quinta-feira, 28 de agosto de 2008

HISTÓRIA DA ENFERMAGEM



A Evolução da Assistência à Saúde nos Períodos Históricos
Período Pré-Cristão Neste período as doenças eram tidas como um castigo de Deus ou resultavam do poder do demônio. Por isso os sacerdotes ou feiticeiras acumulavam funções de médicos e enfermeiros. O tratamento consistia em aplacar as divindades, afastando os maus espíritos por meio de sacrifícios. Usavam-se: massagens banho de água fria ou quente, purgativos, substâncias provocadoras de náuseas. Mais tarde os sacerdotes adquiriam conhecimentos sobre plantas medicinais e passaram a ensinar pessoas, delegando-lhes funções de enfermeiros e farmacêuticos. Alguns papiros, inscrições, monumentos, livros de orientações políticas e religiosas, ruínas de aquedutos e outras descobertas nos permitem formar uma idéia do tratamento dos doentes.
EGITO
Os egípcios deixaram alguns documentos sobre a medicina conhecida em sua época. As receitas médicas deviam ser tomadas acompanhadas da recitação de fórmulas religiosas. Pratica-se o hipnotismo, a interpretação de sonhos; acreditava-se na influência de algumas pessoas sobre a saúde de outras. Havia ambulatórios gratuito, onde era recomendada a hospitalidade e o auxílio aos desamparados.
ÍNDIA
Documentos do século VI a.C. nos dizem que os hindus conheciam: ligamentos, músculos, nervos, plexos, vasos linfáticos, antídotos para alguns tipos de envenenamento e o processo digestivo. Realizavam alguns tipos de procedimentos, tais como: suturas, amputações, trepanações e corrigiam fraturas. Neste aspecto o budismo contribui para o desenvolvimento da enfermagem e da medicina. Os hindus tornaram-se conhecidos pela construção de hospitais. Foram os únicos, na época, que citaram enfermeiros e exigiam deles qualidades morais e conhecimentos científicos. Nos hospitais eram usados músicos e narradores de histórias para distrair os pacientes. O bramanismo fez decair a medicina e a enfermagem, pelo exagerado respeito ao corpo humano - proibia a dissecação de cadáveres e o derramamento de sangue. As doenças eram consideradas castigo.
ASSÍRIA E BABILÔNIA
Entre os assírios e babilônios existiam penalidades para médicos incompetentes, tais como: amputação das mãos, indenização, etc.
A medicina era baseada na magia - acreditava-se que sete demônios eram os causadores das doenças. Os sacerdotes-médicos vendiam talismãs com orações usadas contra ataques dos demônios. Nos documentos assírios e babilônicos não há menção de hospitais, nem de enfermeiros. Conheciam a lepra e sua cura dependia de milagres de Deus, como no episódio bíblico do banho no rio Jordão. "Vai, lava-te sete vezes no Rio Jordão e tua carne ficará limpa".(II Reis: 5, 10-11)
CHINA
Os doentes chineses eram cuidados por sacerdotes. As doenças eram classificadas da seguinte maneira: benignas, médias e graves. Os sacerdotes eram divididos em três categorias que correspondiam ao grau da doença da qual se ocupava. Os templos eram rodeados de plantas medicinais. Os chineses conheciam algumas doenças: varíola e sífilis. Procedimentos: operações de lábio. Tratamento: anemias indicavam ferro e fígado; doenças da pele aplicavam o arsênico. Anestesia: ópio. Construíram alguns hospitais de isolamento e casas de repouso. A cirurgia não evoluiu devido à proibição da dissecação de cadáveres.
JAPÃO
Os japoneses aprovaram e estimularam a eutanásia. A medicina era fetichista e a única terapêutica era o uso de águas termais.
GRÉCIA
As primeiras teorias gregas se prendiam à mitologia. Apolo, o deus sol, era o deus da saúde e da medicina. Usavam sedativos, fortificantes e hemostáticos, faziam ataduras e retiravam corpos estranhos, também tinham casas para tratamento dos doentes. A medicina era exercida pelos sacerdotes-médicos, que interpretavam os sonhos das pessoas. Tratamento: banhos, massagens, sangrias, dietas, sol, ar puro, água pura mineral. Dava-se valor à beleza física, cultural e a hospitalidade. O excesso de respeito pelo corpo atrasou os estudos anatômicos. O nascimento e a morte eram considerados impuros, causando desprezo pela obstetrícia e abandono dos doentes graves. A medicina tornou-se científica, graças a Hipócrates, que deixou de lado a crença de que as doenças eram causadas por maus espíritos. Hipócrates é considerado o Pai da Medicina. Observava o doente, fazia diagnóstico, prognóstico e a terapêutica. Reconheceu doenças como: tuberculose, malária, histeria, neurose, luxações e fraturas. Seu princípio fundamental na terapêutica consistia em "não contrariar a natureza, porém auxiliá-la a reagir". Tratamentos usados: massagens, banhos, ginásticas, dietas, sangrias, ventosas, vomitórios, purgativos e calmantes, ervas medicinais e medicamentos minerais.
ROMA
A medicina não teve prestígio em Roma. Durante muito tempo era exercida por escravos ou estrangeiros. Os romanos eram povos essencialmente guerreiros. O indivíduo recebia cuidados do Estado como cidadão destinado a tornar-se bom guerreiro, audaz e vigoroso. Roma distinguiu-se pela limpeza das ruas, ventilação das casas, água pura e abundante e redes de esgoto. Os mortos eram sepultados fora da cidade, na via Ápia. O desenvolvimento da medicina dos romanos sofreu influência do povo grego. O cristianismo foi a maior revolução social de todos os tempos. Influiu positivamente através da reforma dos indivíduos e da família. Os cristãos praticavam tal caridade, que movia os pagãos: "Vede como eles se amam". Desde o início do cristianismo os pobres e enfermos foram objeto de cuidados especiais por parte da Igreja.
Origem da Profissão
A profissão surgiu do desenvolvimento e evolução das práticas de saúde no decorrer dos períodos históricos. As práticas de saúde instintivas foram as primeiras formas de prestação de assistência. Num primeiro estágio da civilização, estas ações garantiam ao homem a manutenção da sua sobrevivência, estando na sua origem, associadas ao trabalho feminino, caracterizado pela prática do cuidar nos grupos nômades primitivos, tendo como origem as concepções evolucionistas e teológicas, Mas, como os domínios dos meios de cura passaram a significar poder, o homem, aliando este conhecimento ao misticismo, fortaleceu tal poder e apoderou-se dele.
Quanto à Enfermagem, as únicas referências concernentes à época em questão estão relacionadas com a prática domiciliar de partos e a atuação pouco clara de mulheres de classe social elevada que dividiam as atividades dos templos com os sacerdotes. As práticas de saúde mágico-sacerdotais abordavam a relação mística entre as práticas religiosas e de saúde primitivas desenvolvidas pelos sacerdotes nos templos. Este período corresponde à fase de empirismo, verificada antes do surgimento da especulação filosófica que ocorre por volta do século V a.C. Essas ações permanecem por muitos séculos desenvolvidos nos templos que, a princípio, foram simultaneamente santuários e escolas, onde os conceitos primitivos de saúde eram ensinados. Posteriormente, desenvolveram-se escolas específicas para o ensino da arte de curar no sul da Itália e na Sicília, propagando-se pelos grandes centros do comércio, nas ilhas e cidades da costa.
Naquelas escolas pré-hipocráticas, eram variadas as concepções acerca do funcionamento do corpo humano, seus distúrbios e doenças, concepções essas, que, por muito tempo, marcaram a fase empírica da evolução dos conhecimentos em saúde. O ensino era vinculado à orientação da filosofia e das artes e os estudantes viviam em estreita ligação com seus mestres, formando as famílias, as quais serviam de referência para mais tarde se organizarem em castas. As práticas de saúde no alvorecer da ciência - relacionam a evolução das práticas de saúde ao surgimento da filosofia e ao progresso da ciência, quando estas então se baseavam nas relações de causa e efeito. Inicia-se no século V a.C. estendendo-se até os primeiros séculos da Era Cristã.
A prática de saúde, antes mística e sacerdotal, passa agora a ser um produto desta nova fase, baseando-se essencialmente na experiência, no conhecimento da natureza, no raciocínio lógico - que desencadeia uma relação de causa e efeito para as doenças - e na especulação filosófica, baseada na investigação livre e na observação dos fenômenos, limitada, entretanto, pela ausência quase total de conhecimentos anatomofisiológicos. Essa prática individualista volta-se para o homem e suas relações com a natureza e suas leis imutáveis. Este período é considerado pela medicina grega como período hipocrático, destacando a figura de Hipócrates que como já foi demonstrado no relato histórico, propôs uma nova concepção em saúde, dissociando a arte de curar dos preceitos místicos e sacerdotais, através da utilização do método indutivo, da inspeção e da observação. Não há caracterização nítida da prática de Enfermagem nesta época.
As práticas de saúde monástico-medievais focalizavam a influência dos fatores sócio-econômicos e políticos do medievo e da sociedade feudal nas práticas de saúde e as relações destas com o cristianismo. Esta época corresponde ao aparecimento da Enfermagem como prática leiga, desenvolvida por religiosos e abrange o período medieval compreendido entre os séculos V e XIII. Foi um período que deixou como legado uma série de valores que, com o passar dos tempos, foram aos poucos legitimados a aceitos pela sociedade como características inerentes à Enfermagem. A abnegação, o espírito de serviço, a obediência e outros atributos que dão à Enfermagem, não uma conotação de prática profissional, mas de sacerdócio.
As práticas de saúde pós monásticas evidenciam a evolução das ações de saúde e, em especial, do exercício da Enfermagem no contexto dos movimentos Renascentistas e da Reforma Protestante. Corresponde ao período que vai do final do século XIII ao início do século XVI. A retomada da ciência, o progresso social e intelectual da Renascença e a evolução das universidades não constituíram fator de crescimento para a Enfermagem. Enclausurada nos hospitais religiosos, permaneceu empírica e desarticulada durante muito tempo, vindo desagregar-se ainda mais a partir dos movimentos de Reforma Religiosa e das conturbações da Santa Inquisição. O hospital, já negligenciado, passa a ser um insalubre depósito de doentes, onde homens, mulheres e crianças utilizam as mesmas dependências, amontoados em leitos coletivos.
Sob exploração deliberada, considerada um serviço doméstico, pela queda dos padrões morais que a sustentava, a prática de enfermagem tornou-se indigna e sem atrativos para as mulheres de casta social elevada. Esta fase tempestuosa, que significou uma grave crise para a Enfermagem, permaneceu por muito tempo e apenas no limiar da revolução capitalista é que alguns movimentos reformadores, que partiram, principalmente, de iniciativas religiosas e sociais, tentam melhorar as condições do pessoal a serviço dos hospitais. As práticas de saúde no mundo moderno analisam as ações de saúde e em especial, as de Enfermagem, sob a ótica do sistema político-econômico da sociedade capitalista. Ressaltam o surgimento da Enfermagem como atividade profissional institucionalizada. Esta análise inicia-se com a Revolução Industrial no século XVI e culmina com o surgimento da Enfermagem moderna na Inglaterra, no século XIX.
Enfermagem Moderna
O avanço da Medicina vem favorecer a reorganização dos hospitais. É na reorganização da Instituição Hospitalar e no posicionamento do médico como principal responsável por esta reordenação, que vamos encontrar as raízes do processo de disciplina e seus reflexos na Enfermagem, ao ressurgir da fase sombria em que esteve submersa até então. Naquela época, estiveram sob piores condições, devido à predominância de doenças infecto-contagiosas e a falta de pessoas preparadas para cuidar dos doentes. Os ricos continuavam a ser tratados em suas próprias casas, enquanto os pobres, além de não terem esta alternativa, tornavam-se objeto de instrução e experiências que resultariam num maior conhecimento sobre as doenças em benefício da classe abastada.
É neste cenário que a Enfermagem passa a atuar, quando Florence Nightingale é convidada pelo Ministro da Guerra da Inglaterra para trabalhar junto aos soldados feridos em combate na Guerra da Criméia.
Período Florence Nightingale
Nascida a 12 de maio de 1820, em Florença, Itália, era filha de ingleses. Possuía inteligência incomum, tenacidade de propósitos, determinação e perseverança - o que lhe permitia dialogar com políticos e oficiais do Exército, fazendo prevalecer suas idéias. Dominava com facilidade o inglês, o francês, o alemão, o italiano, além do grego e latim. No desejo de realizar-se como enfermeira, passa o inverno de 1844 em Roma, estudando as atividades das Irmandades Católicas. Em 1849 faz uma viagem ao Egito e decide-se a servir a Deus, trabalhando em Kaiserswert, Alemanha, entre as diaconisas.
Decidida a seguir sua vocação, procura completar seus conhecimentos que julga ainda insuficientes. Visita o Hospital de Dublin dirigido pela Irmãs de Misericórdia, Ordem Católica de Enfermeiras, fundada 20 anos antes. Conhece as Irmãs de Caridade de São Vicente de Paulo, na Maison de la Providence em Paris. Aos poucos vai se preparando para a sua grande missão. Em 1854, a Inglaterra, a França e a Turquia declaram guerra à Rússia: é a Guerra da Criméia. Os soldados acham-se no maior abandono. A mortalidade entre os hospitalizados é de 40%.
Florence partiu para Scutari com 38 voluntárias entre religiosas e leigas vindas de diferentes hospitais. Algumas enfermeiras foram despedidas por incapacidade de adaptação e principalmente por indisciplina. A mortalidade decresce de 40% para 2%. Os soldados fazem dela o seu anjo da guarda e ela será imortalizada como a "Dama da Lâmpada" porque, de lanterna na mão, percorre as enfermarias, atendendo os doentes. Durante a guerra contrai tifo e ao retornar da Criméia, em 1856, leva uma vida de inválida. Dedica-se, porém com ardor, a trabalhos intelectuais. Pelos trabalhos na Criméia, recebe um prêmio do Governo Inglês e, graças a este prêmio, consegue iniciar o que para ela é a única maneira de mudar os destinos da Enfermagem - uma Escola de Enfermagem em 1959. Após a guerra, Florence fundou uma escola de Enfermagem no Hospital Saint Thomas, que passou a servir de modelo para as demais escolas que foram fundadas posteriormente. A disciplina rigorosa, do tipo militar, era uma das características da escola nightingaleana, bem como a exigência de qualidades morais das candidatas. O curso, de um ano de duração, consistia em aulas diárias ministradas por médicos.
Nas primeiras escolas de Enfermagem, o médico foi de fato a única pessoa qualificada para ensinar. A ele cabia então decidir quais das suas funções poderiam colocar nas mãos das enfermeiras. Florence morre em 13 de agosto de 1910, deixando florescente o ensino de Enfermagem. Assim, a Enfermagem surge não mais como uma atividade empírica, desvinculada do saber especializado, mas como uma ocupação assalariada que vem atender a necessidade de mão-de-obra nos hospitais, constituindo-se como uma prática social institucionalizada e específica.
Primeiras Escolas de Enfermagem
Apesar das dificuldades que as pioneiras da Enfermagem tiveram que enfrentar, devido à incompreensão dos valores necessários ao desempenho da profissão, as escolas se espalharam pelo mundo, a partir da Inglaterra. Nos Estados Unidos a primeira Escola foi criada em 1873. Em 1877 as primeiras enfermeiras diplomadas começam a prestar serviços a domicílio em New York. As escolas deveriam funcionar de acordo com a filosofia da Escola Florence Nightingale, baseada em quatro idéias-chave:

1- O treinamento de enfermeiras deveria ser considerado tão importante quanto qualquer outra forma de ensino e ser mantido pelo dinheiro público.
2- As escolas de treinamento deveriam ter uma estreita associação com os hospitais, mas manter sua independência financeira e administrativa.
3- Enfermeiras profissionais deveriam ser responsáveis pelo ensino no lugar de pessoas não envolvidas em Enfermagem.
4- As estudantes deveriam, durante o período de treinamento, ter residência à disposição, que lhes oferecesse ambiente confortável e agradável, próximo ao hospital.
Sistema Nightingale de Ensino
As escolas conseguiram sobreviver graças aos pontos essenciais estabelecidos:
1º. Direção da escola por uma Enfermeira.
2º. Mais ensino metódico, em vez de apenas ocasional.
3º. Seleção de candidatos do ponto de vista físico, moral, intelectual e aptidão profissional.
História da Enfermagem no Brasil
A organização da Enfermagem na Sociedade Brasileira começa no período colonial e vai até o final do século XIX. A profissão surge como uma simples prestação de cuidados aos doentes, realizada por um grupo formado, na sua maioria, por escravos, que nesta época trabalhavam nos domicílios. Desde o princípio da colonização foi incluída a abertura das Casas de Misericórdia, que tiveram origem em Portugal.
A primeira Casa de Misericórdia foi fundada na Vila de Santos, em 1543. Em seguida, ainda no século XVI, surgiram as do Rio de Janeiro, Vitória, Olinda e Ilhéus. Mais tarde Porto Alegre e Curitiba, esta inaugurada em 1880, com a presença de D. Pedro II e Dona Tereza Cristina.
No que diz respeito à saúde do povo brasileiro, merece destaque o trabalho do Padre José de Anchieta. Ele não se limitou ao ensino de ciências e catequeses. Foi além. Atendia aos necessitados, exercendo atividades de médico e enfermeiro. Em seus escritos encontramos estudos de valor sobre o Brasil, seus primitivos habitantes, clima e as doenças mais comuns. A terapêutica empregada era à base de ervas medicinais minuncioasamente descritas. Supõe-se que os Jesuítas faziam a supervisão do serviço que era prestado por pessoas treinadas por eles. Não há registro a respeito.
Outra figura de destaque é Frei Fabiano Cristo, que durante 40 anos exerceu atividades de enfermeiro no Convento de Santo Antônio do Rio de Janeiro (Séc. XVIII). Os escravos tiveram papel relevante, pois auxiliavam os religiosos no cuidado aos doentes. Em 1738, Romão de Matos Duarte consegue fundar no Rio de Janeiro a Casa dos Expostos. Somente em 1822, o Brasil tomou as primeiras medidas de proteção à maternidade que se conhecem na legislação mundial, graças a atuação de José Bonifácio Andrada e Silva. A primeira sala de partos funcionava na Casa dos Expostos em 1822. Em 1832 organizou-se o ensino médico e foi criada a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. A escola de parteiras da Faculdade de Medicina diplomou no ano seguinte a célebre Madame Durocher, a primeira parteira formada no Brasil.
No começo do século XX, grande número de teses médicas foram apresentadas sobre Higiene Infantil e Escolar, demonstrando os resultados obtidos e abrindo horizontes e novas realizações. Esse progresso da medicina, entretanto, não teve influência imediata sobre a Enfermagem. Assim sendo, na enfermagem brasileira do tempo do Império, raros nomes de destacaram e, entre eles, merece especial menção o de Anna Nery.
Anna Nery
Aos 13 de dezembro de 1814, nasceu Ana Justina Ferreira, na Cidade de Cachoeira, na Província da Bahia. Casou-se com Isidoro Antonio Nery, enviuvando aos 30 anos. Seus dois filhos, um médico militar e um oficial do exército, são convocados a servir a Pátria durante a Guerra do Paraguai (1864-1870), sob a presidência de Solano Lopes. O mais jovem aluno do 6º ano de Medicina oferece seus serviços médicos em prol dos brasileiros.
Anna Nery não resiste à separação da família e escreve ao Presidente da Província, colocando-se à disposição de sua Pátria. Em 15 de agosto parte para os campos de batalha, onde dois de seus irmãos também lutavam. Improvisa hospitais e não mede esforços no atendimento aos feridos. Após cinco anos, retorna ao Brasil, é acolhida com carinho e louvor, recebe uma coroa de louros e Victor Meireles pinta sua imagem, que é colocada no edifício do Paço Municipal. O governo imperial lhe concede uma pensão, além de medalhas humanitárias e de campanha. Faleceu no Rio de Janeiro a 20 de maio de 1880.
A primeira Escola de Enfermagem fundada no Brasil recebeu o seu nome. Anna Nery que, como Florence Nightingale, rompeu com os preconceitos da época que faziam da mulher prisioneira do lar.
Cruz Vermelha Brasileira
A Cruz Vermelha Brasileira foi organizada e instalada no Brasil em fins de 1908, tendo como primeiro presidente o médico Oswaldo Cruz. Destacou-se a Cruz Vermelha Brasileira por sua atuação durante a I Guerra Mundial (1914-1918). Durante a epidemia de gripe espanhola (1918), colaborou na organização de postos de socorro, hospitalizando doentes e enviando socorristas a diversas instituições hospitalares e a domicílio. Atuou também socorrendo vítimas das inundações, nos Estados de Sergipe e Bahia, e as secas do Nordeste. Muitas das socorristas dedicaram-se ativamente à formação de voluntárias, continuando suas atividades após o término do conflito.
Primeiras Escolas de Enfermagem no Brasil
1. Escola de Enfermagem "Alfredo Pinto"

Esta escola é a mais antiga do Brasil, data de 1890, foi reformada por Decreto de 23 de maio de 1939. O curso passou a três anos de duração e era dirigida por enfermeiras diplomadas. Foi reorganizada por Maria Pamphiro, uma das pioneiras da Escola Anna Nery.
2. Escola da Cruz Vermelha do Rio de Janeiro
Começou em 1916 com um curso de socorristas, para atender às necessidades prementes da 1ª Guerra Mundial. Logo foi evidenciada a necessidade de formar profissionais (que desenvolveu-se somente após a fundação da Escola Anna Nery) e o outro para voluntários. Os diplomas expedidos pela escola eram registrados inicialmente no Ministério da Guerra e considerados oficiais. Esta encerrou suas atividades.
3. Escola Anna Nery
A primeira diretoria foi Miss Clara Louise Kienninger, senhora de grande capacidade e virtude, que soube ganhar o coração das primeiras alunas. Com habilidade fora do comum, adaptou-se aos costumes brasileiros. Os cursos tiveram início em 19 de fevereiro de 1923, com 14 alunas. Instalou-se pequeno internato próximo ao Hospital São Francisco de Assis, onde seriam feitos os primeiros estágios. Em 1923, durante um surto de varíola, enfermeiras e alunas dedicaram-se ao combate à doença. Enquanto nas epidemias anteriores o índice de mortalidade atingia 50%, desta vez baixou para 15%. A primeira turma de Enfermeiras diplomou-se em 19 de julho de 1925.
Destacam-se desta turma as Enfermeiras Lais Netto dos Reys, Olga Salinas Lacôrte, Maria de Castro Pamphiro e Zulema Castro, que obtiveram bolsa de estudos nos Estados Unidos. A primeira diretora brasileira da Escola Anna Nery foi Raquel Haddock Lobo, nascida a 18 de junho de 1891. Foi a pioneira da Enfermagem moderna no Brasil. esteve na Europa durante a Primeira Grande Guerra, incorporou-se à Cruz Vermelha Francesa, onde se preparou para os primeiros trabalhos. De volta ao Brasil, continuou a trabalhar como Enfermeira. Faleceu em 25 de setembro de 1933.
4. Escola de Enfermagem Carlos Chagas
Por Decreto nº 10.925, de sete de junho de 1933 e iniciativa de Dr. Ernani Agrícola, diretor da Saúde Pública de Minas Gerais, foi criado pelo Estado a Escola de Enfermagem "Carlos Chagas", a primeira a funcionar fora da Capital da República. A organização e direção dessa Escola coube a Laís Netto dos Reys, sendo inaugurada em 19 de julho do mesmo ano. A Escola "Carlos Chagas", além de pioneira entre as escolas estaduais, foi a primeira a diplomar religiosas no Brasil.
5. Escola de Enfermagem "Luisa de Marillac"
Fundada e dirigida por Irmã Matilde Nina, Filha de caridade, a Escola de Enfermagem Luisa de Marillac representou um avanço na Enfermagem Nacional, pois abria largamente suas portas, não só às jovens estudantes seculares, como também às religiosas de todas as Congregações. É a mais antiga escola de religiosas no Brasil e faz parte da União Social Camiliana, instituição de caráter confessional da Província Camiliana Brasileira.
6. Escola Paulista de Enfermagem
Fundada em 1939 pelas Franciscanas Missionárias de Maria, foi a pioneira da renovação da enfermagem na Capital paulista, acolhendo também religiosas de outras Congregações. Uma das importantes contribuições dessa escola foi início dos Cursos de Pós-Graduação em Enfermagem Obstétrica. Esse curso que deu origem a tantos outros, é atualmente ministrado em várias escolas do país.
7. Escola de Enfermagem da USP
Fundada com a colaboração da Fundação de Serviços de Saúde Pública (FSESP) em 1944, faz parte da Universidade de São Paulo. Sua primeira diretora foi Edith Franckel, que também prestara serviços como Superintendente do Serviço de Enfermeiras do Departamento de Saúde. A primeira turma diplomou-se em 1946.
Entidades de Classe
1. Associação Brasileira de Enfermagem – ABEN
Sociedade civil sem fins lucrativos que congrega enfermeiras e técnicos em enfermagem, fundada em agosto de 1926, sob a denominação de "Associação Nacional de Enfermeiras Diplomadas Brasileiras". É uma entidade de direito privado, de caráter científico e assistencial regida pelas disposições do Estatuto, Regulamento Geral ou Regimento Especial em 1929, no Canadá, na Cidade de Montreal, a Associação Brasileira de Enfermagem, foi admitida no Conselho Internacional de Enfermeiras (I.C.N.).
Por um espaço de tempo a associação ficou inativa. Em 1944, um grupo de enfermeiras resolveu reerguê-la com o nome Associação Brasileira de Enfermeiras Diplomadas. Seus estatutos foram aprovados em 18 de setembro de 1945. Foram criadas Seções Estaduais, Coordenadorias de Comissões. Ficou estabelecido que em qualquer Estado onde houvesse 7 (sete) enfermeiras diplomadas, poderia ser formada uma Seção. Em 1955 esse número foi elevado a 10 (dez). Em 1952, a Associação foi considerada de Utilidade Pública pelo Decreto nº 31.416/52. Em 21 de agosto de 1964, foi mudada a denominação para Associação Brasileira de Enfermagem - ABEN, com sede em Brasília, funciona através de Seções formadas nos Estados, e no Distrito Federal, as quais, por sua vez, poderão subdividir-se em Distritos formados nos Municípios das Unidades Federativas da União.
1.1. Finalidades da ABEN
- Congregar os enfermeiros e técnicos em enfermagem, incentivar o espírito de união e solidariedade entre as classes;
- Promover o desenvolvimento técnico, científico e profissional dos integrantes de Enfermagem do País;
- Promover integração às demais entidades representativas da Enfermagem, na defesa dos interesses da profissão.
1.2. Estrutura
ABEn é constituída pelos seguintes órgãos, com jurisdição nacional:
a) Assembléia de delegados
b) Conselho Nacional da ABEn
c) Diretoria Central
d) Conselho Fiscal
1.3. Realizações da ABE
Congresso Brasileiro em Enfermagem
Uma das formas eficazes que a ABEn utiliza para beneficiar a classe dos enfermeiros, reunindo enfermeiros de todo o país nos Congressos para fortalecer a união entre os profissionais, aprofundar a formação profissional e incentivar o espírito de colaboração e o intercâmbio de conhecimentos.
Revista Brasileira de Enfermagem
A Revista Brasileira de Enfermagem é Órgão Oficial, publicado bimestralmente e constitui grande valor para a classe, pois trata de assuntos relacionados à saúde, profissão e desenvolvimento da ciência. A idéia da publicação da Revista surgiu em 1929, quando Edith Magalhães Franckel, Raquel Haddock Lobo e Zaira Cintra Vidal participaram do Congresso do I.C.N. em Montreal, Canadá. Numa das reuniões de redatoras da Revista, Miss Clayton considerou indispensável ao desenvolvimento profissional a publicação de um periódico da área. Em maio de 1932 foi publicado o 1º número com o nome de "Anais de Enfermagem", que permaneceu até 1954. No VII Congresso Brasileiro de Enfermagem foi sugerida e aceita a troca do nome para "REVISTA BRASILEIRA DE ENFERMAGEM"- ABEn (REBen). Diversas publicações estão sendo levadas a efeito: Manuais, Livros didáticos, Boletim Informativo, Resumo de Teses, Jornal de Enfermagem
2. Sistema COFEN/CORENs
2.1. Histórico
a) Criação- Em 12 de julho de 1973, através da Lei 5.905, foram criados os Conselhos Federal e Regionais de Enfermagem, constituindo em seu conjunto Autarquias Federais, vinculadas ao Ministério do Trabalho e Previdência Social. O Conselho Federal e os Conselhos Regionais são Órgãos disciplinadores do exercício da Profissão de Enfermeiros, Técnicos e Auxiliares de Enfermagem. Em cada Estado existe um Conselho Regional, os quais estão subordinados ao Conselho federal, que é sediado no Rio de Janeiro e com Escritório Federal em Brasília.
b) Direção- Os Conselhos Regionais são dirigidos pelos próprios inscritos, que formam uma chapa e concorrem à eleições. O mandato dos membros do COFEN/CORENs é honorífico e tem duração de três anos, com direito apenas a uma reeleição. A formação do plenário do COFEN é composta pelos profissionais que são eleitos pelos Presidentes dos CORENs.
c) Receita- A manutenção do Sistema COFEN/CORENs é feita através da arrecadação de taxas emolumentos por serviços prestados, anuidades, doações, legados e outros, dos profissionais inscritos nos CORENs.
d) Finalidade- O objetivo primordial é zelar pela qualidade dos profissionais de Enfermagem e cumprimento da Lei do Exercício Profissional.
O Sistema COFEN/CORENs encontra-se representado em 27 Estados Brasileiros, sendo este filiado ao Conselho Internacional de Enfermeiros em Genebra.
2.2. Competências
- Conselho Federal de Enfermagem (COFEN)
· Normatizar e expedir instruções, para uniformidade de procedimento e bom funcionamento dos Conselhos Regionais;
· Esclarecer dúvidas apresentadas pelos CORENs;
· Apreciar Decisões dos COREns;
· Aprovar contas e propostas orçamentárias de Autarquia, remetendo-as aos Órgãos competentes;
· Promover estudos e campanhas para aperfeiçoamento profissional;
· Exercer as demais atribuições que lhe forem conferidas por lei.

- Conselho Regional de Enfermagem (COREN)
· Deliberar sobre inscrições no Conselho e seu cancelamento;
· Disciplinar e fiscalizar o exercício profissional, observando as diretrizes gerais do COFEN;
· Executar as instruções e resoluções do COFEN;
· Expedir carteira e cédula de identidade profissional, indispensável ao exercício da profissão, a qual tem validade em todo o território nacional;
· Fiscalizar e decidir os assuntos referentes à Ética Profissional impondo as penalidades cabíveis;
· Elaborar a proposta orçamentária anual e o projeto de seu regimento interno, submetendo-os a aprovação do COFEN;
· Zelar pelo conceito da profissão e dos que a exercem;
· Propor ao COFEN medidas visando a melhoria do exercício profissional;
· Eleger sua Diretoria e seus Delegados a nível central e regional;
· Exercer as demais atribuições que lhe forem conferidas pela Lei 5.905/73 e pelo COFEN.
2.3.- Sistema de Disciplina e Fiscalização
O Sistema de Disciplina e Fiscalização do Exercício Profissional da Enfermagem, instituído por lei, desenvolve suas atividades segundo as normas baixadas por Resoluções do COFEN. O Sistema é constituído dos seguintes objetivos:
a) Área disciplinar normativa: Estabelecendo critérios de orientação e aconselhamento para o exercício da Enfermagem, baixando normas visando o exercício da profissão, bem como atividade na área de Enfermagem nas empresas, consultórios de Enfermagem, observando as peculiaridades atinentes à Classe e a conjuntura de saúde do país.
b) Área disciplinar corretiva: Instaurando processo em casos de infrações ao Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem, cometidas pelos profissionais inscritos e, no caso de empresa, processos administrativos, dando prosseguimento aos respectivos julgamentos e aplicações das penalidades cabíveis; encaminhando às repartições competentes os casos de alçada destas.
c) Área fiscalizatória: Realizando atos e procedimentos para prevenir a ocorrência de Infrações à legislação que regulamenta o exercício da Enfermagem; inspecionando e examinando os locais públicos e privados, onde a Enfermagem é exercida, anotando as irregularidades e infrações verificadas, orientando para sua correção e colhendo dados para a instauração dos processos de competência do COREN e encaminhando às repartições competentes, representações.

Bibliografia

TURKIEWICZ, Maria. História da Enfermagem. Paraná, ETECLA, 1995.
GEOVANINI, Telma. História da Enfermagem : versões e Interpretações. Rio de janeiro, Revinter, 1995.
BRASIL, Leis, etc. Lei 5.905, de 12 de julho de 1973. Dispõe sobre a criação dos Conselhos Federal e Regionais de Enfermagem e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 13 de julho de 1973. Seção I, p. 6.825.
CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM. Documentos Básicos de Enfermagem.
CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SÃO PAULO.

CONTROLE SOCIAL E PARTICIPAÇÃO SOCIAL EM SAÚDE


CONTROLE SOCIAL E PARTICIPAÇÃO POPULAR EM SAÚDE
GERSON DE SOUZA SANTOS
Enfermeiro Especialista em Saúde Coletiva - Mestrando em Enfermagem
ÁLVARO DA SILVA SANTOS Enfermeiro Sanitarista. Doutor em Ciências Sociais, Coordenador do Curso de Pós-graduação de Enfermagem em Saúde Coletiva – UNINOVE.

A declaração de direitos que compõe a atual Carta Magna Brasileira é caracterizada como um dos mais avançados textos constitucionais do mundo, particularmente no que se refere ao conjunto de direitos sociais promulgados, e sobretudo quanto aos direitos no campo da saúde. Este trabalho aborda questões referentes ao controle social e saúde e participação popular em saúde, apresentando uma revisão da literatura, baseando-se em opiniões de autores em relação ao tema. Descritores: Controle social, Participação popular The bill of rights that composes the current Brazilian Great Letter is characterized as one of the most advanced constitucional texts of the world, particularly as for the set of promulgated social rights, and over all to the rights in the field of the health. This work approaches referring questions to the social control in health and popular participation in health, presentig a revision of literature, being based on opinions of authors in relation to the subject. Descritors: Social control, Popular participation in health Introdução Até o final da década de 1970, não se falava em controle social por uma razão óbvia: autoritarismo e participação popular são termos antagônicos. Somente com o início do processo de redemocratização do país, a partir do fim do governo militar na década de 1980, é que a expressão “controle sócia e participação popular” passaram a ser aclamadas. Sabemos que o controle social pressupõe um avanço na construção de uma sociedade democrática o que determina alterações profundas nas formas de relação do Estado com o cidadão. Através da reforma e modernização do aparelho do Estado é possível se criar mecanismos capazes de viabilizarem a integração dos cidadãos no processo de definição, implementação e avaliação da ação pública. No decorrer dos últimos anos, as comunidades vem se organizando através de conselhos municipais e comitês populares que abrangem os mais diversos setores da sociedade, quais sejam: transporte coletivo, saúde, e participação na gestão do orçamento municipal, deixando para o Poder Público apenas a função de mediar e fiscalizar as relações entre o público e o privado a fim de garantir meios de proporcionar uma melhor qualidade de vida da população. Um exemplo positivo de controle social e que vem sendo ampliado a cada ano é o que envolve o Orçamento Participativo. A participação popular na elaboração do Orçamento Municipal de inúmeras cidades vêm demonstrando ser esta uma forma mais democrática de decidir sobre a aplicabilidade dos recursos públicos em benefício da maioria. Informações são recolhidas, trocam-se experiências, realizam-se pesquisas, congressos e eventos participativos para que se promova uma maior isonomia na distribuição de bens e serviços. Revisão da Literatura Segundo a definição proposta pela Conferência Nacional de Saúde, controle social é a capacidade que tem a sociedade organizada de intervir nas políticas públicas, interagindo com o Estado para o estabelecimento de suas necessidades e interesses na definição das prioridades e metas dos planos de saúde (BRASIL, 1992). (CARVALHO, 1995) destaca que o controle social deve ser entendido como a tentativa de se estabelecer uma nova relação entre o Estado e a sociedade que implica numa abertura do Estado, para que a sociedade participe das suas decisões. Quando buscamos compreender a atuação da população organizada no cenário político-sanitário, percebemos que esse tema é recente, e teve sua origem na área da saúde, a partir das reformulações setoriais que deram origem ao Sistema Único de Saúde (SUS) no final dos anos 1980. Um dos pressupostos deste sistema é a participação da comunidade, cabendo assegurar o controle social sobre as ações e serviços de saúde. Quando investigamos a história da participação e controle social em saúde no Brasil, percebe-se que os mesmos assumem diversos significados, que depende do contexto nos quais se inserem, do entendimento do processo saúde-doença e, principalmente, das relações entre o Estado e a Sociedade. Diferentes concepções do controle social em saúde Segundo (MENDES, 1996) no início do século XX, o termo “controle social” em saúde, no Brasil, foi utilizado como significado praticamente oposto ao daquele utilizado hoje, ou seja, era visto como medidas sanitárias, de controle do Estado sobre a sociedade. Do inicio deste século até meados de 1960 era vigente no país o sanitarismo campanhista. Neste momento, a Saúde Pública no Brasil passou a ser baseada em intervenções engenhadas na corrente do pensamento do Sanitarismo , que tinha operação no âmbito urbano das cidades, através da comercialização e transporte de alimentos e cobertura dos portos marítimos. Tais medidas eram promovidas sob a forma de campanhas, as quais eram abandonadas assim que se conseguiam controlar os surtos presentes na época. (CARVALHO, 1995) aponta que as medidas severas de combate de vetores (no caso da peste e da febre amarela) e da imunização compulsória da população ( no caso da varíola), o Estado adotava intervenção em pessoas e grupos sociais em nome da saúde de todos. Esta fase foi marcada pelo controle do Estado sobre a sociedade, onde a população era o alvo das ações de saúde. Em 1933 houve a criação do IAPs (Institutos de Aposentadorias e Pensões), que aos poucos foram constituindo as CAPs (Caixas de Aposentadorias e Pensões). Nos IAPs , a organização se dava por categorias funcionais (marítimos, comerciários, bancários etc.) e a representação de empregados e empregadores passou a ser feita pelos sindicatos. Diferentemente do papel de direção e definição de metas, exercido pelo Conselho de Administração nas CAPs, nesse momento, a representação – tanto dos empregados quanto dos empregadores – assume um papel secundário, de acessória ou de fiscalização. (OLIVEIRA e TEIXEIRA, 1985). Após o golpe militar de 1964, o Estado assume sozinho a direção do INPS (Instituto Nacional de Previdência Social), os empregados e empregadores perdem por completo o direito de gerenciar e definir as políticas previdenciárias e de saúde. Um segundo termo utilizado para designar a participação da população na área da saúde foi “participação comunitária”. Este termo originou-se no inicio da século XX, a partir das experiências de medicina comunitária desenvolvidas nos centros comunitários de saúde norte-americanos. Nesses centros , o trabalho comunitário tinha caráter de assitencia social (dirigia-se aos mais pobres, com maiores riscos sociais e sanitários); de educação (transmissão de conhecimentos que estimulassem o auto-cuidado, a solidariedade e o coletivismo); de integralidade (programas de atenção materno-infantil, saúde mental, tuberculose etc.) e de descentralização e organização comunitária (o êxito do trabalho dependia do grau de integração da comunidade). (CARVALHO, 1995). Nessa época , as práticas do sanitarismo campanhista eram dominantes, e a oferta de assistência médica pelo sistema previdenciário estava em pleno movimento, portanto essas experiências citadas a cima tiveram pouca repercussão no Brasil. O exemplo mais conhecido foi o SESP (Serviço Especial de Saúde Pública), implantado através da iniciativa do Ministro de Estado dos Negócios e Relações Exteriores (Osvaldo Aranha) em 17 de julho de 1942, com o apoio de instituições norte-americanas. Aos poucos, o termo participação comunitária foi se consolidando como um processo social em que grupos específicos com necessidades compartilhadas, vivendo numa determinada área geográfica, perseguem ativamente a identificação de suas necessidades, tomam decisões e estabelecem mecanismos para atender a essas necessidades. A idéia de participação social deu lugar a propostas de gestão colegiadas e representativas, que reconhecem e legitimam as organizações da sociedade civil. Houve ainda, uma alteração qualitativa das relações sociais, permitindo o controle popular das atividades de saúde (OPAS, 1990). O processo de reforma sanitária, desencadeado por intelectuais e profissionais do Movimento Sanitário, impulsionava a realização da VIII Conferência Nacional de Saúde. Em decorrência desse processo, em 1986, O Ministério da Saúde convocou a VIII Conferência Nacional de Saúde. Ao contrário das Conferências de Saúde que haviam sido convocadas até então, e que discutiam questões de caráter essencialmente técnico. A VIII inovou , no que toca à escolha da temática – Direito à Saúde, Sistema de Saúde e Financiamento -, à participação da sociedade civil e ao processo preparatório que envolveu profissionais da saúde, intelectuais, usuários e membros de partidos políticos e sindicatos (BRASIL, 1986). A partir desse momento a participação social é tida como direito de cidadania, e sua relação com o Estado visa o seu controle, ou seja, impedi-lo de transgredir. A Participação Social no Sistema Único de Saúde A Carta Magna de 1988 garante a saúde como direito de todos e um dever do Estado, tendo os usuários acesso igualitário e universal às ações de promoção, prevenção e recuperação da saúde. As instituições privadas têm sua participação de forma a complementar aos serviços públicos de saúde. Os princípios básicos do SUS são a descentralização, com delegação de poderes para os níveis estatal e municipal, tendo o atendimento integral com maior enfoque a atividades preventivas. A participação da comunidade no SUS foi regulamentada em 1990, através da Lei Orgânica de Saúde (LOS), inicialmente representada pela Lei 8.080/90 e depois complementada pela Lei 8.142/90 e depois complementada pela Lei 8.142/90. Essa segunda Lei teve que ser editada em função dos vetos indevidos que a primeira Lei recebeu, principalmente em relação à participação da comunidade e ao repasse de recursos. Indevidos em função da necessidade de regulamentação da determinação constitucional de participação da comunidade e da instituição constitucional de descentralização da execução das ações e dos serviços públicos de saúde (CARVALHO e SANTOS, 1995). Devido às pressões sociais, os políticos do pós-regime militar criaram uma ferramenta para garantir a seguridade social. Segundo OLIVEIRA JR. (1998), a arrecadação para a seguridade social aumentou de 6% do valor do PIB de 1988 para 11% no ano de 1996. No entanto, estas contribuições também têm sido destinadas para outros Ministérios, chegando representar 3% do PIB no governo Collor. Dos nove vetos à lei 8.080/90, os mais importantes foram: os que instituía as conferências e os conselhos de saúde como instâncias colegiadas e representativas para formular e propor estratégias, além de exercer controle sobre a execução das políticas de saúde; a não extinção dos escritórios regionais do INAMPS; a transferência da verba direta para os Estados e Municípios; a obrigatoriedade de planos de carreiras, de cargos e salários para o SUS em cada esfera de governo e a fixação de pisos nacionais de salários. Cabe ressaltar que o controle social em saúde, apesar de institucionalizado não garante de forma mágica a igualdade de oportunidades de acesso ao poder, nem tampouco elimina as desigualdades de caráter reivindicatório entre os diversos segmentos sociais. Assim, nem os setores dominantes deixam de operar e realizar seus interesses através de canais privativos de acesso e influencia (anéis burocráticos, poder econômico, etc), nem os setores subalternos ou excluídos, tem suas necessidades de saúde automaticamente atendidas (CARVALHO, 1995). Participação Popular em Saúde A participação popular se diferencia das demais formas de participação, uma vez que se caracteriza por atuação popular de grupos e da sociedade civil em órgãos, agências ou serviços do Estado, responsáveis pelas políticas publicas na área social. Essa participação implica em dois principais significados: de um lado legitima a política do Estado diante da população e de outro se torna um canal para que entre outras coisas as entidades populares ou grupos da comunidade disputem o controle e a destinação da verba publica. Apesar disso o Estado e as entidades da sociedade civil que defendem os interesses das classes dominantes buscaram sempre bloquear, desviar e impedir o desenvolvimento do movimento popular, seja restringindo o acesso às informações, fragmentando a participação, limitando o campo das atribuições, retardando decisões ou remetendo-as a instâncias superiores, seja através da cooptação das lideranças do movimento popular para aceitar esses procedimentos em troca de benefícios pessoais ou políticos (SANTOS, 2002). Na área da saúde, as experiências de participação popular não são tão antigas, e muitas vezes estiveram atrelados a grupos populares com os mais variados interesses sociais que não só a saúde (sociedade de amigos de bairros, movimentos populares, dentre outros); todavia as necessidades de manifestação popular frente a questões sociais que necessitassem de respostas (a própria repressão da ditadura militar, por exemplo), geraram certo amadurecimento dos movimentos populares e em conseqüência disso os diretas ou indiretamente relacionados com as questões de saúde. Segundo (SANTOS, 2002) o controle social é a expressão mais viva da participação da sociedade nas decisões tomadas pelo Estado no interesse geral ou a presença do cidadão e usuário no centro do processo de avaliação e o Estado deixando de ser o árbitro infalível do interesse coletivo, do bem comum; de outra forma pode ser entendido como: uma decorrência da democracia onde cidadãos se organizam em associações das mais diversas (de consumidores, de pais e mestres, de comunidades eclesiais, de profissionais, de moradores de bairros, dentre outras) a fim de exigirem do Estado o cumprimento do seu papel em favor do bem estar social. Aspectos Históricos da Participação Popular em Saúde Poucos são os relatos na literatura a respeito da participação popular em saúde e dentre os poucos pode-se destacar alguns movimentos pós-guerras mundiais que se diziam respeito a luta por maiores direitos previdenciários e equidade nestes para todos os trabalhadores. Embora as “Conferências de Saúde” ocorram desde 1941, e nesse tempo se achou importante que as mesmas acontecessem a cada 2 anos, sua legalização ocorre anos depois e a participação social até os anos 80 teve pouca importância, uma vez que somente as camadas dominantes e o próprio Estado tinham efetivo envolvimento e poder de decisão. Os anos 60 marcaram a chegada dos governos militares (Ditadura), que gerou a supressão dos canais de expressão de interesses da população em relação ao Estado (que já era expressiva) surgem os novos movimentos sociais: associações de moradores, movimentos por habitação e movimentos comunitários, assumindo o significado da ação direta e autêntica das bases populares, com características autônomas, na luta por melhores condições de vida, mas com peculiaridades relacionadas ás suas origens e comprometimento ideológico. Em meados dos anos 70 ocorre a queda do regime militar e já existe abertura legal para a criação de “Conselhos de Saúde”, onde a população organizada ou não em movimentos, poderia participar, porém quase nada se avança nessa época devido a uma série de questões antigas ou atuais (medo da repressão do regime anterior – ditadura, questões da previdência, cultura pouco participativa dentre outros). Os anos 80 marca maior abertura com o advento das AIS (Ações Integradas de Saúde), além da possibilidade de participação criada entre INAMPS (curativo) e Ministério da Saúde (Preventivo) onde se criou uma gerência compartilhada, com a presença de representantes de instituições e da população; o que de certa forma representou um passo adiante na participação popular em saúde; vale ressaltar que essa época marca a presença de movimentos populares de saúde não formais (Sociedade de Amigos de Bairro, grupos de luta pela saúde dentre outros) que na prática lutavam principalmente pela ampliação quantitativa dos serviços de saúde. Todavia marco histórico na saúde em vários aspectos de avanços na saúde (e dentre eles a participação da comunidade e o controle social) se dá na “VIII Conferência Nacional de Saúde que teve um alto índice de participação dos representantes da comunidade e de grandes intelectuais e cientistas em Saúde Coletiva que debateram grande temas que até hoje delineiam os pensamentos nessa área” (SUS por exemplo), haja visto que as temáticas debatidas nessa plenária influenciaram a confecção da nova Carta Magna a “Constituição” em 1988 que de forma legal garantiu direitos à saúde até então inexistentes, e embora de fato a realização deste importante documento não teve participação popular direta sofreu influência indireta pelo evento anteriormente citado (SANTOS, 2002). O avanço social da comunidade terá muito a ver com seu nível de mobilização na busca e defesa de seus direitos afim de garantir uma sociedade mais saudável e justa, nesse contexto a participação dos profissionais de saúde é imprescindível. CONSIDERAÇÕES FINAIS Considerando que o futuro deverá ou deveria ser na saúde coletiva o avanço na qualidade de saúde da comunidade, e nas tantas reuniões científicas no mundo (Alma Ata, OMP, OPS, entre outras) o profissional enfermeiro tem importante papel no alcance da qualidade de vida da comunidade, uma vez que tem capacidade de grande vínculo com a população na sua prática. Mas o momento atual exige sempre lembrar que a luta por cidadania, um processo ainda inacabado no Brasil, corre sérios riscos de fragilizar-se num contexto marcado pela desordem provocada pela globalização. Assim, a necessidade de fortalecer a participação cidadã se confronta com uma realidade dada pela existência de cidadanias cada vez mais restritas e diferenciadas, principalmente pela não resolução das graves desigualdades sociais que caracterizam a séculos a nossa sociedade.A consolidação de práticas participativas que potencializam conquistas materiais para os desiguais dentre os desiguais mostra os alcances que a criação de um espaço público não-estatal pode promover quando se transforma em arena democrática de negociação entre o Estado e Sociedade, como principal pressuposto para a governabilidade e legitimidade

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL, Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Relatório final da VIII Conferência Nacional de Saúde. Brasília: Gabinete do Ministro, 1992.
MENDES, E.V. Uma agenda para a Saúde. São Paulo: Hucitec, 1996.
CARVALHO, A.I. Conselhos de Saúde no Brail: participação cidadã e controle social. Rio de Janeiro: Fase/IBAM, 1995.
OLIVEIRA, J.A.A.; (Im)previdência Social: 60 anos de história da previdência no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1985. CARVALHO, G.I.; SANTOS, L. Sistema Único de Saúde: Comentários à Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080/90 e Lei 8.142/90). 2. ed. São Paulo: Hucitec, 1995.
SANTOS, A.S, Apostila elaborada para a disciplina, Enfermagem em Saúde Coletiva, Centro Universitário Nove de Julho. 2002.
ANDRADE, S.M.; SOARES, D.A.; JUNIOR, L.C. Bases da Saúde Coletiva. Ed. Abrasco. Rio de Janeiro. 2001. BOSI, Maria Lúcia M. Cidadania, participação popular e saúde na visão dos profissionais do setor: um estudo de caso na rede pública de serviços. Cad. Saúde Pública, out./dez. 1994, vol.10, no.4, p.446-456. ISSN 0102-311X.

VIGILÂNCIA EM SAÚDE PÚBLICA


BREVE INTRODUÇÃO À EPIDEMIOLOGIA

ASPECTOS CONCEITUAIS
A epidemiologia é uma disciplina básica da saúde pública voltada para a compreensão do processo saúde-doença no âmbito de populações, aspecto que a diferencia da clínica, que tem por objetivo o estudo desse mesmo processo, mas em termos individuais. Como ciência, a epidemiologia fundamenta-se no raciocínio causal; já como disciplina da saúde pública, preocupa-se com o desenvolvimento de estratégias para as ações voltadas para a proteção e promoção da saúde da comunidade. A epidemiologia constitui também instrumento para o desenvolvimento de políticas no setor da saúde. Sua aplicação neste caso deve levar em conta o conhecimento disponível, adequando-o às realidades locais. Se quisermos delimitar conceitualmente a epidemiologia, encontraremos várias definições; uma delas, bem ampla e que nos dá uma boa idéia de sua abrangência e aplicação em saúde pública, é a seguinte: "Epidemiologia é o estudo da freqüência, da distribuição e dos determinantes dos estados ou eventos relacionados à saúde em específicas populações e a aplicação desses estudos no controle dos problemas de saúde." (J. Last, 1995) Essa definição de epidemiologia inclui uma série de termos que refletem alguns princípios da disciplina que merecem ser destacados (CDC, Principles, 1992):

  • Estudo: a epidemiologia como disciplina básica da saúde pública tem seus fundamentos no método científico.

  • Freqüência e distribuição: a epidemiologia preocupa-se com a freqüência e o padrão dos eventos relacionados com o processo saúde-doença na população. A freqüência inclui não só o número desses eventos, mas também as taxas ou riscos de doença nessa população. O conhecimento das taxas constitui ponto de fundamental importância para o epidemiologista, uma vez que permite comparações válidas entre diferentes populações. O padrão de ocorrência dos eventos relacionados ao processo saúde-doença diz respeito à distribuição desses eventos segundo características: do tempo (tendência num período, variação sazonal, etc.), do lugar (distribuição geográfica, distribuição urbano-rural, etc.) e da pessoa (sexo, idade, profissão, etnia, etc.).

  • Determinantes: uma das questões centrais da epidemiologia é a busca da causa e dos fatores que influenciam a ocorrência dos eventos relacionados ao processo saúde-doença. Com esse objetivo, a epidemiologia descreve a freqüência e distribuição desses eventos e compara sua ocorrência em diferentes grupos populacionais com distintas características demográficas, genéticas, imunológicas, comportamentais, de exposição ao ambiente e outros fatores, assim chamados fatores de risco. Em condições ideais, os achados epidemiológicos oferecem evidências suficientes para a implementação de medidas de prevenção e controle.

  • Estados ou eventos relacionados à saúde: originalmente, a epidemiologia preocupava-se com epidemias de doenças infecciosas. No entanto, sua abrangência ampliou-se e, atualmente, sua área de atuação estende-se a todos os agravos à saúde.

  • Específicas populações: como já foi salientado, a epidemiologia preocupa-se com a saúde coletiva de grupos de indivíduos que vivem numa comunidade ou área.

  • Aplicação: a epidemiologia, como disciplina da saúde pública, é mais que o estudo a respeito de um assunto, uma vez que ela oferece subsídios para a implementação de ações dirigidas à prevenção e ao controle. Portanto, ela não é somente uma ciência, mas também um instrumento.

Boa parte do desenvolvimento da epidemiologia como ciência teve por objetivo final a melhoria das condições de saúde da população humana, o que demonstra o vínculo indissociável da pesquisa epidemiológica com o aprimoramento da assistência integral à saúde.

A PESQUISA EPIDEMIOLÓGICA
Acuña & Romero salientam que a pesquisa epidemiológica é responsável pela produção do conhecimento sobre o processo saúde-doença por meio de:

  • estudo da freqüência e distribuição das doenças na população humana com a identificação de seus fatores determinantes;

  • avaliação do impacto da atenção à saúde sobre as origens, expressão e curso da doença.

Segundo aqueles autores, as áreas de produção do conhecimento pela epidemiologia e as respectivas metodologias aplicadas são as seguintes:

EVOLUÇÃO DA EPIDEMIOLOGIA
A trajetória histórica da epidemiologia tem seus primeiros registros já na Grécia antiga (ano 400 a.C.), quando Hipócrates, num trabalho clássico denominado Dos Ares, Águas e Lugares, buscou apresentar explicações, com fundamento no racional e não no sobrenatural, a respeito da ocorrência de doenças na população.
Já na era moderna, uma personalidade que merece destaque é o inglês John Graunt, que, no século XVII, foi o primeiro a quantificar os padrões da natalidade, mortalidade e ocorrência de doenças, identificando algumas características importantes nesses eventos, entre elas:

  • existência de diferenças entre os sexos e na distribuição urbano-rural;

  • elevada mortalidade infantil;

  • variações sazonais.

São também atribuídas a ele as primeiras estimativas de população e a elaboração de uma tábua de mortalidade. Tais trabalhos conferem-lhe o mérito de ter sido o fundador da bioestatística e um dos precursores da epidemiologia. Posteriormente, em meados do século XIX, Willian Farr iniciou a coleta e análise sistemática das estatísticas de mortalidade na Inglaterra e País de Gales. Graças a essa iniciativa, Farr é considerado o pai da estatística vital e da vigilância. Quem, no entanto, mais se destacou entre os pioneiros da epidemiologia foi o anestesiologista inglês John Snow, contemporâneo de William Farr. Sua contribuição está sintetizada no ensaio Sobre a Maneira de Transmissão da Cólera, publicado em 1855, em que apresenta memorável estudo a respeito de duas epidemias de cólera ocorridas em Londres em 1849 e 1854.

A principal contribuição de Snow foi a sistematização da metodologia epidemiológica, que permaneceu, com pequenas modificações, até meados do século XX. Ele descreve o comportamento da cólera por meio de dados de mortalidade, estudando, numa seqüência lógica, a freqüência e distribuição dos óbitos segundo a cronologia dos fatos (aspectos relativos ao tempo) e os locais de ocorrência (aspectos relativos ao espaço), além de efetuar levantamento de outros fatores relacionados aos casos (aspectos relativos às pessoas), com o objetivo de elaborar hipóteses causais. Sua descrição do desenvolvimento da epidemia e das características de sua propagação é tão rica em detalhes e seu raciocínio, tão genial, que consegue demonstrar o caráter transmissível da cólera (teoria do contágio), décadas antes do início das descobertas no campo da microbiologia e, portanto, do isolamento e identificação do Vibrio cholerae como agente etiológico da cólera, contrariando, portanto, a teoria dos miasmas, então vigente. Apresentamos a seguir alguns trechos do trabalho Sobre a Maneira de Transmissão da Cólera, em que seu autor destaca o caráter transmissível da doença: "O fato da doença caminhar ao longo das grandes trilhas de convivência humana, nunca mais rápido que o caminhar do povo, via de regra mais lentamente..." "Ao se propagar em uma ilha ou continente ainda não atingido, surge primeiro num porto..." "Jamais ataca tripulações que se deslocam de uma área livre da doença para outra atingida até que elas tenham entrado no porto..." Ainda fortalecendo a teoria do contágio, Snow comentava:

"... doenças transmitidas de pessoa a pessoa são causadas por alguma coisa que passa dos enfermos para os sãos e que possui a propriedade de aumentar e se multiplicar nos organismos dos que por ela são atacados..."

Apresenta evidências da disseminação da cólera de pessoa a pessoa ou por fonte comum. Vejamos os seguintes trechos:

Transmissão pessoa a pessoa: "... Os casos subseqüentes ocorreram sobretudo entre parentes daquelas (pessoas) que haviam sido inicialmente atacadas, e a sua ordem de propagação é a seguinte: ... o primeiro caso foi o de um pai de família; o segundo, sua esposa; o terceiro, uma filha que morava com os pais; o quarto, uma filha que era casada e morava em outra casa; o quinto, o marido da anterior, e o sexto, a mãe dele..."

Transmissão por veículo comum: "... Estar presente no mesmo quarto com o paciente e dele cuidando não faz com que a pessoa seja exposta obrigatoriamente ao veneno mórbido... Ora, em Surrey Buildings a cólera causou terrível devastação, ao passo que no beco vizinho só se verificou um caso fatal... No primeiro beco a água suja despejada... ganhava acesso ao poço do qual obtinham água. Essa foi de fato a única diferença..."

Snow levanta ainda a possibilidade da transmissão indireta por fômites, ao relatar um caso fatal de cólera de um indivíduo que havia manipulado roupas de uso diário de outra pessoa que morrera poucos dias antes pela mesma causa.
Estudando aspectos relacionados à patogenia da doença, Snow deduz a via de penetração e de eliminação do agente, atribuindo ao aparelho digestivo a porta de entrada e de eliminação do "veneno mórbido" (maneira pela qual Snow se referia ao agente da cólera). Vejamos o seguinte trecho:

"... Todavia, tudo o que eu aprendi a respeito da cólera ... leva-me a concluir que a cólera invariavelmente começa com a afecção do canal alimentar".

Um outro aspecto muito interessante do trabalho de Snow é a sua introdução do conceito de risco. Identifica como fator de risco para a transmissão direta a falta de higiene pessoal, seja por hábito ou por escassez de água. Exemplifica demonstrando o menor número de casos secundários em casas ricas, se comparadas com as pobres. Aponta como fator de risco para a transmissão indireta a contaminação, por esgotos, dos rios e dos poços de água usada para beber ou no preparo de alimentos. Nessa forma de transmissão não se verifica diferença na ocorrência da doença por classe social e condições habitacionais.
Vejamos então o seguinte trecho:

"... Se a cólera não tivesse outras maneiras de transmissão além das já citadas, seria obrigada a se restringir às habitações aglomeradas das pessoas de poucos recursos e estaria continuamente sujeita à extinção num dado local, devido à ausência de oportunidades para alcançar vítimas ainda não atingidas. Entretanto, freqüentemente existe uma maneira que lhe permite não só se propagar por uma maior extensão, mas também alcançar as classes mais favorecidas da comunidade. Refiro-me à mistura de evacuações de pacientes atingidos pela cólera com a água usada para beber e fins culinários, seja infiltrando-se pelo solo e alcançando poços, seja sendo despejada, por canais e esgotos, em rios que, algumas vezes, abastecem de água cidades inteiras." Na primeira das duas epidemias estudadas por Snow, ele verificou que os distritos de Londres que apresentaram maiores taxas de mortalidade pela cólera eram abastecidos de água por duas companhias: a Lambeth Company e a Southwark & Vauxhall Company. Naquela época, ambas utilizavam água captada no rio Tâmisa num ponto abaixo da cidade. No entanto, na segunda epidemia por ele estudada, a Lambeth Company já havia mudado o ponto de captação de água do rio Tâmisa para um local livre dos efluentes dos esgotos da cidade. Tal mudança deu-lhe oportunidade para comparar a mortalidade por cólera em distritos servidos de água por ambas as companhias e captadas em pontos distintos do rio Tâmisa. Os dados apresentados na tabela 1 sugerem que o risco de morrer por cólera era mais de cinco vezes maior nos distritos servidos somente pela Southwark & Vauxhall Company do que as servidas, exclusivamente, pela Lambeth Company. Chama a atenção o fato de os distritos servidos por ambas as companhias apresentarem taxas de mortalidade intermediárias. Esses resultados são consistentes com a hipótese de que a água de abastecimento captada abaixo da cidade de Londres era a origem da cólera.

Para testar a hipótese de que a água de abastecimento estava associada à ocorrência da doença, Snow concentrou seus estudos nos distritos abastecidos por ambas as companhias, uma vez que as características dos domicílios desses distritos eram geralmente comparáveis, exceto pela origem da água de abastecimento. Nesses distritos, Snow identificou a companhia de abastecimento de cada residência onde ocorrera um ou mais óbitos por cólera durante a segunda epidemia estudada. Os resultados desse levantamento estão na tabela 2.

Esses resultados tornaram consistente a hipótese formulada por Snow e permitiram que os esforços desenvolvidos para o controle da epidemia fossem direcionados para a mudança do local de captação da água de abastecimento.
Portanto, mesmo sem dispor de conhecimentos relativos à existência de microrganismos, Snow demonstrou por meio do raciocínio epidemiológico que a água pode servir de veículo de transmissão da cólera. Mostrou, por decorrência, a relevância da análise epidemiológica do comportamento das doenças na comunidade para o estabelecimento das ações de saúde pública.
Podemos sintetizar da seguinte forma a estratégia do raciocínio epidemiológico estabelecido por Snow:

a. Descrição do comportamento da cólera segundo atributos do tempo, espaço e da pessoa.

b. Busca de associações causais entre a doença e determinados fatores, por meio de:

  • exames dos fatos;

  • avaliação das hipóteses existentes;

  • formulação de novas hipóteses mais específicas;

  • obtenção de dados adicionais para testar novas hipóteses.
No final do século passado, vários países da Europa e os Estados Unidos iniciaram a aplicação do método epidemiológico na investigação da ocorrência de doenças na comunidade.
Nesse período, a maioria dos investigadores concentraram-se no estudo de doenças infecciosas agudas. Já no século XX, a aplicação da epidemiologia estendeu-se para as moléstias não-infecciosas. Um exemplo é o trabalho coordenado por Joseph Goldberger, pesquisador do Serviço de Saúde Pública norte-americano.
Em 1915, Goldberger estabelece a etiologia carencial da pelagra através do raciocínio epidemiológico, expandindo os limites da epidemiologia para além das doenças infecto-contagiosas.
No entanto, é a partir do final da Segunda Guerra Mundial que assistimos ao intenso desenvolvimento da metodologia epidemiológica com a ampla incorporação da estatística, propiciada em boa parte pelo aparecimento dos computadores.
A aplicação da epidemiologia passa a cobrir um largo espectro de agravos à saúde. Os estudos de Doll e Hill, estabelecendo associação entre o tabagismo e o câncer de pulmão, e os estudos de doenças cardiovasculares desenvolvidas na população da cidade de Framingham, Estados Unidos, são dois exemplos da aplicação do método epidemiológico em doenças crônicas.
Hoje a epidemiologia constitui importante instrumento para a pesquisa na área da saúde, seja no campo da clínica, seja no da saúde pública. O objetivo deste texto é justamente apresentar e discutir a epidemiologia como uma prática da saúde pública.

USOS E OBJETIVOS DA EPIDEMIOLOGIA
O método epidemiológico é, em linhas gerais, o próprio método científico aplicado aos problemas de saúde das populações humanas. Para isso, serve-se de modelos próprios aos quais são aplicados conhecimentos já desenvolvidos pela própria epidemiologia, mas também de outros campos do conhecimento (clínica, biologia, matemática, história, sociologia, economia, antropologia, etc.), num contínuo movimento pendular, ora valendo-se mais das ciências biológicas, ora das ciências humanas, mas sempre situando-as como pilares fundamentais da epidemiologia. Sendo uma disciplina multidisciplinar por excelência, a epidemiologia alcança um amplo espectro de aplicações. As aplicações mais freqüentes da epidemiologia em saúde pública são*:
  • descrever o espectro clínico das doenças e sua história natural;

  • identificar fatores de risco de uma doença e grupos de indivíduos que apresentam maior risco de serem atingidos por determinado agravo;

*Fonte: Adaptado de T. C. Timmreck, 1994.

  • prever tendências;

  • avaliar o quanto os serviços de saúde respondem aos problemas e necessidades das populações;

  • testar a eficácia, a efetividade e o impacto de estratégias de intervenção, assim como a qualidade, acesso e disponibilidade dos serviços de saúde para controlar, prevenir e tratar os agravos de saúde na comunidade.

A saúde pública tem na epidemiologia o mais útil instrumento para o cumprimento de sua missão de proteger a saúde das populações. A compreensão dos usos da epidemiologia nos permite identificar os seus objetivos, entre os quais podemos destacar os seguintes:

Objetivos da epidemiologia*:

  • identificar o agente causal ou fatores relacionados à causa dos agravos à saúde;

  • entender a causação dos agravos à saúde;

  • definir os modos de transmissão;

  • definir e determinar os fatores contribuintes aos agravos à saúde;

  • identificar e explicar os padrões de distribuição geográfica das doenças;

  • estabelecer os métodos e estratégias de controle dos agravos à saúde;

  • estabelecer medidas preventivas;

  • auxiliar o planejamento e desenvolvimento de serviços de saúde;

  • prover dados para a administração e avaliação de serviços de saúde.
FONTE: http://www.saude.sc.gov.br



O QUE É O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE?


O Sistema Único de Saúde - SUS - foi criado pela pela Constituição Federal de 1988 e regulamentado pelas Leis n.º 8080/90 (Lei Orgânica da Saúde) e nº 8.142/90, com a finalidade de alterar a situação de desigualdade na assistência à Saúde da população, tornando obrigatório o atendimento público a qualquer cidadão, sendo proibidas cobranças de dinheiro sob qualquer pretexto. Do Sistema Único de Saúde fazem parte os centros e postos de saúde, hospitais - incluindo os universitários, laboratórios, hemocentros (bancos de sangue), além de fundações e institutos de pesquisa, como a FIOCRUZ - Fundação Oswaldo Cruz e o Instituto Vital Brazil. Através do Sistema Único de Saúde, todos os cidadãos têm direito a consultas, exames, internações e tratamentos nas Unidades de Saúde vinculadas ao SUS, sejam públicas (da esfera municipal, estadual e federal), ou privadas, contratadas pelo gestor público de saúde.

O SUS é destinado a todos os cidadãos e é financiado com recursos arrecadados através de impostos e contribuições sociais pagos pela população e compõem os recursos do governo federal, estadual e municipal. O Sistema Único de Saúde tem como meta tornar-se um importante mecanismo de promoção da eqüidade no atendimento das necessidades de saúde da população, ofertando serviços com qualidade adequados às necessidades, independente do poder aquisitivo do cidadão. O SUS se propõe a promover a saúde, priorizando as ações preventivas, democratizando as informações relevantes para que a população conheça seus direitos e os riscos à sua saúde. O controle da ocorrência de doenças, seu aumento e propagação (Vigilância Epidemiológica) são algumas das responsabilidades de atenção do SUS, assim como o controle da qualidade de remédios, de exames, de alimentos, higiene e adequação de instalações que atendem ao público, onde atua a Vigilância Sanitária. O setor privado participa do SUS de forma complementar, por meio de contratos e convênios de prestação de serviço ao Estado – quando as unidades públicas de assistência à saúde não são suficientes para garantir o atendimento a toda a população de uma determinada região.

CONTROLE SOCIAL NO SUS
A Lei Nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, estabelece duas formas de participação da população na gestão do Sistema Único de Saúde: as Conferências e os Conselhos de Saúde onde a comunidade, através de seus representantes, pode opinar, definir, acompanhar a execução e fiscalizar as ações de saúde nas três esferas de governo: federal, estadual e municipal.

Como Funcionam as Conferências e os Conselhos de Saúde? Nas Conferências, reúnem-se os representantes da sociedade (que são os usuários do SUS), do governo, dos profissionais de saúde, dos prestadores de serviços, parlamentares e outros para “avaliar a situação da saúde e propor as diretrizes para a formulação da política de saúde” nos municípios, nos estados e no país. Foi o relatório final da 8ª Conferência Nacional de Saúde de 1986 que serviu de base para a elaboração do capítulo sobre saúde da nossa Constituição Federal de 1988, quando foi criado o Sistema Único de Saúde. De quatro em quatro anos deve acontecer a Conferência Nacional de Saúde, após a realização das Conferências estaduais e municipais, onde são apontados os rumos para aperfeiçoamento do SUS. Os Conselhos de Saúde são os órgãos de controle do SUS pela sociedade nos níveis municipal, estadual e federal. Eles foram criados para permitir que a população possa interferir na gestão da saúde, defendendo os interesses da coletividade para que estes sejam atendidos pelas ações governamentais. O legítimo representante dos cidadãos usuários do SUS defende os interesses e necessidades da população que mais precisa e usa os serviços do SUS, exercendo o controle social ao lutar para garantir, na prática, o direito constitucional à saúde com qualidade e o respeito à dignidade humana. Os Conselhos de Saúde funcionam como colegiados, de caráter permanente e deliberativo, isto é, devem funcionar e tomar decisões regularmente, acompanhando, controlando e fiscalizando a política de saúde e propondo correções e aperfeiçoamentos em seu rumo. São componentes dos Conselhos os representantes do governo, dos prestadores de serviços, dos profissionais de saúde e usuários. Para conhecer melhor os Conselhos de Saúde procure a Secretaria Municipal de Saúde do seu município e veja como pode participar.

ASPECTOS GERAIS
O Sistema Único de Saúde - SUS constitui o modelo oficial público de atenção à saúde em todo o país, sendo um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo e o único a garantir assistência integral e totalmente gratuita para a totalidade da população, inclusive aos pacientes portadores do HIV, sintomáticos ou não, aos pacientes renais crônicos e aos pacientes com câncer. O SUS,esta´definido na Lei Nº 8.080, de 19 de setembro de 1990´- Lei Orgânica da Saúde, como “o conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, incluídas as instituições públicas federais, estaduais e municipais de controle de qualidade, pesquisa e produção de insumos, medicamentos, inclusive de sangue e hemoderivados, e de equipamentos para saúde”, garantida, também, a participação complementar da iniciativa privada no Sistema Único de Saúde. A direção do SUS, de acordo com o inciso I do art. 198 da Constituição Federal, é única, sendo exercida em âmbito nacional pelo Ministério da Saúde; em âmbito estadual e no Distrito Federal, pela respectiva Secretaria de Saúde ou órgão equivalente e, no âmbito municipal, pela respectiva Secretaria de Saúde ou órgão equivalente. A Lei Nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, que dispõe, entre outros assuntos, sobre a participação da comunidade na gestão do SUS, estabelece, no seu artigo 1°, que o SUS, “contará, em cada esfera de governo, sem prejuízo das funções do Poder Legislativo, com as seguintes instâncias colegiadas: a Conferência de Saúde e o Conselho de Saúde”. A Conferência de Saúde, pelo menos a cada quatro anos, é convocada para avaliar a situação de saúde e propor as diretrizes para a formulação da política de saúde nos níveis nacional, estadual e municipal. O Conselho de Saúde, órgão colegiado com caráter permanente e deliberativo, composto por representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários, atua na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde, sendo que suas decisões requerem a homologação do chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo. A Comissão Intergestores Tripartite - CIT, integrada por representantes dos gestores municipais (CONASEMS - Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde), estaduais (CONASS - Conselho Nacional de Secretários de Saúde) e federal (Ministério da Saúde) - e a Comissão Intergestores Bipartite - CIB, integrada por representantes dos gestores municipais (COSEMS - Colegiado de Secretários Municipais de Saúde) e estadual (Secretaria Estadual de Saúde), criadas pela segunda Norma Operacional Básica do SUS - a NOB-SUS 01/93, são responsáveis pelo gerenciamento do Sistema Único de Saúde, apreciando, entre outros assuntos, os pactos e programações entre gestores, buscando a integração entre as esferas de governo.

ASPECTOS GERAIS

1 - ANTECEDENTES. Desde o início do século passado, até o final dos anos sessenta, o sistema de saúde brasileiro se preocupava, fundamentalmente, com o combate em massa de doenças, através das campanhas de saúde pública. A partir dos anos setenta, passou a priorizar a assistência médica curativa e individual. Em 1975, através da Lei 6.229, foi criado o Sistema Nacional de Saúde, separando as ações de saúde pública das ações ditas de atenção às pessoas. Em 1977, se criou INAMPS – Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social, para tender exclusivamente as pessoas que possuíam carteira de trabalho. O atendimento dos desempregados e residentes no interior era de responsabilidade das Secretarias Estaduais de Saúde e dos serviços públicos federais. Somente a partir dos anos oitenta, mudanças econômicas e políticas ocorridas no país, passaram a exigir a substituição do modelo médico-assistencial privatista por um outro modelo de atenção à saúde. Os primeiros sinais de mudança do modelo de atenção à saúde no Brasil, surgiram com a criação, em 1979, do PIASS – Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento a partir de alguns projetos pilotos medicina comunitária. Em 1983, se implantou a AIS – Ações Integradas de Saúde, o primeiro desenho estratégico de co-gestão, de desconcentração e de universalização da atenção à saúde. Em 1986 foi realizada a 8ª Conferência Nacional de Saúde e, no ano seguinte, se criou o SUDS – Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde, que representou a desconcentração das atividades do INAMPS para as Secretarias Estaduais de Saúde. A Constituição Federal de 1988, incorporando, parcialmente, as propostas estabelecidas pelo movimento da reforma sanitária brasileira criou o Sistema Único de Saúde, regulamentado dois anos depois pelas Leis 8.080, de 19 de setembro de 1990 e 8.142, de 28 de dezembro de 1990. Um passo significativo na direção do cumprimento da definição constitucional de construção do Sistema Único de Saúde, foi a publicação do decreto nº 99.060, de 7 de março de 1990, que transferiu o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) do Ministério da Previdência para o Ministério da Saúde. Em 27 de julho de 1993, quase três anos após a promulgação da lei 8.080, que regulamentou o SUS, o INAMPS foi extinto através da Lei n° 8.689, sendo suas funções, competências, atividades e atribuições absorvidas pelas instâncias federal, estadual e municipal do SUS. Ao se preservar as funções, competências, atividades e atribuições do INAMPS, se preservou também a sua lógica de financiamento e de alocação de recursos financeiros, como, por exemplo, o estabelecimento de limites ou tetos físicos e financeiros para as Unidades Federadas. 2. NORMAS DO SUS. O SUS está amparado em uma vasta legislação, cujo tripé principal é formado pela Constituição Federal de 1988, a Lei 8.080, de 19 de setembro de 1990 e a Lei 8.142, de 28 de dezembro de 1990. Complementarmente existiram as Normas Operacionais do SUS, das quais pode-se fazer o seguinte resumo:

3. PRINCÍPIOS. O SUS DEVE ser entendido como um processo em marcha de produção social da saúde, que não se iniciou em 1988, com a sua inclusão na Constituição Federal, nem tão pouco tem um momento definido para ser concluído. Ao contrário, resulta de propostas defendidas ao longo de muitos anos pelo conjunto da sociedade e por muitos anos ainda estará sujeito a aprimoramentos. Segundo a legislação brasileira, a saúde é um direito fundamental do ser humano, cabendo ao poder público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) garantir este direito, através de políticas sociais e econômicas que visem à redução dos riscos de se adoecer e morrer, bem como o acesso universal e igualitário às ações e serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde. O acesso universal (princípio da universalidade), significa que ao SUS compete atender a toda população, seja através dos serviços estatais prestados pela União, Distrito Federal, Estados e Municípios, seja através dos serviços privados conveniados ou contratados com o poder público. O acesso igualitário (princípio da eqüidade) não significa que o SUS deva tratar a todos de forma igual, mas sim respeitar os direitos de cada um, segundo as suas diferenças, apoiando-se mais na convicção íntima da justiça natural do que na letra da lei.

4. CONTROLE SOCIAl
Tanto a Constituição Federal como as leis orgânicas da saúde (8.080 e 8.142) estabelecem que saúde é direito de todos e dever do estado e suas ações e serviços devem ser organizados com a participação da comunidade. Isso quer dizer que o SUS impõe o direito de cidadania que deve ser exercido, institucionalmente, através dos Conselhos de Saúde, em cada esfera de governo – federal, estadual e municipal. Embora em muitos lugares, os Conselhos de Saúde não sejam mais do que palco de imposições governamentais e de influências partidárias ou corporativas, no geral o resultado parece apontar para a democratização da saúde. Avaliações dos Conselhos de Saúde existentes apontam para a necessidade de se propiciar a capacitação dos conselheiros mediante cursos regulares e de prover, de forma sistemática, as informações necessárias para o exercício do controle social da saúde. Manda a Lei 8.689: “O gestor do SUS em cada esfera de Governo, apresentará trimestralmente, ao conselho de saúde correspondente e em audiência pública nas câmaras de vereadores e nas assembléias legislativas respectivas, para análise e ampla divulgação, relatório detalhado, contendo, dentre outros , dados sobre o montante e a fonte de recursos aplicados, auditorias concluídas ou iniciadas no período, bem como sobre a oferta e produção de serviços na rede assistencial própria, contratada ou conveniada”.

5. FINANCIAMENTO
Segundo a Constituição Federal (Parágrafo Único, do artigo 198) o financiamento do SUS se dá pelo orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e Municípios, além de outras fontes. Portanto, o SUS é uma responsabilidade financeira dos três níveis de governo – federal, estadual e municipal. Confirmando esse conceito, em setembro de 2000, foi aprovada a Emenda Constitucional 29 (EC-29), que determina a vinculação de receitas das três esferas de governo para o SUS, definindo percentuais mínimos de recursos para as ações e serviços de saúde, vinculados à arrecadação de impostos e às transferências constitucionais . Provisoriamente, até que seja elaborada lei complementar, a EC-29 acresceu, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, o artigo 77, que define os recursos mínimos a serem aplicados, de 2000 a 2004, nas ações e serviços públicos de saúde, pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Por outro lado, reforçou a obrigatoriedade desses recursos serem aplicados por meio dos respectivos Fundos de Saúde, que serão acompanhados e fiscalizados pelos Conselhos de Saúde correspondentes. Portanto, desde o ano de 2000, passam a existir fontes de recursos e percentuais definidos para o SUS, o que antes não havia. Progressivamente, até 2004, a União terá que gastar no SUS, no mínimo, o valor empenhado no ano anterior acrescido da variação nominal do PIB – Produto Interno Bruto (5% em 1999). Os Estados e o Distrito Federal terão que gastar, no mínimo, 12% do produto da arrecadação dos impostos próprios e dos que lhes são transferidos pela União, deduzidas as parcelas que forem transferidas aos Municípios. O Distrito Federal e os Municípios terão que gastar, no mínimo, 15% o produto da arrecadação dos impostos próprios e dos que lhes são transferidos pela União e, no caso dos municípios, também pelos Estados. Com o advento da EC-29 estimou-se que o gasto público em saúde, em 2001, chegaria a casa dos 40,4 bilhões de reais. Destes, 22,2 bilhões (55%) gastos pela esfera federal, 7,7 bilhões (19%) pelos governos estaduais e 10,5 bilhões (26%) pelos municípios. São, fundamentalmente, 3 (três) os mecanismos de transferência dos recursos do SUS da União para os estados, Distrito Federal e Municípios: Transferência fundo a fundo: Os recursos são repassados diretamente do Fundo Nacional de Saúde aos Fundos estaduais e municipais, independentemente de convênio ou qualquer outro instrumento congênere, segundo as condições de gestão. · Transferência por Serviços Produzidos: Os recursos são pagos diretamente a prestadores da rede estadual ou privados, contratados ou conveniados, contra apresentação de faturas, referentes a serviços realizados conforme programação e mediante prévia autorização do gestor, obedecendo as tabelas editadas pelo MS/SAS. · Transferência por Convênio: os recursos são repassados via convênio, visando a execução descentralizada de programa e ações de saúde, com interesses mútuos, ou cumprimento de emendas parlamentares ou, ainda, a assistência financeira suplementar. Os recursos federais, devido à habilitação dos estados e municípios, passam a ser transferidos diretamente do Fundo Nacional de Saúde aos Fundos Estaduais e Municipais, em observância ao mecanismo instituído pelo Decreto N° 1.232, de 30 de agosto de 1994. Além das transferências do Fundo Nacional de Saúde, os Fundos Estaduais e Municipais recebem aportes de seus próprios orçamentos. E, em alguns estados, há o repasse de recursos próprios para os Fundos Municipais de Saúde, de acordo com regras definidas no âmbito estadual.

7. MUNICIPALIZAÇÃO A municipalização da saúde, estabelecida na Constituição Federal (Artigo 30, VII) e na Lei Federal 8.080 (Artigo 7°, IX, a), compreende sob dois aspectos: a HABILITAÇÃO dos municípios para assumirem a responsabilidade total pela gestão do sistema de saúde em seu território, e a DESCENTRALIZAÇÃO da gerência das ações e serviços de saúde para os municípios. Com a municipalização da saúde, o poder público municipal passa a ser o responsável imediato, porém não o único, pelas necessidades de saúde de seus munícipes. A municipalização da saúde, todavia, não exime os demais poderes públicos (União, Estados e Distrito Federal) e a sociedade da co-responsabilidade pela saúde. (CF, Artigo 194, caput). De acordo com a Norma Operacional Básica do SUS (NOB-SUS 01/96), GERÊNCIA é a administração de um Serviço ou Órgão de Saúde (Posto ou Centro de Saúde, unidade Mista, Hospital, Fundação, etc.), enquanto que GESTÃO é a administração de um Sistema de Saúde, através das funções de direção ou comando, coordenação, planejamento, controle, avaliação e auditoria. A municipalização é determinada: a) em nível federal pela CIT – Comissão Intergestores Tripartite, que reúne representantes da União (MS – Ministério da Saúde), dos Estados (CONASS – Conselho de Secretários Estaduais de Saúde) e dos Municípios (CONASEMS – Conselho Nacional de secretários Municipais de Saúde); b) em nível estadual, pela CIB – Comissão Intergestores Bipartite, que reúne representantes do Estado (SES – Secretaria Estadual de Saúde) e dos Municípios (COSEMS – Colegiado de Secretários Municipais de Saúde). A habilitação de um município em uma das condições de gestão definidas na Norma Operacional da Assistência à Saúde – NOAS-SUS 01/2002 – Plena da Atenção Básica Ampliada e Plena do Sistema Municipal, significa declarar compromissos assumidos, na pessoa do gestor municipal, perante os outros gestores do SUS – União, Estado e demais Municípios, e perante a população sob sua responsabilidade.

HISTÓRIA DO SUS
As duas últimas décadas foram marcadas por intensas transformações no sistema de saúde brasileiro, intimamente relacionadas com as mudanças ocorridas no âmbito político-institucional. Simultaneamente ao processo de redemocratização iniciado nos anos 80, o país passou por grave crise na área econômico-financeira. No início da década de 80, procurou-se consolidar o processo de expansão da cobertura assistencial iniciado na segunda metade dos anos 70, em atendimento às proposições formuladas pela OMS na Conferência de Alma-Ata (1978), que preconizava “Saúde para Todos no Ano 2000″, principalmente por meio da Atenção Primária à Saúde. Nessa mesma época, começa o Movimento da Reforma Sanitária Brasileira, constituído inicialmente por uma parcela da intelectualidade universitária e dos profissionais da área da saúde. Posteriormente, incorporaram-se ao movimento outros segmentos da sociedade, como centrais sindicais, movimentos populares de saúde e alguns parlamentares. As proposições desse movimento, iniciado em pleno regime autoritário da ditadura militar, eram dirigidas basicamente à construção de uma nova política de saúde efetivamente democrática, considerando a descentralização, universalização e unificação como elementos essenciais para a reforma do setor. Várias foram as propostas de implantação de uma rede de serviços voltada para a atenção primária à saúde, com hierarquização, descentralização e universalização, iniciando-se já a partir do Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento (PIASS), em 1976. Em 1980, foi criado o Programa Nacional de Serviços Básicos de Saúde (PREV-SAÚDE) - que, na realidade, nunca saiu do papel -, logo seguido pelo plano do Conselho Nacional de Administração da Saúde Previdenciária (CONASP), em 1982, a partir do qual foi implementada a política de Ações Integradas de Saúde (AIS), em 1983. Estas constituíram uma estratégia de extrema importância para o processo de descentralização da saúde. A 8ª Conferência Nacional da Saúde, realizada em março de 1986, considerada um marco histórico, consagra os princípios preconizados pelo Movimento da Reforma Sanitária. Em 1987 é implementado o Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), como uma consolidação das Ações Integradas de Saúde (AIS), que adota como diretrizes a universalização e a eqüidade no acesso aos serviços, a integralidade dos cuidados, a regionalização dos serviços de saúde e implementação de distritos sanitários, a descentralização das ações de saúde, o desenvolvimento de instituições colegiadas gestoras e o desenvolvimento de uma política de recursos humanos. O capítulo dedicado à saúde na nova Constituição Federal, promulgada em outubro de 1988, retrata o resultado de todo o processo desenvolvido ao longo dessas duas décadas, criando o Sistema Único de Saúde (SUS) e determinando que “a saúde é direito de todos e dever do Estado” (art. 196). Entre outros, a Constituição prevê o acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde, com regionalização e hierarquização, descentralização com direção única em cada esfera de governo, participação da comunidade e atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais. A Lei nº 8.080, promulgada em 1990, operacionaliza as disposições constitucionais. São atribuições do SUS em seus três níveis de governo, além de outras, “ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde” (CF, art. 200, inciso III).

DESCENTRALIZAÇÃO A formulação e a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) é a resultante de um expressivo movimento de reforma sanitária, inserido no movimento mais amplo de redemocratização do país e que teve na VIII Conferência Nacional de Saúde (1986) um de seus “locus” privilegiados para o estabelecimento das grandes diretrizes para a reorganização do sistema de saúde no Brasil. Ao lado dos avanços no campo político-institucional, com a estratégia das Ações Integradas de Saúde (AIS) e a implantação do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), houve um trabalho político no campo legislativo na Assembléia Nacional Constituinte, que estava formulando a nova Carta Magna do país. Desse modo, a saúde teve um expressivo reconhecimento e inserção na nova Constituição Federal, promulgada em outubro de 1988, destacando-se sua inclusão como um componente da seguridade social, a caracterização dos serviços e ações de saúde como de relevância pública e seu referencial político básico expresso no Artigo 196, no qual é assumido que “a saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”. Além disso, foram assumidos também os princípios da universalidade, da eqüidade e integralidade às ações de Saúde. Tanto que a sua regulamentação só foi estabelecida no final de 1990, com as Leis 8.080 e 8.142, nas quais se destacaram os princípios organizativos e operacionais do sistema, tais como a construção de modelo de atenção fundamentado na epidemiologia, o controle social e um sistema descentralizado e regionalizado com base municipal.

fonte: www.saúde.gov.br