ENFERMAGEM, CIÊNCIAS E SAÚDE

Gerson de Souza Santos - Bacharel em Enfermagem, Especialista em Saúde da Família, Mestrado em Enfermagem, Doutorado em Ciências da Saúde - Universidade Federal de São Paulo. Atualmente professor do Curso de Medicina do Centro Universitário Ages - Irecê-Ba.

sábado, 31 de outubro de 2009

Endocardite


Endocardite Infecciosa

A endocardite infecciosa é uma infecção do endocárdio e das válvulas cardíacas. Bactérias (e, menos freqüentemente, fungos) que invadem a corrente sangüínea ou, em raras circunstâncias, contaminam o coração durante uma cirurgia cardíaca a céu aberto podem alojarse nas válvulas cardíacas e infectar o endocárdio.

As válvulas anormais ou lesadas são as mais suscetíveis a infecções. No entanto, válvulas normais podem ser infectadas por algumas bactérias agressivas, especialmente quando presentes em grande quantidade. Acúmulos de bactérias e coágulos sangüíneos nas válvulas (denominados vegetações) podem soltar-se e deslocar-se até órgãos vitais, onde eles podem obstruir o fluxo sangüíneo arterial. Essas obstruções são muito graves, podendo causar acidente vascular cerebral, infarto do miocárdio, infecção e lesão da área onde estiverem localizadas.

A endocardite infecciosa pode ocorrer subitamente e pode ser potencialmente letal em questões de dias (endocardite infecciosa aguda), ou pode evoluir de forma sutil e gradual, ao longo de um período de semanas a vários meses (endocardite infecciosa subaguda).

Causas

Embora as bactérias normalmente não estejam presentes no sangue, uma lesão da pele, da mucosa oral ou das gengivas (mesmo uma lesão em decorrência de uma atividade normal, como escovar os dentes ou mastigar) pode permitir que um pequeno número de bactérias invada a corrente sangüínea.

A gengivite (infecção e inflamação das gengivas), as infecções de pele menores e infecções em qualquer outra parte do organismo podem permitir que bactérias entrem na corrente sangüínea, aumentando o risco de endocardite. Certos procedimentos cirúrgicos, odontológicos e médicos também podem facilitar a entrada de bactérias na corrente sangüínea. Por exemplo, o uso de linhas intravenosas para o fornecimento de líquidos, nutrientes ou medicamentos, a cistoscopia (inserção de um tubo que permite a visualização do interior da bexiga) e a colonoscopia (inserção de um tubo para visualização do interior intestino grosso).

Em pessoas com válvulas cardíacas normais, não ocorre qualquer dano e os glóbulos brancos (leucócitos) do sangue destroem essas bactérias. Entretanto, as válvulas cardíacas lesadas podem aprisionar bactérias, as quais, em seguida, alojam-se no endocárdio e começam a multiplicar- se. Raramente, quando uma válvula cardíaca é substituída por uma válvula artificial (prótese valvular), pode ocorrer a introdução de bactérias e é provável que estas sejam resistentes aos antibióticos. Os indivíduos que apresentam um defeito ou uma anormalidade congênita que permite a passagem de sangue de uma parte do coração para outra (por exemplo, de um ventrículo a outro) também apresentam maior risco de sofrer endocardite.

A presença de algumas bactérias no sangue (bacteremia) pode não produzir sintomas imediatos, mas é possível que a bacteremia evolua para a septicemia, uma infecção grave do sangue, a qual, normalmente, provoca febre alta, calafrios, tremores e hipotensão arterial. O indivíduo com septicemia apresenta um grande risco de endocardite. Algumas vezes, as bactérias que causam a endocardite bacteriana aguda são suficientemente agressivas para infectar válvulas cardíacas normais.

As bactérias que causam endocardite bacteriana subaguda, quase sempre, infectam apenas válvulas anormais ou lesadas. Nos Estados Unidos, quase todos os casos de endocardite ocorrem em indivíduos com defeitos congênitos das câmaras e das válvulas cardíacas, em indivíduos com válvulas cardíacas artificiais e em idosos com lesão valvular causada pela moléstia reumática na infância ou com alterações valvulares relacionadas ao envelhecimento.

Os usuários de drogas injetáveis apresentam um grande risco de endocardite, pois é comum a injeção de bactérias diretamente na corrente sangüínea através de agulhas, seringas ou soluções de drogas contaminadas. Nos usuários de drogas injetáveis e nos indivíduos que apresentaram endocardite em decorrência do uso prolongado de cateteres, a válvula de entrada para o ventrículo direito (válvula tricúspide) é a mais freqüentemente infectada. Na maioria dos outros casos de endocardite, a válvula de entrada para o ventrículo Vista Interna da Endocardite Infecciosa Este corte transversal mostra vegetações (acúmulos de bactérias e coágulos sangüíneos) nas quatro válvulas cardíacas. Vegetação Átrio direito Válvula pulmonar Válvula tricúspide Ventrículo direito Átrio esquerdo Válvula aórtica Válvula mitral Ventrículo esquerdo (válvula mitral) é a estrutura infectada. Para um indivíduo com uma válvula artificial, o risco de endocardite infecciosa é maior durante o primeiro ano após a cirurgia. Transcorrido esse período, o risco diminui, mas permanece discretamente maior que o normal. Por razões desconhecidas, o risco sempre é maior com uma válvula aórtica artificial do que com uma válvula mitral artificial e com uma válvula mecânica em vez de uma transplantada de porco.

Vista Interna da Endocardite Infecciosa

Este corte transversal mostra vegetações (acúmulos de bactérias e coágulos sangüíneos) nas quatro válvulas cardíacas.

Sintomas

Geralmente, a endocardite bacteriana aguda apresenta um início súbito, com febre elevada (de 38,5 a 40°C), freqüência cardíaca aumentada, fadiga e dano rápido e extenso da válvula cardíaca. Vegetações endocardíacas desalojadas (êmbolos) podem deslocar-se para outras áreas e criar novos locais de infecção.

Agrupamentos de pus (abscessos) podem formar-se na base das válvulas cardíacas infectadas ou em qualquer local onde tenha havido depósito de êmbolos. As válvulas cardíacas podem ser perfuradas e podem ocorrer escapes importantes de sangue em poucos dias. Algumas pessoas entram em choque e seus rins e outros órgãos param de funcionar – situação conhecida como síndrome da sépsis.

Infecções arteriais podem enfraquecer as paredes dos vasos sangüíneos, fazendo com que eles se rompam. A ruptura pode ser fatal, particularmente quando ocorre no cérebro ou em áreas próximas ao coração.

A endocardite bacteriana subaguda pode produzir sintomas durante meses antes que a lesão valvular ou dos êmbolos tornem o diagnóstico evidente para o médico. Os sintomas incluem a fadiga, febre baixa (de 37 a 38°C), perda de peso, sudorese e anemia (baixa contagem de hemácias ou eritrócitos). O médico pode suspeitar de endocardite quando o indivíduo apresenta febre sem apresentar uma origem evidente de infecção, quando surge um novo sopro cardíaco ou quando ocorre alteração de um sopro já existente. O médico pode observar o aumento do baço ou o aparecimento de manchas muito pequenas na pele, parecidas com sardas diminutas, ou de manchas similares no branco dos olhos (esclera) ou sob a unha dos dedos das mãos. Essas manchas são áreas minúsculas de sangramento causadas por êmbolos pequenos que se desprenderam das válvulas cardíacas. Êmbolos maiores podem causar dores gástricas, obstrução súbita de uma artéria que irriga um membro superior ou inferior, infarto do miocárdio ou acidente vascular cerebral. Outros sintomas de endocardite bacteriana aguda e subaguda incluem os calafrios, dores articulares, palidez da pele, batimentos cardíacos rápidos, nódulos subcutâneos dolorosos, confusão mental e presença de sangue na urina. A endocardite de uma válvula cardíaca artificial pode ser aguda ou subaguda. Em comparação com a infecção de uma válvula natural, é mais provável que a infecção de uma válvula artificial se dissemine ao miocárdio da base da válvula, provocando o desprendimento dessa estrutura. Nesse caso, é necessária uma cirurgia de emergência para substituição da válvula, pois a insuficiência cardíaca em decorrência do escape valvular muito intenso pode ser fatal. Algumas vezes, o sistema de condução elétrica do coração é interrompido, resultando em um retardo do batimento cardíaco, o que pode acarretar uma perda súbita de consciência ou mesmo à morte.

Diagnóstico

Geralmente, os indivíduos que apresentam suspeita de endocardite bacteriana aguda são imediatamente hospitalizadas para diagnóstico e tratamento. Como, no início, os sintomas da endocardite bacteriana subaguda são vagos, a infecção pode lesar as válvulas cardíacas ou disseminar-se para outros locais antes do problema ser diagnosticado. A endocardite subaguda não tratada pode ser tão letal quanto a endocardite aguda. O médico suspeita de endocardite baseando-se apenas nos sintomas, principalmente quando eles ocorrem em um indivíduo com um distúrbio predisponente.

A ecocardiografia, exame que utiliza ondas ultrassônicas refletidas para gerar imagens do coração, pode identificar vegetações e lesões valvulares. Para identificar a bactéria causadora da doença, o médico deve coletar amostras de sangue e submetê-las à cultura. Como em determinadas ocasiões as bactérias são liberadas na corrente sangüínea em quantidades suficientes que permitem a sua identificação, três ou mais amostras devem ser coletadas em ocasiões diferentes, visando aumentar a probabilidade de pelo menos uma das amostras conter bactérias em número suficiente para que o crescimento em laboratório seja possível.

Após a identificação, vários antibióticos são testados contra a bactéria (antibiograma), para se determinar qual é o mais adequado para uso. Algumas vezes, as bactérias não podem ser cultivadas a partir de amostras de sangue. A razão pode ser a necessidade de técnicas especiais para o crescimento da bactéria em questão ou a ingestão anterior de antibióticos que, apesar de não ter debelado a infecção, diminui o número de bactérias suficientes para mascarar sua presença. Outra possibilidade é o paciente não apresentar endocardite, mas um dos vários distúrbios muito semelhantes à endocardite como, por exemplo, um tumor cardíaco.

Prevenção e Tratamento

Como medida preventiva, os indivíduos com anomalias valvulares, válvulas artificiais ou defeitos congênitos são tratadas com antibióticos antes de procedimentos cirúrgicos ou odontológicos. É por essa razão que os dentistas e cirurgiões precisam saber se seus pacientes apresentaram um distúrbio valvular. Apesar do risco de endocardite não ser muito alto para os procedimentos cirúrgicos e como a antibioticoterapia preventiva nem sempre é eficaz, as conseqüências da endocardite são tão graves que quase todos os médicos e dentistas acreditam que a administração de antibióticos antes desses procedimentos é uma precaução justificável. Como o tratamento normalmente consiste em pelo menos duas semanas de doses elevadas de antibióticos intravenosos, os indivíduos com endocardite bacteriana são quase sempre tratadas em ambiente hospitalar. O uso isolado de antibióticos nem sempre cura uma infecção de válvulas artificiais. Pode ser necessária a realização de uma cirurgia cardíaca para reparação ou substituição de válvulas lesadas e remoção de vegetações.

Endocardite Não Infecciosa

A endocardite não infecciosa é um distúrbio no qual ocorre formação de coágulos sangüíneos nas válvulas cardíacas lesadas. Os indivíduos com maior risco de endocardite não infecciosa são as que apresentam lúpus eritematoso sistêmico (doença do sistema imune), câncer do pulmão, estômago ou pâncreas, tuberculose, pneumonia, infecção óssea ou doenças que provocam perda significativa de peso. Como ocorre com a endocardite infecciosa, as válvulas cardíacas podem permitir escapes ou sua abertura pode ser inadequada. O risco de êmbolos virem a causar um acidente vascular cerebral ou um infarto do miocárdio é elevado. Podem ser utilizadas drogas que impede a coagulação, mas não foram publicadas pesquisas confirmando seus benefícios.

fonte: Manual Merck