagem contra os rins.

Sintomas e Diagnóstico

Os sintomas dependem da gravidade da insuficiência renal, de sua velocidade de progressão e de sua causa básica.

A condição que acarreta a lesão renal, freqüentemente produz sintomas graves não relacionados aos rins. Por exemplo, a febre alta, o choque, a insuficiência cardíaca e a insuficiência hepática podem ocorrer antes da insuficiência renal e podem ser mais graves que qualquer um dos sintomas da insuficiência renal. Algumas das condições que causam insuficiência renal aguda também afetam outras partes do corpo. Por exemplo, a granulomatose de Wegener, a qual lesa os vasos sangüíneos renais, também pode lesar vasos sangüíneos pul-monares, acarretando a tosse com expectoração sanguinolenta. As erupções cutâneas são típicas de algumas causas de insuficiência renal aguda como, por exemplo, a poliarterite, o lúpus eritematoso sistêmico e algumas drogas tóxicas.

A hidronefrose pode causar insuficiência renal aguda em decorrência da obstrução do fluxo urinário. O refluxo da urina para o interior do rim faz com que a área coletora de urina (pelve renal) distenda, causando uma dor tipo cólica de intensidade variável (de leve a excruciante), normalmente localizada no flanco. Aproximadamente 10% dos indivíduos apresentam sangue na urina.

O médico suspeita de uma insuficiência renal aguda quando o débito urinário diminui. A dosagem da concentração de creatinina e de uréia no sangue (produtos da degradação metabólica presentes no sangue que são normalmente eliminados pelos rins) ajudam a ratificar o diagnóstico. Um aumento progressivo da concentração de creatinina indica insuficiência renal aguda.

Durante o exame físico, o médico avalia os rins para determinar se ocorreu um aumento no tamanho desses órgãos ou se eles são dolorosos à palpação. A estenose (estreitamento) da artéria principal que irriga um rim pode produzir um ruído como de uma corrente (sopro), o qual pode ser auscultado com o auxílio de um estetoscópio colocado na altura dos rins.

Quando é detectado um aumento da bexiga, o médico pode passar uma sonda para verificar se ela contém um excesso de urina. Sobretudo nos homens idosos, o fluxo urinário normalmente é obstruído ao nível da saída da bexiga (a abertura da bexiga para a uretra). Conseqüentemente, a bexiga dilata e a urina reflui, lesando os rins. Quando existe a suspeita de uma obstrução, o médico realiza um exame retal e um exame ginecológico para verificar se uma massa em uma dessas regiões pode estar causando a obstrução.

Os exames laboratoriais podem ajudar a indicar com maior precisão a causa e o grau da insuficiência renal. Primeiramente, a urina é minuciosamente examinada. Quando a insuficiência renal é causada por um suprimento sangüíneo inadequa-do ou por uma obstrução urinária, a urina geralmente parece normal. No entanto, quando a causa da insuficiência é um problema intra-renal, a urina pode conter sangue ou aglomerados de eritrócitos ou de leucócitos. Além disso, a urina pode conter grande quantidade de proteínas ou tipos de prote-ínas que não estão normalmente presentes.

Comumente, os exames de sangue revelam concentrações anormalmente elevadas de uréia e de creatinina e desequilíbrios metabólicos como, por exemplo, uma acidez anormal (acidose), uma concentração elevada de potássio (hipercalemia) e uma concentração baixa de sódio (hiponatremia).

Os exames de diagnóstico por imagem (p.ex., ultra-sonografia e a tomografia computadorizada) dos rins são úteis. Radiografias das artérias ou veias renais (angiografias) podem ser realizadas quando a causa suspeita é a obstrução de vasos sangüíneos. A ressonância magnética (RM) pode ser realizada quando o uso de contraste (substância radiopaca) é muito perigoso. Quando esses estudos não revelam a causa da insuficiência renal, pode ser necessária a realização de uma biópsia.

Principais Causas de Insuficiência Renal Aguda
Problema Causas Possíveis
Suprimento sanguíneo insuficiente aos rins • Sangue insuficiente devido a uma perda de sangue, à desidratação ou a uma lesão física que obstrui os vasos sangüíneos
• O bombeamento cardíaco é muito fraco (insuficiência cardíaca)
• Pressão arterial extremamente baixa (choque)
• Insuficiência hepática (síndrome hepatorrenal)
Obstrução do fluxo urinário • Próstata aumentada de tamanho
• Tumor comprimindo o trato urinário
Lesões no interior do rim • Reações alérgicas (p.ex., contrastes utilizados em estudos radiográficos)
• Substâncias tóxicas
• Distúrbios que afetam as unidades de filtração (néfrons) dos rins
• Artérias ou veias obstruídas no interior dos rins
• Cristais, proteínas ou outras substâncias nos rins

Tratamento

A insuficiência renal aguda e suas complica-ções imediatas podem freqüentemente ser tratadas com sucesso. A taxa de sobrevida varia de menos de 50% para os indivíduos com falência de múltiplos órgãos a aproximadamente 90% dos indivíduos com diminuição do suprimento suprimento aos rins devido a uma perda líquida do organismo decorrente de um sangramento, de vômitos ou de uma diarréia.

Freqüentemente, para permitir que os rins cu-rem por si mesmos é apenas um tratamento simples mas meticuloso. O consumo de água deve ser limitado à reposição do volume perdido pelo organismo. O peso corpóreo é controlado diariamente, para monitorizar o consumo de água. Um ganho de peso de um dia para outro significa que o indivíduo está consumindo líquido em excesso. Além dos nutrientes com glicose e com carboidratos altamente concentrados, certos aminoácidos (componentes constituintes das proteínas) são administrados pela via oral ou intravenosa para manutenção de concentrações adequadas de proteínas. O consumo de substâncias eliminadas pelos rins deve ser rigorosamente limitado, incluindo muitos medicamentos (p.ex., digoxina e certos antibióticos). Como os antiácidos que contêm alumínio ligam o fósforo nos intestinos, esses medicamentos podem ser administrados para evitar o aumento excessivo da concentração sérica de fósforo. Algumas vezes, o sulfonato de poliestireno sódico é administrado pela via oral ou retal para tratar a concentração elevada de potássio no sangue.

A insuficiência renal pode ser tão grave a ponto de exigir a diálise, para evitar lesões graves de outros órgãos e para controlar os sintomas.

Nesses casos, a diálise é iniciada assim que pos-sível após o estabelecimento do diagnóstico. A diálise pode ser necessária apenas temporaria-mente como ajuda até os rins recuperarem a sua função, o que normalmente pode levar alguns dias ou algumas semanas. Por outro lado, quando os rins encontram-se muito lesados e a sua recuperação é impossível, a diálise pode ser necessária indefinidamente, exceto se for realizado um transplante renal.

Insuficiência Renal Crônica

A insuficiência renal crônica é uma diminuição lenta e progressiva da função renal que acarreta o acúmulo de produtos da degradação metabólica no sangue (azotemia).

A lesão aos rins, causada por muitas doenças, pode levar a danos irreversíveis.

Causas de Insuficiência Renal Crônica

•Hipertensão arterial
•Obstrução do trato urinário
•Glomerulonefrite
•Alterações renais (p.ex., rim policístico)
•Diabetes mellitus
•Distúrbios auto-imunes (p.ex., lúpus eritematoso sistêmico)

A lesão renal, causada por muitas doenças, pode acarretar danos irreversíveis.

Sintomas

Na insuficiência renal crônica, os sintomas manifestam-se lentamente. Inicialmente, o indivíduo é assintomático. A função renal anormal pode ser detectada apenas através de exames laboratoriais. O indivíduo com uma insuficiência renal leve a moderada pode apresentar apenas sintomas leves, apesar do aumento de uréia, um produto da degradação metabólica, no sangue. Neste estágio, o indivíduo pode apresentar uma urgência miccional noturna, necessitando urinar várias vezes durante a noite (noctúria), pois os rins não conseguem absorver água da urina para concentrá-la do modo que eles normalmente fazem durante à noite. Conseqüentemente, os volumes urinários são maiores. Freqüentemente, o indivíduo com insuficiência renal apresenta hipertensão arterial, pois os rins não conseguem eliminar o excesso de sal e água. A hipertensão arterial pode acarretar um acidente vascular cerebral (derrame cerebral) ou uma insuficiência cardíaca.

À medida que a insuficiência renal progride e ocorre um acúmulo de substâncias tóxicas no sangue, o indivíduo pode apresentar fadiga, cansaço fácil e comprometimento do estado mental. À medida que aumenta o acúmulo de substâncias tóxicas, ele pode apresentar sintomas nervosos e musculares como, por exemplo, espasmos muculares, fraqueza muscular e câimbras. Além disso, o indivíduo também pode apresentar uma sensação de formigamento nas extremidades e perder a sensibilidade em certas áreas. Quando a hipertensão arterial ou as alterações químicas do sangue causam disfunção cerebral, o indivíduo pode apresentar crises convulsivas. O acúmulo de substâncias tóxicas também afeta o trato digestivo, causando perda do apetite, náusea, vômito, inflamação do revestimento da boca (estomatite) e um sabor desagradável na boca. Estes sintomas podem acarretar desnutrição e perda de peso. Os indivíduos com insuficiência renal avançada comumente apresentam úlceras e sangramento intestinais. A pele pode apresentar uma coloração amarelo-acastanhada e, ocasionalmente, a concentração de uréia encontra-se tão elevada a ponto de ocorrer a cristalização dessa substância do suor, formando um pó branco sobre a pele (geada de uréia, uridrose cristalina). Alguns indivíduos com insuficiência renal crônica apresentam um prurido generalizado muito desconfortável.

Diagnóstico

A insuficiência renal crônica é diagnosticada através de exames de sangue. Tipicamente, o sangue torna-se moderadamente ácido (acidose). Dois produtos da degradação metabólica, a uréia e a creatinina, as quais são normalmente filtradas pelos rins, acumulam-se no sangue. A concentração de cálcio diminui e a de fosfato aumenta. A concentração de potássio no sangue permanece normal ou aumenta discretamente. Contudo, ela pode tornar-se perigosamente elevada. O volume urinário tende a permanecer igual (geralmente, 1 a 4 litros por dia), independentemente da quantidade de líquido ingerida. Normalmente, o indivíduo apresenta uma anemia moderada. A urinálise (análise da urina) pode detectar muitas alterações, incluindo células e concentrações de sais anormais.

Como a Insuficiência Renal Crônica Afeta o Sangue
• Aumento das concentrações de uréia e de creatinina
• Anemia
• Aumento da acidez do sangue (acidose)
• Diminuição da concentração de cálcio
• Aumento da concentração de fosfato
• Aumento da concentração de paratôrmonio
• Diminuição da concentração de vitamina D
• Concentração de potássio normal ou discretamente aumentada

Prognóstico e Tratamento

A insuficiência renal crônica geralmente piora independentemente do tratamento e, quando não tratada, é fatal. A diálise ou o transplante renal podem salvar a vida do indivíduo.
As condições que causam insuficiência renal devem ser corrigidas o mais rapidamente possível. Essas ações incluem a a correção dos desequilíbrios de sódio, de água e ácido-básicos, a remoção de substâncias tóxicas dos rins, o tratamento da insuficiência cardíaca, da hipertensão arterial, das infecções da concentração sangüínea elevada de potássio (hipercalemia) ou de cálcio (hipercalcemia) e de qualquer obstrução do fluxo urinário.

Uma especial atenção à dieta ajuda no controle da acidose e das concentrações elevadas de potássio e de fosfato no sangue. Uma dieta pobre em proteínas (0,4 a 0,8 g por quilo de peso corpóreo ideal) pode retardar a velocidade da progressão da insuficiência renal crônica à insuficiência renal terminal, para a qual é necessária a instituição da diálise ou a realização de um transplante renal. Comparados com os não diabéticos os indivíduos diabéticos normalmente necessitam de um desses tratamentos mais precocemente. Quando a dieta é rigorosamente limitada ou quando a diálise é iniciada, é recomendável a administração de uma suplementação vitamínica contendo vitaminas do grupo B e vitamina C.

Comum nos indivíduos com insuficiência renal crônica, a concentração elevada de triglicerídeos no sangue aumenta o risco de complicações (p.ex., acidentes vasculares cerebrais e infarto do miocárdio). Medicamentos, como o genfibrozil, podem ser utilizados com o objetivo de reduzir a concentração de triglicerídeos, embora ainda não tenham sido publicadas pesquisas demonstrando que essas drogas reduzem as complicações cardiovasculares.

Durante a insuficiência renal, as alterações da sede normalmente determinam o consumo de água. Ocasionalmente, para evitar que a concentração de sódio no sangue torne-se muito baixa, o consumo de água deve ser limitado. A ingestão de sal (sódio) normalmente não é limitada, exceto quando existe edema (acúmulo de líquido nos tecidos) ou hipertensão arterial. Os alimentos muito ricos em potássio (p.ex., substitutos do sal) devem ser evitados e os alimentos ricos em potássio não devem ser consumidos em excesso. Uma concentração elevada de potássio (hipercalemia) no sangue é perigosa, pois ela aumenta o risco de arritmias cardíacas (ritmos cardíacos anormais) de parada cardíaca. Quando a concentração de potássio torna-se excessivamente elevada, drogas como o sulfonato de polistireno sódico podem ligar-se ao potássio, fazendo com que ele seja excretado nas fezes. No entanto, a diálise de emergência pode ser necessária.

A formação dos ossos pode ser comprometida quando determinadas condições persistem durante um longo período. Essas condições incluem a baixa concentração de calcitriol (um derivado da vitamina D), o consumo escasso e a má absorção de cálcio e as concentrações elevadas de fosfato e do hormônio da paratireóide (paratormônio) no sangue. A concentração de fosfato no sangue é controlada através da restrição do consumo de alimentos ricos em fósforo (p.ex., produtos laticínios, fígado, legumes, nozes e a maioria dos refrigerantes). Os medicamentos orais que ligam o fosfato como, por exemplo, o carbonato de cálcio, o acetato de cálcio e o hidróxido de alumínio (um antiácido comum), também podem ser úteis.

A anemia é causada pela incapacidade dos rins de produzir quantidades suficientes de eritropoietina (um hormônio que estimula a produção de eritrócitos). A anemia responde lentamente à epoetina, uma droga injetável. As transfusões de sangue somente são realizadas quando a anemia é intensa ou sintomática. O médico também investiga outras causas de anemia, particularmente as deficiências dietéticas de nutrientes como, por exemplo, de ferro, de ácido fólico (folato) e de vitamina B12, ou o excesso de alumínio no organismo.

A tendência ao sangramento na insuficiência renal crônica pode ser temporariamente suprimida por transfusões de eritrócitos (hemácias, glóbulos vermelhos) ou de plaquetas ou por medicamentos (p.ex., desmopressina ou estrógenos). Este tratamento pode ser necessário após uma lesão ou antes de um procedimento cirúrgico ou de uma extração dentária.

Os sintomas da insuficiência cardíaca, a qual é mais comumente devida à retenção excessiva de sódio e de água, melhoram com a redução da ingestão de sódo com os alimentos. Os diuréticos (p.ex., furosemida, bumetanida e torsemida) também podem ser eficazes, mesmo quando a função renal é ruim. Elevações moderadas ou graves da pressão arterial são tratadas com medicamentos anti-hipertensivos usuais para prevenir o comprometimento das funções cardíaca e renal.

Quando os tratamentos iniciais da insuficiência renal deixam de ser eficazes, o médico deve aventar a instituição da diálise prolongada ou o transplante renal.

Diálise

A diálise é o processo de remoção de produtos da degradação metabólica e do excesso de água do organismo.

Existem dois métodos de diálise: a hemodiálise e a diálise peritoneal. Na hemodiálise, o sangue é removido do corpo e bombeado até um aparelho que retira as substâncias tóxicas do organismo e, em seguida, retorna o sangue purificado ao indivíduo. A quantidade total de líquido retornado pode ser ajustada.

Na diálise peritoneal, é realizada a infusão no interior da cavidade abdominal de um líquido contendo uma mistura especial de glicose e sais que retira as substâncias tóxicas dos tecidos. Em seguida, o líquido é retirado da cavidade abdominal e descartado. Para a remoção de uma maior ou uma menor quantidade de líquido do organismo, a quantidade de glicose pode ser ajustada.

Razões para a Diálise

Os médicos decidem iniciar a diálise quando a insuficiência renal causa encefalopatia urêmica (disfunção cerebral), pericardite (inflamação do pericárdio, o saco que envolve o coração), acidose (acidez elevada do sangue) não responsiva a outros tratamentos, insuficiência cardíaca ou uma concentração muito elevada de potássio no sangue (hipercalemia). Em geral, os sintomas da disfunção cerebral causada pela insuficiência renal são revertidos pela diálise em alguns dias, ou, raramente, em até 2 semanas.

Muitos médicos utilizam a diálise preventivamente na insuficiência renal aguda quando o débito urinário é baixo e continuam os tratamentos até os exames de sangue indicarem a restauração da função renal. Para a insuficiência renal crônica, a diálise pode ser iniciada quando os exames indicarem que os rins não estão removendo adequadamente os produtos da degradação metabólica ou quando o indivíduo não consegue mais realizar as atividades quotidianas.

A freqüência da diálise varia de acordo com o nível da função renal remanescente. No entanto, a maioria dos indivíduos necessita de 2 a 3 sessões de diálise por semana. Um programa de diálise eficaz permite ao indivíduo levar uma vida razoavelmente normal, a manter uma dieta razoável, uma contagem de eritrócitos aceitável, uma pressão arterial normal e não desenvolver qualquer lesão nervosa. A diálise pode ser utilizada como tratamento de longo prazo para a insuficiência renal crônica ou como uma medida paliativa antes de um transplante renal. Para a insuficiência renal aguda, a diálise pode ser necessária por apenas alguns dias ou semanas, até a função renal ser restaurada.

A diálise também pode ser utilizada para remover certas drogas ou venenos do corpo. Freqüentemente, os indivíduos sobrevivem a envenenamentos quando é instituída imediatamente a assistência ventilatória e cardíaca enquanto o veneno está sendo removido.

Problemas

Os indivíduos submetidos à diálise necessitam de dietas e medicamentos especiais. Devido à inapetência e à perda de proteínas durante a diálise peritoneal, eles geralmente necessitam de uma dieta relativamente rica em proteínas (aproximadamente 0,1 g de proteínas por quilo de peso corpóreo ideal por dia). Para os indivíduos submetidos à hemodiálise, o consumo de sódio e de potássio deve ser limitado a 2 g de cada por dia. O consumo de alimentos ricos em fósforo também deverá ser limitado. A ingestão diária de líquidos será limitada apenas para aqueles que apresentam uma concentração sérica de sódio persistentemente baixa ou que vem diminuindo progressivamente. É importante controlar o peso do indivíduo diariamente e um ganho de peso excessivo entre as sessões de hemodiálise sugere um consumo excessivo de líquidos. Para os indivíduos submetidos à diálise peritoneal, as restrições de potássio (4 gramas diários) e de sódio (3 a 4 gramas diários) são menos rigorosas.

Para repor os nutrientes perdidos durante a diálise, o indivíduo deve tomar suplementos polivitamínicos e de ferro. No entanto, os indivíduos submetidos à diálise e que recebem muitas transfusões sangüíneas freqüentemente apresentam um excesso de ferro, pois o sangue contém uma grande quantidade desse mineral. Conseqüentemente, eles não devem tomar suplementos de ferro. Podem ser administrados hormônios (p.ex., testosterona ou eritropoietina) para estimular a produção de eritrócitos. As substâncias que ligam o fosfato (p.ex., carbonato de cálcio ou acetato de cálcio) são administradas para remover o excesso de fosfato.

A concentração baixa de cálcio no sangue ou a doença óssea causada pelo hiperparatireoidismo grave podem ser tratadas com o calcitriol (uma forma de vitamina D) e a suplementação de cálcio.

A hipertensão arterial é comum entre os indivíduos com insuficiência renal. Este problema pode ser controlado em aproximadamente 50% dos indivíduos com a simples remoção de uma quantidade suficiente de líquido durante a diálise. Os outros 50% podem necessitar de medicamentos antihipertensivos.

Para os indivíduos submetidos à diálise crônica, os tratamentos regulares os mantêm vivos. Contudo, a diálise freqüentemente causa estresse, pois os tratamentos são contínuos e realizados várias vezes por semana, durando várias horas.

Os indivíduos submetidos à diálise podem sofrer perdas em todos os aspectos de suas vidas. A possibilidade da perda da independência pode ser particularmente angustiante. Esses indivíduos dependem da equipe de tratamento. Os indivíduos submetidos à hemodiálise organizar o transporte regular aos centros de diálise, pois devem ter um acesso ininterrupto a esse tipo de tratamento. As sessões de diálise, freqüentemente programadas de acordo com a conveniência de terceiros, influencia o esquema de trabalho, de estudo ou de atividades de lazer do indivíduo. A manutenção de um emprego regular pode ser impossível. Os indivíduos em diálise podem necessitar de auxílio da comunidade para enfrentar o alto custo dos tratamentos, dos medicamentos, das dietas especiais e do transporte. Os adultos idosos submetidos à diálise podem tornar-se mais dependentes de seus filhos ou podem ser incapazes de viver sozinhos. Freqüentemente, os papéis e responsabilidades familiares estabelecidos devem ser modificados para se adequarem à rotina da diálise, o que causa estresse e sentimentos de culpa e de inadequação.

Os indivíduos submetidos à diálise também enfrentam perdas e alterações estressantes da imagem e das funções orgânicas. As crianças cujo crescimento foi comprometido podem sentir-se isoladas e diferentes de seus companheiros. As questões relacionadas à identidade, à independência e à imagem corpórea enfrentadas pelos adultos jovens e pelos adolescentes podem tornar-se mais complicadas devido à diálise.

Como conseqüência dessas perdas, muitas pessoas submetidas à diálise tornam-se deprimidas e ansiosas. Não obstante, a maioria dos indivíduos consegue adaptar-se à diálise. Como os indivíduos submetidos à diálise (e a equipe de tratamento) enfrentam essas questões afeta não apenas o seu ajuste social, mas também a sua sobrevida a longo prazo. Geralmente, os problemas psicológicos e sociais diminuem quando os programas de diálise estimulam o indivíduo a ser independente e a retomar seus interesses anteriores.

Freqüentemente, o aconselhamento psicológico e social para a depressão, para os distúrbios comportamentais e os assuntos envolvendo perdas ou ajustes ajuda tanto as famílias quanto as pessoas que estão sendo submetidas à diálise. Esses serviços são fornecidos por assistentes sociais, psicólogos e psiquiatras. Muitos centros de diálise oferecem auxílio psicológico e social.

HEMODIÁLISE

A hemodiálise, um procedimento no qual o sangue é removido do corpo e circulado através de um aparelho externo (denominado dialisador), exige o acesso repetido à corrente sangüínea. Uma fístula arteriovenosa (conexão artificial entre uma artéria e uma veia) é criada cirurgicamente para facilitar o acesso.

Na hemodiálise, o sangue do paciente flui através de um tubo conectado à fístula arteriovenosa (AV) e é bombeado até o dialisador. A heparina (uma droga que impede a coagulação) é utilizada durante a diálise para evitar a coagulação do sangue no interior do dialisador. No interior do dialisador, uma membrana artificial porosa separa o sangue de um líquido (dialisado), o qual possui uma composição química similar dos líquidos corpóreos normais. A pressão no compartimento da membrana onde se encontra o dialisado é mais baixa que a do compartimento onde se encontra o sangue, permitindo a filtração do líquido, de produtos da degradação metabólica e de substâncias tóxicas presentes no sangue através da membrana para o interior do dialisado. No entanto, as células sangüíneas e as proteínas maiores são muito grandes para serem filtradas através dos pequenos poros da membrana. O sangue dialisado (purificado) é em seguida retornado ao corpo do indivíduo.

Os dialisadores possuem tamanhos e graus de eficácia diferentes. As unidades mais modernas são muito eficazes, permitindo que o sangue flua com mais rapidez e abreviando o tempo da diálise. Por exemplo, as unidades modernas exigem 2 a 3 horas diárias de diálise, 3 vezes por semana, em comparação com uma mais antiga que exige 3 a 5 horas diárias, 3 vezes por semana. Para permanecerem saudáveis, a maioria dos indivíduos com insuficiência renal crônica necessita de hemodiálise 3 vezes por semana.

Possíveis Complicações da Hemodiálise
Complicação Causa
Febre Bactérias ou substâncias causadoras de febre (pirógenos) na corrente sangüínea Dialisado superaquecido
Reação alérgica com risco de vida (anafilaxia) Alergia a alguma substância no aparelho
Baixa pressão arterial Remoção de líquido em excesso
Ritmos cardíacos anormais Níveis sangüíneos anormais de potássio e outras substâncias
Êmbolo de ar Ar que entra no sangue, na máquina
Sangramento no intestino, cérebro, olhos ou abdome Uso de heparina para evitar coagulação no aparelho


DIÁLISE PERITONEAL

Na diálise peritoneal, o peritôneo (membrana que reveste o abdômen e os órgãos abdominais) funciona como um filtro permeável. Esta membrana possui uma grande área superficial e uma rica rede de vasos sangüíneos. As substâncias presentes no sangue podem ser facilmente filtradas através do peritôneo para o interior da cavidade abdominal quando as condições forem adequadas. É realizada a infusão do líquido através de um cateter inserido através da parede abdominal até o espaço peritoneal no interior do abdômen. Para permitir a passagem dos produtos da degradação metabólica presentes no sangue para o interior do líquido, este deve permanecer um tempo suficiente no interior do abdômen. Em seguida, o líquido é drenado, descartado e substituído por um líquido novo.

Normalmente, é utilizado um cateter de borracha de silicone macia ou de poliuretano poroso, pois esses materiais permitem o fluxo suave do líquido e é improvável que causem lesões. O cateter temporário pode ser passado à beira do leito e o cateter permanente deve ser passado em uma sala cirúrgica. Um tipo de cateter permanente forma uma vedação com a pele e pode ser tampado quando não estiver sendo utilizado.

São utilizadas várias técnicas de diálise peritoneal. Na técnica mais simples, a diálise peritoneal manual intermitente, as bolsas que contêm o líquido são aquecidas até a temperatura corpórea. A seguir, o líquido é infundido no interior da cavidade peritoneal durante 10 minutos, sendo mantido na cavidade durante 60 a 90 minutos e, a seguir, ele é drenado durante um período de10 a 20 minutos. O tratamento completo pode levar doze horas. Esta técnica é utilizada sobretudo no tratamento da insuficiência renal aguda.

A diálise peritoneal intermitente com ciclagem automatizada pode ser realizada em casa pelo próprio indivíduo, eliminando a necessidade de atenção constante de pessoal especializado. Um aparelho com relógio automático bombeia automaticamente o líquido e o drena da cavidade peritoneal. Normalmente, os indivíduos ajustam o dispositivo de ciclagem no momento de dormir para que a diálise seja realizada durante o sono. Esses tratamentos devem ser realizados 6 a 7 noites por semana.

Na diálise peritoneal contínua ambulatorial, o líquido é mantido no interior da cavidade abdominal durante intervalos extremamente longos. Comumente, o líquido é drenado e reposto 4 a 5 vezes ao dia. Os líquidos são acondicionados em bolsas flexíveis de cloreto de polivinila, as quais podem ser dobradas quando vazias, colocadas entre as vestimentas e utilizadas em drenagens subseqüentes, sem que haja necessidade de desconexão do cateter. Normalmente, o indivíduo realiza 3 trocas de líquidos durante o dia, em intervalos de 4 horas ou mais. Cada troca leva 30 a 45 minutos. Uma troca mais demorada (8 a 12 horas) é realizada à noite, durante o sono.

Uma outra técnica, a diálise peritoneal contínua auxiliada por um dispositivo de ciclagem, utiliza um dispositivo de ciclagem automática para realizar trocas curtas à noite, durante o sono, enquanto que as trocas mais longas são realizadas durante o dia, sem o dispositivo de ciclagem. Esta técnica minimiza o número de trocas durante o dia, mas ela impede a mobilidade durante a noite por causa do grande porte do equipamento.

Comparação Entre Hemodiálise e Diálise Peritoneal

Quando os rins falham, os produtos da degradação metabólica e o excesso de água podem ser removidos do sangue através da hemodiálise ou da diálise peritoneal. Na hemodiálise, o sangue é removido do corpo e circulado através de um aparelho denominado dialisador, o qual realiza a sua filtração. Na diálise peritoneal, o peritôneo, uma membrana existente no abdômen, é utilizado como filtro.

Na hemodiálise, uma fístula arteriovenosa (conexão entre uma artéria e uma veia) é criada cirurgicamente para facilitar a remoção e o retorno do sangue. O sangue flui para o dialisador através de um tubo conectado à fístula. No interior do dialisador, uma membrana artificial separa o sangue de um líquido (dialisado) similar aos líquidos corpóreos normais.

Através da membrana, o líquido, os produtos da degradação metabólica e as substâncias tóxicas presentes no sangue são filtrados para o dialisador. O sangue purificado retorna ao corpo da pessoa.

Na diálise peritoneal, um cateter é inserido através de pequena incisão na parede abdominal até o espaço peritoneal. O dialisado drena através da ação da força da gravidade ou é bombeado através de um cateter, sendo mantido no espaço peritoenal durante um período suficiente para permitir a filtragem dos produtos da degradação metabólica presentes no sangue para o dialisado. Em seguida, o dialisado é drenado, descartado e substituído.

Complicações

Embora muitos indivíduos sejam submetidos à diálise peritoneal durante anos sem qualquer problema, complicações podem ocorrer. O sangramento pode ocorrer no local onde o cateter foi passado ou no interior da cavidade abdominal ou um órgão interno pode ser perfurado durante a instalação de um cateter. Pode ocorrer extravasamento de líquido em torno do cateter ou para o interior da parede abdominal. O fluxo do líquido pode ser bloqueado por coágulos ou outros resíduos.

No entanto, a complicação mais grave da diálise peritoneal é a infecção. Ela pode envolver o peritôneo, a pele da região onde o cateter foi passado ou a área em torno do cateter, causando a formação de um abcesso. Normalmente, a infecção ocorre devido a uma falha na técnica de assepsia durante alguma parte da diálise. Comumente, os antibióticos conseguem combater a infecção. Quando isto não ocorre, pode ser necessária a retirada do cateter até o desaparecimento da infecção.

Outros problemas podem associar-se à diálise. A concentração baixa de albumina no sangue (hipoalbuminemia) é comum. As complicações mais raras incluem a esclerose peritoneal (cicatrização do peritôneo) que acarreta uma uma obstrução parcial do intestino delgado, o hipotireoidismo (concentração baixa do hormônio tireoidiano) e crises convulsivas. A hiperglicemia (concentração elevada de glicose no sangue) também é rara, exceto em pacientes diabéticos. Aproximadamente 10% dos pacientes apresentam hérnias abdominais e inguinais.

Os indivíduos submetidos à diálise peritoneal podem apresentar uma propensão à constipação, a qual interfere na drenagem do cateter. Conseqüentemente, eles podem necessitar de laxantes e de emolientes fecais.

Geralmente, a diálise peritoneal não é realizada em indivíduos que apresentam infecções da parede abdominal, conexões anormais entre o tórax e o abdômen, um enxerto artificial de vaso sangüíneo recém-instalado no abdômen ou uma ferida abdominal recente.

fonte: Manual Merck