terça-feira, 30 de abril de 2013

Redução de estômago será testada contra hipertensão e complicações do diabetes

Redução de estômago será testada contra hipertensão e complicações do diabetes

Três hospitais de São Paulo --o HCor (Hospital do Coração), o InCor (Instituto do Coração do HC da USP) e o Hospital Alemão Oswaldo Cruz-- vão testar a cirurgia bariátrica para o tratamento de outras doenças que não a obesidade e o diabetes, suas indicações primárias. As pesquisas se concentrarão em problemas circulatórios e cardíacos, e as três instituições estão recrutando voluntários (veja abaixo). Ricardo Cohen, ex-presidente da Sociedade de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, diz que a intervenção atingiu sua fase de maturidade. "A grande demanda agora são os outros resultados que a operação pode trazer." No HCor, a redução de estômago será testada para controlar a hipertensão resistente, condição na qual o paciente não consegue baixar a pressão mesmo tomando dois ou mais remédios todo dia. Carlos Schiavon, um dos coordenadores do projeto, diz que estudos apontam que pacientes submetidos à cirurgia têm melhora na pressão como "efeito colateral" O estudo vai comparar a cirurgia com o tratamento clínico. Os pacientes devem ter obesidade grau 1 ou 2 --ou seja, IMC (Índice de Massa Corporal) entre 30 e 40. Esse índice é obtido dividindo o peso, em quilos, pela altura, em metros, ao quadrado. "Há pacientes que tomam quatro, cinco remédios e não têm um bom controle. É uma doença de tratamento difícil", afirma Schiavon. Para Bruno Geloneze, endocrinologista do Laboratório de Investigação em Metabolismo e Diabetes da Unicamp, a iniciativa tem um "grau de ousadia e coragem" por se concentrar no paciente que está sem tratamento. "Esse é um estudo inédito que pode cobrir uma lacuna importante."
CORAÇÃO
Já o estudo do InCor pretende investigar como a cirugia bariátrica pode reduzir o risco cardiovascular.
"É difícil dizer que variáveis a cirurgia altera para reduzir o risco. Investigaremos esses mecanismos", diz Bruno Caramelli, diretor da unidade de medicina interdisciplinar em cardiologia do InCor e coordenador do estudo. Os pacientes devem ter diabetes e IMC entre 28 e 35, ou seja, sobrepeso e obesidade grau 1. Hoje, a cirurgia só é autorizada no país para obesos grau 3 e grau 2 --neste último caso, quando há doenças associadas. Geloneze avalia a escolha do perfil dos pacientes como "inadequada". "Já se sabe que, quanto menor o IMC, pior o resultado da cirurgia." Mas Caramelli diz que o objetivo é investigar como o diabetes se desenrola desde o começo. "A ideia é tentar identificar, numa fase precoce, quem são os caras que amanhã terão IMC de 35 e 40."
DIABETES
No hospital Oswaldo Cruz, o estudo quer comprovar os benefícios do tratamento cirúrgico para problemas microvasculares decorrentes do diabetes tipo 2, como as doenças renais e da retina (que pode levar à cegueira). A cirurgia será comparada ao melhor tratamento clínico disponível para o diabetes. Segundo o cirurgião Ricardo Cohen, coordenador da pesquisa, se a cirurgia levar à redução da incidência dessas complicações, causará também uma diminuição na mortalidade cardiovascular a longo prazo. "Acredito que, se comprovarmos a eficácia da cirurgia nesse caso, o paciente com a doença microvascular terá indicação cirúrgica imediata. Não há razão para esperar falhar o tratamento clínico." Os pacientes devem ter obesidade grau 1 (IMC entre 30 e 35), perfil para o qual a cirurgia não é autorizada fora de protocolos de estudo. Cohen justifica a escolha porque a média do IMC dos diabéticos no Brasil é 29. "Vamos focar na população que realmente precisa." O endocrinologista Bruno Geloneze da Unicamp, porém, afirma que um estudo já mostrou que, depois de cinco anos, a melhora de problemas microvasculares em pacientes diabéticos com IMC acima de 40 foi variada. "Essa melhora depende de tempo de doença, fatores genéticos e boa nutrição. Como há o risco de desnutrição nesses pacientes menos obesos, o balanço tende a ser desfavorável", diz. O presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, Almino Ramos, diz que os estudos se concentraram no diabetes, doença associada à obesidade que tinha mais resultados com a cirurgia. "Agora, eles devem focar em outros fatores, como a apneia do sono." Mas, para Geloneze, é preciso lembrar que a prioridade é operar quem mais precisa -- obesos grau 3, com IMC acima de 40. "Discutir novas indicações é uma forma de excluir os casos mais urgentes. Há que se pensar sempre no interesse do paciente."



   

domingo, 28 de abril de 2013

Retratos do corpo

Uma nova geração de exames está revolucionando a maneira pela qual é possível descobrir as doenças, de preferência antes que elas se tornem incuráveis. Cada vez mais sofisticados, eles fornecem os resultados rapidamente e com maior precisão. Na semana passada, cientistas apresentaram os dois mais recentes representantes dessa classe de testes. O primeiro é uma técnica capaz de fazer uma análise completa do DNA de crianças recém-nascidas em até 50 horas, muito menos do que as seis semanas necessárias usualmente. O exame, divulgado na última edição da revista científica “Science Translational Medicine”, rastreia 3,5 mil enfermidades genéticas. Os pesquisadores esperam que a ferramenta esteja disponível a partir do próximo ano. Por enquanto, foi avaliada com sucesso em quatro bebês do Children’s Mercy Hospitals and Clinics, dos Estados Unidos. “Cerca de um terço dos bebês admitidos nas unidades de terapia intensiva americanas tem uma doença genética”, afirmou Stephen Kingsmore, diretor do Centro de Medicina Genômica Pediátrica do Children’s Mercy. “Ao obterem o genoma interpretado em cerca de dois dias, os médicos poderão usar os resultados para aplicar tratamentos personalizados e mais eficazes”, completou o especialista. A segunda novidade foi divulgada por pesquisadores do Institute of Cancer Research, da Inglaterra. Em um artigo publicado na revista “The Lancet Oncology”, eles descreveram um exame por meio do qual é possível conhecer o grau de agressividade do câncer de próstata após análise de suas características genéticas. Como o teste para os recém-nascidos, o exame criado pelos ingleses também irá auxiliar os médicos a adotar tratamentos mais individualizados, de acordo com o perfil do tumor de cada paciente.
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No Brasil, uma das novidades na área do diagnóstico genético é um mapeamento criado pelo laboratório Alta Excelência Diagnóstica, em São Paulo. Ele traça um perfil que responde a questões como de que forma o organismo responde à cafeína até sua capacidade de aproveitar melhor as vitaminas. As respostas ajudam a pautar uma dieta focada nas necessidades individuais, algo bastante útil, por exemplo, para atletas de alto desempenho. Profundidade semelhante também pode ser obtida por meio do teste criado pelo bioquímico brasileiro Alexandre Cosendey e apresentado no 39º Congresso Brasileiro de Análises Clínicas. O exame faz uma análise do conjunto de reações químicas desencadeadas dentro do organismo. Com uma amostra de sangue, ele aponta o nível de estresse a que as células estão submetidas, indicando o surgimento de possíveis problemas logo mais à frente. “As células estão sob forte demanda o tempo todo”, explica Cosendey. “Em uma situação-limite, suas membranas se rompem e algumas substâncias podem vazar, indicando um desequilíbrio”, completa. O atleta amador Diogo Menegaz, 39 anos, fez a análise. “Sentia-me exausto o tempo todo e não conseguia entender a razão”, diz. “Com o exame, descobri que algumas vitaminas, apesar de estarem em níveis altos, não estavam sendo bem aproveitadas pelas células. Voltei a ganhar disposição”, conta.
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No Hospital Nove de Julho, em São Paulo, os médicos estão se valendo da termografia, ou termometria cutânea, para rastrear a origem de dores crônicas e enfermidades como hipotireoidismo (disfunção na glândula tireoide). O teste é feito usando uma câmera que capta o calor emitido pelo corpo. Quanto maior a temperatura em alguma região, mais intensa é a atividade inflamatória no local. Isso é indicativo de que algo vai mal naquele ponto. “Antes de aparecer uma lesão, existe a alteração da circulação local, detectada pelas imagens”, explica o médico Marcos Brioschi, do Nove de Julho. Foi por meio do exame que Patrícia Zylbergeld, 30 anos, descobriu que estava no início de um hipotireoidismo. “O exame de sangue tinha identificado uma alteração hormonal pequena”, diz. “Mas a termometria indicou que havia mesmo uma atividade maior na região”, lembra. O exame também pode ser usado no diagnóstico precoce de câncer de mama. Nesse caso, a inflamação indica crescimento de vasos sanguíneos na região, o que sugere a formação de uma rede vascular para alimentar um futuro tumor. “É possível analisar a área antes de qualquer alteração anatômica”, afirma Brioschi.
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A revolução está dando também nova roupagem a exames convencionais. Hoje, já é possível realizar ultrassom em três dimensões do feto com a possibilidade de impressão das formas da criança em um molde de resina, como se fosse um boneco. “O molde ajuda a visualizar melhor qualquer má-formação existente”, explica a hematologista Regina Biasoli. O objetivo de outras inovações é aumentar o conforto do paciente. Nesta categoria, uma das opções é o Accuvein. Por meio da emissão de luz infravermelha, o exame auxilia na visualização de veias. “O teste facilita a aplicação de medicamentos em crianças e obesos, por exemplo”, diz a enfermeira Célia de Fátima Moraes, de São Paulo, que usa o aparelho. Para o futuro, uma das promessas é um kit capaz de identificar a probabili­dade de uma pessoa vir a ser hipertensa. Ele está em desenvolvimento pela Sociedade Brasileira de Hipertensão, a partir de um estudo comandado pela nefrologista Dulce Elena Casarini, da Universidade Federal de São Paulo. “Descobrimos a existência de uma enzima que indica a instalação da ­doença precocemente”, explica Dulce.  
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quinta-feira, 25 de abril de 2013

ARTROSE

Artrose (do grego artros - articulação e do latim ose - desgaste), também chamada de osteoartrose, é um processo e não uma doença. Trata-se de um fenômeno absolutamente natural - o desgaste da cartilagem que reveste nossas articulações ou juntas - que faz parte do envelhecimento global do organismo humano. Pode ser também chamada de osteoartrose.
É do senso comum que fiquemos com cabelos brancos, com rugas ou que apareçam as chamadas manchas senis em nossas mãos. Mas é surpreendente como não conseguimos encarar fatos simples como o engrossamento das articulações dos dedos das mãos, o aumento de nossas articulações do dedão dos pés, o aparecimento de bicos-de-papagaio em uma radiografia de rotina. A confusão logo se instala: devo estar com reumatismo:
preciso procurar um Reumatologista.
Aí se inicia a confusão: reumatismo (do grego reuma - fluido) não é uma doença, mas um termo genérico que significa apenas dor nas juntas. A confusão piora quando traduzimos textos do inglês: na língua de Shakespeare, reumatismo (rheumatism) é sinônimo de arthritis. Nos textos em inglês, a artrose ou osteoartrose é chamada osteoarthritis e está formada a bagunça semântica.
Numa primeira consulta, salta aos olhos a falta de clareza: qual a diferença entre artrite e artrose? Esta é a pergunta infalível, fruto de uma confusão primariamente semântica: artrite (do grego artros - articulação e do latim ite - inflamação) denota a presença de uma das três características definidas por Galeno (século III d.C): dor, calor e rubor.
A artrite é sempre um evento patológico, que denota uma doença. Existem mais de cem causas de artrite ou inflamação articular: a mais comum e temida é a Artrite Reumatóide, doença de origem autoimune que provoca grave acometimento das articulações, com grande destruição das mesmas. Mas existe também a artrite psoriática, associada a formas graves de psoríase cutânea, a artrite gotosa ou gota, causada pelo depósito de cristais de ácido úrico (urato), a artrite reativa, causada por infecções, a artrite que acompanha doenças sistêmicas como o Lúpus Eritematoso, entre muitas mais.
Quando falamos de artrose ou osteoartrose, estamos falando de um reumatismo, mas de um reumatismo diferente: aquele que todos vamos ter (se já não temos). É o reumatismo causado pelo desgaste articular, também chamado de degenerativo. Este caráter de desgaste é muito mal compreendido e associado a doença de velhos.
Não se trata de doença, apesar do mau uso da língua e do sensacionalismo da imprensa leiga que, traduzindo textos do inglês, anuncia: o mundo tem uma epidemia de artrite (tradução equivocada de osteoarthritis ou arthritis).
A proposta deste texto é tentar aclarar o significado deste processo pelo qual todos haveremos de passar, se vivermos o suficiente: a artrose.

Quando atingimos o auge do nosso desenvolvimento músculo-esquelético (algo em torno dos 28 anos), já se inicia um silencioso processo de desgaste articular. Se submetermos alguma de nossas articulações a um estresse precoce, como esportes em nível competitivo ou traumas, este processo pode ser ainda mais precoce. Todos conhecemos jogadores de futebol, tenistas e nadadores com desgaste precoce de joelhos, quadris ou ombros.
O desgaste da cartilagem articular se deve a uma particularidade do tecido que reveste as articulações: os condrócitos, células formadoras do tecido cartilaginoso, não se regeneram (faz parte do senso comum a compreensão de que apenas os neurônios, células do tecido nervoso, não podem se regenerar). Assim, uma vez destruído um condrócito, não há peças sobressalentes para reparar a cartilagem. Além disso, a cartilagem articular não é vascularizada, ou seja não recebe seus nutrientes através de vasos sanguíneos, mas se nutre apenas por embebição (como uma esponja) a partir do osso situado logo abaixo da cartilagem, chamado osso subcondral.

A partir do nosso pico de desenvolvimento osteo-articular, começa um lento, insidioso e inicialmente assintomático processo de desgaste, desidratação e afilamento da cartilagem: a chamada artrose.
Apesar de ser um fenômeno universal (todos vamos ter), nem todos teremos uma artrose igual à de nosso vizinho: por fatores genéticos, algumas pessoas têm artrose um pouco mais precoce; umas têm artrose nas mãos (como suas mães ou avós), outras nos joelhos (em função de excesso de peso ou de joelhos em valgo - em xis - ou varo - pernas tortas à Garrincha), outras nos quadris, outras na coluna (bicos de papagaio). Em algumas pessoas, a artrose pode se comportar mais agressivamente, com um componente inflamatório local, gerando a artrose erosiva, muitas vezes confundida com a Artrite Reumatóide. Felizmente, esta é uma minoria dos casos.
Um fato cruel para as mulheres é que a artrose, já iniciada silenciosamente, apresenta uma grande exacerbação após a menopausa. Assim, é frequente que os sintomas da artrose se iniciem próximo desta fase nem sempre fácil da vida da mulher. Os homens também têm artrose, mas o processo costuma ser mais lento, exceto naqueles onde a herança genética é mais intensa.

Assim, o processo de desgaste da cartilagem articular, fenômeno universal entre aqueles que passam dos 40 ou 45 anos, fica mais simples de ser compreendido e aceito. Não devemos apenas menosprezá-lo e fazer como os médicos de antigamente, dizendo: isso é assim mesmo, você precisa conviver com a dor. A artrose muitas vezes não causa dor, mas quando isto acontece, devemos tratá-la da melhor maneira possível.
Como ainda não descobrimos como regenerar o tecido cartilaginoso, devemos tratar os sintomas da artrose com analgésicos (sempre) e antiinflamatórios (somente nas crises). Há medicamentos capazes de retardar o processo e amenizar seus sintomas: a glucosamina (associada ou não à condroitina), os chamados insaponificáveis do abacate, entre outros. O uso de medicamentos como a hidroxicloroquina pode ser útil nas artroses erosivas.
Mas a medicação é apenas uma pequena parte do tratamento da artrose. Perder peso, fortalecer globalmente a musculatura, utilizar técnicas como a hidroterapia e outras formas de tratamento fisioterapêutico, associar acupuntura como aliada no combate à dor; tudo isto constitui um conjunto de medidas capazes de melhorar muito os sintomas da artrose.
Assim, compreendendo melhor o significado desse processo, podemos ajudar os pacientes a tomar consciência da necessidade de uma mudança de hábitos de vida, cuidando melhor dessas preciosas dobradiças que garantem todos os nossos movimentos: as articulações.
Fonte: http://www.hospitalsiriolibanes.org.br/hospital/especialidades/Nucleo-Avancado-Reumatologia/Paginas/artrose.aspx

segunda-feira, 22 de abril de 2013

HERPES ZOSTER




HERPES ZOSTER
ASPECTOS CLÍNICOS E EPIDEMIOLÓGICOS
            Descrição - Doença viral autolimitada, com ciclo evolutivo de, aproximadamente, 15 dias, que atinge homens e mulheres, sendo mais frequente na idade adulta e nos idosos. Antes do surgimento das lesões cutâneas, a maioria dos doentes refere dores nevrálgicas, parestesias, ardor e prurido locais, acompanhados de febre, cefaleia e mal-estar. A lesão elementar constitui-se de vesículas sobre base eritematosa, que surgem de modo gradual e levam de 2 a 4 dias para se estabelecerem. Essas vesículas podem confluir formando bolhas contendo liquido transparente ou ligeiramente amarelado, seguindo o trajeto de um nervo. Quando não ocorre infecção secundaria, em alguns dias, as lesões secam e formam crostas que serão liberadas gradativamente, deixando discretas manchas que tendem a desaparecer. Em pacientes imunossuprimidos, as lesões surgem em localizações atípicas e, geralmente, disseminadas. Em geral, o quadro evolui para a cura em 2 a 4 semanas. Todavia, os sintomas dolorosos podem se agravar, tornando-se muitas vezes insuportáveis, principalmente quando atinge pessoas mais idosas. Embora a dor melhore gradativamente, nos idosos pode permanecer por meses ou anos apos o final do quadro cutâneo, caracterizando a neuralgia pos-herpetica. Os nervos atingidos, com maior frequência, são os intercostais (entre as costelas), provocando manifestações no tronco, mas outros nervos também podem ser afetados.
As regiões mais comprometidas são a torácica (53% dos casos), cervical (20%), trigêmeo (15%) e lombossacra (11%). Quando os nervos cranianos são acometidos, podem ocorrer sintomas, como ulceras da córnea, vertigem ou surdez. O envolvimento do VII par craniano leva a uma combinação de paralisia facial periférica e rash no pavilhão auditivo, denominado síndrome de Hawsay-Hurt, cuja recuperação e pouco
provável. O surgimento do Herpes Zoster pode ser um indicativo de baixa da imunidade.
Sinonímia - Zoster, cobreiro, fogo selvagem.
Agente etiológico - Varicella-zoster vírus, o mesmo vírus causador da Varicela.
Modo de transmissão - O Herpes Zoster, geralmente, e decorrente da reativação do vírus da Varicela em latência, em adultos e pacientes imunocomprometidos, como portadores de doencas cronicas, neoplasias, aids e outras. Apos a fase de disseminação hematogenica, em que atinge a pele, caminha centripetamente pelos nervos periféricos ate os gânglios nervosos, onde poderá permanecer, em latência, por toda a vida. Causas diversas podem levar a reativação do vírus, que, caminhando centrifugamente pelo nervo periférico, atinge a pele, causando a característica erupção do Herpes Zoster. Excepcionalmente, há pacientes que desenvolvem Herpes Zoster apos contato com doentes de Varicela e, ate mesmo, com outro doente de zoster, o que indica a possibilidade de uma reinfecção em paciente já previamente imunizado. E também possível uma criança adquirir Varicela por contato com doente de Zoster.


Diagnóstico
             A confirmação do diagnostico só e possível pelo isolamento do vírus em linhagens celulares de cultura de tecidos susceptíveis, ou pela demonstração de soroconversao, ou elevacao de 4 vezes ou mais nos titulos de anticorpos entre as amostras de soro na fase convalescente e na fase aguda. A tecnologia da reação da cadeia de polimerase para a detecção do ADN viral no liquido vesicular e disponível em alguns laboratórios. As provas sorológicas mais frequentemente utilizadas para avaliar a resposta do hospedeiro incluem a detecção de anticorpos contra o antígeno de membrana (FAMA), a imuno-hemaglutinacao por aderência e o ensaio imunossorvente ligado a enzima (ELISA). O teste FAMA e o ensaio ELISA parecem ser os mais sensíveis. - Lesões vesiculares unilaterais em um padrão de dermatomo sugerem o diagnostico de Herpes Zoster, embora se tenha relatado a ocorrencia de Herpes Zoster na ausência de erupcao. Tanto as infeccoes pelo herpesvirus-simples, quanto as infeccoes por virus Coxsackie, podem causar lesoes vesiculares em dermátomos. A virologia diagnostica e a coloração fluorescente de raspados da pele com anticorpos monoclonais ajudam estabelecer o diagnostico correto. No estagio prodrômico, o diagnostico pode ser muito difícil.
Tratamento
            As lesoes da pele tem involução espontânea, mas medidas para evitar a infecção secundaria devem ser tomadas. O tratamento deve ser iniciado assim que os sintomas forem observados, visando reduzir a dor aguda associada ao Herpes Zoster, a infecção viral aguda e prevenir a nevralgia pos-herpetica. Os agentes antivirais tem demonstrado eficácia pela cicatrização acelerada das lesoes e resolução da dor associada ao zoster. A ação efetiva dos agentes antivirais para a prevenção da nevralgia pos-herpetica e controversa. A terapia com Aciclovir parece produzir uma redução moderada do desenvolvimento de nevralgia pos-herpetica. A posologia do Aciclovir oral e de 800mg/ dia, durante 7 a 10 dias. Outros agentes antivirais, como Valaciclovir e Famciclovir, parecem ser, pelo menos, tão efetivo quanto o Aciclovir. O uso de Prednisona em conjunto com Aciclovir mostrou que reduz a intensidade e a duração da dor associada ao Herpes Zoster. A dose oral de Prednisona e de 60mg/dia, nos 1o ao 7o dias, e de 30mg/dia, nos 15º ao 21o dias. Pacientes com dor leve ou moderada podem responder a analgésicos. Dor mais severa pode necessitar da adição de medicamentos narcóticos. Loções contendo Calamina podem ser utilizadas nas lesoes abertas para reduzir a dor e o prurido. Quando as lesoes ganham crosta, Capsaicin creme pode ser aplicado. Lidocaína e bloqueadores nervosos tem um efeito na redução da dor. Não existem tratamentos que revertam os danos causados pelo zoster, apenas existe tratamento para aliviar a dor associada a nevralgia pos-herpetica.
Características epidemiológicas
             Ocorre em todas as idades, porem a sua incidência e maior nos idosos. Pacientes com infecção pelo HIV, doença de Hodgkin, leucemia ou linfoma, com transplante de medula, em uso de medicamentos imunossupressivos e anticancerígenos são de risco. A incidência de Herpes Zoster em pacientes infectados pelo virus HIV e cerca de 15 vezes maior do que em pessoas não infectadas. Pacientes com disseminação cutânea, apresentam risco de pneumonite, meningoencefalite, Hepatite E outras complicações graves. Cerca de 20% dos pacientes com zoster desenvolvem nevralgia pos-herpetica.
Herpes Zoster e Aids
            A partir de 1981, o Herpes Zoster passou a ser reconhecido como uma infecção frequente em pacientes portadores de HIV. Posteriormente, observações epidemiológicas demonstraram que era uma manifestação inicial de infecção pelo HIV, cuja ocorrencia e preditiva de soropositividade para HIV, em populações de risco. A incidência de Herpes Zoster e significativamente maior entre indivíduos HIV positivos do que entre os soronegativos (15 vezes mais frequente nos primeiros). A incidência cumulativa de zoster por 12 anos apos a infecção pelo HIV foi de 30%, ocorrendo segundo uma taxa relativamente constante, podendo ser manifestação precoce ou tardia da infecção pelo HIV. Complicações, como retinite, necrose aguda de retina e encefalite progressiva fatal, tem sido relatadas com mais frequência em pacientes HIV positivos.

terça-feira, 9 de abril de 2013

DOENÇA DE CHAGAS

A doença de Chagas (DC) é uma das consequências da infecção humana pelo protozoário flagelado Trypanosoma cruzi. Na ocorrência da doença observam-se duas fases clínicas: uma aguda, que pode ou não ser identificada, podendo evoluir para uma fase crônica. No Brasil, atualmente predominam os casos crônicos decorrentes de infecção por via vetorial, com aproximadamente três milhões de indivíduos infectados. No entanto, nos últimos anos, a ocorrência de doença de Chagas aguda (DCA) tem sido observada em diferentes estados (Bahia, Ceará, Piauí, Santa Catarina, São Paulo), com maior frequência de casos e surtos registrados na Região da Amazônia Legal (Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Amapá, Pará, Tocantins). 

 A distribuição espacial da doença é limitada primariamente ao continente americano em virtude da distribuição do vetor estar restrito a ele, daí é também denominada de tripanossomíase americana. Entretanto, são registrados casos em países não endêmicos por outros mecanismos de transmissão. Os fatores que determinam e condicionam a sua ocorrência refletem a forma como a população humana ocupa e explora o ambiente em que vive. Questões como migrações humanas não controladas, degradação ambiental e precariedade de condições socioeconômicas (habitação, educação, entre outras) inseremse nesses fatores. A área endêmica ou, mais precisamente, com risco de transmissão vetorial da doença de Chagas no País, conhecida no final dos anos 70, incluía 18 estados com mais de 2.200 municípios, nos quais se comprovou a presença de triatomíneos domiciliados. Até então, a Região Amazônica estava excluída dessa área de risco em virtude da ausência de vetores domiciliados. Ações sistematizadas de controle químico focalizadas nas populações de Triatoma infestans, principal vetor e estritamente domiciliar no Brasil, foram instituídas a partir de 1975 e mantidas em caráter regular desde então e levaram a uma expressiva redução da presença de T. infestans intradomiciliar e, simultaneamente, da transmissão do T.cruzi ao homem. Associadas a essas ações, mudanças ambientais, maior concentração da população em áreas urbanas e melhor compreensão da dinâmica de transmissão contribuíram para o controle e a reorientação das estratégias no Brasil. Atualmente o risco de transmissão da DC depende:
1. Da existência de espécies de triatomíneos autóctones; 2. Da presença de mamíferos reservatórios de T. cruzi próximos às populações humanas; 3. Da persistência de focos residuais de T. infestans, nos estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Bahia.
Soma-se a esse quadro a emergência de casos e surtos na Amazônia Legal por transmissão oral, vetorial domiciliar sem colonização e vetorial extradomiciliar. Com isso, evidenciam-se duas áreas geográficas onde os padrões de transmissão são diferenciados: 1. A região originalmente de risco para a transmissão vetorial, que inclui os estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Paraná, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Sergipe, São Paulo e Tocantins; 2. A região da Amazônia Legal, incluindo os estados do Acre, Amazonas, Amapá, Rondônia, Roraima, Pará, parte do Maranhão, do Mato Grosso e do Tocantins. 
AGENTE ETIOLÓGICO
A doença é causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi, caracterizado pela presença de um flagelo. No sangue dos vertebrados, o T. cruzi se apresenta sob a forma de tripomastigota, que é extremamente móvel e, nos tecidos, como amastigotas. No tubo digestivo dos insetos vetores, ocorre um ciclo com a transformação do parasito, dando origem às formas infectantes presentes nas fezes do inseto.

VETORES E RESERVATÓRIO
 Estádios evolutivos do triatomíneo, de ovo a adulto. A maioria das espécies de triatomíneos deposita seus ovos livremente no ambiente, entretanto, algumas espécies possuem substâncias adesivas que fazem com que os ovos
fiquem aderidos ao substrato. Essa é uma característica muito importante, uma vez que ovos aderidos às penas de aves e outros substratos podem ser transportados passivamente por longas distâncias, promovendo a dispersão da espécie.

A introdução no domicílio de materiais com ovos aderidos (como folhas de palmeiras para cobertura de casas e lenha) pode favorecer o processo de colonização. A oviposição ocorre entre 10 e 30 dias após a cópula e o número de ovos varia de acordo com a espécie e principalmente em função do estado nutricional da fêmea. Uma fêmea fecundada e alimentada pode realizar posturas por todo o seu período de vida adulta. Pouco se conhece sobre a biologia dos vetores nos seus ecótopos naturais. Muitas espécies são ecléticas quanto ao habitat e fonte alimentar, embora algumas sejam bem menos generalistas, como a Cavernícola lenti, que habita ocos de árvores e se alimenta de sangue de morcegos, e as espécies do gênero Psammolestes, que ocorrem em ninhos de aves. A maioria das espécies conhecidas vive no meio silvestre, associada a uma diversidade de fauna e flora. É importante ter em mente que essa associação a habitats é dinâmica, ou seja, uma espécie hoje considerada exclusivamente silvestre pode se tornar domiciliada se as condições em que vivem forem alteradas. A maioria das espécies do gênero Rhodnius encontra-se predominantemente associada a palmeiras, enquanto as espécies do gênero Triatoma e Panstrongylus vivem preferencialmente em associação com hospedeiros terrestres. Algumas poucas espécies, ao longo de seu processo evolutivo, adaptaram-se aos domicílios e às estruturas construídas no peridomicílio, como galinheiros e chiqueiros, e tornaram-se mais importantes na transmissão da doença ao homem. Um triatomíneo (ninfa ou adulto) que tenha se alimentado em um mamífero (incluindo o homem) infectado com o T. cruzi pode adquirir a infecção, assim permanecendo por toda a sua vida. Não há transmissão transovariana do T. cruzi, portanto, os ovos não são infectados e os insetos que dele eclodirem permanecerão livres de infecção até a primeira ingestão de sangue contaminado. Das 140 espécies de triatomíneos conhecidas atualmente, 69 foram identificadas no Brasil e são encontradas em vários estratos florestais, de todos os biomas. Com a interrupção da transmissão vetorial por Triatoma infestans no País, quatro espécies de triatomíneos têm especial importância na transmissão da doença ao homem: T. brasiliensis, Panstrongylus megistus, T. pseudomaculata e T. sordida. Espécies como o T. rubrovaria, no Rio Grande do Sul, e Rhodnius neglectus, em Goiás, têm sido encontradas colonizando o domicílio. O T. vitticeps (Rio de Janeiro e Espírito Santo) e o P. lutzi (Ceará e Pernambuco) merecem atenção pelas altas taxas de infecção natural. Por sua vez, R. nasutus é frequentemente capturado no peridomíciliodo Nordeste brasileiro (Ceará e Rio Grande do Norte). Na Amazônia, as espécies mais encontradas são R. pictipes, R. robustus, P. geniculatus, P. lignarius e T. maculata.
O T. cruzi é encontrado nos mais diversos nichos ecológicos, contribuindo cada tipo de ecótopo para formar modalidades distintas de focos naturais da parasitose. Apresenta uma enorme competência em infectar espécies de hospedeiros. Esse flagelado está amplamente distribuído em todas as regiões do País, sendo reportado em infecções naturais em cerca de uma centena de espécies de mamíferos silvestres e domésticos pertencentes a oito diferentes ordens. Desse modo, como parasita de animais silvestres, podemos encontrar diferentes espécies de mamíferos sustentando diferentes ciclos de transmissão, os quais podem estar isolados ou conectados. Esse caráter é particular e único para cada localidade. Alguns animais silvestres como quatis, mucuras e tatus aproximam-se das casas, frequentando galinheiros, currais e depósitos na zona rural e periferia das cidades. Em alguns casos, como os morcegos, compartilham ambientes com o homem e animais domésticos. Desse modo, essas espécies podem estar servindo como fonte de infecção aos insetos vetores que ocupam os mesmos habitats dos humanos. Desde os primeiros estudos, o tatu-galinha (Dasypus novemcinctus), amplamente distribuído em toda a América Latina, foi reconhecido como um dos hospedeiros do T. cruzi. Em seus abrigos subterrâneos esse mamífero é encontrado associado ao triatomíneo Panstrongylus geniculatus, igualmente infectado com o parasito. 
Roedores como a paca e o porco-espinho, mucuras e macacos, entre outros mamíferos, foram encontrados naturalmente infectados por T. cruzi. O contato do homem com o ambiente silvestre e, portanto, com os ciclos de transmissão desse parasito ocorre em diversas situações que em geral (mas não necessariamente) são ou foram influenciadas direta ou indiretamente pelo homem. Procurando uma explicação para a emergência ou reemergência de parasitoses, os profissionais de saúde tentaram identificar as espécies animais que são fontes de infecção para o homem e/ou animais domésticos. Nesses estudos, muitas espécies de mamíferos são denominadas “reservatórios naturais” de parasitos. A continuação desses estudos mostrou que em muitos casos não apenas uma, mas diversas espécies animais poderiam ser apontadas como fonte de infecção do homem em um determinado local. Passou-se a entender que determinados parasitos eram capazes de infectar um número grande de espécies de animais e que estas apresentavam diferenças na sua importância como fonte de infecção para o homem – esse é o caso do T. cruzi. Ficou claro que em diferentes localidades uma mesma espécie de mamífero pode desempenhar distintos papéis na manutenção do parasita na natureza. Mais ainda, começou-se a entender que cada área estudada apresentava características próprias e que variavam no tempo, ou seja, as ações de saúde deveriam entender o que se passa em cada local para então estabelecer a estratégia de atuação. Dentro dessa nova maneira de entender os parasitos e sua transmissão para o homem, o conceito de reservatório como uma espécie animal que mantém o parasita como “portador assintomático” passou a ser considerado ultrapassado na medida em que não reflete a complexidade e temporalidade do ciclo de transmissão. Assim sendo, a definição mais completa de reservatório até o momento é: Reservatório é um sistema ecológico complexo formado por uma ou mais espécies, responsável pela manutenção de um parasita na natureza. Esse sistema
deve ser consistente e considerado sempre em uma escala espaçotemporal única. Portanto considera-se reservatório não mais uma espécie animal, mas um sistema ecológico (formado por uma ou mais espécies) no qual o parasita sobrevive. Esse sistema deve ser duradouro, abundante e incluir uma grande proporção da biomassa de mamíferos locais. Pequenos mamíferos são modelos adequados para diagnóstico ambiental se considerarmos que: (a) são frequentemente apontados como reservatórios de diversos parasitas de caráter zoonótico; (b) são o grupo de mamíferos com maior biomassa em qualquer ecótopo silvestre; (c) incluem gêneros com comportamento nômade, amplificando
a área de dispersão do parasita; são os principais alvos de predação na natureza, possibilitando uma via alternativa (via oral) para dispersão dos parasitas; (e) embora silvestres, alguns se adaptam bem à presença do homem, o que favorece a formação de um gradiente contínuo de transmissão entre os ambientes silvestre e doméstico. 
POR QUE E COMO ESTUDAR RESERVATÓRIOS
A transmissão do T. cruzi para o homem ocorre por meio de um vetor – os triatomíneos. Porém esses triatomíneos apenas transmitem o parasita se estiverem infectados e isso acontece quando eles se alimentam sobre um dos numerosos hospedeiros. Ou seja, se os mamíferos de uma determinada área apresentar altas taxas de infecção por T. cruzi, há probabilidade do vetor se infectar e, portanto, infectar o próximo mamífero (incluindo o homem) do qual ele se alimenta. A identificação do que é o reservatório de um parasito é um desafio tanto do ponto de vista teórico quanto
prático. No entanto, é um ponto fundamental para a definição de medidas que serão adotadas para o controle da transmissão do parasito em questão. Essa tarefa se torna um desafio maior, um quebra-cabeça no estudo de um parasita generalista como o
Trypanosoma cruzi. Quando se discute reservatórios do T. cruzi, é preciso ter em mente que o simples fato de um indivíduo ser encontrado naturalmente infectado não quer dizer necessariamente que ele venha a constituir um risco à saúde de sua população, de outras espécies. Ainda, o papel que cada espécie de hospedeiro desempenha na dispersão e/ou manutenção do parasito pode ser extremamente inconstante devido à (a) complexidade dos processos e inter-relações ecológicas; e (b) a espantosa velocidade com a qual o homem modifica cada vez mais os ambientes. É importante lembrar que um ciclo de transmissão muitas vezes é imaginado como nas ilustrações dos livros didáticos, unidimensional e linear. No entanto é preciso compreendê-lo de outro modo, é preciso compreender o ciclo do Trypanosoma cruzi como um sistema complexo, variável e dinâmico. Para definir e desenvolver medidas de controle, é necessário conhecer todos os elos da cadeia de transmissão, o que inclui os reservatórios. Como definido anteriormente, a condição de reservatório difere no tempo e no espaço, o que exige estudos locais realizados a partir de metodologia específica. Um conhecimento incompleto dos elos da cadeia de transmissão já comprometeu o controle de várias parasitoses no passado. Um olhar abrangente sobre todos os componentes da rede de transmissão vai evitar uma percepção distorcida da realidade e, consequentemente, vai evitar a adoção de medidas de controle insuficientes. A condição de reservatório é dinâmica e difere no recorte tempo espacial. É classicamente afirmado que gambás são os reservatórios silvestres mais importantes do T. cruzi. Na verdade os gambás podem sim ser excelentes reservatórios, mas isso não acontece em todos os biomas e habitats. De fato o gambá é atualmente considerado como uma espécie sinantrópica, muito mais do que silvestre. Considerando como reservatório do T. cruzi a espécie de mamífero capaz de sustentar, manter o parasito e também ser capaz de transmitir esse parasita, ou seja, apresentar alta transmissibilidade para o vetor, há que se conhecer na área que for o alvo dos estudos os seguintes aspectos:
1) O conjunto dos mamíferos existentes no local: a composição faunística e abundância relativa das espécies de mamíferos – essa informação vai permitir reconhecer o papel que as diferentes espécies desempenham no ciclo de transmissão. Assim: uma espécie de mamífero que apresentar altas prevalências da infecção por T. cruzi, mas que representar apenas uma pequena parte da fauna de mamíferos do local de estudo não representará um risco de infecção muito expressivo. 
 2) Proceder a identificação correta dos hospedeiros – é importante saber identificar exatamente a espécie na qual se detectou a infecção por T. cruzi, porque é sabido que espécies semelhantes apresentam padrões de infecção bem diferentes, a saber: maior ou menor quantidade de parasitas no sangue (parasitemia) e tempo de duração dessa parasitemia. Essas diferenças resultam na maior ou menor possibilidade da infecção do triatomíneo que for se alimentar sobre esses animais, ou seja, na sua maior ou menor transmissibilidade. 
 3) A prevalência e o perfil da infecção por T. cruzi na população de hospedeiros como forma de avaliar a infecção e a transmissibilidade, ou seja, quantos animais (de quais espécies) do total estão infectados e quantos animais apresentam muitos parasitos no sangue. Essa informação vai demonstrar quais as espécies de animais que foram expostos à infecção e são ou não fontes de infecção para os triatomíneos. Assim, mamíferos nos quais foram detectados anticorpos certamente foram expostos à infecção. Se esses mamíferos não apresentarem parasitas no sangue (e isso se
observa examinando o sangue entre lâmina e lamínula e/ou cultivando o sangue em meio de cultivo), isso sugere que naquele momento estes não são fonte de infecção para os triatomíneos.
4) A distribuição regional dos hospedeiros nos distintos habitats do bioma. Essa informação permite avaliar onde está acontecendo a transmissão, ou seja, onde há maior risco de contaminação. Observa-se com frequência que a transmissão do T. cruzi é agregada, não é homogênea. Podem-se encontrar animais infectados de modo mais localizado em uma determinada área e não em outra. Portanto, é sempre importante examinar um número representativo de animais de todos os ambientes representativos das áreas que estamos estudando.
5) A prevalência da infecção entre as distintas subpopulações de hospedeiros, a saber: machos e fêmeas, adultos e jovens. Com essa informação será possível determinar se a infecção ainda está acontecendo (caso a infecção pelo T. cruzi seja muito frequente em animais jovens) ou a possibilidade da dispersão do parasito. Tomando como exemplo: a) Os marsupiais (mucuras, cassacos, sarigues), que são descritos como animais nômades, no entanto, os machos têm um comportamento nômade muito mais acentuado do que as fêmeas. b) Primatas vivem em grupos e são muito territorialistas. Provavelmente as taxas de infecção irão variar entre os grupos, o que deverá ser considerado nos estudos desses animais.
6) A dinâmica das populações de hospedeiros no tempo e espaço – estudos longitudinais.

7) O isolamento e caracterização do parasito – apenas a caracterização das subpopulações do T. cruzi vai permitir rastrear os ciclos de transmissão, ou seja, entender quais os animais estão envolvidos no ciclo de transmissão que inclui o homem. Sempre que possível deve ser construído um banco de dados com todas as informações, para posterior análise espacial e definição das áreas de risco.
Animais domésticos
Alguns animais domésticos (cães e gatos) podem ser excelentes reservatórios do T. cruzi. Animais domésticos de vida livre podem atuar como elo entre os ciclos de transmissão silvestre e domiciliar. Porcos também se infectam com o parasito, mas o seu papel como reservatório ainda precisa ser mais bem estudado. Do mesmo modo que
os mamíferos silvestres, a importância dos animais domésticos como reservatório varia nos diferentes locais, mas eles estão sempre expostos à infecção e esta sempre precede a do homem. Uma proposta que vem sendo feita por profissionais de saúde de vários países da América Latina é utilizar os animais domésticos como sentinela da transmissão do T. cruzi. O que é isso? A presença de anticorpos específicos nos animais domésticos em uma determinada área sinaliza que a transmissão do T. cruzi está acontecendo nas proximidades do homem e que é hora de ampliar as ações: aprofundar o estudo dos ciclos de transmissão, incluir um programa de educação em saúde e boas práticas e principalmente sensibilizar a população da área. 

TRANSMISSÃO
Ciclo de Transmissão
 
Formas de transmissão• Vetorial: ocorre por meio das fezes dos triatomíneos, também conhecidos como “barbeiros” ou “chupões”. Esses, ao picarem os vertebrados, em geral defecam após o repasto, eliminando formas infectantes de tripomastigotas
metacíclicos, que penetram pelo orifício da picada ou por solução de continuidade deixada pelo ato de coçar;
• Transfusional/transplante: ocorre pela passagem por transfusão de sangue e/ou hemocomponentes ou transplante de órgãos de doadores infectados a receptores sadios;
• Vertical ou congênita: ocorre pela passagem de parasitas de mulheres infectadas pelo T.cruzi para seus bebês durante a gestação ou o parto;
• Oral: ocorre pela ingestão de alimentos contaminados com parasitas provenientes de triatomíneos infectados ou, ocasionalmente, por secreção das glândulas de cheiro de marsupiais (mucura ou gambá);
• Acidental: ocorre pelo contato da pele ferida ou de mucosas com material contaminado (sangue de doentes, excretas de triatomíneos, animais contaminados) durante manipulação em laboratório (acidental), em geral sem o uso adequado de equipamentos de proteção individual.
Transmissibilidade: o parasito só se transmite de pessoa a pessoa por meio do sangue, órgãos ou placenta. A maioria dos indivíduos com infecção pelo T. cruzi alberga o parasito nos tecidos e sangue, durante toda a vida, o que significa que devem serexcluídos das doações de sangue e de órgãos.
PERÍODO DE INCUBAÇÃO
• Transmissão vetorial: 4 a 15 dias;
• Transmissão transfusional: 30 a 40 dias ou mais;
• Transmissão vertical: pode ser transmitida em qualquer período da gestação ou durante o parto;
• Transmissão oral: 3 a 22 dias;
• Transmissão acidental: até aproximadamente 20 dias.
ASPECTOS CLÍNICOS DA DOENÇA
Após a entrada do parasito no organismo, basicamente ocorrem duas etapas fundamentais na infecção humana pelo T. cruzi:
I. Fase aguda (inicial): predomina o parasito circulante na corrente sanguínea, em quantidades expressivas. As manifestações de doença febril podem persistir por até 12 semanas. Nessa fase os sinais e sintomas podem desaparecer espontaneamente, evoluindo para a fase crônica, ou progredir para formas agudas graves, que podem levar ao óbito.
II. Fase crônica: existem raros parasitos circulantes na corrente sanguínea. Inicialmente, essa fase é assintomática e sem sinais de comprometimento cardíaco e/ou digestivo. Pode apresentar-se como uma das seguintes formas:
• Forma indeterminada: paciente assintomático e sem sinais de comprometimento do aparelho circulatório (clínica, eletrocardiograma e radiografia de tórax normais) e do aparelho digestivo (avaliação clínica e radiológica normais de
esôfago e cólon). Esse quadro poderá perdurar por toda a vida da pessoa infectada ou pode evoluir tardiamente para uma das formas a seguir;
• Forma cardíaca: evidências de acometimento cardíaco que, frequentemente, evolui para quadros de miocardiopatia dilatada e insuficiência cardíaca congestiva (ICC). Essa forma ocorre em cerca de 30% dos casos crônicos e é a maior responsável pela mortalidade na doença de Chagas crônica;
• Forma digestiva: evidências de acometimento do aparelho digestivo que, frequentemente, evolui para megacólon ou megaesôfago. Ocorre em cerca de 10% dos casos;
Forma associada (cardiodigestiva): ocorrência concomitante de lesões compatíveis com as formas cardíacas e digestivas. A fase crônica da doença de Chagas (DCC) evolui para óbito em cerca de 1% a 10% dos casos estudados e não tratados, especialmente em crianças.

Manifestações clínicas da doença de Chagas aguda (DCA)
A manifestação mais característica é a febre, sempre presente, usualmente prolongada, constante e não muito elevada (37,5º a 38,5º C), podendo apresentar picos vespertinos ocasionais.
Sintomatologia inespecífica Na maioria dos casos aparentes, ocorrem:
• Prostração, diarreia, vômitos, inapetência, cefaleia, mialgias, aumento de gânglios linfáticos;
• Manchas vermelhas na pele, de localização variável, com ou sem prurido;
• Crianças menores frequentemente ficam irritadiças, com choro fácil e copioso. Sintomatologia específica É caracterizada pela ocorrência, com incidência variável, de uma ou mais manifestações:
• Miocardite difusa com vários graus de severidade;
• Pericardite, derrame pericárdico, tamponamento cardíaco;
• Cardiomegalia, insuficiência cardíaca, derrame pleural.
São comumente observados:
• Edema de face, membros inferiores ou generalizado;
• Tosse, dispneia, dor torácica, palpitações, arritmias;
• Hepatomegalia e/ou esplenomegalia leve a moderada.
Sinais de porta de entrada, próprios da transmissão vetorial, como o sinal de Romaña (edema bipalpebral unilateral por reação inflamatória à penetração do parasito na conjuntiva e adjacências) ou o chagoma de inoculação (lesões furunculoides não supurativas em membros, tronco e face, por reação inflamatória à penetração do parasito, que se mostram descamativas após duas ou três semanas), são menos frequentes atualmente. Deve-se ressaltar que a picada de um triatomíneo pode causar reações alérgicas
locais ou sistêmicas sem que isso signifique necessariamente infecção pelo T. cruzi. Em alguns casos por transmissão oral, foram observados sangramento digestivo (hematêmese, hematoquezia ou melena) e outros tipos de sinais hemorrágicos concomitantes. 

Doença de Chagas por transmissão vertical Na transmissão vertical (congênita).
A maioria dos casos é assintomática. Não obstante, podem ocorrer: febre, hepatoesplenomegalia, sinais de cardiopatia aguda ou de comprometimento do sistema nervoso central (SNC), prematuridade ou natimorto. Cabe lembrar que, diante da suspeita ou ocorrência de caso de DCA congênita, a mãe deve ser diagnosticada, acompanhada e eventualmente tratada (não durante a gravidez).
Reativação da doença de Chagas na infecção por HIV (vírus da imunodeficiência humana)
Em pacientes imunodeprimidos, como os portadores de neoplasias hematológicas, os usuários de drogas imunodepressoras ou os coinfectados pelo vírus da Imunodeficiência Humana Adquirida, pode haver reativação da doença de Chagas, que deve ser confirmada por exames parasitológicos diretos no sangue periférico, em outros fluidos orgânicos ou em tecidos.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
A abordagem sindrômica é uma estratégia epidemiológica que se baseia na detecção de um conjunto de manifestações clínicas comuns a muitas doenças, visando a captar um maior número de casos, de forma oportuna, de modo que contribua para a adoção precoce e precisa de medidas de controle. Para a fase aguda, devem ser considerados agravos como leishmaniose visceral, malária, dengue, febre tifoide, toxoplasmose, mononucleose infecciosa, esquistossomose aguda, coxsakieviroses. Atualmente cabe acrescentar também doenças que podem
cursar com eventos íctero-hemorrágicos como leptospirose, dengue, febre amarela e outras arboviroses, meningococcemia, sepse, hepatites virais, febre purpúrica brasileira, hantaviroses e rickettsioses.

DIAGNÓSTICO LABORATORIAL 
Fase aguda
Para definição do diagnóstico laboratorial da fase aguda da doença de Chagas, são considerados critérios parasitológicos e sorológicos. O critério parasitológico é definido pela presença de parasitos circulantes demonstráveis no exame direto do sangue periférico. Por sua vez, o critério sorológico é baseado na presença de anticorpos antiT. cruzi da classe IgM no sangue periférico, particularmente quando associada a alterações clínicas e epidemiológicas sugestivas


FONTE: Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Vigilância em saúde : zoonoses / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – Brasília : Ministério da Saúde, 2009. 228 p. : il. – (Série B. Textos Básicos de Saúde) (Cadernos de Atenção Básica ; n. 22).