domingo, 13 de fevereiro de 2011

Acidentes por Animais Peçonhentos


Introdução
Acidentes por Animais Peçonhentos contribui para a difusão de conhecimentos acerca de um agravo usualmente pouco conhecido do profissional de saúde, mas que, invariavelmente, se defronta com um paciente acidentado. Estima-se que ocorrem, anualmente, no Brasil cerca de 20.000 casos de acidentes com serpentes, 5.000 com aranhas e 8.000 com escorpiões, podendo estar relacionados à ocorrência de óbitos ou produção de sequelas. Por questões operacionais, optou-se por abordar os envenenamentos para os quais existem soros específicos, ainda que o tema abranja outros grupos de animais peçonhentos bastante frequentes, porém pouco estudados, como alguns animais aquáticos e os himenópteros (abelhas, vespas, formigas).

Ofidismo
ASPECTOS CLÍNICOS E EPIDEMIOLÓGICOS
Descrição - Envenenamento provocado pela ação de toxinas, através de aparelho inoculador (presas) de serpentes, podendo determinar al terações locais (na região da picada) e sistêmicas. Acidentes por serpentes não peçonhentas são relativamente frequentes, porém não determinam acidentes graves, na maioria dos casos, e, por isso, são considerados de menor importância médica. Agentes causais - No Brasil, são quatro os gêneros de serpentes de interesse médico: Bothrops (jararaca, jararacuçu, urutu, caiçaca), Crotalus (cas cavel), Lachesis (surucucu, pico-de-jaca) e Micrurus (coral verdadeira). Bothrops e Micrurus são encontrados em todo o país, enquanto que Crotalus é mais frequentemente encontrado em campos, áreas abertas e secas. Lachesis habita somente as florestas da Amazônia e da Mata Atlântica. Diversos gêneros de serpentes considerados não-peçonhentas ou de menor importância médica, também, são encontrados em todo o país, sendo causa comum de acidentes: Phylodrias (cobra-verde, cobra-cipó), Oxyrhopus (falsa-coral), Waglerophis (boipeva), Helicops (cobra d’água), Eunectes (sucuri) e Boa (jibóia), dentre outras. Diversos gêneros de serpentes consideradas não-peçonhentas são encontrados em todo o país, sendo também causa comum de acidentes: Phylodrias (cobra-verde, cobra-cipó), Oxyrhopus (falsa-coral), Waglerophis (boipeva), Helicops (cobra d’água), Eunectes (sucuri) e Boa (jibóia), dentre outras.

Manifestações clínicas - Como consequência da absorção do veneno na circulação sanguínea, os mecanismos de ação específicos determinam manifestações clínicas diferenciadas para cada gênero de serpente.

Acidente botrópico - Causado por serpentes do gênero Bothrops. Determina processo inflamatório no local da picada, com edema tenso, equimose, dor e adenomegalia regional, que progridem ao longo do membro acometido. Podem ocorrer bolhas com conteúdo seroso ou sero-hemorrágico e, eventualmente, necrose cutânea. Manifestações sistêmicas podem estar presentes com alteração da coagulação sanguínea e sangramentos espontâneos (gengivorragia, equimoses e hematomas pós-trauma, hematúria). Com base no quadro clínico, pode ser classificado em: leve, moderado e grave.
Acidente laquético - Causado por serpentes do gênero Lachesis. Apresenta quadro clínico semelhante ao botrópico, acrescido de manifestações decorrentes de estimulação vagal (náuseas, vômitos, diarreia, bradicardia, hipotensão e choque).
Acidente crotálico - Causado por serpentes do gênero Crotalus. Não leva a alterações locais proeminentes, apenas edema discreto e parestesia; por outro lado, as manifestações sistêmicas são consequentes à paralisia neuromuscular (ptose palpebral, distúrbios de acomodação visual, de olfato e paladar, sialorreia, ptose mandibular), rabdomiólise (dores musculares generalizadas, urina escura) e incoagulabilidade sanguínea.
Acidente elapídico - Causado por serpentes do gênero Micrurus. Leva a quadro neuroparalítico semelhante ao do acidente crotálico, sem outros sinais e sintomas concomitantes.
Acidente por serpentes não-peçonhentas - Sem gravidade, porém frequente, podendo, em algumas circunstâncias, causar edema, dor e equimose na região da picada.
Acidente por serpentes não-peçonhentas - Sem gravidade, porém frequente, podendo, em algumas circunstâncias, causar edema, dor e equimose na região da picada.
Complicações Acidete botrópico e laquético - Celulite, abcesso, síndrome compartimental (compressão do feixe nervoso secundário ao edema), necrose com amputação e/ou sequela funcional, sangramento ma çico, choque e insuficiência renal aguda.
Acidente crotálico - Insuficiência renal aguda e insuficiência respiratória.
Acidente elapídico - Insuficiência respiratória aguda.

Diagnóstico clínico - Na maioria dos casos, o diagnóstico é clínico, baseado nas manifestações apresentadas pelo paciente; o diagnóstico etiológi co, quando há identificação do animal, é pouco frequente. Na ausência de alterações clínicas, o paciente deve ser mantido em observação por 6 a 12 horas seguintes ao acidente, após o que, mantendo-se o quadro inalterado, deve ser considerada a possibilidade de acidente por serpente não-peçonhenta ou acidente por serpente peçonhenta sem envenenamento.

Diagnóstico laboratorial - Não há exame laboratorial para diagnosticar o tipo de acidente. O tempo de coagulação (TC) constitui ferramenta útil para a confirmação dos acidentes botrópico e laquético, quando o quadro local não é muito evidente, e nos acidentes por serpente não peçonhenta ou sem envenenamento. No acidente botrópico, o hemograma pode auxiliar o diagnóstico através de achado de leucocitose, neutrofilia com desvio para a esquerda e plaquetopenia. O sumário de urina pode apresentar hematúria, leucocitúria e proteinúria.

Tratamento - O soro ou antiveneno deve ser específico para cada tipo de acidente. A soroterapia deve ser realizada o mais rapidamente possível e o número de ampo las depende do tipo e da gravidade do acidente A via de administra ção é a endovenosa, devendo-se prestar atenção para a ocorrência de manifestações alérgicas durante e logo após a infusão do antiveneno (urticária, estridor laríngeo, angioedema, náuseas e vômitos, bronco espasmo, hipotensão e choque). Na vigência de reações imediatas, a soroterapia deve ser interrompida e posteriormente reinstituída após o tratamento da anafilaxia. Hidratação endovenosa deve ser iniciada precocemente para prevenir a insuficiência renal aguda. Não há evi dências de que fármacos (antiinflamatórios, heparina) neutralizem os efeitos dos venenos. O único tratamento medicamentoso efetivo pode ser realizado no acidente elapídico, utilizando-se anticolinesterásico (neostigmina ataque: 0,25mg, adultos, ou 0,05mg/kg, crianças, IV; manutenção: 0,05 a 1mg/kg, IV, a cada 4 horas), precedido de atropina IV (0,5mg/kg, adultos, 0,05mg/ kg, crianças). Reações tardias (doença do soro) podem ocorrer 1 a 4 semanas após a soroterapia, com urticá ria, febre baixa, artralgia e adenomegalia.

Características epidemiológicas - O ofidismo constitui, dentre os acidentes por animais peçonhentos, o de maior interesse médico, pela frequência e gravidade. Os acidentes ocorrem em todo o país, porém verifica-se variação significativa por região, com os coeficientes mais elevados no Norte e Centro-oeste. A distribuição por gênero de serpente peçonhenta, entre os casos notificados, indica pre domínio do acidente botrópico (73,5%), seguido do crotálico (7,5%), laquético (3,0%), elapídico (0,7%) e por serpentes não-peçonhentas (3,0%). A sazonalidade é característica marcante, relacionada a fatores climáticos e da atividade humana no campo, que determina ainda um predomínio de incidência nos meses quentes e chuvosos, em indivídu os adultos jovens, do sexo masculino durante o trabalho na zona rural. A letalidade geral é baixa (0,4%). O tempo decorrido entre o acidente e o atendimento e o tipo de envenenamento podem elevar a letalidade em até oito vezes essa taxa, como no envenenamento crotálico, quando o atendimento é realizado mais de 6 a 12 horas após o acidente (4,7%). Por outro lado, a frequência
de sequelas, relacionada a complicações locais, é bem mais elevada, situada em 10% nos acidentes botrópicos, associada a fatores de risco, como o uso de torniquete, picada em extremidades (dedos de mãos e pés) e retardo na administração da soroterapia.
Fonte: www.saúde.gov.br/publicações/manuais tecnicos