sábado, 5 de dezembro de 2009

Distúrbios Mieloproliferativos


Os distúrbios mieloproliferativos são enfermidades nas quais as células produtoras das células sangüíneas (células precursoras) desenvolvem-se e reproduzem-se anormalmente na medula óssea ou são expulsas desta devido a um crescimento excessivo de tecido fibroso. Os quatro principais distúrbios mieloproliferativos são a policitemia vera, a mielofibrose, a trombocitemia e a leucemia mielocítica crônica. A mielofibrose difere dos outros três distúrbios porque ocorre um envolvimento dos fibroblastos (células que produzem tecido fibroso ou conjuntivo), que não são células precursoras. Contudo, os fibroblastos parecem ser estimulados por células precursoras anormais, possivelmente megacariócitos (células que produzem plaquetas).

Policitemia Vera

A policitemia vera é um distúrbio das células sangüíneas precursoras que acarreta um excesso de eritrócitos. A policitemia vera é rara. Apenas 5 indivíduos em 1 milhão apresentam esse distúrbio. A idade média na qual a policitemia vera é diagnosticada é 60 anos, mas ela pode manifestar-se antes.

Sintomas

O excesso de eritrócitos aumenta o volume sangüíneo, tornando-o mais espesso, de modo que o sangue passa a fluir com menor facilidade através dos pequenos vasos sangüíneos (hiperviscosidade). No entanto, o número de eritrócitos pode estar aumentado muito tempo antes do surgimento dos sintomas. Freqüentemente, os primeiros sintomas são fraqueza, fadiga, cefaléia, tontura e falta de ar. A visão pode ser distorcida e o indivíduo pode apresentar manchas cegas ou pode ver flashes de luz. O sangramento gengival e através de pequenos cortes é comum. A pele, especialmente a da face, pode tornar-se avermelhada. O indivíduo pode sentir um prurido generalizado, sobretudo após um banho quente.

Ele pode sentir uma sensação de queimação nas mãos e nos pés e, mais raramente, dor óssea. Com a evolução do distúrbio, o fígado e o baço podem aumentar de tamanho, causando uma dor maçante e intermitente no abdômen. O excesso de eritrócitos pode estar associado a outras complicações como úlceras do estômago, cálculos renais e trombos venosos e arteriais, que podem causar infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral e podem obstruir o fluxo sangüíneo para os membros superiores e inferiores. Raramente, a policitemia vera evolui para a leucemia. Determinados tratamentos aumentam a probabilidade dessa evolução.

Diagnóstico

A policitemia vera pode ser diagnosticada através de exames de sangue de rotina realizados por uma outra razão, inclusive antes do indivíduo apresentar qualquer sintoma. A concentração de hemoglobina (a proteína que transporta oxigênio nos eritrócitos) e o hematócrito (a porcentagem de glóbulos vermelhos no volume sangüíneo total) encontram-se anormalmente elevados. Um valor do hematócrito superior a 54% no homem e 49% na mulher pode indicar policitemia, mas o diagnóstico não pode ser estabelecido baseando-se apenas num hematócrito anormal. Um exame que utiliza eritrócitos radiomarcados para determinar o número total de eritrócitos no corpo pode ajudar no estabelecimento do diagnóstico. A biópsia de medula óssea (coleta de uma amostra para exame ao microscópio) raramente é necessária.

Um hematócrito elevado também pode indicar policitemia relativa, um distúrbio no qual o número de eritrócitos encontra-se normal, mas o volume líquido do sangue encontra-se baixo. Um excesso de eritrócitos causado por outros problemas, excetuando-se a policitemia vera, é denominado policitemia secundária. Por exemplo, a concentração baixa de oxigênio no sangue estimula a medula óssea a produzir mais eritrócitos. Por essa razão, os indivíduos com uma doença pulmonar crônica ou uma cardiopatia, os tabagistas e aqueles que vivem em altitudes elevadas pode apresentar um maior número de eritrócitos. Para diferenciar a policitemia vera de algumas formas de policitemia secundária, o médico mensura a concentração de oxigênio numa amostra de sangue coletada de uma artéria.

Quando a concentração de oxigênio está anormalmente baixa, é provável que o indivíduo apresente uma policitemia secundária. A concentração sérica de eritropoietina (hormônio que estimula a medula óssea a produzir eritrócitos) também pode ser mensurada. Na policitemia vera, a concentração de eritropoietina encontra-se extremamente baixa, mas ela está normal ou elevada na policitemia secundária. Raramente, cistos hepáticos ou renais e tumores renais ou cerebrais produzem eritropoetina. Os indivíduos com esses problemas apresentam uma concentração elevada de eritropoietina e podem desenvolver policitemia secundária.

Prognóstico e Tratamento

Sem tratamento, aproximadamente metade dos indivíduos com policitemia vera sintomáticos morre em menos de 2 anos. Com tratamento, eles vivem, em média, 15 a 20 anos. O tratamento visa retardar a produção e diminuir o número de eritrócitos. Normalmente, é realizada a remoção do sangue do corpo através de um procediemnto denominado flebotomia. São removidos 500 ml de sangue em dias alternados até o hematócrito começar a diminuir. Quando ele atinge o nível normal, o sangue é removido em intervalos de alguns meses, de acordo com a necessidade.

Principais Distúrbios Mieloproliferativos


Distúrbio Características da
Medula Óssea
Características do Sangue

Policitemia vera Aumento do número de precursores
eritróides (eritrócitos)
Quantidade elevada de eritrócitos

Mielofibrose Excesso de tecido fibroso Quantidade elevada de eritrócitos e
de leucócitos imaturos e de
eritrócitos deformados

Trombocitemia Quantidade elevada de megacariócitos
(células produtoras de plaquetas)
Quantidade elevada de plaquetas

Leucemia mielocítica crônica Quantidade elevada de mielócitos
(precursores dos granulócitos, um
tipo de leucócito)
Quantidade elevada de granulócitos
maduros e imaturos

Em alguns indivíduos, a produção anormal de células sangüíneas na medula óssea acelera, aumentando o número de plaquetas (partículas similares a células que estão envolvidas no processo de coagulação) na corrente sangüínea ou aumentando bastante o tamanho do fígado ou do baço. Como a flebotomia também aumenta o número de plaquetas e não reduz o tamanho dos órgãos afetados, esses indivíduos necessitam de quimioterapia para suprimir a produção de células sangüíneas. Comumente, é utilizada a hidroxiuréia, uma droga antineoplásica. Outros medicamentos podem ajudar a controlar alguns dos sintomas. Por exemplo, os antihistamínicos podem ajudar a aliviar o prurido e a aspirina pode aliviar as sensações de queimação nas mãos e nos pés e também as dores ósseas.

Mielofibrose

A mielofibrose é um distúrbio no qual o tecido fibroso pode substituir as células precursoras que produzem células sangüíneas normais na medula óssea, resultando em eritrócitos com formas anormais, anemia e aumento de tamanho do baço. Na medula óssea, as células denominadas fibroblastos produzem tecido fibroso (conjuntivo) que forma uma malha de sustentação das células produtoras de sangue. Na mielofibrose, uma célula precursora anormal estimula os fibroblastos a produzir uma quantidade excessiva de tecido fibroso, que expulsa as células produtoras de sangue. Com a diminuição da produção de eritrócitos, uma quantidade menor dessas células é liberada na circulação sangüínea e ocorre a anemia. Muitos desses eritrócitos são imaturos ou apresentam formas defeituosas. Os leucócitos e plaquetas também podem estar deformados e a quantidade destes pode ser excessivamente grande ou pequena.

Ao final do processo, o tecido fibroso substitui uma parte tão grande da medula óssea que a produção de todas as células sangüíneas é reduzida. Quando isto ocorre, a anemia torna-se intensa, o número reduzido de leucócitos não consegue combater as infecções e o número reduzido de plaquetas não mais consegue evitar os sangramentos. O corpo produz células sangüíneas fora da medula óssea, principalmente no fígado e no baço, os quais podem aumentar de tamanho. Este distúrbio é denominado metaplasia mielóide agnogênica. Algumas vezes, a mielofibrose acompanha a leucemia, a policitemia vera, o mieloma múltiplo, o linfoma, a tuberculose ou infecções ósseas, mas a sua causa é desconhecida. Indivíduos expostos a determinadas substâncias tóxicas (p.ex., benzeno) e à radiação apresentam um maior risco de mielofibrose. Esta é mais comum em indivíduos com idades entre 50 e 70 anos. Como a doença geralmente evolui lentamente, os indivíduos com mielofibrose geralmente vivem 10 anos ou mais. Ocasionalmente, a doença evolui rapidamente. Esta forma, denominada mielofibrose maligna ou mielofibrose aguda, é um tipo de leucemia.

Sintomas e Diagnóstico

Freqüentemente, a mielofibrose não produz sintomas durante anos. Com o passar do tempo, a anemia produz fraqueza e cansaço. Os indivíduos doentes não se sentem bem e perdem peso. O baço e o fígado aumentados de tamanho podem causar dor abdominal. Os eritrócitos imaturos e deformados (observados nas amostras de sangue examinadas ao microscópio) e a anemia sugerem a mielofibrose, mas é necessária a realização de uma biópsia de medula óssea (coleta de uma amostra para exame ao microscópio) para confirmar o diagnóstico.

Tratamento

Atualmente, não existe qualquer tratamento capaz de reverter ou de retardar de forma permanente a evolução desse distúrbio, embora a hidroxiuréia, uma droga antineoplásica, possa diminuir o tamanho do fígado ou do baço. O tratamento visa retardar as complicações. O transplante de medula óssea oferece alguma esperança em casos especiais. Em alguns indivíduos, a produção de eritrócitos pode ser estimulada com a eritropoietina, mas, em outros, é necessária a transfusão de sangue para tratar a anemia. Raramente, o baço torna-se extremamente grande e doloroso e pode ter que ser removido. As infecções são tratadas com antibióticos.

Trombocitemia

A trombocitemia é um distúrbio no qual ocorre uma produção excessiva de plaquetas, originando uma coagulação anormal do sangue. As plaquetas, também denominadas trombócitos, são produzidas normalmente na medula óssea por células denominadas megacariócitos. Na trombocitemia, os megacariócitos tornam-se anormais e produzem plaquetas em excesso. Esse distúrbio normalmente ocorre em indivíduos com mais de 50 anos de idade. Ele é chamado trombocitemia primária quando a causa é desconhecida e trombocitemia secundária quando a causa é um outro distúrbio (p.ex., sangramento, remoção do baço, infecções, artrite reumatóide, certos cânceres ou sarcoidose).

Sintomas

O excesso de plaquetas, as quais são essenciais para a coagulação do sangue, pode fazer com que ocorra a formação espontânea de coágulos, que provocam a obstrução do fluxo sangüíneo através dos vasos. Os sintomas são formigamento e outras sensações anormais nas mãos e nos pés, pontas dos dedos frias, cefaléias, fraqueza e tontura. O sangramento, comumene leve, pode consistir em epistaxes (sangramentos nasais), equimoses fáceis, sangramentos gengivais ou do trato gastrointestinal. O baço e o fígado podem aumentar de tamanho.

Diagnóstico

Os sintomas sugerem o diagnóstico de trombocitemia e os exames de sangue podem confirmá- lo. A contagem de plaquetas está acima de 500.000 por microlitro de sangue (aproximadamente duas vezes o normal) e, freqüentemente, acima de 1.000.000 por microlitro de sangue. Ao microscópio, uma amostra de sangue revela plaquetas anormalmente grandes, aglomerados de plaquetas e fragmentos de megacariócitos. Para diferenciar a trombocitemia primária da secundária, o médico busca sinais de outros distúrbios que possam aumentar a contagem de plaquetas. Algumas vezes, a biópsia de medula óssea (coleta de uma amostra para exame ao microscópio) ajuda no estabelecimento do diagnóstico.

Tratamento

Quando um outro distúrbio explica o aumento da contagem de plaquetas (trombocitemia secundária), o tratamento visará curar tal distúrbio. Quando o tratamento é eficaz, a quantidade de plaquetas geralmente retorna aos níveis normais. Quando não é detectada uma causa para o aumento da contagem de plaquetas (trombocitemia primária), o médico normalmente prescreve um medicamento que reduz a sua produção. Comumente, o tratamento é iniciado quando a contagem de plaquetas excede 750.000 por microlitro de sangue ou quando ocorrem complicações hemorrágicas ou da coagulação. A medicação é mantida até a contagem de plaquetas cair para menos de 600.000 por microlitro de sangue.

Geralmente, é prescrita a hidroxiuréia, um medicamento antineoplásico, embora, algumas vezes, seja utilizada a anagrelida, um medicamento anticoagulante. Como a hidroxiuréia também pode retardar a produção de eritrócitos e de leucócitos, a dose deve ser ajustada para que seja mantido um número adequado dessas células. Pequenas doses de aspirina, que diminui a adesividade plaquetária e evita a formação de coágulos, podem adiar a necessidade desses medicamentos. Se o tratamento medicamentoso não diminui a produção de plaquetas a tempo, o paciente poderá ser submetido à plaquetaferese. Neste procedimento, o sangue é retirado do paciente, as plaquetas são removidas do sangue e o sangue sem plaquetas é retornado ao paciente. Comumente, esse procedimento é combinado com o tratamento medicamentoso.

fonte: Manual Merck