segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Infecções por Bactérias Anaeróbias


As bactérias anaeróbias diferem de outras bactérias de várias maneiras. Elas desenvolvem-se adequadamente em áreas do organismo com concentrações baixas de oxigênio (p.ex., intestino) e nos tecidos que sofrem um processo de degeneração, particularmente as feridas profundas e contaminadas, onde outras bactérias não conseguem sobreviver e onde as defesas do organismo não chegam facilmente.

As bactérias anaeróbias não necessitam de oxigênio, na realidade, algumas não sobrevivem em sua presença. Elas tendem a causar infecções que formam coleções purulentas (abcessos). Centenas de espécies de bactérias anaeróbias vivem normalmente e sem causar danos na pele e nas membranas mucosas (p.ex., revestimento da boca, do intestino e da vagina). Em um centímetro cúbico de fezes, podem existir várias centenas de bilhões de bactérias. Quando o ambiente normal de determinadas espécies de bactérias anaeróbias é desequilibrado por uma cirurgia, por um suprimento sangüíneo inadequado ou por uma lesão tecidual, elas podem invadir os tecidos do hospedeiro, causando infecções graves ou mesmo letais.

As bactérias anaeróbias que causam doenças incluem os clostrídios, os quais vivem na poeira, no solo, na vegetação e no trato intestinal de seres humanos e animais, os peptococos e os peptostreptococos, os quais fazem parte da flora bacteriana normal da boca, do trato respiratório superior e do intestino grosso. Outras bactérias anaeróbias incluem o Bacteroides fragilis, o qual faz parte da flora normal do intestino grosso, a Prevotella melaninogenica e o Fusobacterium spp., os quais fazem parte da flora normal da boca.

Sintomas e Diagnóstico

Os sintomas das infecções anaeróbias dependem da localização da infecção. As infecções incluem os abcessos dentais, as infecções mandibulares, a doença periodontal, a sinusite crônica e a infecção do ouvido médio, os abcessos do cérebro, da medula espinhal, dos pulmões, da cavidade abdominal, do fígado, do útero, dos órgãos genitais, da pele e dos vasos sangüíneos. Para estabelecer o diagnóstico de uma infecção anaeróbia, o médico geralmente coleta uma amostra de pus ou de um líquido corpóreo e a envia ao laboratório para cultura. A amostra deve ser manipulada cuidadosamente, pois a exposição ao ar pode matar as bactérias anaeróbias, tornando conseqüentemente inútil a cultura do material.

Prevenção e Tratamento

Uma infecção bacteriana anaeróbia grave normalmente pode ser evitada através do tratamento de uma infecção limitada a uma área específica antes que ela se dissemine. A limpeza cuidadosa e completa de feridas, a remoção de corpos estranhos e o início precoce da antibioticoterapia são medidas preventivas úteis. Antes, durante e após uma cirurgia abdominal, são administrados antibióticos intravenosos para evitar a ocorrência de infecções.

As infecções de feridas profundas tendem a ser causadas por bactérias anaeróbias. Tais infecções são tratadas principalmente através da drenagem do abcesso e da remoção cirúrgica (debridamento) do tecido morto. Como o crescimento de bactérias anaeróbias em laboratório é difícil, o médico comumente inicia a antibioticoterapia antes que os resultados da cultura estejam disponíveis.

Freqüentemente, as infecções de feridas profundas contêm mais de um tipo de bactéria e, por essa razão, pode ser realizada a administração concomitante de vários antibióticos intravenosos. A penicilina é utilizada para tratar as infecções causadas por uma mistura de bactérias da boca ou da garganta. Como as infecções originárias do intestino geralmente incluem o Bacteroides fragilis, o qual é resistente à penicilina, outros antibióticos são utilizados.

Doenças Causadas por Clostrídios


Doença
Bactéria
Tétano
Clostridium tetani
Botulismo e botulismo
infantil
Clostridium botulinum,
clostridium baratii
Intoxicação alimentar
Clostridium perfringens
Colite associada a
antibiótico
Clostridium difficile
Enterite necrosante
Clostridium perfringens
Infecções uterinas e
infecções de feridas
Clostridium perfringens
e outros

Infecções Causadas por Clostrídios

Muitas infecções anaeróbias são causadas por clostrídios, os quais produzem várias toxinas que lesam tecidos ou o sistema nervoso. As infecções causadas por clostrídios mais comuns são intoxicações alimentares relativamente leves e de curta duração. Além disso, os clostrídios podem causar inflamação que, algumas vezes, destrói as paredes do intestino grosso e do intestino delgado, uma condição denominada enterite necrosante.

Embora esta infecção possa ocorrer como um caso isolado, ela também pode ocorrer em epidemias causadas pelo consumo de carne contaminada. Os clostrídios também infectam feridas. As infecções letais causadas por clostrídios, incluindo a gangrena da pele e o tétano, são relativamente raras, mas podem ocorrer quando um indivíduo sofre uma lesão ou é usuário de droga injetável. O botulismo ocorre devido ao consumo de alimentos contaminados pela toxina produzida por alguns clostrídios.

Freqüentemente, a doença grave é decorrente de infecções causadas por clostrídios, as quais podem ser complicadas pela destruição de tecidos profundos. O risco de morte é alto, especialmente em indivíduos com câncer e idosos.

Tétano

O tétano (trismo) é uma doença causada por uma toxina produzida pela bactéria Clostridium tetani. O espasmo dos músculos mandibulares é responsável pelo bloqueio mandibular. Embora esteja tornando-se raro nos Estados Unidos, o tétano ocorre em muitas partes do mundo, especialmente nos países em desenvolvimento. Os esporos do Clostridium tetani podem viver durante anos no solo e nas fezes de animais.

Uma vez que as bactérias do tétano penetram no organismo de um indivíduo, pode ocorrer uma infecção em feridas contaminadas, sejam elas superficiais ou profundas. Nos Estados Unidos, os indivíduos com queimaduras ou feridas cirúrgicas e usuários de drogas injetáveis apresentam um risco especial de apresentar tétano. Após o parto, pode ocorrer uma infecção no útero da mãe e no coto umbilical do recém-nascido (tétano neonatal). As bactérias do tétano produzem uma toxina à medida que crescem. É a toxina, não as bactérias em si, que causa os sintomas da infecção.

Sintomas

Normalmente, os sintomas manifestam-se de 5 a 10 dias após a infecção pela bactéria, mas eles podem ocorrer até 2 dias após, assim como até 50 dias após. O sintoma mais comum é a rigidez mandibular. Outros sintomas incluem a agitação, a dificuldade de deglutição, a irritabilidade, a cefaléia, a febre, a dor de garganta, calafrios, espasmos musculares e rigidez do pescoço, dos membros superiores e inferiores. À medida que a doença evolui, o indivíduo pode apresentar dificuldade para abrir a mandíbula (trismo). O espasmo dos músculos faciais produz uma expressão facial de um sorriso fixo e sobrancelhas elevadas.

A rigidez ou o espasmo dos músculos abdominais, do pescoço e das costas pode causar uma postura característica, com a cabeça e os calcanhares deslocados para trás e o corpo arqueado para a frente. Os espasmos dos esfíncteres musculares da região abdominal inferior podem acarretar a constipação e a retenção urinária. Pequenas perturbações (p.ex., um ruído, uma corrente de ar ou uma sacudida da cama) podem desencadear espasmos musculares dolorosos e sudorese abundante.

Durante os espasmos generalizados, o indivíduo não consegue gritar ou falar devido à rigidez da musculatura torácica ou do espasmo da garganta. Esse distúrbio também impede a respiração normal, acarretando privação de oxigênio ou asfixia fatal. Comumente, o indivíduo não apresenta febre. Geralmente, a freqüência cardíaca e a respiratória aumentam e os reflexos podem tornar-se exagerados. O tétano também pode ser limitado a um grupo de músculos localizados próximos à ferida. Os espasmos próximos à ferida podem persistir por semanas.

Diagnóstico e Prognóstico

O médico suspeita de tétano quando um indivíduo apresenta rigidez ou espasmo muscular após sofrer um ferimento. Embora o Clostridium tetani possa algumas vezes ser cultivado a partir de um swab da ferida, os resultados negativos não excluem o diagnóstico de tétano. A taxa de mortalidade global do tétano é de 50%. É mais provável a morte de indivíduos muito jovens, muito idososo ou usuários de drogas injetáveis. O prognóstico é grave quando os sintomas pioram rapidamente ou quando o tratamento é retardado.

Prevenção e Tratamento

A prevenção do tétano através da vacinação é muito melhor que o tratamento da infecção já estabelecida. Nas crianças jovens, a vavina antitetânica é administrada como parte de uma série que inclui as vacinas contra a difteria e a coqueluche. Os adultos devem receber reforços contra o tétano a cada 5 a 10 anos. Um indivíduo que sofre um ferimento e recebeu um reforço contra o tétano nos últimos 5 anos não necessita de vacinação adicional.

No entanto, um indivíduo que não recebeu reforço nos últimos 5 anos deve recebê-lo o mais breve possível após uma lesão. Para um indivíduo que nunca foi vacinado ou que não recebeu a série completa de vacinações, deve ser administrada uma injeção de imunoglobulina antitetânica e a primeira das três vacinas mensais. O cuidado da ferida inclui a limpeza imediata e meticulosa, especialmente quando se tratar de ferimentos puntiformes profundos, pois a sujeira e o tecido morto facilita o crescimento do Clostridium tetani. Antibióticos (p.ex., penicilina ou tetraciclinas) também podem ser administrados, mas não são substituem a remoção cirúrgica do tecido lesado.

A imunoglobulina antitetânica é administrada para neutralizar a toxina. Os antibióticos (p.ex., penicilina e tetraciclinas) são administrados para impedir a produção de maiores quantidades da toxina. Outros medicamentos são prescritos para sedar, controlar as convulsões e relaxar os músculos. Geralmente, o paciente é hospitalizado e mantido em um quarto silencioso. Para os indivíduos com infecções moderadas ou graves, pode ser necessária a instalação de um ventilador mecânico para auxiliar a respiração.

A nutrição é realizada através da via intravenosa ou de uma sonda nasogástrica. Freqüentemente, é necessária a passagem de uma sonda vesical e de uma sonda retal para remover os dejetos do organismo. O paciente é freqüentemente mudado de posição e forçado a tossir para evitar a pneumonia. A codeína é administrada para reduzir a dor. Outras drogas podem ser prescritas para controlar a pressão arterial e a freqüência cardíaca. Como o tétano não torna o organismo imune a infecções subseqüentes, deve ser realizada uma série completa de vacinações após a recuperação.

Actinomicose

A actinomicose é uma infecção crônica causada principalmente pelo Actinomyces israelii, uma bactéria que pode estar presente nas gengivas, nos dentes e nas amígdalas. Esta infecção causa a formação de abcessos em vários locais. Ela ocorre em quatro formas e afeta mais freqüentemente os homens adultos. Ocasionalmente, a actinomicose ocorre em mulheres que utilizam um dispositivo intra-uterino (DIU) como método de contracepção. A forma abdominal é causada pela deglutição de secreções bucais contaminadas pela bactéria.

A infecção afeta os intestinos e o peritôneo (revestimento da cavidade abdominal). Os sintomas comuns são a dor, a febre, o vômito, a diarréia ou a constipação e uma perda de peso acentuada. Ocorre a formação de uma massa abdominal e pode ocorrer drenagem cutânea de pus através de canais que conectam a massa à parede abdominal. A forma cervicofacial (denominada “mandíbula em grumos”) geralmente começa com um pequeno inchaço, chato e duro na boca, sobre a pele do pescoço ou abaixo da mandíbula. Algumas vezes, o inchaço pode causar dor.

A seguir, ocorre a formação de áreas moles que drenam um líquido que contém pequenos grânulos amarelos e arredondados semelhantes ao enxôfre. A infecção pode estender-se para a bochecha, a língua, a garganta, as glândulas salivares, os ossos do crânio ou para o cérebro e as meninges . A forma torácica causa dor torácica, febre e tosse produtora de escarro. Contudo, esses sintomas podem surgir apenas quando os pulmões já se encontram gravemente infectados.

Trajetos fistulosos são formados e podem chegar a perfurar a parede torácica, o que permite a drenagem de pus através da pele. Na forma generalizada, a infecção transportada pelo sangue atinge a pele, as vértebras, o cérebro, o fígado, os rins, os ureteres e, nas mulheres, o útero e os ovários.

Diagnóstico

Os sintomas, os achados radiográficos e o isolamento da bactéria Actinomyces irsraelii ajudam o médico a estabelecer o diagnóstico. Em algumas infecções intestinais, a amostra não pode ser obtida e a cirurgia é necessária para o estabelecimento do diagnóstico.

Prognóstico e Tratamento

A mandíbula em grumos é a forma de actinomicose mais fácil de ser tratada. O prognóstico é pior para as formas torácica, abdominal e generalizada. O pior prognóstico é para os casos em que ocorre comprometimento cerebral e da medula espinhal. Mais de 50% dos indivíduos com essas infecções apresentam lesão neurológica e mais de 25% deles morrem.

A maioria dos indivíduos melhoram lentamente com o tratamento, mas, freqüentemente, são necessários meses de antibioticoterapia e repetidos procedimentos cirúrgicos. A drenagem cirúrgica de grandes abcessos e a antibioticoterapia com penicilina ou tetraciclina podem ser mantidas por várias semanas após o desaparecimento dos sintomas.