sexta-feira, 2 de abril de 2010

ANEMIA FERROPRIVA


Irene de Almeida Biasoli

1. Introdução

A anemia ferropriva é a causa mais comum de anemia. Acredita-se que 500 milhões de pessoas no mundo apresentem esta patologia, o que corresponde a 30% da população mundial. As maiores taxas de prevalência de deficiência de ferro são encontradas em populações que sofrem de sangramento crônico do trato gastrintestinal (TGI), devido a infecções parasitárias e/ou que apresentam baixo conteúdo de ferro na dieta.


2. Metabolismo do ferro

2.1. Proteínas envolvidas no metabolismo do ferro

O suprimento e o estoque de ferro são mediados por três proteínas principais: transferrina, receptor de transferrina e ferritina, que por sua vez são reguladas por uma quarta classe de proteínas, que são as proteínas regulatórias de ferro (IRPs). A transferrina é uma proteína de transporte e carreia o ferro no plasma e no líquido extracelular para suprir as necessidades teciduais. O receptor de transferrina é uma glicoproteína de membrana que se liga ao complexo ferro-transferrina, mediando a endocitose. O ferro é liberado dentro da célula, o receptor de transferrina volta a superfície celular e a apotransferrina é liberada no plasma. A ferritina é a mais importante proteína de reserva do ferro e é encontrada em todas as células, especialmente naquelas envolvidas na síntese de compostos que contêm ferro (precursores eritróides) e no metabolismo e reserva do ferro (hepatócitos e macrófagos). As IRPs (IRP1 e IRP2) coordenam a expressão intracelular do receptor de transferrina, ferritina e outras proteínas envolvidas no metabolismo do ferro.

2.2. Suprimento de ferro e reservas

A massa total de ferro corporal é normalmente 40-50 mg/Kg; as mulheres tipicamente tem uma quantidade menor. A distribuição do ferro corporal pode ser vista na Tabela 1.

Tabela 1: Distribuição do ferro corporal

Quantidade (mg/Kg)
Homem Mulher
Compartimento funcional
Hemoglobina 31 28
Mioglobina 5 4
Enzimas Heme 1 1
Enzimas não-heme 1 1
Compartimento de transporte
Transferrina <1> <1>
Compartimento de reserva
Ferritina 8 4
Hemossiderina 4 2
Total 50 40

O equilíbrio do ferro é determinado pela diferença do que entra e do que sai do organismo; é fisiologicamente regulado pelo controle da absorção do ferro: a quantidade absorvida de ferro e as reservas de ferro estão reciprocamente relacionadas, isto é, quando as reservas de ferro diminuem, a taxa de absorção de ferro aumenta. Da mesma forma, o nível de eritropoiese também influencia a taxa de absorção de ferro, isto é, a absorção aumenta com o nível de eritropoiese.
Normalmente a troca de ferro com o meio é extremamente limitada. A absorção de ferro acontece na parte superior do duodeno e é influenciada pela quantidade e forma do ferro, fatores gastro-intestinais e composição da dieta (exemplo: ácido ascórbico aumenta a absorção do ferro não-heme).

Uma vez absorvido, o ferro se liga à transferrina plasmática e a maior parte do ferro em trânsito é captada pelos precursores eritróides na medula óssea e vai compor a hemoglobina das hemácias circulantes. Estas, após cerca de 120 dias são catabolizadas por macrófagos na medula óssea, baço e fígado. O ferro é liberado da hemoglobina e retorna à transferrina plasmática. O restante do turn over diário de ferro corresponde à parcela absorvida no TGI e a uma pequena parcela do ferro que é perdida para o plasma, resultante de hemólise intravascular. Se liga à haptoglobina ou hemopexina e leva ao hepatócito para um retorno eventual à transferrina plasmática.

O movimento do ferro para o éritron (todos os elementos eritróides, em todos os estágios de desenvolvimento, na medula óssea, circulação e espaço extravascular) corresponde a 80% do fluxo de ferro ligado à transferrina. O restante corresponde a: troca de ferro com os hepatócitos, movimento entre o plasma, espaço extravascular e tecido, e uma troca externa limitada (absorção e perda pelo TGI).

2.3. Estágios no desenvolvimento da deficiência de ferro

A deficiência de ferro é geralmente o resultado final de um longo período de balanço de ferro negativo. Conceitualmente, podemos delinear três estágios no desenvolvimento da deficiência de ferro. O primeiro estágio, também chamado de pré-latente, é caracterizado pela depleção das reservas de ferro nos hepatócitos, macrófagos do fígado, baço e medula óssea, sem no entanto haver diminuição do ferro sérico. Neste momento a taxa de absorção intestinal de ferro aumenta. O segundo estágio, também chamado de latente, existe quando as reservas já estão depletadas, mas o nível de hemoglobina ainda permanece normal. Neste estágio, já é possível detectar algumas anormalidades: diminuição da saturação de transferrina, aumento da protoporfirina eritrocitária livre (PEL) e aumento do TIBC (capacidade total de ligação do ferro). O VGM (volume globular médio) permanece normal, mas podem ser detectadas algumas hemácias microcíticas no exame do sangue periférico. Finalmente, quando os níveis de hemoglobina caem abaixo do limite da normalidade, verifica-se a anemia ferropriva, o terceiro estágio. (Tabela 2)

Tabela 2: estágios de desenvolvimento da deficiência de ferro

Normal Pré-latente Latente Anemia ferropriva
Ferro medular Normal Reduzida Ausente Ausente
Ferritina sérica (g/L) Normal Reduzida <> <>
Saturação de transferrina Normal Normal <> <>
PEL Normal Normal Aumentado Muito Aumentado
Hemoglobina Normal Normal Normal Diminuída
VGM Normal Normal Normal Reduzida
Outros Aumento da absorção de ferro Alterações epiteliais


3. Etiologia e patogênese

A causa mais comum de aumento das necessidades de ferro que leva à anemia ferropriva é a perda de sangue; em homens e mulheres na pós-menopausa a anemia ferropriva quase inevitavelmente significa perda sangüínea pelo TGI. No TGI, qualquer lesão hemorrágica pode ser responsável por esta perda: hérnia hiatal, varizes esofageanas, esofagite, gastrite, duodenite, úlcera péptica, sangramento intra-hepático, doença inflamatória intestinal, diverticulose, hemorróidas e pólipos adenomatosos. Além disso, a anemia ferropriva é geralmente o primeiro sinal de malignidade do TGI.

Ademais, a ingestão crônica de antiinflamatórios, corticoesteróides, salicilatos e álcool pode causar ou contribuir para esta perda de sangue. Mundialmente, a causa mais freqüente de perda de sangue é a infecção por ancilostomídeo; acredita-se que aproximadamente 1 bilhão de pessoas estejam infectadas.

Em mulheres, a perda sangüínea menstrual é geralmente responsável pelo aumento das necessidades de ferro. Outras causas genito-urinárias de sangramento incluem neoplasias uterinas e hemoglobinúria resultante de hemoglobinúria paroxística noturna ou hemólise intravascular crônica.

Raramente, a perda sangüínea pelo trato respiratório resultante de hemoptise recorrente crônica pode produzir anemia ferropriva.

Em crianças e adolescentes as necessidades de ferro podem exceder o suprimento de ferro disponível na dieta. Outros exemplos de necessidades aumentadas de ferro são a gravidez e a lactação.

Em alguns casos, o suprimento inadequado de ferro na dieta pode contribuir para o desenvolvimento de anemia ferropriva. Em crianças ou mulheres com hipermenorréia ou múltiplas gestações, o risco de anemia ferropriva pode ser aumentado pelo consumo de dietas com quantidade insuficiente de ferro biodisponível, isto é, aquelas com pouco ou nenhum ferro na forma heme ou grande quantidade de inibidores da absorção. Para crianças mais velhas, homens e mulheres na pós-menopausa, a dieta quase nunca é a explicação para a deficiência de ferro; e outras causas, principalmente perda sangüínea, devem ser pesquisadas.

Raramente, uma absorção de ferro prejudicada é a causa da deficiência de ferro.


4. Manifestações clínicas

O paciente com anemia ferropriva pode apresentar: (1) sinais e sintomas da doença de base responsável pela anemia ferropriva, (2) manifestações comuns a todas as anemias (palidez, tonteiras, palpitações, cefaléia, irritabilidade, fraqueza) ou (3) assintomático, somente com alterações laboratoriais. O paciente pode ou não apresentar os sinais e sintomas considerados altamente específicos para anemia ferropriva: pagofagia (consumo excessivo de gelo) ou outra perversão do apetite, coiloníquia e escleras azuis. A presença e a proeminência de sintomatologia depende do grau e do tempo para o desenvolvimento da anemia. Como a anemia ferropriva geralmente é de instalação insidiosa, ocorre adaptação circulatória e respiratória, permitindo uma tolerância a níveis baixos de hemoglobina.

O paciente com anemia ferropriva pode também apresentar glossite, estomatite angular, estenose esofagenana e atrofia gástrica.


5. Avaliação laboratorial

A anemia ferropriva é uma anemia microcítica e hipocrômica na maior parte dos casos. O grau de alteração dos índices hematimétricos (VGM, HCM e CHCM) é relacionado, em parte, com a duração e a gravidade da anemia. Na deficiência de ferro de curta duração, os índices podem estar normais. A hematoscopia pode revelar anisocitose e um certo grau de poiquilocitose.

O número de leucócitos é geralmente normal, mas em casos extremos pode ser encontrada neutropenia. O número de plaquetas está geralmente aumentado.

O exame da medula óssea (mielograma) vai revelar uma hiperplasia do setor eritróide com alguns eritroblastos menores e com citoplasma escasso. A coloração para ferro (azul da Prússia) demonstrará ausência das reservas de ferro.

A Tabela 2 mostra os estágios de desenvolvimento da anemia ferropriva e as alterações laboratoriais em cada uma destas fases.


6. Diagnóstico diferencial

A anemia ferropriva é a única anemia microcítica e hipocrômica em que as reservas de ferro estão ausentes. Se as reservas ainda estão presentes, o diagnóstico de anemia ferropriva é excluído, e se as reservas estão ausentes, o diagnóstico é confirmado.

Na maioria dos casos, a avaliação dos indicadores indiretos é suficiente (ferro baixo, TIBC aumentado, ferritina <12>

As patologias que podem ser consideradas diagnóstico diferencial para as anemias microcíticas e hipocrômicas são: anemia de doença crônica, talassemias e outras hemoglobinopatias, anemia sideroblástica e defeitos na absorção, transporte e utilização do ferro (exemplo: atransferrinemia congênita). A anemia de doença crônica é a causa mais comum de anemia em pacientes hospitalizados e se desenvolve durante semanas em pacientes com algum quadro infeccioso, inflamatório ou neoplasia. A anemia é geralmente leve a moderada. A anemia pode ser normocítica / microcítica e normocrômica /hipocrômica. As características laboratoriais que podem ajudar a diferenciá-la da anemia ferropriva são: TIBC normal ou diminuído e concentração do receptor de transferrina normal (está aumentada na anemia ferropriva). A ferritina está normal ou alta na anemia de doença crônica.


7. Tratamento

O objetivo inicial do tratamento é reparar o déficit de hemoglobina e repor as reservas de ferro medular. Entretanto, a correção deste déficit é somente uma parte do tratamento; é importante identificar e corrigir a doença de base que causou a anemia ferropriva.

O tratamento de escolha é a reposição com ferro oral (sal de ferro, 3-4 vezes por dia, dose total diária: 150-200 mg de ferro elementar), principalmente entre as refeições, o que maximiza a absorção; a preparação de sulfato ferroso é a mais utilizada.
Espera-se um aumento de 2g/dl da hemoglobina após três semanas de tratamento que deve ser mantido até 4-6 meses de normalização do nível de hemoglobina para a reposição das reservas de ferro. Os efeitos colaterais mais comuns são no TGI, que pode ser minimizado com a administração do ferro durante as refeições, ou utilização de preparações com menor quantidade de ferro, ou ainda reduzindo a freqüência de administração para dose única diária.

Virtualmente todos os pacientes podem ser tratados por via oral. Desta forma, a terapia parenteral, com riscos de reações adversas, deve ser reservada aos pacientes que permanecem intolerantes apesar de modificações no regime de doses ou pacientes com sangramento crônico incontrolável ou má-absorção de ferro.


Bibliografia

1. Wintrobe's Clinical Hematology 10th edition.

2. Hematology Basic Principles and Practice. 3 rd edition.


Hematologista, Médica do Serviço de Hematologia do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho - UFRJ
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Anemia Falciforme


A Anemia Falciforme tem origem desconhecida, mas provavelmente desenvolveu-se na África, milhões de anos atrás. Protege as pessoas contra a malária, doença séria e comum nos países de clima quente. No Brasil estima-se que 3 de cada 100 pessoas são portadoras do traço de Anemia Falciforme e 1 em cada 500 negros brasileiros nasce com uma forma de doença. Embora haja uma maior incidência na raça negra, os brancos, particularmente os que são provenientes do Mediterrâneo (Grécia, Itália, etc.) Oriente médio, Índia, apresentam a doença.
Diante deste quadro é possível deduzir-se que a miscigenação racial existente no Brasil está gerando a continuidade desta anemia, conforme ratifica a literatura científica brasileira, apontando de forma contundente que anemias hereditárias no país constituem um grave problema de saúde pública.

A DOENÇA

A Anemia Falciforme é uma doença genética e hereditária, causada por anormalidade da hemoglobina dos glóbulos vermelhos do sangue, responsáveis pela retirada do oxigênio dos pulmões, transportando-os para os tecidos. Esses glóbulos vermelhos perdem a forma discóide, enrijecem-se e deformam-se, tomando o formato de “foice “. Os glóbulos deformados, alongados, nem sempre conseguem passar através de pequenos vasos, bloqueando-os e impedindo a circulação do sangue nas áreas ao redor. Como resultado causa dano ao tecido circunvizinho e provoca dor. O curso da doença é variável. Há doentes que apresentam problemas sérios com mais freqüência e outros têm problemas esporádicos de saúde. Geralmente é durante a Segunda metade do primeiro ano de vida de uma criança que apareceram os primeiros sintomas da doença. Exceção é feita nos casos onde o exame de sangue – para detecção da doença – foi realizado já no nascimento ou no berçário. Até atingir a idade escolar é comum a doença se manifestar; é raro isso não ocorrer. A Anemia Falciforme não deve ser confundida com o traço falciforme. Traço falciforme significa que a pessoa é tão somente portadora da doença, com vida social normal.

O QUE É DOENÇA FALCIFORME?

A Doença Falciforme é uma doença herdada em que, os glóbulos vermelhos, diante de certas condições, alteram sua forma e se tornam parecidos com uma foice, daí o nome falciforme.
Os glóbulos vermelhos em forma de foice se agregam e dificultam a circulação do sangue nos pequenos vasos do corpo. Com a diminuição da circulação ocorrem lesões nos órgãos atingidos, causando dor, destruição dos glóbulos, icterícia (olhos amarelos) e anemia.

COMO UM INDIVÍDUO SE TORNA PORTADOR DE ANEMIA FALCIFORME?

A hemoglobina, pigmento que dá cor vermelha aos glóbulos vermelhos, é essencial para a saúde de todos os órgãos do corpo transportando o oxigênio. A hemoglobina normal é chamada de A e os indivíduos normais são considerados AA, porque recebem uma parte do pai e outra da mãe.

Na Anemia Falciforme a hemoglobina produzida é anormal e é chamada de S. Quando a pessoa recebe de um dos pais a hemoglobina A e de outro a hemoglobina S, ele é chamado de “traço falcêmico”, sendo representado por AS. O portador de traço falcêmico não é doente, sendo portanto, geralmente assintomático e só é descoberto quando é realizado um estudo familiar. Quando uma pessoa recebe de ambos, pai e mãe, a hemoglobina S, ela nasce com Anemia Falciforme cuja representação é SS. Então os pais do paciente com Anemia Falciforme deverão ser portadores do traço ou doentes. Além de filhos com Anemia Falciforme, pessoas portadores do Traço Falcêmico poderão também ter filhos normais ou portadores do traço como eles.

QUAL A DIFERENÇA ENTRE ANEMIA FALCIFORME E DOENÇA FALCIFORME?

A Anemia Falciforme acontece quando o indivíduo é SS. Ocorre entretanto em alguns indivíduos a união de um traço S com outro traço doente (C, D, Talassemia), levando ao aparecimento da hemoglobinopatia SC, SD, S-Talassemia. Todas as hemoglobinopatias juntas incluindo a Anemia Falciforme (SS), são chamadas de Doenças Falciformes (SS, SD, SC, S-Talassemisa).

QUAIS OS SINTOMAS DA DOENÇA?

A Doença Falciforme (englobadas SS, SC, SD, S – Talassemia), pode se manifestar de forma diferente em cada indivíduo. Uns têm apenas alguns sintomas leves já outros apresentam um ou mais sinais ou sintomas que vamos descrever:

1. Crise de Dor

É o sintoma mais freqüente da Doença Falciforme causado pela obstrução de pequenos vasos pelos glóbulos vermelhos em foice. A dor pode se localizar nos ossos ou nas articulações, no tórax, no abdômen, podendo atingir qualquer local do corpo. Essas crises têm duração variável e podem ocorrer várias vezes ao ano. Geralmente são associadas ao tempo frio, infecções, períodos pré-menstrual, problemas emocionais, gravidez, ou desidratação.

2. Icterícia (cor amarela nos olhos)

É o sinal mais freqüente da doença. O quadro não é contagioso e não deve ser confundido com hepatite. Quando o glóbulo vermelho se rompe, aparece um pigmento amarelo no sangue que se chama bilirrubina. A urina se torna cor de coca-cola e o branco dos olhos torna-se amarelo.

3. Síndrome Mão-pé

Nas crianças pequenas as crises de dor podem ocorrer nos pequenos vasos das mãos e dos pés causando inchaço, dor e vermelhidão no local.

4. Infecções

Podem ocorrer infecções freqüentes localizadas na garganta, pulmões e ossos. Estas infecções devem ser vistas pelo médico hematologista tão logo apareçam, podem ser muito graves e até fatais. Todos os pacientes devem estar com a caderneta de vacinação atualizada. Ao primeiro sinal de febre procure o Hospital onde você é atendido, isto certamente fará com que a infecção seja controlada com mais facilidade. Para prevenir infecções graves, todos os pacientes até 5 anos de idade devem receber penicilina (Benzetacyl de 21/21d ou penicilina oral 2x dia) ou Eritromicina se forem alérgicos à penicilina.

5. Úlceras de Perna

Úlceras de perna ocorrem, freqüentemente, próximo aos tornozelos. Os pacientes devem ser orientados pelo médico hematologista para o tratamento das úlceras e encaminhados para a sala de curativos. As úlceras podem levar anos para cicatrização completa, se não forem bem cuidadas no início de seu aparecimento. Para prevenir o aparecimento de úlceras, os pacientes devem andar com meias grossas e sapato.

6. Seqüestro do Sangue no Baço

O afoiçamento dos glóbulos no baço pode levar ao seqüestro do sangue. Há palidez e dor no baço e é uma emergência. Procure o hospital onde você é atendido.

EXISTE CURA PARA A DOENÇA FALCIFORME?

A Doença Falciforme, embora não tenha cura, já que é hereditária tem controle. Por isso é necessário fazer o diagnóstico precoce e ir sempre à consultas.

COMO DEVEM SE COMPORTAR NO DIA-A-DIA AS PESSOAS COM DOENÇA FALCIFORME?

Elas devem fazer repouso moderado, evitando exercícios muito pesados. Devem também alimentar-se com legumes, verduras, frutas e carnes, e ingerir bastante líquidos. É importante agasalhar-se durante o período de frio, usar roupas leves durante o verão e usar sempre sapatos e meias para evitar machucados nas pernas. Se apresentar crises leves de dor, sem febre, deve aumentar a ingestão de líquidos e usar remédios para dor. Se houver febre ou crises que melhoram, procurar o hospital onde você é atendido. Sim. As crianças não são diferentes em relação às outras quanto à inteligência. Devem ser estimuladas para o estudo. Quanto às atividades de educação física, estas só poderão ser liberadas após avaliação do seu médico hematologista. Os professores deverão ser orientados quanto ao quadro clínico e às complicações da Doença Falciforme. Procure nos Centros de Atendimento o manula para o aluno falciforme e leve para o seu colégio. É o desconhecimento que faz com que os seus amiguinhos olhem para você com estranheza. Informe-os e aos seus professores. Você só está ajudando!

E AS VACINAS?

Os pacientes devem ter a caderneta de vacinações atualizada. Além das vacinas distribuídas às demais crianças, você deve receber também vacina anti-Hepatite B, anti-Pneumococo e anti-Hemofílus.

POR QUE SE TRATA A CRISE COM SORO?

Porque a hidratação torna o sangue menos vicioso, diminuindo portanto a formação de novos trombos e evitando a obstrução dos vasos.

SE O PACIENTE ESTIVER EM CRISE DE DOR E NÃO HOUVER HEMATOLOGISTA NA CIDADE, COMO DEVE PROCEDER?

O paciente deverá mostrar ao Clínico da Emergência sua carteira do Centro de Atendimento, onde consta seu diagnóstico. Deve sempre levar este manual consigo, pois em caso de dúvida, o médico pode consultá-lo. Caso o médico ainda tenha alguma dúvida quanto a consulta a seguir deverá telefonar para o Centro de Atendimento da sua região.

POR QUE OS MÉDICOS PRESCREVEM ÁCIDO FÓLICO?

Porque o organismo, para tentar compensar a anemia, produz muitos glóbulos vermelhos ou hemácias e o ácido fólico é uma vitamina importante na formação das hemácias.

POR QUE NÃO SE DEVE TOMAR REMÉDIOS QUE TENHAM FERRO?

Porque quando os glóbulos vermelhos se rompem, liberam de ferro de dentro deles. Este ferro é estocado nos tecidos e pode levar a uma reação tipo “cicatriz”. Se o paciente recebe muitas transfusões ou toma compostos que contenham ferro, com o passar dos anos, o ferro deposita-se no organismo podendo vir a apresentar problemas no coração, fígado ou desenvolvimento de doenças como a Diabetes.

A PACIENTE COM DOENÇA FALCIFORME PODE TER FILHOS?

A gravidez é considerada de alto risco. Esta decisão deve ser tomada após o conhecimento pela paciente falcêmica e pelo futuro pai, dos riscos que envolverão a gestação. Cada caso deverá ser discutido com o médico. Há mais chance de aumento da pressão do sangue, problemas nos rins, necrose asséptica do fêmur, exposição às transfusões com maior freqüência e a transmissão da doença que merece estudo de hemoglobina do futuro pai.

A PACIENTE COM DOENÇA FALCIFORME PODE TOMAR PÍLULA ANTICONCEPCIONAL?

Sim. A paciente pode usar pílula, desde que acompanhada por médico especialista.
Hoje em dia há anticoncepcionais orais (mini-pílula) e injetável (3 em 3 meses), não havendo evidências de efeitos colaterais importantes para a paciente falcêmica. O anticoncepcional injetável é um excelente método contraceptivo para doente falciforme já que pode evitar crise de falcização, diminuindo a incidência de doença inflamatória pélvica e o índice de falha é inferior a 1%.

O QUE É NECROSE ASSÉPTICA DA CABEÇA DO FÊMUR?

Alguns pacientes fazem obstrução das pequenas veias da articulação do quadril. Nesse caso a cabeça do fêmur (osso da coxa), se achata e a perna encurta; muitas vezes há muito incômodo e é necessário fazer cirurgia com colocação de prótese da cabeça do fêmur (cabeça de fêmur artificial) pelo médico ortopedista, com acompanhamento do seu hematologista.

O QUE É PRIAPISMO?

É um estado de ereção DOLOROSA, causada pela obstrução dos vasos do pênis. Geralmente ocorre espontaneamente, à noite. Procure o médico hematologista logo que isto ocorrer. O tratamento imediato visa evitar complicações futuras. Este quadro também pode ocorrer de forma passageira e repetida. Quando comparecer ao ambulatório, não esqueça de informar ao seu médico, pois ele prescreverá medicação.

O PACIENTE PODE TER DOENÇA NOS RINS?

Sim. A obstrução dos vasos ocorre também no rim. Isto leva a uma série de alterações no funcionamento dos rins. Alguns pacientes podem evoluir para insuficiência renal crônica. Como identificar isto? Comparecendo regularmente aos exames e consultas de rotina com o hematologista, que o encaminhará ao nefrologista quando necessário.

O PACIENTE PODE TER DOENÇA NEUROLÓGICA?

Sim. Com certa freqüencia os pacientes com Doença falciforme podem apresentar diversas queixas e sinais neurológicos, tais como: dor de cabeça, convulsões, tonteiras e derrame. Tais complicações se devem à anemia que por sua vez baixa os níveis de oxigênio na circulação cerebral ou à obstrução dos vasos cerebrais. Quando os sintomas acima ocorrerem, o paciente deverá ser encaminhado ao setor de emergência ou ao médico assistente que pedirá a avaliação do neurologista. Aqueles que já estão em acompanhamento neurológico devem ser conscientizados a não faltar às consultas regulares e fazer uso criterioso dos medicamentos prescritos.

O PACIENTE PODE VIAJAR DE AVIÃO?

As grandes altitudes levam às crises de falcização. Se precisar viajar de avião, não é necessário se preocupar, pois todas as grandes companhias aéreas tem aviões com cabines pressurizadas.

O PACIENTE PODE IR À PRAIA TOMAR SOL?

Sim, até as 10h ou a partir das 15h, e deve ingerir líquidos abundantemente. Geralmente, quando o paciente suado vai nadar em águas com baixa temperatura, ele pode entrar em crise de dor, pelo esfriamento.

O PACIENTE PODE FAZER EDUCAÇÃO FÍSICA, NATAÇÃO E JOGAR BOLA?

O exercício físico acentuado pode levar à crise dolorosa. O exercício físico deve ser moderado, sempre lembrando-se de ingerir líquidos em abundância. Nos grupos interdisciplinares de Anemias Hemolíticas Hereditárias há a participação de fisioterapeutas que orientam e trabalham na recuperação física dos pacientes.

COMO DEVE SER A ALIMENTAÇÃO?

Como há um estado de maior necessidade calórica do organismo, causado pela anemia, a alimentação deve ser equilibrada. Para isto devem estar presentes na alimentação diariamente: pães e derivados, margarina, leite e derivados, açúcares (doces), cereais, leguminosas (feijão, lentilha, ervilha, grão de bico), carnes (de boi, frango ou peixe), legumes (utilizar as folhas normalmente dispensadas, como por exemplo, de beterraba), verduras, frutas, óleo vegetal (3 colheres das de sopa divididas em 3 refeições).
É IMPORTANTE INGERIR GRANDE QUANTIDADE DE LÍQUIDOS.

QUAIS OS CUIDADOS COM OS DENTES?

Os cuidados são os mesmo exigidos para outros pacientes. O desenvolvimento dentário na Doença Falciforme é normal. Cuidados especiais estão indicados na prevenção da cárie dentária. Devem escovar os dentes após ingestão de qualquer tipo de alimento, principalmente os ricos em açúcar. A consistência do tipo de acúcar é fator importante, pois em certos tipos de balas e doces o açúcar adere mais às superfícies dos dentes e quanto mais tempo aí permanecer, mais prejudicial será. Procurar o dentista uma vez ao ano, é uma boa medida para prevenir problemas dentários no futuro.

NECESSIDADES DO PACIENTE

CADA PACIENTE PRECISA:

1- Manter Boa Saúde
Dieta adequada, repouso suficiente, exercício moderado , podem ajudar a proteger contra crises de falcização.

2- Ter Atividades Leves
Pessoas com Anemia Falciforme não são inválidas. Elas podem fazer a maioria das coisas que não sejam estressantes.

3- Evitar Estresse
Crianças podem se cansar facilmente ao se esforçarem demais para acompanhar as atividades das outras. Evitar a fadiga.

4- Prevenir Infecções
De cortes e machucados. Isto significa atenção especial para cuidados da pele e higiene pessoal.

TRATAMENTO

O TRATAMENTO HABITUALMENTE INCLUI:
Medicação para dor.
Antibióticos.
Aumento da oferta de líquidos.
Transfusão.
Repouso no leito.
Cirurgia ==> Sempre recomendada pelo médico.

PADRÃO DE HEREDITARIEDADE

A forma comum da Anemia Falciforme (HbSS) acontece quando uma criança herda um gene da hemoglobina falciforme da mãe e outro do pai. É necessário que cada um dos pais tenha pelo menos um gene falciforme, o que significa que cada um é portador de um gene da hemoglobina falciforme e um gene da hemoglobina normal. Como a condição de portador do traço falciforme é um estado benigno, muitas pessoas não estão cientes de que o possuem. Quando duas pessoas portadoras do traço falciforme resolvem Ter filho(s), é importante que saibam que para cada gestação há possibilidade de um para quatro de que a criança tenha doença falciforme; há possibilidade de uma em duas de que a criança tenha doença falciforme; há possibilidade de uma em quatro de que a criança tenha o traço da falciforme, e a chance de um em quatro de que tenha a hemoglobina normal.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DA ANEMIA FALCIFORME

1.Episódios vaso-oclusivos (Dolorosos)

A doença se manifesta por ataques episódicos de dor, com crises dolorosas. A dor geralmente atinge mais freqüentemente os ossos e as articulações das mãos e dos pés (especialmente em crianças mais novas), braços e pernas, costas e tórax (especialmente em crianças maiores), ou no abdome. Quando os pequenos vasos sangüíneos são obstruídos (vaso-oclusão) pelos glóbulos falcizados as áreas adjacentes se tornam privadas de oxigênio e o tecido fica lesado (enfarte). A dor é resultante da lesão ao tecido provocado pela falta de oxigênio. Fatores desencadeantes: Inclui infecção, fadiga física, febre, desidratação e exposição ao frio. No entanto, na maioria dos casos, o episódio doloroso não está associado a qualquer fator desencadeante reconhecível. Duração: Esses episódios duram de 3 a 5 dias; às vezes, podem durar uma semana ou mais. Uma pequena porcentagem de pacientes tem episódios freqüentes, extremamente dolorosos, exigindo hospitalizações múltiplas no período de 1 ano, enquanto outros passam longos períodos sem dor. Às vezes uma criança sofre uma série de episódios em um período curto de tempo, ficando depois livre deste problema por meses ou até anos. Pelo fato de ocorrerem de maneira inesperada, e poderem variar em intensidade e duração, os episódios dolorosos freqüentemente têm um impacto psicológico negativo nos pacientes e em suas famílias. É importante enfatizar que os episódios dolorosos são autolimitados e desaparecem espontaneamente. Ainda não há medicação preventiva para evitar ou parar um episódio doloroso logo no seu início. A ênfase deve ser dada no manuseio do controle da dor. Não envolve risco de vida.

2. Infecções e Febre

As crianças com Anemia Falciforme têm maior incidência de infecção bacteriana (particularmente pneumonia, septicemia, meningite e osteomielite) que as crianças que não têm essa doença.

3.Incapacidade para Concentrar Urina

Lesões causadas por repetidas obstruções de pequenos vasos fazem com que os rins percam sua capacidade de concentrar urina. Portanto, esses pacientes eliminam sempre grande quantidades de urina em qualquer situação. O resultado é micção freqüente, em alguns enurese (urinar na cama) e desidratação quando houver aumento das atividades em dias quentes. Quando os líquidos forem eliminados de outras maneiras, como transpiração excessiva, diarréias ou v6omitos, a desidratação ocorre e pode surgir um episódio doloroso vaso-oclusivo.

4. Acidente Vascular Cerebral (AVC)

Aproximadamente 6% das crianças com Anemia Falciforme sofrem de acidente vascular cerebral. Existe a tendência de repetir quando já se teve AVC uma vez. A causa mais freqüente é o bloqueio dos vasos sangüíneos no cérebro, resultando em lesão.

5. Seqüestro Esplênico

É a complicação da Doença Falciforme, que envolve risco de vida imediato, exigindo tratamento de emergência. Grande quantidade de sangue é retida no baço, que se torna bastante aumentado. Pode ser comparado à hemorragia com sangue indo para o baço. Uma criança com sequestração esplênica torna-se pálida, fraca e prostrada; tem o abdome distendido e doloroso, transpirando muito. O nível de hemoglobina cai drasticamente, a criança pode entrar em estado de choque e morrer. Raramente ocorre com crianças com mais de 5 anos, pois nesta idade o baço geralmente está destruído pelos freqüentes episódios de falcização. Entretanto, a sequestração esplênica pode ocorrer em crianças mais velhas, portadoras de outras variantes da doença falciforme.

6. Atraso na Maturação Física

Algumas crianças com Doença Falciforme apresentam um atraso no desenvolvimento físico e sexual. O atraso no crescimento torna-se aparente na primeira década de vida. Geralmente, mais tarde recuperam a altura, sendo que os adultos com Doença Falciforme são com freqüência tão alto quanto os outros. Embora a causa seja desconhecida, supõe-se que o atraso no crescimento e desenvolvimento possa ser decorrente de um aumento na demanda calórica, causada pelo excesso de atividade cardiovascular para compensar a anemia, além da hiperatividade da médula óssea para repor glóbulos vermelhos que tem vida média diminuída. A maturidade sexual é retardada em ambos os sexos. A fertilidade parece ser normal, tanto nos homens como nas mulheres.

7. Icterícia

As crianças com Doença Falciforme freqüentemente têm uma coloração amarela na parte branca dos olhos. Esta característica é causada pelo aumento dos níveis sangüíneos da bilirrubina (produto resultante da quebra da hemoglobina). Se a criança tiver dor abdominal, vômitos ou estiver prostrada, torna-se necessário procurar auxílio médico. Muitas crianças com Anemia Falciforme têm cálculos biliares.

8. Problemas nos Ossos e Articulações

O crânio, ossos longos, vértebras e as grandes articulações sofrem mudanças típicas da doença. Necrose asséptica (morte do tecido não relacionada à infecção) do osso devido à lesão causada por enfartes pode ocorrer em qualquer osso, acometendo parcialmente a cabeça do fêmur. Esta complicação pode se iniciar em crianças com mais de 5 anos de idade; todavia, é mais comum surgir bem mais tarde.

O QUE PODE SER FEITO PARA AJUDAR AS PESSOAS COM ANEMIA FALCIFORME?

MANUSEIO DOMICILIAR DA DOR:

Verificar a temperatura
Aumentar a ingestão diária de líquidos
Estimular a ingestão de alimentos
Distrair o paciente
Usar técnicas de relaxamento
Proporcionar conforto físico

ACONSELHAMENTO GENÉTICO:

Pessoas que apresentam risco de geara filhos com hemoglobinopatias graves têm o direito de serem informadas através do aconselhamento genético, a respeito de todas as implicações dessa doença. O aconselhamento genético tem como objetivo permitir aos indivíduos a tomada de decisões consciente e equilibrada a respeito da procriação. Isto envolve também a discussão, por exemplo, dos recursos terapêuticos disponíveis para a doença, a possibilidade de diagnóstico precoce e de prevenção de complicações graves, adoção de filhos, uso de métodos anticoncepcionais. Como muito bem comenta o professor Bernardo Beiguelman, os programas de aconselhamento genético devem visar, fundamentalmente, os interesses dos indivíduos e de suas famílias e não os interesses da sociedade. O termo “aconselhamento genético” é impróprio, uma vez que o princípio desse processo é, justamente, não dar conselhos. As crianças devem ser testadas para a doença tão cedo quanto possível. Medicamentos podem ser dados para minimizar a ameaça de outras infecções.

fonte: http://www.saudeemmovimento.com.br

Alergia ao latex


INTRODUÇÃO

A borracha natural de látex ou simplesmente látex é um produto que está muito presente em nosso dia a dia, entra na composição de produtos que utilizamos em casa, no trabalho e lazer. Os primeiros relatos de reações alérgicas induzidas pelo látex são de 1980 , mas com o estabelecimento das medidas de proteção universal e prevenção de doenças , a padronização do uso de luvas de látex fez aumentar o número de relatos rapidamente (1). Anafilaxia e as primeiras mortes atribuídas à exposição ao látex foram documentadas pôr Slater em 1989 (2). Neste mesmo ano análises mostravam que 0,5 % dos casos de choque intraoperatórios eram devido à alergia ao látex. Dois anos depois este número passou à 12,5 % (3). Em 1997 o FDA ( Food and Drug Administration) recebeu notificações de cerca de 2.300 casos de reações alérgicas envolvendo produtos médicos com látex , sendo 225 casos de Anafilaxia, 53 paradas cardíacas e 17 mortes (4) . Dados recentes apontam para uma sensibilidade ao látex de 12,5% a 15,8% entre a população de médicos anestesiologistas (5).

Figura 1: exposição ocupacional - trabalhador da área de saúde.

A borracha natural é extraída da seiva da Seringueira ( Hevea braziliensis), nativa do Brasil, mas atualmente muito cultivada e comercializada no Oeste da África e Sudeste Asiático. É uma mistura complexa de polisoprene, lipídios, fosfolípides, e proteínas. Durante sua manufatura são adicionados vários produtos químicos como: amônia, thiocarbonetos, anti-oxidantes e radicais de enxofre para vulcanização (6). O agente alergênico mais importante parecem ser as proteínas de látex.

Figura 2: Seringueira.

Atualmente foram identificadas sete tipos de proteínas sensibilizadoras que receberam classificação de alergenos (Hev b-1 a b-7) pela União Internacional de Sociedades de Imunologia. Uma proteína de 14 kiloDaltons, 14kd ( fator de alongamento da borracha) parece ser a responsável pela maioria das reações alérgicas entre profissionais de saúde. Outras populações com alta incidência apresentam maior sensibilidade à proteína 27kd. A quantidade de proteínas presentes nas luvas de látex varias muito entre lotes de mesmo fabricante e mais ainda entre marcas diferentes, de 3 a 337mcg/g de látex, isto devido a desnaturação das mesmas durante a produção; os índices aumentam nas luvas com talco ou pó lubrificante(Cornstarch)(7).

As vias de exposição e sensibilização podem ser resultado de contato com a pele e membranas mucosas ou pôr via inalatória, ingestão, injeção parenteral ou inoculação pelos ferimentos. As luvas de látex são as principais fontes de antígenos entre as equipe médicas (8). As partículas de poeira ou talco presentes nas luvas formam ligações com as proteínas e podem transportá-las pelo ar na forma de aerossóis. Nas salas cirúrgicas, como ocorrem trocas freqüentes de luvas os níveis de partículas no ar podem ser muito altos determinando sintomas que vão desde conjuntivites, rinites, tosse , rouquidão, sibilos e até broncoespasmo (9).

Os estudos sobre a prevalência das reações alérgicas ao látex variam muito dependendo da população estudada e dos métodos utilizados para estabelecer a sensibilidade ao antígeno. Mas mesmo com estas variações existem alguns grupos bem estabelecidos onde o risco é elevado.

GRUPOS DE RISCO:

1.Pacientes com história de múltiplos procedimentos cirúrgicos.

Este grupo inclui principalmente pacientes com malformações geniturinárias congênitas ( extrofia vesical, válvula de uretra posterior, malformações de bexiga ), mielomeningocele, espinha bífida, atresia esofágica, Arnold Chiari tipoII, ânus imperfurado, sindrôme de “VATER”( alteração vertebral, ânus imperfurado, fistula traqueoesofágica, displasia renal) (10).

Figura 3: Doença de Arnold-Chiari - herniação das tonsilas cerebelares através do Forame Magno ( setas azuis ). A seta amarela aponta para a medula espinhal.

Um estudo entre paciente com espinha bífida mostrou 60% de sensibilidade através da história clínica e testes laboratoriais e cutâneos, embora nem todos demonstraram sintomas alérgicos durante os procedimentos realizados (11). Mais recentemente, o Dr.Fernandes vem conduzindo um levantamento no Hospital da A.A.C.D.(Associação de Assistência à Criança Deficiente) em São Paulo onde através de metodologia mais específica encontrou cerca de 25,8% de sensibilidade nas crianças com mielomeningocele acompanhadas na instituição. Os dois maiores fatores de risco nesta população são as freqüentes exposições e história de atopia prévia (12).

Figura 4: Mielomeningocele

2.Profissionais da Saúde.

Dependendo da metodologia encontramos prevalência variando de 2,9% à 17% entre profissionais de saúde, mas ela pode ser bem maior, pois segundo relatos atualizados do FDA ,dos eventos adversos relacionados ao látex, 70% envolvem agentes da saúde que em muitos casos estão também na condição de pacientes em tratamento ou hospitalizados. O Colégio Americano de Alergia, Asma e Imunologia(ACAAI) classificou a alergia ao látex como um grande problema de saúde pública e uma doença ocupacional. Entre os trabalhadores ,histórico de atopia, eczema ou dermatite de contato em mãos associadas ao uso freqüente de luvas descartáveis estão associadas ao aumento do risco de desenvolver reações alérgicas importantes.

3.Outros indivíduos com exposição ocupacional.

Figura 5: exposição ocupacional - trabalhador da indústria da borracha.

Os trabalhadores da industria da borracha e outros profissionais com manipulação dos produtos (cabeleireiros, jardineiros) devem apresentar níveis de sensibilização semelhantes aos do meio médico.

4.Indivíduos com antecedentes de febre do feno, rinites, asma ou eczema(atopia).

Atopia parece ser o principal fator de risco predisponente .

5.Indivíduos com antecedentes de alergia a determinados alimentos.

Algumas frutas tropicais( abacate, banana, kiwi,) e castanhas parecem possuir algumas proteínas semelhantes, algumas até idênticas, às proteínas encontradas no látex (13).

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

Existem três tipos distintos de reações que podem ocorrer com o contato ao látex:

Dermatite de contato irritativa.

Figura 6: Dermatite de contato.

É a manifestação mais comum e freqüente, corresponde a 80% das queixas daqueles trabalhadores que utilizam luvas. É resultado da ação direta do látex ou substâncias químicas irritantes sobre a pele, podendo ser potencializado pelo degermante e procedimentos de lavagem das mãos para cirurgia. Esta reação não é mediada pelo sistema imunológico e não é uma reação alérgica verdadeira, mas as lesões produzem perda da integridade da pele e podem permitir absorção das proteínas e sensibilização posterior.

Figura 7: Luvas de látex.

Hipersensibilidade tardia, Tipo IV.

Também chamada de dermatite mediada por células-T ,dermatite alérgica ou reação anafilactóide, envolve diretamente o sistema imune. Entre todas as reações imunológicas às luvas, 84% são do Tipo IV. Normalmente são produzidas por resposta à alguns aditivos químicos utilizados na produção das luvas e não pela sensibilização às proteínas. A pele desenvolve um eritema urticariforme que aparece geralmente 72 horas após o contato inicial e pode evoluir para uma dermatite bolhosa. Não existem repercussões sistêmicas.

Hipersensibilidade imediata, Tipo I.

Também chamada de reação anafilática ou reação mediada por células IgE. O antígeno induz a produção de imumoglobulinas classe E (IgE) específicas. Na reexposição ao agente a ligação dos anticorpos com o antígeno ativa um gatilho para uma cascata de eventos que promovem degranulação de mastócitos e basófilos com liberação de mediadores inflamatórios como: histamina, ácido aracdônico, leucotriênos e prostaglandinas. As reações ocorrem geralmente alguns minutos após o estímulo, mas em pacientes anestesiados são relatadas reações até 30 minutos após a indução. Os sintomas desenvolvem intensidade e gravidade variadas, se manifestando desde eritemas, coceira, tosse, rouquidão, dispnéia, sibilância, conjuntivite, edema de via aérea, broncoespasmo e até choque com colapso circulatório e parada cardíaca (14).

Figura 8: Eosinófilo, envolvido nas reações de hipersensibilidade

DIAGNÓSTICO

O diagnóstico de sensibilidade ao látex é determinado por anamnese detalhada com dados positivos em um questionário específico e/ou exame físico detalhado buscando reações dérmicas ou alérgicas, associados a testes laboratoriais "in vivo" e "in vitro".

O teste diagnóstico mais indicado para determinar reações de sensibilidade Tipo IV são testes cutâneos com "patchs" padronizados que contém fragmentos de produtos que contém látex.

A reação tipo I é investigada por testes sorológicos buscando detectar anticorpos. O FDA aprovou quatro testes para a IgE específica do látex que utilizam as tecnologias classificadas como "RAST"( Radioallergosorbent Test) e "EAST" (Enzymeallergosorbent Test). Comercialmente são conhecidos como : Ala-STAT, Immunolite, Pharmacia Coated Allergen Particle test(CAP) e HY-TEC (15). Infelizmente estes teste mostram índices de falso negativo de cerca de 30%, embora alguns trabalhos mostrem maiores vantagens no teste CAP na investigação das equipes médicas. Os teste de inoculação cutânea de frações de antígeno apresentam altíssimos índices de sensibilidade e especificidade, mas ainda não existem testes standard em kits comerciais, isto devido ao perigo potencial destes testes produzirem reações severas em pacientes sensibilizados previamente (16).

A melhor conduta para evitar complicações no período perioperatório seria identificar previamente os pacientes dos grupos de risco e/ou com história sugestiva e achados laboratoriais e prevenir totalmente o contato com o látex. Para tanto é necessário um esforço conjunto multidisciplinar e apoio das instituições para estabelecer rotinas e padronizações que vão além das salas de cirurgia. A A.S.A (American Society of Anesthesiology) realizou em 1999 uma "task force" que sugere algumas medidas:

1 - Os cuidados aos pacientes devem ser planejados e coordenados pelas várias equipes: anestesia, cirurgia, enfermagem , fisioterapia.

2 - Sempre que possível as cirurgias eletivas devem ser agendadas para o primeiro horário do dia, isto previne níveis muito altos de antígenos de látex na forma de aerossóis na sala cirúrgica..

3 - Os pacientes devem ser identificados com braceletes ou colares de alerta e os prontuários devem conter avisos de "Alergia ao látex" para os pacientes com diagnóstico estabelecido e "Alerta ao látex" para aqueles com suspeita.

4 - Pesquisar e listar todos os produtos padronizados na instituição que tenham látex na sua composição, estes produtos devem ser substituídos ou totalmente afastados. Esta lista é a base fundamental para produzir um ambiente sem látex nas salas cirúrgicas e enfermarias. Aqui seguem alguns itens que fazem parte de uma checagem inicial de uma sala cirurgia:

a - Partes internas e externas do equipamento de anestesia .

Figura 9: Cânula naso-faríngea ( látex )

b - Luvas,tubos endotraqueais e conecções "látex free".

c - Máscaras, balões de ventilação, circuitos respiratórios (usar de silicone, polivinilcloridato ou de borracha preta que seja velha e bem lavada previamente).

d - Remover as tampas de borracha de medicamentos , não furar a borracha com agulhas.

Figura 10:Tampa de medicação contendo látex - sua perfuração com agulhas pode contaminar soluções e sensibilizar pacientes ao látex.

e - Não utilizar seringas com êmbolos de borracha, usar seringas descartáveis com silicone ou seringas de vidro.

f - Evitar garrotes ou torniquetes com borracha.

g - Cuidado com manguitos de medida de pressão arterial( as borrachas devem ser encapadas ou protegidas com algodão).

h - AMBU ( verificar se as válvulas e o balão não são de látex ).

i - Verificar os introdutores de medicação nos soros e equipos, evitar punções repetidas e trocar soluções cada 6 horas.

j - Deixar adrenalina diluída (0,01mg/ml ou 1:100.000) para uso imediato.

k - Verificar equipamento de cirurgia.

Figura 11: Sonda vesical (látex )

l - Evitar produtos cirúrgicos com látex ( luvas, drenos tipo Penrose, cateter urinário ,instrumental específico, clamps de borracha, cateter vascular, garrotes e equipamento de irrigação.(17)

Figura 12: Dreno de Penrose (látex ).

m - A profilaxia medicamentosa é de utilidade duvidosa. Alguns autores recomendam uso de difenidramina, cimetidina e metilpredinisolona pré-operatório (18), mas outros questionam que a pré- medicação atenuaria apenas a resposta imune inicial e não a anafilaxia , não incentivando seu uso rotineiro .(19)

TRATAMENTO DAS REAÇÕES ALÉRGICAS AO LÁTEX

A dermatite de contato e as reações tipo IV são controladas com sucesso afastando os agentes irritantes da pele e aplicando corticóides tópicos.

As manifestações alérgicas sistêmicas, tipo I, apresentam uma grande variedade de sintomas e sinais e o tratamento depende da seriedade do quadro clínico mas é extremamente importante identificar e remover o agente desencadeante. As reações mais brandas como a rinite e eritemas respondem ao uso de antihistamínicos e corticoesteroides nasais e sistêmicos. As reações mais severas com comprometimento das vias aéreas podem requerer tratamento agressivo com antihistamínicos , esteroides, bloqueadores H2, oxigênio, broncodilatadores, intubação traqueal e principalmente adrenalina.

No caso de anafilaxia deve ser padronizado protocolo de tratamento específico que visa a rapidez e eficiência no atendimento. A A.S.A sugere o seguinte protocolo:

Terapia inicial

1. Parar imediatamente a administração ou reduzir a absorção do agente agressor( verificar vias de contato, inclusive mucosas e via inalatória).

2.Remover todo látex do campo cirúrgico.

3.Trocar as luvas.

Figura 13: Luvas "látex-free".

4.Descontinuar administração de antibióticos e/ou sangue e derivados.

5.Manter a ventilação com oxigênio e FiO2 de 100%.

6.Intubação traqueal ( quando necessária).

7.Administrar 25-50ml/kg de peso de cristalóide.

8. Administrar adrenalina:

a)intravenosa: 0,1mcg/kg ou aproximadamente 10 mcg em um adulto(hipotensão) e 0,1mg/kg no colapso circulatório com parada cardíaca.

b)subcutânea: ( na falta de acesso venoso) 300mcg .

c)endotraqueal: de 5 a 10 vezes a dose intravenosa ou 50-100mcg no adulto( 10 ml de solução 1:10.000).

d)inalação com dosímetro: 3 inalações de 0,16 à 0,20mg de adrenalina.

e)nebulização: 15 gotas de solução de adrenalina a 2,25% em 2 ml de solução salina.

9.Desligar todos os agentes anestésicos

10. Colocar avisos de "Alerta Látex" na entrada da sala de cirurgia e limitar a entrada de materiais e pessoas.

Terapia secundária

1.Administrar antihistamínicos: Difeniframina 1mg/kg EV ou IM( dose máxima de 50mg) e Ranitidina 1mg/kg EV (dose máxima de 50mg).

2.Administrar corticoides: Hidrocortisona 5mg/kg de ataque e depois 2,5mg/kg cada 4 à 6 horas ou Metilpredisolona 1mg/kg de ataque e 0,8mg/kg cada 4 à 6 horas.

3.Administrar aminofilina (para broncoespasmo) 5-6mg/kg de ataque e infusão contínua de 0,4-0,9mg/kg/h. ( Monitorizar nível sangüíneo)

4.Administrar Beta-2 agonistas inalatórios (broncoespasmo).

5.Administrar drogas vasoativas contínuas para manter níveis pressóricos:

a)adrenalina: 0,02-0,05mcg/kg/min.

b)noradrenalina: 0,05mcg/kg/min.

c)dopamina: 5-20mcg/kg/min.

d)isoproperenol: 0,02-0,05mcg/kg/min.

6.Administrar Bicarbonato de sódio 0,5-1mg/kg inicialmente e depois corrigir pela análise do sangue arterial. (20)

fonte: http://www.anestesiologia.com.br/artigos.php?itm=23