Gerson de Souza Santos
HISTÓRICO
MORFOLOGIA DA PELE
A Pele divide-se em várias camadas.
Camadas da Epiderme
DERME é um Tecido que sustenta a Epiderme, é constituído por elementos fibrilares, como Cologénio e a Elastina e outros elementos da matriz, como proteínas estruturais Glicosaminoglicanos ( GAGs).
Na Derme encontra-se Vasos Sanguíneos, terminações nervosas e órgãos Sensoriais e Glândulas.
A Epiderme Penetra na Derme e origina os folículos pilosos, Glândulas Sebáceas e Sudoríparas, também aqui se encontra o músculo erector do Pêlo, fibras de Elásticas (Elastina), fibras de colagénio (Resistência). A parte mais Externa da Pele em Contacto com a Epiderme designa-se por Camada Papilar formada por tecido conjuntivo lasso e com feixes de Colagénio mais finos, enquanto a camada mais Interna designa-se por Camada Reticular formada por tecido conjuntivo denso e rico em fibras Elásticas
Imagem da Estrutura da Pele e sua Legenda | 1- Epiderme 2- Junção Dermo Epidermica 3- Derme 4- Hipoderme 5- Filme Hidrolipídico 6- Corneocitos 7- Queratinócitos 8- Inervação 9- Melanócito 10- Células de Langerhans 11- Células de Merkel 12- Sistema Linfático 13- Vascularização 14- Sistema Pilo sebáceo 15- Glândulas Sebáceas 16- Colagénio 17- Elastina 18- Fibroblastos 19- Substância Fundamental |
HIPODERME é a porção mais profunda da Pele, formada por um tecido conjuntivo lasso que serve para unir, de maneira pouco firme, a Derme aos outros órgãos do corpo. Contém feixes de tecido que envolvem adipócitos (tecido adiposo). Sua Estrutura fornece protecção contra traumas físicos, além de ser um depósito de calorias, protege o organismo da perda de calor e armazena água e energia.
FERIDAS: Uma ferida é representada pela interrupção da continuidade de um tecido corpóreo, em maior ou em menor extensão, causada por qualquer tipo de trauma físico, químico, mecânico ou desencadeada por uma afecção clínica, que aciona as frentes de defesa orgânica para o contra ataque. Sua classificação constitui importante forma de sistematização, necessária para o processo de avaliação e registro. Assim, as feridas podem ser classificadas, de acordo com o tempo de reparação tissular, em agudas e crônicas. As feridas agudas, são originadas de cirurgias ou traumas e a reparação ocorre em tempo adequado, sem complicações. As feridas crônicas, são aquelas que não são reparadas em tempo esperado e apresentam complicações. Outra classificação, se refere às estruturas comprometidas, e consiste na descrição anatômica da profundidade da ferida. Este sistema é adotado para estadiar alguns tipos de feridas crônicas, como as úlceras por pressão e as queimaduras. O sistema de classificação por extensão do dano tissular completa o anterior. Engloba a ferida superficial (limitada à epiderme), ferida com perda parcial (limitada à epiderme e porção superior da derme) e a perda total (existe destruição da epiderme, derme, tecido subcutâneo, podendo invadir músculos, tendões e ossos).
PROCESSO DE REPARAÇÃO TISSULAR
O processo de reparação tissular compreende dois mecanismos de restauração dos tecidos: a regeneração e a cicatrização. A regeneração ocorre com reposição tissular "original". O trauma inicial gera uma resposta inflamatória aguda, manifesta através de edema e formação de exsudato seroso, rico em leucócitos, que cessa em menos de 24 horas. As células epidérmicas, das margens da ferida e das invaginações epidérmicas dos folículos pilosos e glândulas sudoríparas e sebáceas começam a proliferar e migrar no leito da ferida, ocluindo rapidamente sua superfície. O processo de cicatrização de feridas é composto de uma série de estágios complexos, interdependentes e simultâneos, que são descritos em fases. Do ponto de vista morfológico, identificam-se três fases consecutivas, havendo um dinamismo com sobreposição entre elas.
Fase inflamatória - imediatamente após a lesão há vasoconstrição por 5 a 10 minutos, inicialmente reflexa, propiciando o fechamento dos vasos lesados. Em seguida, as células endoteliais retraem-se e perdem suas conexões, aumentando a permeabilidade vascular e permitindo a passagem dos elementos sangüíneos para a ferida; plasma, eritrócitos e leucócitos através do fenômeno de diapedese. Esta vasodilatação com extravasamento de elementos para o exterior do vaso forma um exsudato, traduzido clinicamente por tumor, calor, rubor e dor, cuja intensidade correlaciona-se com o tipo e grau de agressão. Juntamente com todas estas alterações, que correspondem a resposta vascular, existe uma resposta celular. Algumas células são importantes nesta fase: os neutrófilos são responsáveis pela digestão de bactérias e tecidos desvitalizados e os monócitos transformam-se em macrófagos e auxiliam na fagocitose de bactérias e restos celulares. Após o trauma, são liberados mediadores celulares, os quais estimulam a elaboração de substâncias, que desenvolvem o fenômeno inflamatório (histamina, serotonina, bradicinina, prostaglandinas e tromboxanes, linfocinas, interleucina 1 e 2). O fator de crescimento é liberado pelas células epidérmicas e plaquetas. Inúmeros fatores de crescimento e mediadores têm sido estudados e sua influência na cicatrização de feridas.
Fase de Fibroplasia ou Proliferativa - Nesta fase ocorrem a reparação do tecido conjuntivo e do epitélio. Na reparação do tecido conjuntivo ocorre a formação do tecido de granulação, com proliferação endotelial e fibroblastos. O fibroblasto surge por volta do segundo e terceiro dia após o trauma, sendo uma célula fusiforme, com núcleo oval, de origem controversa. O fibrinogênio do exsudato inflamatório transforma-se em fibrina, formando uma rede, onde os fibroblastos depositam-se e passam a multiplicar-se e a secretar os componentes protéicos do tecido cicatricial. Concomitante a esta fibroplasia, ocorre intensa proliferação vascular. Este tecido formado por fibroblastos, substâncias produzidas por eles e vasos sangüíneos é denominado tecido de granulação, clinicamente apresentando-se com aspecto granuloso e avermelhado. O miofibroblasto é uma célula que está presente no tecido de granulação e confere capacidade contrátil, reduzindo a área cruenta e facilitando a epitelização. A atividade mitótica do fibroblasto praticamente desaparece em torno do 15º dia. Estes passam a secretar as proteínas presentes no tecido de granulação, produzindo componentes da substância fundamental e colágeno. A substância fundamental é formada por água, eletrólitos e glicosaminoglicanos, tem aspecto semelhante a um gel e está distribuído entre fibras do tecido conjuntivo. A formação do epitélio é outro fenômeno que ocorre na fase de fibroplasia. Esta epitelização faz-se pelo aumento de tamanho, da divisão e da migração das células da camada basal da epiderme por sobre a área de reparação do tecido conjuntivo subjacente. Nas feridas com perda total da derme, a epitelização se faz apenas das margens da mesma, pois não há anexos cutâneos remanescentes.
Fase de maturação - Nesta fase ocorrem dois eventos importantes: deposição, agrupamento e remodelação do colágeno e regressão endotelial. A remodelação do colágeno inicia-se na formação do tecido de granulação e mantém-se por meses após a reepitelização. As colagenases e outras proteases produzidas por macrófagos e células epidérmicas dão direção correta às fibras colágenas difusas. Há diminuição de todos elementos celulares, inclusive fibroblastos, bem como dos elementos do tecido conjuntivo. A regressão endotelial ocorre através da diminuição progressiva de vasos neoformados, clinicamente a cicatriz se torna menos espessa, passando de uma coloração rosada para esbranquiçada.
A cicatrização de feridas pode ocorrer por primeira intenção, quando não há perda de tecido e as extremidades da pele ficam justapostas uma à outra, por segunda intenção, que ocorre em feridas onde houve perda de tecido e as extremidades da pele ficam distantes umas das outras, sendo necessário formação de tecido de granulação até que a contração e epitelização aconteçam, ou por terceira intenção, em que a ferida é deixada aberta por um determinado período, funcionando como cicatrização por segunda intenção, sendo suturada posteriormente, como cicatrização por primeira intenção. Este procedimento é empregado geralmente nas feridas cirúrgicas com infecção.
Infecção
A causa mais comum no atraso do processo cicatricial é a infecção da ferida operatória.
Quando a contaminação bacteriana ultrapassa a cifra de 105 unidades formadoras de colônia (CFU) por miligrama de tecido ou na presença de qualquer estreptococo beta-hemolítico, o processo de cicatrização não ocorre mesmo com o uso de enxertos ou recobrimento com retalhos.
A infecção bacteriana prolonga a fase inflamatória e interfere com a epitelização, contração e deposição de colágeno. Clinicamente a infecção manifesta-se através de sinais flogísticos acompanhados, geralmente, de drenagem purulenta. Nestes casos deve-se proceder a exposição da ferida, com retirada das suturas, cuidados locais e administração de antibióticos, quando indicados.
Desnutrição
Apesar das necessidades calóricas mínimas para cicatrização adequada não terem sido definidas, sabe-se que uma perda de 15 a 25% do peso habitual interfere significativamente com o processo cicatricial. O catabolismo protéico associado à desnutrição dificulta e retarda o processo de cicatrização. Níveis de albumina inferiores a 2,0g/dL estão relacionados a uma maior incidência de deiscências, além de atraso na cicatrização de feridas.
- A carência de ácido ascórbico (vitamina C) afeta a síntese do colágeno, uma vez que age como coenzima na formação da hidroxiprolina, aminoácido fundamental, responsável pelas propriedades físico-químicas da estrutura do colágeno. A deficiência de vitamina C é a hipovitaminose mais comumente associada à falência da cicatrização de feridas. Nestes casos, o processo pode ser interrompido na fase de fibroplasia. Doses de 100 a 1.000 mg/dia corrigem a deficiência.
- A vitamina A (ácido retinóico), quando deficiente, leva a uma diminuição da ativação de monócitos e distúrbios dos receptores de TGF-beta, fenômenos que, de uma forma ou de outra, levam a prejuízos no processo de cicatrização.
- A deficiência de zinco é rara, estando presente em queimaduras extensas, trauma grave e cirrose hepática. A deficiência deste mineral compromete principalmente a fase de epitelização.
Perfusão tecidual de oxigênio O processo cicatricial é caracterizado por uma atividade sintética intensa, fenômeno que exige um aporte contínuo e adequado de oxigênio. A perfusão tecidual depende, basicamente de três fatores:
- volemia adequada,
- quantidade de hemoglobina
- conteúdo de oxigênio do sangue
Assim, a anemia, desde que o paciente esteja com a volemia adequada, só interfere no processo de cicatrização caso o hematócrito esteja abaixo de 15%, uma vez que o conteúdo de oxigênio pouco afeta a síntese de colágeno na ferida. Fatores que interferem com a perfusão, como a desidratação e a presença de suturas com muita tensão, podem levar a isquemia e deiscência da sutura.
Diabetes mellitus e obesidade
Pacientes portadores de diabetes mellitus tem todas as suas fases de cicatrização prejudicadas. Nota-se espessamento da membrana basal dos capilares, o que dificulta a perfusão da microcirculação. Existe um aumento da degradação de colágeno; além disso, a estrutura do colágeno formado é fraca. A administração de insulina pode melhorar o processo cicatricial de diabéticos. Indivíduos obesos, independente da presença do diabetes, também apresentam a cicatrização comprometida, provavelmente pelo acúmulo de tecido adiposo necrótico e pelo comprometimento da perfusão da ferida.
Glicocorticóides, quimioterapia e radioterapia
Os glicocorticóides e as drogas citotóxicas interferem em todas as fases da cicatrização, os primeiros na fase inflamatória e na síntese do colágeno, e os últimos na divisão celular, impedindo a proliferação de fibroblastos, endoteliócitos, macrófagos e queratinócitos. As drogas utilizadas na quimioterapia de doenças malignas, como a doxorrubicina e a ciclofosfamida, devem ser evitadas nos primeiros cinco a sete dias do pós-operatório, período critico da cicatrização. A radioterapia, além dos efeitos negativos semelhantes à quimioterapia, também compromete a cicatrização, pois é causa de endarterite, com obliteração de pequenos vasos e conseqüente isquemia e fibrose.
PROBLEMAS ESPECÍFICOS NA CICATRIZAÇÃO DE FERIDAS
Trato gastrointestinal
Pouco se sabe sobre as particularidades da cicatrização do trato gastrintestinal, sendo observado na prática clínica que o aumento da força tênsil das anastomoses intestinais é conseguido de forma mais rápida que a da pele. A parede do tubo digestivo pode ser dividida em seis camadas ao longo de todo seu trajeto: mucosa, com seu epitélio, lâmina própria e camada muscular (muscular da mucosa), submucosa, muscular própria e serosa. Sua porção mais interna é a mucosa, cujo revestimento é formado por uma monocamada epitelial. Subjacente à mucosa, encontramos a membrana basal rica em colágeno tipo IV e a lâmina própria da mucosa, rica em colágeno dos tipos I, III e V, células inflamatórias e elastina. No limite externo da mucosa temos uma delgada camada de células musculares, a muscular da mucosa, que contribui para a motilidade digestiva. A camada submucosa serve como um elo entre a mucosa e a muscular própria. Tem rico conteúdo de colágeno e fibroblastos, sendo a camada mais importante no processo de cicatrização do trato gastrintestinal, incluindo as anastomoses digestivas. A presença de inflamação na mucosa sem lesão epitelial (gastrite) não deflagra o processo de cicatrização e reparo. O envolvimento do epitélio em lesões que não ultrapassam a muscular da mucosa, como nas erosões ácido-pépticas, também não estimula o processo cicatricial, ou seja, não há resposta de células mesenquimais. Quando a lesão atinge a submucosa, observa-se resposta de células mesenquimatosas. Células musculares provenientes da muscular da mucosa e da muscular própria migram para o local. Esta lesão é chamada de úlcera e possui células musculares lisas e colágeno em sua base. Se o processo é agudo, após a sua resolução a arquitetura do intestino é preservada. Em lesões crônicas da submucosa, acumula-se tecido cicatricial, que juntamente com o espessamento da parede do intestino, determinará a formação de estenoses.
Pele
Os quelóides e as cicatrizes hipertróficas resultam de um processo anormal de cicatrização de feridas, caracterizado por uma síntese excessiva de colágeno. Estas complicações são mais comuns em negros, asiáticos e qualquer indivíduo que tenha a tonalidade da pele mais pigmentada. Enquanto as cicatrizes hipertróficas permanecem nos limites da ferida e regridem ao longo do tempo, o quelóide se estende além dos limites da ferida e comumente não regride. A cicatriz quelóide tende a ocorrer acima da clavícula, em membros superiores e em face. A cicatriz hipertrófica pode ocorrer em qualquer local. Como vimos antes, existe em ambas as condições uma produção excessiva de colágeno (principalmente nos quelóides). A presença de um inibidor da colagenase, a alfa-2-macroglobulina, encontrado em tecidos de cicatrizes quelóide e hipertrófica, parece alterar o processo normal de cicatrização, favorecendo o surgimento destas complicações. A citocina TGF-beta participa de forma menos clara, mas também parece implicada na gênese de quelóides e cicatrizes hipertróficas. Fibroblastos de cicatrizes quelóides possuem quantidade aumentada desta citocina. Além disto, existe uma resposta mais acentuada na produção de colágeno, quando fibroblastos de tecido quelóide ou cicatrizes hipertróficas são expostos à TGF-beta. O tratamento dos quelóides pode envolver excisão cirúrgica, quando a lesão é esteticamente inaceitável ou quando se necessita recuperar função de um determinado segmento. Infelizmente, a taxa de recorrência é alta para esta lesão. A injeção intralesional de triancinolona tem sido usada com sucesso para lesões pequenas e para as cicatrizes hipertróficas, com amolecimento da lesão e melhora do prurido e dor. Parece existir um estímulo proveniente do aumento de tensão das feridas para a proliferação excessiva de fibroblastos, um fenômeno que levaria a cicatrizes hipertróficas. Cicatrizes perpendiculares a orientação das fibras musculares são submetidas a uma menor tensão, o que pode atenuar a produção de colágeno. Disposta desta forma, as bordas da cicatriz se aproximam quando o músculo contrai-se.
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