sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Tratamento da Hipertensão Arterial em Grupos Especiais

Negros e Miscigenados

A prevalência da hipertensão arterial na população negra é mais elevada, bem como é maior sua gravidade, particularmente quanto à incidência de hipertensão arterial maligna, acidente vascular encefálico e insuficiência renal crônica. Esse comportamento pode estar relacionado a fatores étnicos e/ou socioeconômicos. Predominam, em nosso país, os miscigenados, uma população que pode diferir dos negros quanto às características da hipertensão.
Recomenda-se especial atenção quanto às medidas não-medicamentosas para os negros, principalmente redução do consumo de sal e perda de peso. Com relação ao tratamento medicamentoso, existem evidências de que nesse grupo de indivíduos os diuréticos têm eficácia aumentada e, assim como em brancos, diminuem a morbidade e a mortalidade cardiovasculares. Outras drogas, como os antagonistas dos canais de cálcio e os alfabloqueadores, são boas opções.

A eficácia dos betabloqueadores e dos inibidores da ECA parece ser menor na população negra americana. Para a população brasileira negra e miscigenada, não existem dados disponíveis que permitem avaliar adequadamente a eficácia dessas drogas. Assim, se houver indicação preferencial para betabloqueadores (como, por exemplo, angina do peito e pós-infarto agudo do miocárdio) ou inibidores da ECA (como, por exemplo, nefropatia diabética e disfunção sistólica ventricular esquerda), essas drogas devem ser prescritas e sua eficácia pode ser melhorada com elevação das doses, restrição dietética de sal e/ou uso associado de diuréticos.

Idosos

Embora haja tendência de aumento da pressão arterial com a idade, níveis de pressão sistólica acima de 140 mmHg e/ou de pressão diastólica acima de 90 mmHg não devem ser considerados fisiológicos para os idosos. No Brasil, o grupo etário de 60 anos ou mais é o que apresenta maior crescimento na população. Estima-se que, em 2025, haverá mais de 30 milhões de idosos no Brasil. Estudos epidemiológicos brasileiros demonstram que a prevalência de hipertensão arterial entre idosos, à semelhança da observada em todo o mundo, é bastante elevada. Cerca de 65% dos idosos são hipertensos, e entre as mulheres com mais de 75 anos a prevalência de hipertensão pode chegar a 80%.

Entre os idosos, a hipertensão sistólica isolada é a mais prevalente e parece estar mais associada a eventos cardiovasculares que a hipertensão diastólica ou sistólica e diastólica. Especial atenção deve ser dada à presença de pseudo-hipertensão (medidas falsamente aumentadas devido a rigidez arterial), à presença de hiato auscultatório (subestimação da pressão sistólica e superestimação da pressão diastólica), e à possibilidade de hipertensão do avental branco, principalmente com elevações da pressão arterial sistólica, que pode ser minimizada por meio de aferições repetidas no próprio consultório ou no domicílio.
O objetivo do tratamento deve ser a redução da pressão arterial a níveis abaixo de 140/90 mmHg, como nos indivíduos adultos jovens. Nos pacientes com níveis muito elevados de pressão sistólica, podem ser mantidos níveis intermediários abaixo de 160 mmHg. Nesse grupo, deve-se iniciar o tratamento com metade da menor dose recomendada e aumentar lentamente até atingir a dose terapêutica.
A maioria dos estudos clínicos controlados com idosos demonstrou que a redução da pressão arterial com diuréticos e betabloqueadores diminui a incidência de eventos cardiovasculares (acidente vascular encefálico e insuficiência cardíaca em particular) e a mortalidade geral, mesmo em casos de hipertensão sistólica isolada e de pacientes com mais de 80 anos portadores de cardiopatia. Estudo recente, utilizando o antagonista dos canais de cálcio - nitrendipina e o inibidor da enzima conversora da angiotensina - enalapril para tratamento da hipertensão arterial sistólica isolada do idoso, também demonstrou diminuição da morbidade e da mortalidade cardiovasculares.
Drogas que exacerbam alterações posturais da pressão arterial (como bloqueadores adrenérgicos periféricos, alfabloqueadores e diuréticos em altas doses), ou que possam causar alterações cognitivas (alfametildopa), devem ser utilizadas com cautela no idoso. O risco de interações medicamentosas deve ser sempre lembrado, devido à alta prevalência de co-morbidade no idoso.

Crianças e Adolescentes

A prevalência de hipertensão arterial em crianças e adolescentes pode variar de 2% a 13%. Estudos epidemiológicos brasileiros têm demonstrado prevalência de hipertensão arterial, nessa faixa etária, entre 6% e 8%. Atualmente, considera-se obrigatória a medida da pressão arterial a partir de 3 anos de idade, anualmente, ou antes dessa idade, quando a criança apresentar antecedentes mórbidos neonatais, doenças renais, ou fatores de risco familiares.

O método empregado na medida da pressão arterial deve ser bastante criterioso, utilizando-se manguito e técnica adequados, devendo-se considerar a fase V de Korotkoff para aferição da pressão diastólica. Os valores obtidos devem ser comparados a valores normativos de idade, sexo e percentil de altura específicos, já descritos no capítulo 1.
Na infância e adolescência, considera-se pressão arterial normal valores de medida abaixo do percentil 90, tanto para pressão sistólica como para diastólica. Valores entre os percentis 90 e 95 são considerados faixa normal limítrofe; valores maiores que o percentil 95, em pelo menos três determinações em ocasiões diferentes, definem hipertensão arterial.
Quanto mais altos os níveis da pressão arterial e quanto mais jovem o paciente, maior a possibilidade de ser hipertensão arterial de causa secundária, com maior prevalência das causas renais. Atenção especial deve ser dada à presença de fatores de riscos, tais como história familiar, obesidade, erros dietéticos, tabagismo e sedentarismo. Cabe ressaltar a importante associação entre excesso de peso e pressão arterial predominantemente no adolescente. A ingestão de álcool, o uso de drogas (particularmente a cocaína) e a utilização de hormônios esteróides, anabolizantes e anticoncepcionais orais devem ser considerados como possíveis causas de hipertensão arterial.
O tratamento não-medicamentoso é obrigatório a partir do percentil 90 de pressão sistólica/diastólica, com ênfase para adoção de medidas em âmbito familiar, em especial a correção do excesso de peso. A presença de hipertensão arterial por si não contra-indica a prática de esportes. Essa atividade deve ser estimulada, sob supervisão, como uma das modalidades de terapêutica não-medicamentosa.
Reserva-se o uso de medicamentos aos hipertensos moderados e graves, aos indivíduos sintomáticos, aos não-responsivos ao tratamento não-medicamentoso e aos com evidência de dano em órgãos-alvo. A escolha das drogas obedece aos critérios utilizados para adultos, com ressalva ao uso de inibidores da enzima conversora da angiotensina e de antagonistas do receptor da angiotensina II em adolescentes do sexo feminino em idade fértil. Os betabloqueadores devem ser evitados em asmáticos, atletas (limitação do desempenho físico) e jovens de ambos os sexos (interferência na atividade sexual).

Mulheres

As mulheres são relativamente protegidas de eventos cardiovasculares antes da menopausa. Entretanto, estudos clínicos de longo prazo têm demonstrado que as mulheres não diferem dos homens quanto à resposta pressórica anti-hipertensiva e ao prognóstico; entretanto, recomenda-se evitar o uso de inibidores da ECA e de antagonistas do receptor da angiotensina II em mulheres em idade fértil que não utilizam métodos anticoncepcionais comprovadamente seguros.

Embora não haja contra-indicação formal, o uso de anticoncepcionais orais deve ser evitado em mulheres com mais de 35 anos de idade e em obesas, pelo maior risco de hipertensão arterial. Em mulheres com mais de 35 anos e fumantes irredutíveis, o anticoncepcional oral está formalmente contra-indicado, devendo-se prescrever outros métodos contraceptivos. O aparecimento de hipertensão arterial durante o uso de anticoncepcional oral implica a descontinuação imediata desse contraceptivo. Em geral, a pressão arterial tende a se normalizar no prazo de alguns meses.
A reposição hormonal pós-menopausa pode ser recomendada mesmo para mulheres hipertensas, pois tem pouca interferência sobre a pressão arterial e representa indiscutíveis benefícios sobre o perfil de risco cardiovascular. Eventualmente, pequeno número de mulheres pode apresentar elevação da pressão arterial atribuível à terapia com estrogênio. Assim sendo, a pressão arterial deve ser monitorizada periodicamente após o início da reposição hormonal, em hipertensas ou não. O efeito do estrogênio ou da progesterona transdérmicos sobre a pressão arterial não está bem estabelecido.
No tratamento anti-hipertensivo da mulher pós-menopausa, particularmente, deve ser lembrado o efeito benéfico dos diuréticos na osteoporose.

Gravidez

Considera-se hipertensão arterial na gravidez quando o nível da pressão arterial for maior ou igual a 140/90 mmHg, em duas aferições, com intervalo mínimo de 4 horas (se a pressão arterial diastólica for maior ou igual a 110 mmHg, confirmada após 1 hora, caracteriza-se forma grave de hipertensão); ou quando a elevação da pressão sistólica for maior ou igual a 30 mmHg e/ou a pressão diastólica for maior ou igual a 15 mmHg, independentemente dos níveis de pressão iniciais e finais. A medida deve ser realizada com a paciente sentada, considerando-se a fase V como indicativa de pressão arterial diastólica e, eventualmente, quando os batimentos arteriais permanecerem até o nível zero, a fase IV de Korotkoff.

Duas formas principais de hipertensão arterial podem complicar a gravidez: hipertensão arterial crônica (preexistente) e hipertensão induzida pela gravidez (pré-eclâmpsia/eclâmpsia). A presença de hipertensão arterial crônica aumenta o risco de pré-eclâmpsia sobreposta.
Hipertensão arterial crônica
Corresponde a hipertensão de qualquer etiologia, presente antes da gravidez ou diagnosticada até a vigésima semana da gestação. Evidências de alterações vasculares ao exame de fundo de olho e presença de hipertrofia ventricular esquerda confirmam a hipertensão preexistente e têm implicações prognósticas materno-fetais.
Toda grávida hipertensa deve ter acompanhamento quinzenal, após a vigésima semana, e semanal, após a trigésima semana de gestação. Os níveis de pressão que requerem tratamento medicamentoso durante a gravidez permanecem controversos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que o tratamento seja iniciado quando a pressão arterial diastólica ultrapassar 95 mmHg. Em contraste com relatos da literatura, em nosso meio observou-se expressiva incidência de complicações materno-fetais em grávidas com hipertensão arterial moderada. A alfametildopa é considerada a melhor opção, face à ampla experiência e à ausência de efeitos sobre o feto. Caso não seja bem tolerada, betabloqueadores (particularmente com atividade simpatomimética intrínseca), antagonistas dos canais de cálcio e diuréticos em baixas doses (principalmente se já utilizados antes da gestação) constituem boas opções alternativas ou aditivas. Inibidores da ECA, que podem agravar a isquemia uterina e causar insuficiência renal no feto, assim como antagonistas do receptor da angiotensina II estão formalmente contra-indicados na gravidez.
Pré-eclâmpsia
É uma doença hipertensiva peculiar à gravidez humana, que ocorre após a vigésima semana de gestação, mais freqüentemente próximo ao termo. Caracteriza-se pelo desenvolvimento gradual de hipertensão e proteinúria, reversíveis após a gravidez. A superveniência de convulsão define uma forma grave, chamada eclâmpsia. No terceiro trimestre de gravidez, a presença de dor epigástrica requer a exclusão definitiva de formas graves de pré-eclâmpsia com envolvimento hepático.
Diante do diagnóstico presuntivo de pré-eclâmpsia, a internação hospitalar é obrigatória. Se já houver maturidade pulmonar fetal (> 34 semanas), a gestação deve ser interrompida. Quando a pré-eclâmpsia se desenvolve antes da maturidade pulmonar fetal e não houver sinais de gravidade materna, pode-se tentar prolongar a gestação. Entretanto, a interrupção da gestação deve ser considerada na vigência de sofrimento fetal ou de sinais de risco materno. Quando o parto é iminente, a hipertensão arterial deve ser tratada com hidralazina endovenosa (5 mg) e/ou com nifedipina oral (5 mg). Doses subseqüentes são ditadas pela resposta inicial. As mesmas restrições já discutidas no capítulo de tratamento medicamentoso (crise hipertensiva) aplicam-se ao emprego na gravidez da nifedipina de curta duração de ação. Uma preocupação adicional em relação aos antagonistas de canais de cálcio relaciona-se ao uso concomitante de sulfato de magnésio, que deve ser utilizado como droga de escolha no tratamento e, possivelmente, na prevenção da convulsão eclâmptica. O magnésio pode potencializar os efeitos dos antagonistas de canais de cálcio e provocar queda súbita e intensa da pressão arterial. É contra-indicado o uso de nitroprussiato de sódio em gestantes na iminência do termo, pelo risco de intoxicação fetal por cianeto.

Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica ou Asma Brônquica

A única restrição medicamentosa nesse grupo limita-se aos betabloqueadores, pois podem desencadear broncoespasmos, independentemente da cardiosseletividade do agente. Deve-se atentar para o uso eventual de simpatomiméticos, tais como teofilina e efedrina e/ou corticosteróides, que podem dificultar o adequado controle da pressão, quando prescritos simultaneamente. Entretanto, se indicados, podem ser usados com cautela. Cromoglicato de sódio, brometo de ipratrópio, ou corticosteróides por via inalatória podem ser usados com segurança em indivíduos hipertensos.

Depressão

A depressão pode dificultar a aderência ao tratamento da hipertensão arterial, bem como de outros fatores de risco cardiovascular. Por outro lado, vários agentes hipotensores (alfametildopa, clonidina e betabloqueadores de ação central) também podem causar depressão. Os diuréticos tiazídicos podem aumentar os níveis séricos de lítio. O uso de antidepressivos tricíclicos, inibidores de monoaminoxidase (IMAO) e venlafaxine exige atenção com os níveis da pressão.

Obesidade

Hipertensão arterial e obesidade são condições freqüentemente associadas, em especial a obesidade centrípeta, fazendo parte de uma síndrome metabólica caracterizada pela presença de resistência periférica à insulina e hiperinsulinemia. A frequência dessa associação pode variar com a idade, o sexo e a raça.
Redução do excesso de peso, restrição dietética de sódio e prática de atividade física regular são fundamentais para o controle da pressão e podem, por si só, normalizar os níveis de pressão. Anorexígenos que contenham anfetaminas ou seus derivados e hormônios tireoideanos podem causar elevação da pressão arterial, não devendo ser utilizados. A associação de obesidade e apnéia do sono deve ser sempre lembrada como fator que pode dificultar o controle da pressão arterial.
Os inibidores da ECA são benéficos para o paciente obeso, pois aumentam a sensibilidade à insulina, enquanto os antagonistas dos canais de cálcio poderiam ser recomendados pela sua ação natriurética e neutralidade sobre o metabolismo lipídico e glicêmico. Por outro lado, os diuréticos e betabloqueadores devem ser utilizados com cautela pela possibilidade de aumentar a resistência à insulina e determinar intolerância à glicose.

Diabete Melito

A prevalência de hipertensão arterial em pacientes diabéticos é pelo menos duas vezes a da população em geral. Nesses pacientes, a pressão arterial deve ser medida nas posições deitada, sentada e em pé, devido à maior incidência de hipotensão postural decorrente da disautonomia.
No diabete tipo I (dependente de insulina), a hipertensão arterial associa-se claramente à nefropatia diabética. Nesses pacientes, o controle da pressão arterial é crucial para retardar a perda de função renal. No diabete tipo II (não-dependente de insulina), a hipertensão arterial associa-se comumente a outros fatores de risco cardiovascular, tais como dislipidemia, obesidade, hipertrofia ventricular esquerda e hiperinsulinemia. Nesses pacientes, o tratamento não-medicamentoso (atividade física regular e dieta apropriada) é obrigatório. O controle do nível glicêmico, por sua vez, contribui para a redução do nível de pressão.
Todos os medicamentos podem ser usados. Os diuréticos podem alterar a liberação ou até aumentar a resistência à insulina e prejudicar o controle glicêmico, em alguns pacientes, embora possam ser utilizados em baixas doses, como recomendado atualmente. Os betabloqueadores podem interferir na liberação de insulina e também aumentar a resistência à insulina endógena. Em diabéticos tipo I, em uso de insulina, os betabloqueadores podem mascarar os sintomas de hipoglicemia e prolongar uma crise hipoglicêmica. Entretanto, deve-se dar preferência a esses agentes em situações de indicações específicas (angina e pós-infarto do miocárdio). Inibidores adrenérgicos e vasodilatadores podem exacerbar sintomas neuropáticos, tais como disfunção sexual ou hipotensão postural. Os inibidores da ECA tornam-se particularmente úteis por não interferir no metabolismo glicêmico e por melhorar a resistência à insulina. Além disso, exercem, comprovadamente, efeito de proteção renal em pacientes com nefropatia diabética, caracterizada por micro ou macroalbuminúria. Na impossibilidade de manter o tratamento com inibidores da ECA, os antagonistas do receptor da angiotensina II constituem alternativa promissora. Nos casos de difícil controle da pressão, podem ser úteis os antagonistas dos canais de cálcio, os alfabloqueadores e a hidralazina.
O hipoaldosteronismo hiporreninêmico não é raro em diabéticos; assim, os níveis de potássio séricos devem ser vigiados, pela possibilidade de hiperpotassemia, especialmente durante o uso de inibidores da ECA, antagonistas do receptor da angiotensina II, diuréticos poupadores de potássio e betabloqueadores.
Pela maior prevalência e gravidade da retinopatia em pacientes diabéticos hipertensos, é obrigatória a realização periódica de fundoscopia ocular.

Dislipidemia

É freqüente a associação entre dislipidemia e hipertensão arterial; quando presentes, as duas afecções devem ser tratadas agressivamente. A abordagem não-medicamentosa (dieta e atividade física regular) se impõe para ambas as condições.
Inibidores da ECA, antagonistas dos canais de cálcio e alfa-2-agonistas não interferem na lipemia, enquanto os alfabloqueadores podem melhorar o perfil lipídico. Os diuréticos em baixas doses não interferem nos níveis séricos de lipídios. Os betabloqueadores podem aumentar, temporariamente, os níveis de triglicerídeos e reduzir o HDL-colesterol. Contudo, em portadores de infarto do miocárdio, os benefícios proporcionados pelos betabloqueadores superam as eventuais desvantagens.
Estudos mais recentes têm demonstrado que a redução agressiva de lipídios séricos com o uso de vastatinas confere proteção contra a doença coronariana.

Doença Vascular Encefálica

A hipertensão arterial é o maior fator de risco para doença vascular encefálica. O risco tem maior correlação com os níveis de pressão arterial sistólica e aumenta na presença de outros fatores causais.
Nos acidentes vasculares encefálicos, em hipertensos, recomenda-se observar o paciente por algumas horas antes de intervir na pressão arterial, salvo se ocorrerem níveis de pressão extremamente elevados. Sabe-se que hipertensos crônicos sofrem desvio para a direita na curva de auto-regulação de seu fluxo cerebral. Assim sendo, reduções superiores a 20% na pressão arterial diastólica podem comprometer a perfusão encefálica, devendo ser evitadas. A redução da pressão arterial deve ser lenta e gradual, principalmente nos idosos, observando-se continuamente os parâmetros clínicos do quadro neurológico. Convém lembrar que em muitas situações, como na hemorragia subaracnóide, por exemplo, a elevação da pressão arterial é um importante fator hemodinâmico para manter a perfusão cerebral em condições de vasospasmo.
Devem-se evitar drogas que tenham ações no sistema nervoso central (clonidina e alfametildopa, guanabenzo e moxonidina). Estão particularmente indicados os inibidores da ECA, os antagonistas dos canais de cálcio e os diuréticos.

Cardiopatia Isquêmica

Nesses pacientes, deve-se buscar o controle da pressão de forma gradual, até níveis inferiores a 140/90 mmHg, lembrando que reduções muito acentuadas podem comprometer o fluxo coronariano. Adicionalmente, o controle de outros fatores de risco presentes também é indicado, bem como o uso de ácido acetilsalicílico em doses baixas.
Entre as drogas hipotensoras, os betabloqueadores são os mais indicados, por sua ação antiisquêmica. Se os betabloqueadores não forem efetivos ou estiverem contra-indicados, os antagonistas dos canais de cálcio podem ser utilizados, exceto os de ação rápida. Agentes hipotensores que aumentam a freqüência cardíaca devem ser evitados. Nos pacientes que já sofreram infarto agudo do miocárdio, deve-se dar preferência aos betabloqueadores sem atividade simpatomimética intrínseca e aos inibidores da ECA, especialmente na presença de disfunção sistólica ventricular. No infarto agudo do miocárdio sem onda Q, com função sistólica preservada, podem ser utilizados diltiazem ou verapamil.

Insuficiência Cardíaca

A hipertensão arterial pode promover alterações estruturais no ventrículo esquerdo, acompanhadas ou não por isquemia coronariana, que contribuem para o desenvolvimento de insuficiência cardíaca com função sistólica preservada ou não.
Entre os diversos agentes, recomendam-se, em primeira escolha, os inibidores da ECA, seguidos pelos vasodilatadores, como hidralazina combinada a nitratos. O uso isolado desses agentes ou associado a diuréticos e digitálicos reduz a morbidade e a mortalidade cardiovasculares. Recentemente, foi demonstrado que os antagonistas do receptor da angiotensina II também seriam eficazes na redução de mortalidade dos pacientes idosos com insuficiência cardíaca. Para controle da angina e da hipertensão arterial em pacientes com insuficiência cardíaca, amlodipina e felodipina podem ser adicionados com segurança. O alfa e betabloqueador carvedilol, associado aos inibidores da ECA, mostrou-se benéfico no tratamento da insuficiência cardíaca.

Hipertrofia do Ventrículo Esquerdo

A hipertrofia do ventrículo esquerdo (HVE) pode ser associada a hipertensão arterial, e constitui importante indicador de risco para arritmias e morte súbita, independentemente da própria hipertensão.
O tratamento medicamentoso é imperativo. Todas as drogas, à exceção dos vasodilatadores de ação direta, são eficazes na redução da hipertrofia do ventrículo esquerdo. Até o momento, entretanto, os benefícios da regressão da HVE não estão bem estabelecidos.

Nefropatias

A hipertensão arterial pode resultar de qualquer forma de doença renal que diminua o número de néfrons funcionantes, levando à retenção de sódio e água. A nefroesclerose hipertensiva é a causa mais comum de doença renal progressiva, particularmente em negros americanos. Estudos prospectivos em pacientes do sexo masculino têm demonstrado evidencias conclusivas e diretas da relação entre pressão arterial e doença renal terminal.
A detecção precoce do dano renal associado à hipertensão tem-se mostrado essencial na profilaxia da progressão da lesão renal, devendo incluir avaliação da creatinina sérica, exame de urina e, como complemento, ultra-sonografia de rins e vias urinárias para detecção de doença renal obstrutiva, doença policística renal e determinação do tamanho renal. Pequenas elevações de creatinina podem significar perdas funcionais renais significativas.
Os níveis de pressão devem ser reduzidos para 130/85 mmHg (ou 125/75 mmHg), principalmente em pacientes com proteinúria superior a 1 grama em 24 horas, utilizando-se a terapêutica anti-hipertensiva necessária. Dentre as medidas terapêuticas consideradas importantes, ressalta-se a ingestão de sódio na dieta inferior a 100 mEq/dia (dieta geral sem sal). Recomenda-se cuidado com ingestão de potássio em pacientes com creatinina sérica acima de 3 mg/dl.
Todas as classes de hipotensores podem ser utilizadas. O uso de inibidores da ECA é recomendado para pacientes com creatinina inferior a 3 mg/dl, particularmente em vigência de proteinúria e/ou diabete melito. Em pacientes com creatinina superior a 3 mg/dl, a utilização de inibidores da ECA exige cautela. A introdução de inibidores da ECA para qualquer paciente implica a necessidade de avaliação dos níveis séricos de potássio e creatinina dentro de uma semana. Elevações acima de 1 mg/dl na creatinina sérica podem ser sugestivas de estenose de artéria renal bilateral ou em rim único. Diuréticos tiazídicos não são eficazes em pacientes com creatinina superior a 2,5 mg/dl. Nesses pacientes, quando necessário, podem ser utilizados os diuréticos de alça. Diuréticos poupadores de potássio, como amilorida, espironolactona e triantereno, são formalmente contra-indicados nesses pacientes, devido ao risco de induzir hiperpotassemia.

Hipertensão Renovascular

A hipertensão renovascular deve ser suspeitada em pacientes com hipertensão arterial de:
— início precoce (abaixo de 30 anos) ou recente (após 50 anos);
— sopro abdominal;
— hipertensão acelerada ou resistente;
— edema pulmonar recorrente;
— insuficiência renal de causa desconhecida com exame de urina normal;
— coexistência de doença aterosclerótica difusa, especialmente em fumantes;
— insuficiência renal aguda precipitada por anti-hipertensivos, particularmente inibidores da  ECA ou antagonistas do receptor da angiotensina II.
O tratamento de escolha para pacientes com estenose de artéria renal é a angioplastia transluminal, associada ou não ao implante de "stents". A revascularização cirúrgica também apresenta bons resultados. Em pacientes sob tratamento conservador, a piora da função renal impõe a revascularização renal, com o objetivo de preservação funcional do órgão.

Doença Vascular Arterial Periférica

A hipertensão arterial é importante fator de risco para aterosclerose e doença vascular arterial periférica.
Nesses pacientes, os betabloqueadores não devem ser utilizados, sendo indicados os vasodilatadores e os antagonistas dos canais de cálcio. Os inibidores da ECA também são úteis nessa afecção, devendo-se, entretanto, lembrar que, embora rara, existe a possibilidade de coexistência de estenose bilateral de artéria renal, podendo, nessa eventualidade, ocorrer redução da função renal.
Deve-se enfatizar o benefício do abandono do tabagismo, que, seguramente, representa importante fator de risco para a gravidade da doença vascular arterial periférica incapacitante.

Outras Afecções

Em caso de gota, deve-se ter cautela com o uso dos diuréticos. Por outro lado, a hiperuricemia induzida pelos diuréticos não requer tratamento na ausência de gota ou litíase úrica.
Na enxaqueca, os betabloqueadores e a clonidina podem ser úteis, e a hidralazina é contra-indicada.
Em hepatopatas crônicos, a alfametildopa é contra-indicada e o uso de betabloqueadores lipossolúveis (propranolol, metoprolol,) deve ser cuidadoso. Convém evitar, em hepatopatas, a asociação de betabloqueadores com hidralazina, cimetidina e clorpromazina.
No glaucoma, os betabloqueadores são úteis. Contudo, em pacientes suscetíveis, mesmo os colírios contendo betabloqueador podem causar broncospasmo.
Na presença de arritmias cardíacas, especialmente nas taquiarritmias supraventriculares, dá-se preferência a betabloqueadores ou verapamil. Nos casos de bloqueios da condução atrioventricular, deve-se evitar o uso de betabloqueadores, verapamil, diltiazem e mibefradil.
Os antiinflamatórios não-hormonais reduzem a eficácia anti-hipertensiva de diuréticos, betabloqueadores, inibidores da ECA e antagonistas do receptor da angiotensina II. Além disso, o uso de antiinflamatórios não-hormonais em pacientes desidratados, como, por exemplo, sob o uso de diuréticos, pode levar à perda de função renal, principalmente em idosos.
Na hipertensão associada ao uso crônico de ciclosporina, todos os agentes podem ser empregados, embora os inibidores da ECA sejam menos efetivos. Os antagonistas dos canais de cálcio diidropiridínicos também estão indicados. Diltiazem e verapamil aumentam os níveis sanguíneos de ciclosporina e digoxina.
O uso de eritropoetina recombinante humana pode causar elevação da pressão arterial, mais relacionada ao aumento da resistência vascular periférica do que ao aumento do hematócrito ou da viscosidade. Deve-se manter controle adequado do volume circulante e dos agentes anti-hipertensivos. Em alguns casos, a dose de eritropoetina pode ser reduzida e a via de administração modificada, de endovenosa para subcutânea.
Fonte: http://departamentos.cardiol.br/dha/consenso /capitulo6.asp


terça-feira, 12 de novembro de 2013

RINITE ALÉRGICA

DEFINIÇÃO
 
Rinite é a inflamação aguda ou crônica, infecciosa, alérgica ou irritativa da mucosa nasal, sendo os casos agudos, em sua maioria, causada por vírus, ao passo que os casos crônicos ou recidivantes são geralmente determinados pela rinite alérgica, induzida pela exposição a alérgenos, que, após sensibilização, desencadeiam resposta inflamatória mediada por imunoglobulina E (IgE). Como toda afecção alérgica, ela pode apresentar duas fases. A primeira, chamada imediata, ocorre minutos após o estímulo antigênico e a segunda, denominada fase tardia ou inflamatória, ocorre quatro a oito horas após o estímulo. Os sintomas mais comuns são rinorreia aquosa, obstrução ou prurido nasal e espirros em salvas. Muitas vezes acompanham sintomas oculares como prurido, hiperemia conjuntival e lacrimejamento. Esses sintomas podem melhorar espontaneamente. Nos casos crônicos, pode ocorrer perda do paladar e do olfato. Os principais alérgenos ambientais desencadeantes e/ou agravantes da rinite são os ácaros da poeira domiciliar, barata, os fungos, epitélio, urina e saliva de animais (cão e gato). Os principais irritantes inespecíficos são a fumaça do cigarro e compostos voláteis utilizados em produtos de limpeza e construção, desencadeando os sintomas por mecanismos não imunológicos.
Qual a relação entre rinite alérgica e asma?
Diversos autores têm referido que asma e rinite fazem parte de uma mesmadoença, defendendo o conceito de “via aérea única”, com manifestações clínicas mais intensas e evidentes que dependeriam do órgão “mais acometido”. As alterações de função nas vias aéreas superiores poderiam levar a alterações nas vias aéreas inferiores e vice-versa, caracterizadas por inflamação da mucosa que podem ser mantidas e amplificadas por mecanismos imunológicos similares e interrelacionados. Um estudo multicêntrico mostrou que cerca de 80% das pessoas com asma têm rinite alérgica e aproximadamente 15 a 30% dos portadores de rinite têm sintomas de asma. Estudo de base populacional realizado com adolescentes brasileiros demonstrou que cerca de 10% deles tinham concomitância de sintomas de rinite alérgica e asma. A rinite alérgica é considerada como fator de risco e marcador de gravidade da asma. Ela piora a asma, além de aumentar o risco de hospitalizações e exacerbar as crises. Portanto, portadores de rinite persistente devem ser investigados para asma e viceversa.
A fim de se obterem bons resultados no controle de cada doença, é importante o tratamento e controle das duas doenças.
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico de rinite alérgica é clínico, com base nos dados de história e exame físico. Na anamnese, perguntar sobre início, duração e intensidade dos sintomas, quais os fatores desencadeantes ou irritantes, tratamentos realizados, frequência de uso de medicamentos e resposta obtida, além dos efeitos adversos. Pesquisar também história familiar e pessoal de atopia. 
Ao exame físico, pode-se encontrar linha de Dennie-Morgan (prega em pálpebras inferiores secundárias ao edema), sulco ou prega nasal transversa. À rinoscopia anterior observam-se frequentemente cornetos nasais edemaciados com a mucosa de coloração pálida e secreção nasal mucoide.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
O diagnóstico diferencial de rinite alérgica pode ser resumido nas principais doenças e condições listadas abaixo:
• Rinite crônica não alérgica
• Rinite infecciosa
• Póliposse nasossinusal
• Fatores mecânicos
• Desvio de septo
• Hiperplasia adenoideana
• Corpo estranho nasal
• Atresia coanal
• Tumores
• Discinesia ciliar
• Rinorreia cerebroespinhal.
CLASSIFICAÇÃO DA GRAVIDADE
A rinite alérgica é classificada atualmente com base na intensidade dos sintomas e seu impacto sobre a qualidade de vida do paciente. Assim, de acordo com o Allergic Rhinitis and its Impact on Asthma (ARIA), a rinite pode ser intermitente leve; intermitente moderada/grave; persistente leve; persistente moderada/grave. Essa classificação é importante porque implica diretamente na conduta terapêutica. 
Objetivos do tratamento
O objetivo do tratamento da rinite alérgica é promover a prevenção e o alívio dos sintomas, de forma segura e eficaz. O tratamento a ser instituído depende da classificação da rinite, constando de medidas farmacológicas e não farmacológicas.
Princípios do tratamento de manutenção Abordagem educacional
O conhecimento dos pacientes sobre a rinite, os medicamentos utilizados e as habilidades necessárias para o uso correto dos diversos dispositivos existentes no mercado são deficientes e permeados de mitos. O maior impacto sobre o controle da rinite implica tratamento farmacológico, no entanto o controle ambiental e a educação dos pacientes e familiares podem promover efeito aditivo na melhora desses indivíduos. Ainda, faz-se necessário identificação de condições sociais e ambientais e hábitos de vida, principalmente tabagismo e exposições ocupacionais. Abaixo estão sugeridas abordagens educacionais a serem desenvolvidas por médicos e/ou enfermeiros.
Abordagem educacional – profissionais médicos e enfermagem
Objetivos: sedimentar as noções básicas sobre a rinite, seu tratamento, técnicas de uso de dispositivos inalatórios, esclarecimento de questões expostas pelos pacientes. Conteúdo sugerido: o que é rinite; medicações de alívio e de manutenção; uso correto dos diferentes dispositivos para aplicação dos medicamentos intranasais; elaborar (médico) e revisar (enfermagem) plano de ações simplificado na própria receita. Caráter obrigatório: solicitar que o paciente compareça assiduamente às consultas e atividades de grupo, além da necessidade de adesão à terapêutica. Periodicidade: primeira consulta, visitas mais frequentes no início do tratamento até controle dos sintomas. Variável de acordo com a gravidade da doença.
Tratamento não farmacológico
Para o tratamento não farmacológico, asma e rinite seguem os mesmos parâmetros, uma vez que são doenças integradas e principalmente desencadeadas por componente alérgico. O tratamento não farmacológico da rinite deve seguir os itens abaixo listados:
• Educação e orientação quanto à doença.
• Uso correto das medicações inalatórias e capacidade de distinção entre medicações de manutenção (coricoides intranasais, por exemplo) e de alívio (anti-histamínicos, por exemplo).
• Cessação do tabagismo (ele deve ser exaustivamente desencorajado).
• Perda de peso (quando indicado) e prevenção do sobrepeso e obesidade.
• Realização de atividades físicas.
• Controle ambiental.
• Reduzir a exposição a fatores desencadeantes de forma individualizada levando em consideração a história do paciente:
- Evitar exposição a ácaros ou alérgenos relacionados.
- Evitar exposição a mofo.
- Evitar tabagismo ativo e passivo.
- Retirar animais domésticos se comprovada sensibilização.
- Evitar odores fortes e exposição ocupacional.
- Evitar locais de poluição atmosférica.

Fonte: Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Doenças respiratórias crônicas / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – Brasília : Ministério da Saúde, 2010.

terça-feira, 22 de outubro de 2013

HUMANIZAÇÃO E ACOLHIMENTO À MULHER NA ATENÇÃO BÁSICA

Humanização na saúde significa a valorização da qualidade técnica e ética do cuidado, aliada ao reconhecimento dos direitos do/a usuário/a, de sua subjetividade e referências culturais, garantindo o respeito às questões de gênero, etnia, raça, situação econômica, orientação sexual e a grupos populacionais como indígenas, trabalhadores, quilombolas, ribeirinhos e assentados. A Política Nacional de Humanização do Sistema Único de Saúde – HumanizaSUS, instituída pelo Ministério da Saúde em 2003, é fruto de um debate no campo da saúde pública interessada em fazer avançar os princípios do SUS de acesso universal, integralidade da atenção e eqüidade na gestão, distribuição e uso dos recursos segundo as necessidades de saúde da população brasileira. Coloca-se como protagonista nesse debate fazendo propostas voltadas para a mudança dos modelos de gestão e de atenção que, no cotidiano dos serviços, são operadas pelos/as gestores/as, trabalhadores/as e usuários/as. Altera o modo tradicional com que habitualmente se constroem as relações entre as instâncias efetuadoras do SUS, como também nos serviços, já que ela se faz transversalmente, num trabalho conjunto com outras áreas, programas, setores e outras políticas. A concretude dessa política se dá por meio de seus dispositivos - tecnologias, ferramentas e modos de operar. Dentre esses se destaca o “acolhimento”, que se caracteriza como um modo de operar os processos de trabalho em saúde de forma a dar atenção a todos/as que procuram os serviços de saúde, ouvindo suas necessidades – escuta qualificada – e assumindo no serviço, uma postura capaz de
acolher, escutar e pactuar respostas mais adequadas com os/as usuário/as. O acolhimento não é um espaço ou um local, mas uma postura ética, não pressupõe hora ou um profissional específico para fazêlo, implica compartilhamento de saberes, necessidades, possibilidades, angústias e invenções. É importante considerar as especificidades na população feminina - negras, indígenas, trabalhadoras da cidade e do campo, as que estão em situação de prisão, as lésbicas e aquelas que se encontram na adolescência, no climatério e na terceira idade - e relacioná-las à situação ginecológica, em especial ao câncer do colo do útero e as DST. Em relação às mulheres negras, os dados da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde – PNDS (1986) mostram um menor acesso em relação às mulheres brancas à atenção ginecológica. Isso resulta que as mulheres negras têm maiores risco de contrair e morrer de determinadas doenças do que as mulheres brancas, como é o caso do câncer de colo do útero, que é duas vezes mais frequente em mulheres negras. É fundamental inserir o contexto cultural das sociedades indígenas na construção de políticas de saúde voltadas para mulheres. A atenção à saúde dessas mulheres é precária, não garantindo ações de
prevenção de câncer do colo do útero, de mama ou de DST, entre outras, além dos dados epidemiológicos serem insuficientes para avaliação das ações que são desenvolvidas. A organização da rede de saúde deve estar preparada para lidar com a especificidade dos agravos decorrentes do trabalho no campo. A dificuldade das mulheres rurais no acesso às informações e ações de saúde estão relacionadas, dentre outros fatores, as desigualdades das relações de gênero e de trabalho, às grandes distâncias entre a residência ou o trabalho e os serviços de saúde, à maior precariedade dos serviços locais e sua pouca sensibilização. Dentre os fatores de deterioração da saúde das trabalhadoras rurais, a exposição aos agrotóxicos, seja ambiental ou ocupacional, aguda ou crônica, constitui-se em
uma das especificidades relacionadas aos agravos de saúde, podendo causar danos a saúde dessas mulheres. Entre os mais comuns estão a hipertrofia celular, que pode levar ao desenvolvimento do câncer. Em relação às mulheres que fazem sexo com mulheres, a agenda de necessidades de saúde diz respeito, dentre outros, ao atendimento na área da ginecologia, onde os/as profissionais partem do pressuposto de que a vida sexual ativa das mulheres é sempre de caráter heterossexual. É preciso que os profissionais de saúde saibam atender as mulheres lésbicas e bissexuais dentro de suas especificidades, e respeitando seus direitos de cidadania. Constata-se que muitas delas ainda consideram que o câncer do colo do útero só afeta mulheres heterossexuais. Portanto, não se sentem mobilizadas para realização de exames preventivos do câncer do colo do útero e de detecção precoce do câncer de mama. Outro problema se refere às mulheres lésbicas profissionais do sexo e sua vulnerabilidade pela exposição às DST e aids. Grande parte da população presidiária esta exposta a diversos fatores de risco à saúde, ocorrendo um número significativo de casos de DST – aids, câncer e outras doenças prevalentes na população adulta brasileira. Nesse contexto, identifica-se a necessidade de acesso dessa população às ações de atenção à saúde, tanto com a implantação de ações na atenção básica dentro dos presídios, como pelas referências para média e alta complexidade, com garantia do atendimento das demandas específicas das mulheres em situação de prisão. As mulheres e os familiares que encaram um diagnóstico de câncer experimentam uma variedade de
emoções, estresses e aborrecimentos. O medo da morte, a interrupção dos planos de vida, perda da autoestima e mudanças da imagem corporal, além de mudanças no estilo social e financeiro, são questões fortes o bastante para justificarem desânimo e tristeza. Experiência marcada por sentimentos ambivalentes de sofrimento e luta pela sobrevivência, devido às respostas do seu corpo ao tratamento. Quando as mulheres ficam sabendo que estão com câncer é comum tornarem-se, durante um curto espaço de tempo, descrentes, desesperadas ou negarem a doença. Essa é uma resposta comum no espectro de emoções dessa fase, muitas vezes denominada como “a perda do controle da vida”, o que não significa que sejam emoções insuperáveis. Atualmente, a Medicina dispõe de procedimentos que têm se mostrado eficazes para o diagnóstico da neoplasia, em estádios precoces, e de medidas terapêuticas capazes de curar ou melhorar a sobrevida das pacientes. Cuidados adequados para reduzir o sofrimento e ações que possibilitem uma melhor qualidade de vida devem ser disponibilizados à população. O projeto terapêutico, plano de ação que considera todos os fatores envolvidos no processo de adoecimento, deve necessariamente incluir ações que visem ao aumento da autonomia do/a usuário/a e da família, estabelecendo relações simétricas entre o profissional e a pessoa a ser cuidada, dividindo a responsabilidade pela decisão e suas consequências. A equipe de saúde deve valorizar as queixas da mulher, estar disposta a ouví-la, não desvalorizar ou minimizar seus problemas e reconhecer seus direitos a esclarecimentos e informações. As decisões devem ser compartilhadas e caso a mulher deseje procurar alívio para seus sintomas em outras abordagens terapêuticas, a equipe deve respeitar sua opção. É importante lembrar que a equipe da atenção básica não deve se eximir da responsabilidade do acompanhamento da mulher ao longo do tempo, independente do tipo de tratamento e do nível de complexidade do sistema no qual ela esteja sendo atendida.
Há algumas situações que exigem dos/as profissionais de saúde uma atitude diferente da conduta rotineira, para que a relação de confiança seja fortalecida. Por exemplo, quando surgem suspeitas diagnósticas de doenças graves, é importante compartilhar com a mulher até onde o/a profissional poderá acompanhá-la. Às vezes, é necessário adiar ou fornecer gradativamente as informações, até que ela se sinta mais segura. Nesses casos convém saber o que dizer e quando. Pode-se, ainda na fase de investigação diagnóstica, indagar quanto a pessoa deseja saber, de uma forma sutil: “Eu prometo lhe dizer o que sei a respeito do que você tem, se você me perguntar”. É necessário habilidade e tato para sentir o quanto a paciente deseja saber. E às vezes uma pergunta como “Será que eu tenho câncer?” pode esconder outras que não serão formuladas, como: “Quando e como vou morrer?” “Vou sentir muita dor?”
É importante, também, caso se constate que a mulher não tem condições de conviver com o conhecimento de sua doença, compartilhar ao menos com uma pessoa da família, ou de confiança da mulher o que será feito e as razões. Um relacionamento baseado na confiança transmite tranqüilidade e oferece segurança, que são suportes terapêuticos fundamentais. Especificidade do atendimento à adolescente É necessária uma atenção especial em relação à ocorrência do câncer do colo do útero cada vez mais precocemente, pois com a progressiva antecipação do início da puberdade e conseqüente decréscimo na idade da menarca, a capacidade reprodutiva se instala mais cedo, assim como o início precoce da atividade sexual e com ela a ocorrência de DST, entre elas o HPV e aids. A garantia de estratégias de promoção da saúde e prevenção de doenças, principalmente voltadas à educação sexual e reprodutiva, assim como o acolhimento e a realização do exame preventivo do câncer do colo do útero em adolescentes que têm atividade sexual e procurarem os serviços de saúde, devem integrar as ações da atenção integral à saúde da mulher. O Ministério da Saúde considera a adolescência como a segunda década da vida – de 10 a 19 anos, de acordo com a Organização Mundial de Saúde. A existência de diversas limitações etárias, para os adolescentes exercerem seus direitos, causa perplexidade e dificuldades para os profissionais de saúde no atendimento da população adolescente, criando receios do ponto de vista ético e legal. Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em
condições de liberdade e de dignidade. Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n.º 8.069, de 13/7/1990. Dessa forma, qualquer exigência, como a obrigatoriedade da presença de um responsável para acompanhamento no serviço de saúde, que possa afastar ou impedir o exercício pleno do adolescente de seu direito fundamental à saúde e à liberdade, constitui lesão ao direito maior de uma vida saudável.  alguma intervenção em razão de sua complexidade, deve, primeiramente, realizar as intervenções
urgentes que se façam necessárias, e, em seguida, abordar o adolescente de forma clara sobre a necessidade de que um responsável o assista e o auxilie no acompanhamento. A resistência do adolescente em informar determinadas circunstâncias de sua vida à família por si só demonstra uma desarmonia que pode e deve ser enfrentada pela equipe de saúde, preservando sempre o direito do adolescente em exercer seu direito à saúde. Dessa forma, recomenda-se que, havendo resistência fundada e receio que a comunicação ao responsável legal, implique em afastamento do usuário ou dano à sua saúde, se aceite pessoa maior capaz indicada pelo adolescente para acompanhá-lo e auxiliar a equipe de saúde na condução do caso, aplicando-se analogicamente o princípio do art. 142 do Estatudo da Criança e do Adolescente. Art. 142 Os menores de dezesseis anos serão representados e os maiores de dezesseis e menores de vinte e um anos assistidos por seus pais, tutores ou curadores, na forma da legislação civil ou processual. Parágrafo único. A autoridade judiciária dará curador especial à criança ou adolescente, sempre que os interesses desses colidirem com os de seus pais ou responsável, ou quando carecer de representação ou assistência legal ainda que eventual. Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n.º 8.069, de 13/7/1990. Diante das implicações legais que possam surgir nos casos de maior complexidade, recomenda-se que o serviço de saúde busque uma articulação e integração com o Conselho Tutelar da região e com a Promotoria da Infância e Juventude de forma que possibilite a colaboração de seus integrantes na condução das questões excepcionais, e de maneira harmônica com os princípios éticos que regem esse atendimento.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

SINAIS E SINTOMAS RESPIRATÓRIOS


Como identificar um paciente com sintomas respiratórios crônicos? A definição clássica de sintomático respiratório é o indivíduo que apresenta tosse, associada ou não a outra alteração respiratória, por algumas semanas. Esse conceito se aplica tanto a adolescentes quanto a adultos. Recomenda-se a realização de baciloscopia direta do escarro para confirmar ou excluir tuberculose pulmonar nas pessoas que tossem por mais de três semanas, se não têm justificativa clara para o sintoma. Nas crianças, para as quais não há consenso sobre a definição de sintomático respiratório, a presença de tosse por três meses e/ou sibilância (uma semana/mês) e/ou com radiografia de tórax com alteração persistente é sugestiva de doença respiratória crônica.
Tosse
 
A presença de tosse é indicativa da existência de alguma doença e, portanto, sua etiologia deve ser pesquisada. Define-se como tosse persistente a presença desse sintoma por, pelo menos, três semanas. Suas principais causas são rinossinusopatias (rinite e rinossinusite), asma e refluxo gastroesofágico. A tosse pode ser classificada em aguda até três semanas de duração; subaguda de três a oito semanas; e crônica se superior a oito semanas. Pode ser ainda seca ou produtiva. Nos pacientes que não expectoraram voluntariamente, por vergonha ou incapacidade (caso das crianças menores de 6-8 anos e mulheres), deve-se solicitar que tussam voluntariamente para que se reconheça o caráter seco ou produtivo. Diante de paciente com tosse crônica, a anamnese e o exame físico podem auxiliar na formulação do diagnóstico diferencial. Na população pediátrica, a etiologia varia com a faixa etária. Por exemplo, entre os lactentes, predominam as infecções, anomalias congênitas e fibrose cística; nos pré-escolares, as infecções, asma, rinossinusite, corpo estranho e tabagismo passivo; entre escolares e adolescentes, a rinossinusite, asma, processos infecciosos e tosse irritativa secundária ao tabagismo (ativo ou passivo) e poluição ambiental. Em pessoas acima de 40 anos, a tosse pode estar associada a DPOC ou carcinoma brônquico. Indagar sobre antecedentes atópicos, tabagismo ativo ou passivo, exposição ocupacional. Quando de caráter progressivamente mais intenso e persistente, pode sugerir carcinoma brônquico. Tosse durante exercícios físicos, sobretudo se acompanhada
por dispneia, pode significar a presença de broncoespasmo induzido pela atividade física. A história de tosse crônica exige não apenas a investigação dos outros sinais e sintomas respiratórios, como também dos sintomas digestivos, entre eles, a “queimação” retroesternal, que pode sugerir refluxo gastroesofágico. A tosse psicogênica deve ser considerada somente quando todas as outras causas já foram investigadas e excluídas. Esta predomina durante o dia e quase que desaparece durante o sono noturno.
Principais doenças e condições que provocam tosse crônica.
• Asma
• Rinite/rinossinusite
• Doença do refluxo gastroesofágico
• Hiper-reatividade pós-infecção respiratória
• DPOC
• Tuberculose
• Bronquiectasia
• Uso de inibidores da enzima conversora da angiotensina
• Insuficiência cardíaca
• Neoplasia (pulmão, laringe, esôfago).


Expectoração
O escarro eliminado pela boca contém a mistura de secreções provenientes da nasofaringe, orofaringe e pulmões. Qualquer expectoração deve ser considerada como achado clínico anormal, a despeito da benignidade da maioria dos casos. Dado que o paciente pode não conseguir distinguir escarro de saliva, durante a consulta é recomendável que ele expectore sobre uma folha de papel branco para que se proceda a diferenciação. Ademais, ela se prestará para melhor classificação do escarro e das afecções que a ele se associam. É preciso observar as características do escarro: volume (escasso, moderado ou abundante), aspecto (mucoso, purulento, sanguíneo ou com estrias de sangue), coloração (esbranquiçado, amarelado, esverdeado) e odor (fétido ou não). A presença de escarro purulento ou mucopurulento e amarelado ou esverdeado está, geralmente, relacionada a quadros infecciosos agudos, subagudos e crônicos. A expectoração excessiva pela manhã pode estar associada a bronquiectasias, bronquite crônica infectada e abscessos pulmonares. 
Hemoptise
Diante de hemoptise, o primeiro passo é distinguir a verdadeira da falsa. Na verdadeira hemoptise, a origem do sangue está nos vasos da parede da traqueia, brônquios ou do tecido pulmonar, enquanto na falsa, o sangramento se localiza nas vias aéreas superiores ou no trato digestivo superior. Diferentemente da falsa, na verdadeira hemoptise o sangue habitualmente tem aspecto vivo e rutilante, é espumoso e está misturado a alguma quantidade de muco. É necessário diferenciar o sangramento das vias aéreas do das vias digestivas baixas (hematêmese), que habitualmente tem coloração mais escura e está associado a outros sintomas digestivos. A hemoptise pode ser secundária à tuberculose e qualquer das afecções que levam à bronquite, pneumonia e especialmente a bronquiectasias, entre elas as imunodeficiências, sequelas infecciosas prévias e fibrose cística. Pode ocorrer também em doenças que envolvem a circulação pulmonar e brônquica, tais como o tromboembolismo pulmonar, a insuficiência cardíaca e as vasculites.
Sibilância (chiado, chieira, piado)
Geralmente os pacientes ou familiares de crianças têm dificuldade em caracterizar a sibilância com precisão durante a anamnese e a traduzem como “ronqueira” (originárias das vias aéreas superiores), “peito-cheio” (relacionado geralmente à tosse produtiva) e, por isso, é indispensável comprová-la pela ausculta pulmonar. Diferentemente das crepitações, que são ruídos descontínuos, os sibilos são ruídos adventícios contínuos e musicais. A sibilância é secundária a processos obstrutivos brônquicos, sejam intrínsecos (carcinoma brônquico, corpos estranhos, enfermidades que levam à instalação de secreção-inflamação-edema, como é o caso da asma), sejam compressivos extrínsecos (adenomegalias, tumores etc.). Como a asma é, por definição, uma doença que cursa com reversibilidade brônquica, é mandatório auscultar o paciente imediatamente antes e cerca de 20 minutos após a administração de broncodilatadores inalatórios. O diagnóstico fica praticamente confirmado se houver melhora da sibilância (e redução da taquidispneia) nesse curto intervalo de tempo. A falta de resposta sugere diagnóstico diferencial, como é o caso de infecções respiratórias, da DPOC, aspiração de corpos estranhos, tumores, malformações cardiovasculares ou digestivas, refluxo gastroesofágico, entre outros.
Dor torácica
A causa mais comum de dor torácica em adultos é a nevralgia intercostal ou costocondrite. Se houver história de trauma, indica a possibilidade de fratura de costela. Quando a dor torácica está associada a comprometimento pleural, geralmente é superficial, bem localizada (o paciente aponta o local da dor com o dedo), ventilatóriadependente e sem hiperestesia à palpação no local de origem da sensação dolorosa. Em qualquer uma das causas há menor expansibilidade do tórax no lado comprometido. A tosse é propositalmente inibida por causa da dor. Pneumonia, infarto pulmonar e pneumotórax devem ser considerados no
diagnóstico diferencial. É relativamente infrequente na tuberculose pulmonar nos seus estágios iniciais e sem comprometimento pleural.
Taquipneia e dispneia
Taquipneia é definida pelo aumento da frequência respiratória. Dispnéia é caracterizada por falta de ar ou respiração difícil. Como foi referido na sibilância, é essencial
a comprovação dessas anormalidades durante a consulta, porque a “falta de ar” pode ser percebida de forma diversa pelos pacientes e muito frequentemente está relacionada com aspectos culturais e nível de escolaridade. A dispneia deve ser classificada de acordo com a sua relação com as atividades da vida diária (subir ladeira, subir escada, tomar banho, trocar de roupa, colocar sapato, ralações sexuais, entre outras). Deve-se verificar a intensidade da dispneia ao longo do tempo no mesmo paciente, avaliando-se a resposta ao tratamento estabelecido. A dispneia aguda ou de instalação em curto espaço de tempo pode indicar crise de asma, embolia pulmonar ou pneumotórax. A dispneia crônica ou com piora progressiva é característica da DPOC, tumores centrais do trato respiratório, estenose traqueal, doenças do interstício pulmonar e fibrose pleural, além da insuficiência cardíaca.

Cianose
A cianose é a coloração azulada da pele, da região perioral, do leito ungueal e de mucosas, associada ao aumento da hemoglobina não saturada de oxigênio e reflete hipoxemia acentuada. A saturação de hemoglobina pode ser facilmente medida com um oxímetro de pulso, enquanto a pressão arterial de oxigênio requer um gasometria. 


Baqueteamento digital
O baqueteamento digital está associado a doenças cardiovasculares, digestivas e pulmonares. Resulta de aumento de tecido conjuntivo vascularizado e edema intersticial na região subungueal dos dedos das mãos e artelhos. São várias as enfermidades respiratórias crônicas que podem cursar com baqueteamento (ou hipocratismo) digital: a fibrose pulmonar, bronquiectasias, carcinoma broncogênico e fibrose cística.


Respirador bucal
O termo respirador bucal pode ser empregado para definir pacientes que substituem o padrão fisiológico de respiração nasal pela respiração predominantemente oral ou mista (nasal e oral). Caracteriza-se por graus variados de obstrução nasal e roncos (“ronqueira”) durante o sono, hipertrofia de amígdalas e/ou adenoides e apneia obstrutiva do sono. A boca tende a permanecer aberta ou entreaberta, lábios predominantemente ressecados, língua rebaixada e hipotônica, nariz achatado e narinas pequenas, protrusão da arcada dentária superior e mordida cruzada (ver figura abaixo). Crianças podem apresentar sonolência e déficit de atenção. O profissional de saúde deve sempre buscar a etiologia da síndrome do respirador bucal. Na população pediátrica, as causas mais frequentes são a hipertrofia das adenoides e a rinossinusite alérgica (e, nesse caso, além do quadro clínico acima, estarão presentes o prurido nasal e ocular, espirros em salva, rinorreia serosa ou seromucosa), rinosinusite infecciosa crônica, corpos estranhos nasais e polipose nasal. Uma respiração bucal persistente em crianças pequenas pode resultar em anormalidade craniofacial (face alongada). Portanto, diagnóstico e tratamento corretos são essenciais para se evitar essa deformidade e prevenir as complicações a ela associadas.



 As alterações decorrentes da respiração bucal prolongada são:
• Aumento vertical do terço inferior da face.
• Arco maxilar estreito.
• Palato em ogiva.
• Halitose.
• Má oclusão dentária (mordida aberta, incisivos superiores protruídos).
• Lábio inferior evertido.
• Hipotonia dos elevadores de mandíbula e hipotonia lingual.
• Alterações da postura de língua em repouso, na deglutição e na fala.
• Alterações da mastigação e vocais.
• Alterações posturais.

domingo, 21 de julho de 2013

FATORES DE RISCO PARA QUEDAS EM IDOSOS



Quedas e as consequentes lesões resultantes constituem um problema de saúde pública e de grande impacto social enfrentado hoje por todos os países em que ocorre expressivo envelhecimento populacional. As quedas ocorrem devido à perda de equilíbrio postural e tanto podem ser decorrentes de problemas primários do sistema osteoarticular e/ou neurológico quanto de uma condição clínica adversa que afete secundariamente os mecanismos do equilíbrio e estabilidade. Por isso, a queda pode ser um evento sentinela, sinalizador do início do declínio da capacidade funcional, ou sintoma de uma nova doença. A definição de queda varia conforme o autor, mas segundo a diretriz anterior sobre “Quedas em idosos”, que procurou um conceito abrangente, “queda é o deslocamento não intencional do corpo para um nível inferior à posição inicial com incapacidade de correção em tempo hábil, determinado por circunstâncias multifatoriais comprometendo a estabilidade.” A queda é o mais sério e frequente acidente doméstico que ocorre com os idosos e a principal etiologia de morte acidental em pessoas acima de 65 anos. A prevenção da queda é de importância ímpar pelo seu potencial de diminuir a morbidade e a mortalidade, os custos hospitalares e o asilamento consequentes. Os programas de prevenção têm a vantagem de, paralelamente, melhorar a saúde como um todo, bem como a qualidade de vida, sendo sua prática especialmente importante para a faixa etária mais idosa.
EPIDEMIOLOGIA
A estimativa da incidência de quedas por faixa etária é de 28% a 35% nos idosos com mais de 65 anos e 32% a 42% naqueles com mais de 75 anos3,4(C)5(D). Em um estudo realizado em 2002, cerca de 31% dos idosos disseram ter caído no ano anterior ao inquérito e 11% afirmaram ter sofrido duas ou mais quedas. Alguns estudos prospectivos indicam que 30% a 60% da população da comunidade com mais de 65 anos cai anualmente e metade apresenta quedas múltiplas6. Aproximadamente 40% a 60% destes episódios levam a algum tipo de lesão, sendo 30% a 50% de menor gravidade, 5% a 6% injúrias mais graves (não incluindo fraturas) e 5% de fraturas. Destas, as mais comuns são as vertebrais, em fêmur, úmero, rádio distal e costelas. Cerca de 1% das quedas leva à fratura do fêmur. Um estudo nacional evidenciou a seguinte incidência bruta de fraturas do fêmur em pessoas com 70 anos ou mais: mulheres - 90,2/10.000 e homens - 25,4/10.0009(B). Os que já sofreram uma queda apresentam risco mais elevado para cair, entre 60% e 70% no ano subsequente. Os idosos mais saudáveis caem menos, cerca de 15% em um ano, comparativamente aos asilados, cujo porcentual sobe até 50%. Entre 20% e 30% dos caidores (idosos com mais de duas quedas por ano) que sofreram alguma lesão apresentarão redução da mobilidade, da independência, e aumento do risco de morte prematura. Estas estatísticas e a descrição de um perfil do idoso caidor se referem às quedas dentro do domicílio, onde pesa a influência dos fatores intrínsecos. Já as quedas fora do domicílio são causadas em sua maioria por fatores ambientais e, geralmente, atingem idosos mais ativos. Trauma é a quinta causa de mortalidade na faixa etária maior que 65 anos, sendo a queda responsável por 70% das mortes acidentais em pessoas acima de 75 anos2. Quase metade das mortes segue-se a uma fratura de fêmur. Após hospitalização por queda, algumas complicações podem culminar com morte, como exemplos: pneumonia, infarto do miocárdio e tromboembolismo pulmonar. A queda foi considerada um dos preditores de mortalidade em estudo realizado no exterior. Os caidores têm o dobro da taxa de morte em comparação ao grupo de não caidores.
CONSEQUÊNCIAS
O temor de novas quedas é tão prevalente quanto as mesmas, ocorrendo em 30% a 73% dos idosos. A perda de confiança na capacidade de deambular com segurança pode resultar em piora do declínio funcional, depressão, baixa autoestima e isolamento social. Após a queda, o idoso pode restringir sua atividade por temor, pela dor, ou pela própria incapacidade funcional. A reabilitação pós-queda pode ser demorada, e, no caso de imobilidade prolongada, leva a complicações como tromboembolismo venoso, úlceras de pressão e incontinência urinária. Tornando-se dependente, a vítima da queda pode demandar mais tempo do seu cuidador, acarretando problemas sociais. Os caidores estão mais propensos a requererem institucionalização.
FATORES DE RISCO
A estabilidade do corpo depende da recepção adequada de informações de componentes sensoriais, cognitivos, integrativos centrais (principalmente cerebelo) e músculoesqueléticos, de forma altamente integrada. O efeito cumulativo de alterações relacionadas a idade, doenças e meio ambiente inadequado parecem predispor à queda. Os fatores podem ser classificados em três categorias: intrínsecos, extrínsecos e comportamental.
Fatores de risco intrínsecos
• História prévia de quedas – Uma ou mais quedas no ano anterior aumentam o risco de novas quedas no ano subsequente;
• Idade – A prevalência das quedas aumenta com o envelhecimento, porém uma revisão demonstrou que, de 11 estudos apenas quatro encontraram associação positiva entre aumento de idade e futuras quedas;
• Sexo feminino – Nas faixas etárias mais velhas da população, a proporção de mulheres caidoras é maior que a de homens e com maior risco de fraturas;
• Medicamentos – São fatores predisponentes: as drogas psicoativas, as de uso cardiológico, como diuréticos, antiarrítmicos, vasodilatadores e glicosídeo cardíaco e a polifarmácia (uso de quatro ou mais medicamentos simultaneamente);
• Condição clínica – Doenças como hipertensão arterial sistêmica, diabetes melito e doenças neurológicas ou osteoarticulares que afetem a força muscular, o equilíbrio e a marcha são fatores de risco comuns. A hipotensão ortostática deve ser pesquisada sistematicamente devido à sua alta prevalência. As doenças agudas ou condições crônicas descompensadas que afetem a perfusão cerebral também podem precipitar uma queda;
• Distúrbio de marcha e equilíbrio – Podem ser decorrentes do próprio envelhecimento, predispondo a quedas quando ocorre declínio da força e da resistência abaixo do limiar mínimo para realização independente das atividades da vida diárias;
• Sedentarismo – Pode acarretar importante disfunção músculo-esquelética;
• Estado psicológico – O medo de cair novamente após uma queda está correlacionado com pior desempenho da marcha e novos episódios de quedas, podendo restringir atividades físicas e sociais. O estado depressivo também está associado a quedas;
• Deficiência nutricional – Relaciona-se a distúrbio da marcha, perda de força muscular e osteoporose;
• Declínio cognitivo – Mesmo um discreto déficit pode aumentar o risco de queda;
• Deficiência visual – Alterações da acuidade e do campo visual, bem como, catarata, glaucoma e degeneração macular estão correlacionados com aumento do risco de
quedas;
• Doenças ortopédicas – Doenças como espondilose cervical, que pode provocar tontura e desequilíbrio, e problemas nos pés, como calos, deformidades, úlceras e dor ao caminhar, também contribuem para a gênese da queda;
• Estado funcional – O risco de queda aumenta progressivamente conforme o grau de dependência do indivíduo.
Fatores de risco extrínsecos
A participação dos fatores de risco ambientais pode alcançar, conforme o estudo, até 50% das quedas entre os idosos da comunidade. Dentre tais fatores podemos citar:
iluminação inadequada, superfícies escorregadias, tapetes soltos ou com dobras, degraus altos ou estreitos, obstáculos no caminho (móveis baixos, pequenos objetos, fios), ausência de corrimãos em corredores e banheiros, prateleiras excessivamente baixas ou elevadas, roupas e sapatos inadequados, via pública mal conservada com buracos ou irregularidades e órteses inapropriadas.
Fator comportamental: grau de exposição ao risco
Aparentemente, as pessoas mais inativas e as mais ativas são as que têm maior risco de cair, possivelmente pela fragilidade das primeiras e pelo grau de exposição ao risco das demais. Na avaliação dos fatores de risco, portanto, deve-se incluir na anamnese perguntas específicas, como: história prévia de quedas, circunstâncias das mesmas, uso e alterações recentes de medicamentos, evidências de maus tratos, doenças músculo-esqueléticas, capacidade funcional e fatores de risco ambientais. Além do exame físico tradicional, é indicada a realização do teste “get-up and go” (levante-se e ande): o paciente sentado em uma cadeira sem braços deverá levantar-se e caminhar três metros até uma parede, virar-se sem tocá-la, retornar à cadeira e sentar-se novamente, à medida que o médico observa eventuais problemas de marcha e/ou equilíbrio.
INTERVENÇÕES
Otimização Medicamentosa 

Há uma associação bem estabelecida entre o uso de psicoativos e quedas, sendo os antidepressivos, os ansiolíticos, os neurolépticos e os hipnóticos os mais envolvidos. A suspensão desses medicamentos reduz o risco de quedas, embora essa redução possa ser comprometida pela frequente reutilização dos fármacos pelos indivíduos.
Exercício Físico
A implementação de um programa de exercícios físicos que melhore a força muscular e o equilíbrio, orientado de forma individualizada por profissional capacitado, é capaz de reduzir o risco de quedas. Esse tipo de intervenção também se revelou eficaz na prevenção de lesões provocadas por quedas em idosas institucionalizadas e em idosos mais frágeis, com déficit de força muscular e de equilíbrio .Entretanto, apesar dos benefícios comprovados, tipo, duração e intensidade de exercícios necessários para diminuir esse risco ainda não estão estabelecidos. 

Correção dos Fatores de Risco Ambientais
Apesar de um conceito superestimado da importância dos fatores de risco ambientais na indução de quedas, são poucos os estudos consistentes nesta área. As evidências atuais revelam que a intervenção sobre esses fatores, quando realizada por profissional especializado, pode prevenir quedas em idosos com história prévia. Para esses pacientes com episódio prévio de quedas, o uso de barras de apoio foi considerado uma medida útil em um estudo caso-controle envolvendo 270 idosos.


TAI-CHI-CHUAN
A prática do Tai Chi Chuan pode prevenir quedas em idosos relativamente saudáveis da comunidade, assim como naqueles sedentários, com melhora do equilíbrio. 

Correção Visual
Embora o déficit visual seja um fator de risco estabelecido para quedas, não há estudos controlados e randomizados com esta intervenção isoladamente que comprovem sua efetividade na redução da incidência de quedas, com exceção para a primeira cirurgia de catarata. Intervenções Multifatoriais Programas de intervenção multifatorial são efetivos para redução de quedas em idosos da comunidade, com ou sem fatores de risco. Tais programas geralmente incluem exercícios físicos, além de pelo menos outra das seguintes estratégias: correção da visão e riscos ambientais,
tratamento da hipotensão ortostática, revisão de medicamentos e aconselhamento sobre prevenção de quedas.
Questões a Serem Respondidas
Restam ainda muitas questões a serem respondidas: Qual a relação custo-benefício das intervenções? Como selecionar a subpopulação de idosos mais elegível para cada tipo de intervenção? Qual o esquema ideal de exercícios físicos? Estudos controlados para esclarecer essas e outras questões, como o papel da vitamina D (associada em várias publicações a significativa redução de quedas), das abordagens comportamentais e das intervenções cardiovasculares, são necessários, principalmente no âmbito nacional.

Fonte: Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia.